sexta-feira, junho 18, 2010

Antonio (Toninho) Marchini


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 12 de JUNHO de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
ENTREVISTADO: Antonio (Toninho) Marchini
O inesquecível professor de Cálculo Integral e Diferencial Justino Castilho dizia que os números são a forma com a qual a natureza fala com os homens. Muitos profissionais que trabalham com cálculos matemáticos revelam-se grandes poetas, cantores, pintores, expressam de alguma forma o seu dom artístico. Antonio Marchini, ou Toninho Marchini, é muito conhecido em Piracicaba, por ter nascido na Água Branca, dedicado sua vida profissional por quarenta anos a uma empresa que foi orgulho para Piracicaba. Em seus momentos de folga Toninho exerceu seus dotes artísticos, embalando os sonhos de muitos casais e convidados em casamentos realizados nas igrejas de Piracicaba. Com uma voz extremamente semelhante a do cantor Nelson Gonçalves, parece invocar a presença do mesmo quando canta. Vale ressaltar que não é uma imitação do cantor, mas uma notável coincidência de timbre vocal. Com esse talento, passou muitas madrugadas cantando embaixo de janelas, acompanhado por alguns músicos com seus instrumentos, fazendo as tão românticas serenatas. É interessante observar que essas serenatas eram encomendadas por algum Romeu apaixonado, mas que não tinha talento ou coragem de dizer tudo o que sentia pela sua Julieta. Lá ia Toninho cantar e encantar com sua voz e seu conjunto musical. Um hábito quase secreto, muitas pessoas do seu circulo familiar ou pessoal nem imaginavam que aquele compenetrado contador era também um expressivo cantor. Por décadas Toninho foi muito mais do que contador da empresa Alvarco, formada pelos sócios: Marcos Contarini, Ricardo Alvarez Viñuela e Jorge Cesar de Vargas. Toninho Marchini era o quarto ponto de apoio dessa empresa que abasteceu o mercado nacional com produtos fabricados em nossa cidade, sendo os mais conhecidos as rodas de caminhão e peças para o sistema de freio.

Sua veia musical tem sua origem onde?

Acho que começou com o Jornal de Piracicaba. Meu pai vinha até a banca do João Elias, que ficava na Rua Benjamin Constant, esquina com Dr. Paulo de Moraes, comprava o Jornal de Piracicaba, onde eram impressas marchinhas de carnaval. Minhas irmãs me ensinavam a cantar, eu tinha sete anos, a mais nova tinha dezesseis anos, com isso passei a cantar inclusive na igreja da Água Branca, as pessoas achavam engraçado um menino pequeno cantando de forma afinada. Meu irmão mais velho chegou a ir para São Paulo com a finalidade de seguir a carreira artística, só que logo a saudade de casa trouxe-o de volta á Piracicaba. Eu sou barítono, ele era tenor.


Em que ano você casou-se?
Foi em 1964, ano da revolução, todo mundo dizia: “-Você é louco! Vai casar em ano de revolução!”. Casei-me com Ana Maria Calegaris, na capela do Colégio Dom Bosco de Americana, ela é natural de lá. Namoramos por cinco anos e meio, ia namorar viajando pelo ônibus da AVA, Auto Viação Americana. Nasci em 4 de julho de 1942, no bairro da Água Branca, Piracicaba, sou filho de Micheli Marchini, conhecido como Ângelo Marchini, nascido na Itália, e de Maria Mazzucato, nascida no Brasil. O primário fiz na escola do Bairro do Chicó, o preparatório e primeiro ano ginasial fiz no Colégio Dom Bosco. Em seguida fui estudar como seminarista salesiano na cidade de Lavrinhas em Minas Gerais. Quando deveria vir para Pindamonhangaba para fazer o noviciado desisti de seguir a carreira religiosa.

A sua vocação para sacerdote foi descoberta como?

