domingo, maio 04, 2014

MILTON COSTA


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 26 de abril de 2013.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

ENTREVISTADO: MILTON COSTA

 


Milton Costa é piracicabano, nascido a 6 de fevereiro de 1967, filho de José Costa e Maria Regina Paulino Costa que tiveram cinco filhos: Paulino, Milton, Vanderlei, Carlos Alberto e Luiz Fernando. Milton é casado com Silvana Aparecida Rodrigues, é pai de Caroline, Pedro Henrique, Amanda Beatriz e Gabriel.

Qual era a atividade do seu pai?

Era caminhoneiro, trabalhava na Monflex.- Industria de Moveis Estofados Monflex. Ltda. Ele era conhecido por “Zélão”. Ele dirigia um caminhão Mercedes-Benz, modelo conhecido popularmente como “Cara Chata”, furgão. Na época morávamos na Rua Ipiranga, próximo a MAUSA. Freqüentamos muito o Oratório Dom Bosco, próximo ao SENAI, isso na época do Padre Bordignon (Padre Luiz Ignácio Bordignon Fernandes, nascido em Brazópolis, MG em 20/04/1921 e falecido em Araras no dia 22/03/2006). Freqüentávamos as missas, onde ganhávamos pontinhos pela freqüência e no final do ano ganhávamos prêmios. Sou oratoriano dessa época.

Havia incentivo à pratica de esporte?

O esporte era muito incentivado! Lá foi um caminho muito abençoado na nossa vida. Éramos cinco irmãos, cinco crianças de uma família pobre. O Oratório Salesiano Dom Bosco é uma historia de Domingos Sávio que acolhia as crianças da rua e levava para Dom Bosco dar ensinamentos salesianos. Nós aprendíamos as orações e depois fazíamos a prática de esporte. O sonho do oratoriano era ser salesiano. Era ser estudante do Dom Bosco. Era uma escola particular de elite. Como freqüentadores do oratório entravamos umas três horas da tarde, o padre nos levava para as quadras. Havia as quadras para os oratorianos e para os salesianos. Em alguns momentos ambos os grupos usavam as mesmas quadras. Esse padre conseguiu uma área só para os oratorianos, deixou a parte de cima para os salesianos. Ele ainda conseguiu um espaço onde fez salão de jogos para os oratorianos, snooker, xadrez, ping-pong.

A disciplina talvez tenha sido uma dos fatores muito importantes nessa convivência?

Foi maravilhosa! Foi o que deu Norte para sermos uma pessoa do bem! O Oratório Salesiano recuperou muita criança! Quando eu tinha oito anos a minha mãe faleceu. Meu pai lutava pela sobrevivência, viajava muito dirigindo o caminhão. Quando perdi a minha mãe estava interno em um colégio em Ferraz de Vasconcelos.

Como você foi parar lá?

A minha mãe vendo as dificuldades que enfrentávamos aqui em Piracicaba, decidiu mudar-se para São Paulo, levando consigo os cinco filhos. A princípio fomos morar no bairro Barra Funda, havia uma empresa que era ligada a Martini, fábrica de doces. Minha mãe foi trabalhar lá. Não era possível ela trabalhar levando ao serviço os cinco filhos juntos.  Um dos filhos ficou morando na casa do meu avô Benedito Paulino Filho, uma personalidade muito conhecida em Piracicaba pelos famosos bailes que promovia. Meu avô era o famoso “Bidito”! Uma das minhas tias, Vilma Paulino, sensibilizada com a nossa situação foi nos buscar, assim voltei a morar em Piracicaba na Rua Bernardino de Campos, 802, em frente ao Palmeirinha. Nessa época eu tinha de 12 a 13 anos. Eu já tinha freqüentado anteriormente a escola no Grupo Escolar Barão do Rio Banco, na Rua Governador Pedro de Toledo, em Piracicaba, isso quando morava na Rua Ipiranga, vi construir o Teatro Losso Netto. Brincávamos lá na época. Do Grupo Escolar Barão do Rio Branco fui estudar no Grupo Escolar Dr. Alfredo Cardoso. Por uma temporada fomos morar na casa do Tio Dirceu, ele era pintor de paredes. Com muitas crianças na mesma casa, nós acabamos indo para a Casa do Bom Menino.

O que era a Casa do Bom Menino?

Uma instituição que agrega crianças de rua, abandonados pela família. Vinha muita criança da FEBEM ( Fundação do Bem Estar do Menor) de São Paulo para Piracicaba. Tanto que encontrei alguns meninos que haviam estado comigo na casa de Ferraz de Vasconcelos aqui na Casa do Bom Menino. Isso depois de muitos anos.

