sábado, julho 17, 2010

Irineu Laudelino Lopes

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS

JOÃO UMBERTO NASSIF

Jornalista e Radialista

joaonassif@gmail.com

Sábado, 17 de julho de 2010

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana

As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

http://blognassif.blogspot.com/

http://www.tribunatp.com.br/


ENTREVISTADO: Irineu Laudelino Lopes
Irineu Laudelino Lopes é o comerciante mais antigo do mercado municipal de Piracicaba, está a 64 anos na ativa. Formado pela lendária “Escola do Zanin”, quando jovem atravessava o Rio Piracicaba a nado, sócio do Clube de Regatas, remava sua catraia até onde hoje existe a “Ponte do Morato” e voltava rio acima, remando. Foi atleta campeão e presidente do Jaraguá Futebol Club. O Mercado de Piracicaba teve como construtor o engenheiro Miguel Asmussen, que entregou a obra pronta em 28 de fevereiro de 1887. A inauguração e o inicio do funcionamento aconteceram no dia 5 de julho de 1888. Esse intervalo entre a construção e o início efetivo das atividades, foi em decorrência da necessidade de preparar o entorno do prédio e, sobretudo pela confecção do regulamento de uso do Mercado, tanto pelos permissionários, pelos fornecedores como pelo publico consumidor. Tratava-se de uma nova maneira de comercializar, diferente da praticada até aquela data. Uma mudança significativa de hábitos e costumes, lembrando que no dia 13 de maio de 1888 foi sancionada a Lei Áurea, abolindo a escravidão da raça negra. A comissão formada por Prudente de Moraes e Paulo Pinto foi responsável pela elaboração do Projeto de Regulamento do Mercado de Piracicaba, sendo o mesmo apresentado em sessão de 15 de maio de 1887 junto a Assembléia Legislativa Provincial. Entre as peculiaridades, o artigo 18 diz que é proibido dentro dos limites do Mercado: “1-) O ajuntamento de pessoas ociosas que não estejam comprando nem vendendo e que possam perturbar o expediente de quem compra ou vende; 2-) Fazer algazarra e praticar atos ou proferir palavras imorais; 3-) Os ébrios, turbulentos e vadios; 4-) Sujar e danificar qualquer parte do edifício, escrever suas paredes, pintar,borrar,etc. 5-)Fazer fogo dentro do edifício e quatro metros em redor do mesmo, 5-) Amarrar animais nas grades ou nas árvores plantadas para decoração dos pátios do Mercado”, conforme consta nas atas existentes na Câmara Municipal. Com o passar do tempo essas regras sofreram mudanças, ou não teríamos os quitutes fritos na hora e um delicioso cafezinho, muito procurados no Mercado Municipal de Piracicaba. Por ali desfilaram piracicabanos de diversas gerações, criando vínculos e alianças. Atualmente o comerciante mais antigo do Mercado Municipal é Irineu Laudelino Lopes, há 64 anos trabalha em sua banca no Box número 19, que já pertencia a seu pai. Filho de Miguel Lopes e Antonia Moretti nasceu no bairro rural Pau Queimado, Piracicaba, no dia 28 de maio de 1931, casado com Aparecida Costa Lopes, filha de Francisco Luis Costa e Otilia Gazziolli Costa. É neto de Isidoro Lopes e Matilde Alcarde Lopes, seus tios Isidoro Lopes e Antonio Lopes foram comerciantes muito conhecidos.

A família do senhor mudou-se do Pau Queimado para a cidade?

Mudamos para a Avenida Dona Jane Conceição, depois mudamos para a Rua Sud Mennucci. Fiz o primário no Grupo Escolar Barão do Rio Branco, Da. Zica foi a minha primeira professora, tive aulas também com Da. Mimi, Dona Otília, o diretor era o Salustiano, depois veio o Aparício. Nessa época além das minhas irmãs Inês, Maria e Celina, eu era o único neto homem, meu avô passava na minha casa e me levava para o sítio, passear. Íamos de trole, pescava lambari, a noite ia com o meu tio Antonio até um ribeirão que existia no sítio, para tirar o peixe cascudo na toca. Aprendi a nadar no Ribeirão do Enxofre, tinha quatro “poços” para nadar lá. Estudei o ginásio no Instituto Piracicabano. Fiz o Curso Técnico em Contabilidade na Escola de Comércio Cristovão Colombo, do Pedro Zanin, ficava em cima do Cinema Politeama, de vez em quando passavam uns filmes de faroeste, nós escutávamos o tiroteio, íamos assistir ao filme. O melhor recreio de escola quem possuía era a nossa, ao sairmos da sala de aula estava com todo o jardim da praça central a nossa frente. Sou formado na turma de 1959. O meu pai e o meu tio Antonio tinham comprado o box no mercado em 1946, eu fui trabalhar com eles, fazia entrega de compras com uma carrocinha manual, com rodas de madeira e aro de ferro. Os fregueses iam, compravam e eu entregava. Infelizmente quase todos já faleceram Lembro-me de entregar na casa de Antonio Kok Leme, gerente da Casas Pernambucanas, do Antonio Sallun, da Dona Eutália, e outros fregueses. A compra era feita mensalmente, com isso eu tinha que fazer força para levar o carrinho, as ruas centrais eram calçadas em paralelepípedo, mas ainda existiam muitas ruas sem calçamento nenhum. Os vendedores de verdura traziam do sítio seus produtos em carrinho de tração animal, alguns vendedores de frutas como laranjas colocavam seus caminhões no pátio em frente ao mercado, esses veículos permaneciam meses no mesmo local, com outra condução abasteciam esses caminhões, eles não queriam perder o ponto. Após algum tempo meu pai e meu tio dividiram o Box entre si, ficando cada um com 25 metros quadrados de área de venda. Um pouco mais de tempo meu tio vendeu para Domingos Rafael, meu pai acabou adquirindo. O prefeito Luciano Guidotti em seu primeiro mandato reformou o mercado, com essas mudanças o nosso Box perdeu quase metade da área original.