O Padre Baron foi um dos precursores do Colégio Dom Bosco de Piracicaba, ele tinha um irmão, Seu Santo Baron, que trabalhou inicialmente na lavoura também no bairro Água Branca, onde meu pai tinha uma olaria, que vendeu e doou muito tijolo para a construção do colégio. A amizade entre o meu pai e Santo Baron, acabou aproximando meu pai do Padre Baron. Entusiasta da carreira religiosa, esse padre buscava despertar a vocação dos jovens para o sacerdócio, sendo o responsável pelo encaminhamento de muitos jovens para Lavrinhas, onde aqueles que tinham vocação poderiam prosseguir nos estudos até tornarem-se padres. Para mim foi ótimo ir para lá, havia mais de 120 pessoas no seminário, eu e outro seminarista por dois anos fomos os encarregados de lavar a louça da cozinha. Ganhei uma impressionante prática em lavar pratos! Minha ocupação principal era cuidar do teatro, foi construída uma nova igreja e o teatro do seminário passou a ocupar o local da antiga igreja. Realizamos as obras necessárias, aprendi como fazer instalações elétricas, conhecimentos que utilizei mais tarde, posso dizer que conheço bem o assunto. Trabalhei na iluminação de palco, efeitos especiais, fiz algumas participações em encenações de peças.


Você costuma lavar os pratos em casa?

Não!

Qual era o meio de transporte utilizado no tempo em que estudou no Colégio Dom Bosco de Piracicaba?

Eu e Irineu Razera vínhamos de bicicleta. Nos dias de chuva tomávamos chuva, ás vezes meu pai nos levava de charrete, era um tempo diferente, do bairro Taquaral chegava um carroção tracionado por dois ou três burros, com vários estudantes do colégio. O Nozella que foi gerente do Banco Mercantil vinha a cavalo; Osmar e Pedro Furlan vinham de charrete do bairro rural Chicó.

Após o período no seminário em Lavrinhas qual foi o próximo passo?

Estudei por um período no Dom Bosco, em seguida fui estudar o curso Técnico em Contabilidade no Colégio Piracicabano. Em 1974 na Unicamp fiz os cursos de Custo Industrial, Administração Financeira, Marketing e Planejamento e Controle de Produção.

Antes de entrar na Alvarco trabalhava onde?

Na empresa Implementos Agrícola Antonio Dedini, situada em frente ao barracão de cargas e descargas da Estação da Paulista, onde hoje se joga boliche. Ao lado havia a fabrica de vassouras Canta Galo, de propriedade de Giovanni Ferrazzo que gostava muito de cantar e tocar violão. Lembro-me de que ás vezes ia até a cidade de Matão, buscar peças, dirigindo um caminhão Opel, cambio seco. Um dia passei em frente ao local onde foi a Alvarco, estavam mexendo em uns fios, tudo indicava que uma nova empresa estava surgindo. Disseram-me que o contador, João de Oliveira Dorta, era a pessoa indicada para conversar. Na época eu fazia a contabilidade com escrita manual, e ele ia me ensinar a fazer a contabilidade mecanizada. Pensei que era uma oportunidade caída do céu. Além de contabilidade passei a mexer com almoxarifado, fiz um curso a respeito, aprendi a fazer fichas pelo sistema cardex.

Como era a Alvarco quando você passou a ser funcionário da empresa?

Existiam dois barracões, uma balança e um pequeno escritório com frente para a Avenida Dr. João Conceição. Anteriormente tinha pertencido a empresa Amaral Machado. Foi instalado um forno e a empresa passou a funcionar. Em seguida, no piso superior, foram construídas as instalações administrativas da empresa e os apartamentos dos proprietários da Alvarco.

Os proprietários Marcos e Ricardo se conheceram em São Paulo?

Eles trabalhavam em uma empresa chamada Omega. Fazia exatamente o que a Alvarco iniciou fazendo aqui: tambores de freio e peças para chassi de caminhão. O Sr. João Contarini, pai do Sr. Marcos Contarini, foi funcionário, por longos anos até a aposentadoria, do Sr. Paschoal D’Abronzo. Foi um funcionário padrão e por gratidão o Sr. Paschoal D’Abronzo, lhe fez uma promessa: “-Quando seu filho Marcos Contarini terminar o curso de torneiro mecânico na escola SENAI, eu monto uma oficina mecânica para ele”. O Sr. Marcos Contarini, trabalhava nas Indústrias Dedini, moço com a cabeça cheia de ideais foi exercer seu ofício em São Paulo, na empresa Omega. Lá conheceu um espanhol recém chegado ao Brasil, chamado Ricardo Alvarez Viñuela, ferramenteiro, com quem de imediato fez grande amizade e confidenciou a proposta que o pai tinha recebido do Sr. Paschoal D’Abronzo. Nesse meio tempo, o Sr. Paschoal D’Abronzo veio a falecer. No dia do velório do Sr. Paschoal D’Abronzo, o Sr. Jorge Cesar de Vargas, sabendo da promessa, confidenciou ao Sr. João Contarini: “-Eu cumpro a promessa do meu sogro Sr. Paschoal D’ Abronzo e no dia em que seu filho quiser voltar à Piracicaba eu monto uma oficina mecânica para ele”. Marcos Contarini e seu amigo Ricardo Alvarez Viñuela, já tinham exercido várias atividades dentro da empresa Omega, desde a área de engenharia, fundição, mecânica. Resolveram vir à Piracicaba e conversar com o Jorge Cesar de Vargas e assim montaram em 1954 as INDÚSTRIAS MECÂNICAS ALVARCO LTDA. De propriedade de Jorge Cesar de Vargas, Marcos Contarini e Ricardo Alvarez Viñuela, em partes iguais, 100% financiada por Jorge Cesar de Vargas. A junção dos nomes dos três formou a marca ALVARCO, AL(varez)VAR(gas)CO(ntarini), forte em todo território nacional. A empresa passou a funcionar em um prédio alugado na Vila Rezende, o Ricardo dormia no prédio.

Qual foi a sua participação nas obras das Alvarco na Rua do Rosário esquina com a Avenida João Conceição?

Tive participação efetiva, entre algumas realizações fiz a administração de materiais para a obra, lembro-me que aos fins de semana, na ausência dos proprietários, cheguei a molhar as lajes de concreto. Tinha por habito ir ao escritório aos domingos, olhava algumas coisas.

Você foi um dos primeiros funcionários administrativos contratado pela Alvarco?

Quando fui contratado havia um funcionário morador de Rio das Pedras, o Flauri, que estava saindo da empresa O Robertinho Franhani era contínuo, o Sr. Luis Antonio Luis Santos de Almeida já trabalhava lá.

Como você assumiu a contabilidade da Alvarco?

O João de Oliveira Dorta, Ciro Mendes e Araripe Castilho montaram uma empresa de móveis tubular, com a saída do João fui convencido a assumir a contabilidade da empresa. A Alvarco evoluiu muito rapidamente, com a importação de algumas máquinas da Alemanha ela deslanchou. O Seu Ricardo construiu uma maquina de granalha que dava uma excelente apresentação ás peças produzida. O fato de chamar indústrias, no plural, era pelas múltiplas atividades sem terceirizar etapas, a cadeia produtiva da Alvarco era muito grande. Foi uma empresa que contribuiu muito para Piracicaba, para o Estado.

Quantos funcionários trabalhavam na empresa?

No bairro da Paulista, em 10.000 metros quadrados chegamos a ter 350 funcionários.

Ao lado da Alvarco existiam os trilhos da Companhia Paulista de Estrada de Ferro, com instalações próprias para carga e descarga de gado vivo. Você chegou a presenciar essa movimentação de animais?