Antes de adquirir o comércio no mercado qual era a atividade do seu pai?

Meu pai era frangueiro, sai muitas vezes com ele, na segunda feira ia para o Campestre, na terça feira ia para o Pau Queimado, na quarta ia á Dois Córregos, na quinta permanecia em casa para realizar as compras da encomendas feitas pela clientela, sexta feira ia para os Marins e no sábado para o Chicó. Com chuva ou com sol ele saia de manhã cedo. Meu pai era um homem muito calmo, nunca vi nenhuma pessoa igual. Ele tinha um burro branco chamado “Sereno”, o burro era mais calmo do que ele! Meu pai nunca usou um reio. Se tivesse uma touceira de capim ao lado da estrada, o burro ia lá e comia, meu pai esperava o burro comer para prosseguir a viagem.

O prédio do mercado mudou muito?

Olhando de frente para o mercado parte do lado esquerdo do prédio existente hoje, era descoberta, ali tinha a Arca de Noé, propriedade de Osni Massouh, o Galzerani, ficavam em barracas na área descoberta, inicialmente os produtos eram expostos sobre um pano estendido no chão, depois fizeram umas mesas de madeira. O mercado era cercado por um muro de um metro e pouco encima da qual vinha uma grade, as mercadorias ficavam a vista de quem estava do lado de fora, ninguém roubava. O cuidado maior era colocar os produtos mais sensíveis a chuva embaixo das bancas. Na esquina onde hoje há um prédio com uma farmácia na esquina, localizava-se o Hotel dos Viajantes.

Como era Da. Jane Conceição?

Era uma senhora muito fina, seu marido Dr. Jorge Pacheco Chaves era de estatura baixa. Eu era criança, nós escutávamos o cavalo que vinha batendo o sininho dependurado no pescoço, nós íamos correndo para abrir a porteira para eles passarem, sempre ganhávamos um dinheirinho. A porteira ficava nas imediações da Igreja São José, onde hoje é a Avenida Conselheiro Costa Pinto.

O senhor vendia fumo de corda?

Vendi sim, naquele tempo o fumo Bairrinho era muito famoso, era um fumo fraco, existia um fumo forte que vinha de Socorro, Bragança Paulista. Com o canivete fazia um pequeno corte e pela massa do fumo classificava suas qualidades. O fumo do Bairrinho, quando o miolo estava bem amarelinho ele era um fumo bem fraquinho, muito bom. Alguns clientes levavam por quilo, outros levavam um rolo de fumo inteiro. Um produto muito gostoso era a lingüiça de porco envolta em banha e embaladas em latas da marca Oderich. A lata de salada de frutas era uma delicia. O figo ramy, vinha em uma delicia.

Qual é o horário de funcionamento do mercado?

Para o público sempre a partir das seis horas da manhã, para os verdureiros abria às quatro horas da manhã. Fecha às cinco e meia da tarde. Se o comerciante necessitar ele pode permanecer no local fora desses horários.

Quantos Box existem hoje no mercado?

São uns setenta permissionários.

Hoje o senhor trabalha com uma linha de produtos diferenciada, como se deu essa especialização?

Inicialmente era um típico armazém de secos e molhados, atualmente trabalho com mais de 100 itens como trigo para quibe, farelo de trigo, farelo de aveia, gergelim, levedo de cerveja, linhaça, flocos de aveia, guaraná em pó. Um amigo, já falecido, o Osvaldo Bracalion sugeriu que eu deveria trabalhar com alguns desses produtos, achei a sugestão interessante e a adotei. Desenvolvi novos fornecedores.