Vi sim! Cheguei a ir á Campinas com o Deputado Dr. Jairo Ribeiro de Mattos, para solicitar a permissão de fazer uma parceria com a Companhia Paulista e trazer ferro gusa e carvão coque. Não conseguimos.

A área da Cia. Paulista, que hoje está cercada e com um portão de ferro ao lado do Restaurante Frios Paulista, ia até onde?

Passava ao lado da Alvarco, saia na Rua Campinas, tinha um bico que fechava a Rua Campinas. Vinha confrontando com as casas existentes até a Rua do Rosário. Havia um pequeno lote de terras que não deixava a área chegar até a Avenida Nove de Julho. Os trilhos estavam assentados no nível da Rua do Rosário, a terra que existia até então foi retirada, era um terreno bem alto.

Da sua janela dava para ver a Estação da Paulista?

Conseguia ver muito bem a estação. Logo a minha frente havia um virador de locomotivas a vapor. Via a lavagens dos vagões com água quente, saia uma fumaça desse processo de higienização, os carros de passageiros saiam com o encosto de cabeça branquinho. A Companhia Paulista era um brinco.

Onde é hoje um posto Petrobras de combustíveis havia um posto e um restaurante, na esquina da Avenida Dr. Paulo de Moraes com a Rua do Rosário?

Era o Posto Canta Galo, que tinha anexo um Bar e Restaurante, o proprietário era Giovanni Ferrazzo, cheguei a cantar com ele. Pedro Chiquito trabalhava nesse posto como lavador de carros. Pedro Chiquito, um grande cantador de cururu, uma sumidade, deveriam falar “doutor” para ele. Ele cantava ao lado da Igreja dos Frades, nós íamos assistir suas apresentações, quando a trova era sobre a bíblia ninguém ganhava dele. A história de Piracicaba ele começava desde as origens em Itu, vinha descrevendo as famílias que deram origem a cidade. Quando eu era criança, Pedro Chiquito trabalhava em construções, meu irmão levava tijolo para as obras e eu ia junto, na hora do almoço enquanto os demais trabalhadores descansavam ele ficava lendo um pedaço de papel. Curioso como toda criança é, fiquei sabendo que ele estava memorizando um trecho da bíblia ou de um jornal que tinha algum assunto para depois ser cantado no cururu.

Você sempre foi muito meticuloso?

Sergio Defavari trabalhou muitos anos comigo, ele dizia que tinha orgulho de entrar na Alvarco com a luz apagada e pegar a pasta que fosse necessária, sem acender a luz. Eu tinha rascunhado o escritório da Alvarco quando foi construído, fiz um layout para cada armário fiz o seu desenho correspondente, marcava lado direito e esquerdo, para cada prateleira tinha escrito no papel lado direito 1, 2, 3 assim sucessivamente, o mesmo fazendo para o lado esquerdo, no papel estava relacionado o conteúdo de cada armário, ninguém se atrevia a colocar nada fora do lugar. Eu era muito exigente com relação a essa ordem. Um dia recebi a visita de um fiscal de Piracicaba, ele começou a solicitar documentos, passei-lhe a pasta que tinha o desenho dos armários, repartição com os documentos correspondentes e disse-lhe: “-O que o senhor precisar é só olhar na pasta onde encontrará exatamente a localização do documento que julgar necessário”. Ele ficou abismado. Um dia ele me ligou, queria levar uma pessoa para conhecer o escritório da Alvarco. Era o encarregado de organizar todos os postos estaduais do Estado de São Paulo. Recebi o visitante e dei-lhe a pasta que servia de índice para achar determinado documento. Na escrivaninha de cada funcionário tinha uma tabua retrátil, geralmente usada como apoio,eu exigia que fosse colocado um papel, do qual eu tinha uma cópia, discriminando o conteúdo de cada gaveta. Naquele tempo não existia computador, era tudo feito no papel.









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