A febre de consumo da “Ração Humana” ainda está firme?

Caiu um pouco. Algo parecido ocorreu com a aveia. A TV Globo em sua programação divulgou as qualidades da aveia, isso em uma sexta feira. Por coincidência eu tinha feito um pedido de aveia que chegou sexta feira a tarde. No sábado pela manhã começou a haver uma procura enorme por aveia. O meu estoque de aveia que deveria ser por um período maior em quatro dias terminou. Fiz mais um pedido, que rapidamente foi entregue. Em seguida começou a faltar aveia no mercado, eu consegui cobrir a demanda. Não me esqueço de uma senhora que me perguntou: “-O senhor tem aveia?”, respondi que tinha, ela então me disse que queria cinco quilos de aveia. Curioso, perguntei-lhe para o que seria toda aquela quantia toda, ela respondeu que seria para seu consumo, afirmando: Imaginei e disse-lhe que ela deveria ter uma família muito grande, ao que ela afirmou: “-É só para mim! Deu na televisão que é boa para isso, para aquilo.”. Sugeri que levasse apenas um quilo, o que já era bastante aveia para uma única pessoa.

A que horas o senhor dirige-se ao mercado para trabalhar?

Às cinco e meia da manhã. Fecho às cinco e meia da tarde. Aos sábados fecho à uma hora da tarde, e domingo ao meio dia. Quando meus pais eram vivos, as vezes eu tirava umas férias.

Onde o senhor conheceu a sua esposa?

Foi no meu caminho para o trabalho, meu pai saia de casa mais cedo e eu saia um pouco mais tarde, umas seis horas da manhã. Conheci a Aparecida quando ela voltava da compra que ia fazer em um açougue situado na Rua Governador, quase na esquina da Rua Riachuelo onde trabalhavam o Caneva e o Zambello.

O senhor jogou futebol na várzea?

Joguei como lateral direito e zagueiro central do Jaraguá Futebol Club, a camisa era vermelha, preta e branca. O primeiro campo ficava na esquina da Rua do Rosário com Avenida Dona Jane Conceição, onde depois foi a Angemar, hoje funciona um conjunto de lojas. O terreno ia até a Rua Campinas. Nessa época o Romeu Gomes de Oliveira, da Rodomeu, montou um açougue na Avenida Dona Jane Conceição, próximo ao campo de futebol. O Chico Pachani fez sozinho outro campo de futebol, na quadra logo abaixo. Quando o Jaraguá Futebol Club saiu desse primeiro campo foi para o local posteriormente ocupado pela Alvarco, onde hoje existe uma escola técnica.

Por muitos anos quem foi o presidente do Jaraguá Futebol Club?

Foi Abel Pereira, seu filho Jaime Pereira estava sempre presente.

Qual era o maior rival do Jaraguá?

Era o MAF, conhecido como Leão da Paulista. O nome MAF é formado pelas iniciais de Manoel Ambrósio Filho, empresário de São Paulo, proprietário da indústria de máquinas de costura Leonan, que fundou o time. Conheci muito o Olinto alfaiate, que foi presidente do MAF. Jogávamos contra os times existentes na época: Vera Cruz, Nacional, Unidos Club. Comecei a jogar em 1948 e parei em 1962, 1963.

Em que igreja foi o seu casamento?

Foi na Igreja dos Frades, no dia 22 de outubro de 1961, o celebrante foi Frei Liberato de Gries.

Dona Aparecida a senhora trabalhou muito tempo com costura fina?

Costurei por quase cinqüenta anos, a minha primeira maquina de costura comprei em 1955 na loja de propriedade do Cassano, que ficava em frente ao Mercado, onde hoje há uma agencia da Caixa Econômica Federal. Comecei a costurar com dezessete anos, parei há uns três anos. Fazia roupa de noivas, para festas de formaturas. Aos dezenove anos fiz o primeiro vestido de noiva para uma prima de Indaiatuba.

A senhora trabalhou ainda bem jovem com uma costureira famosa em Piracicaba?

Era uma costureira requisitada pelas senhoras da alta sociedade de Piracicaba, chamava-se Generosa Osoris Angeli, lá eu bordei muito para vestidos de noivas. Quando passei a exercer a profissão por conta própria mandava os bordados para serem feitos por outras pessoas. Naquele tempo usavam-se mais brocados, rendas. Meu pai Francisco Luiz Costa era cursilhista, ministro da eucaristia, ele trabalhou muitos anos como metalúrgico na Morlet, que ficava em um galpão onde hoje funciona a Calhas Pizzinatto, na Rua da Glória. Foi um tempo em que o fornecimento de água era sofria muitas interrupções, íamos buscar água na “Bica do Morlet”.















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