A Casa do Bom Menino acolhia só crianças abandonadas ou também crianças problemáticas?

Acolhia a todos. Funcionava mais como um orfanato. Não era abrigo específico de menores infratores. Eram crianças que por inúmeras razões estavam abandonadas a própria sorte. Tivemos em Piracicaba outra instituição que por muitos anos acolheu e educou crianças nessas condições, que foi o Lar Franciscano de Menores. Assim como havia para as meninas o Lar Maria Nossa Mãe.

Com o advento do polêmico Estatuto da Criança e Adolescente essas instituições simplesmente foram extintas?

Foi isso mesmo. No Lar do Bom Menino tínhamos um bom time de futebol.

Em que posição você jogava?

Jogava de meio direita. Eu era muito rápido e tinha o raciocínio rápido em campo.

Nesse período em que permaneceu na Casa do Bom Menino você chegou a fazer algum curso?

Estudava na Escola Estadual de Primeiro Grau Prof. Augusto Saes. A Casa do Bom Menino situava-se na Rua Machado de Assis. Próximo ao Jardim Elite. Acordava as seis horas da manhã, ia até ao Augusto Saes e depois ia até a Casa do Bom Menino. Era semi-interno. Eu dormia na casa do meu tio e passava o dia na Casa do Bom Menino. Lá existia o curso de marcenaria, a Philips mandava as bobinas para serem trabalhadas, havia a serralheria. Conforme a vocação, um seguia um aprendizado. Os que gostavam de trabalhar com móveis trabalhavam na marcenaria. Os equipamentos eram projetados para oferecer a segurança adequada. Nessa época eu já estava com 16 a 17 anos.

Você se identificou com qual atividade?

Eu gostava de trabalhar com a Philips, era para passar quatro voltas de um fio em uma bobininha, fazia 100, 200, isso rendia um dinheirinho bom. Eu gostava também da marcenaria e do esporte. Havia um professor de educação física que além de aulas regulares proporcionava também o jogo de futebol. Portanto eu tinha o ensino regular na Escola Augusto Saes, almoçava na Casa do Bom Menino, As cinco e meia já tinha tomado banho, jantado e estava pronto para voltar para casa. Com o passar do tempo ia permanecendo cada vez mais na Casa do Bom Menino, lá estavam meus amigos. Com o decorrer do tempo passei a ser interno da Casa do Bom Menino.

Você acha que se não tivesse esse apoio da Casa do Bom Menino sua vida poderia ter seguido um rumo diferente?

Lá aprendemos a seguir regras e a ter disciplina. Em nosso meio havia menores infratores, que também seguiam as orientações que nos eram dadas. Só que éramos adolescentes, oriundos das mais diversas origens, com formações familiares distintas, era um convívio que às vezes gerava pequenos conflitos entre nós mesmos. Quem zelava para que a ordem fosse mantida era o diretor Antonio Carlos Danelon, o Totó, assistente social da Prefeitura Municipal. Ele sucedeu o Mineirão, que tinha métodos extremamente rígidos com os jovens. O Paulino, jogador do XV de Novembro, foi coordenador nosso na parte esportiva. O Paulino era uma referência para nós, ele tinha sido jogador do Santos. Até hoje o Totó me chama de filho! Lá que ele conheceu sua esposa Sueli. Era um período da nossa vida em que como jovens estávamos formando nossa personalidade. Tempo em que todos ambicionavam ter uma calça Lee, Lewis. Tínhamos a ânsia natural da idade em nos auto-afirmarmos. Só que tínhamos que trabalhar. Posso afirmar que o melhor conselho é o exemplo que recebemos de outras pessoas. Você sente que realizar ou dizer algo errado é mais difícil.

Com que idade você saiu da Casa do Bom Menino?

Sai de lá com uns 18 anos. Fui ser servente de pedreiro, por um tempo voltei a morar com a minha tia, depois acabei morando na rua. Dos 18 aos 20 anos fui morar na rua. Ao lado da antiga revenda Chevrolet, a Colina, havia os ônibus da Viação Prisma, havia um muro enorme do Posto dos Furlan, meu pai ficava com o caminhão lá, passei a morar dentro do caminhão, só que ele tinha que sair cedo para carregar o caminhão, e eu tinha que acordar cedo e sair do caminhão. Com o passar do temo nós pulávamos o muro e dormíamos dentro dos caminhões da CCNC- Comércio de Combustíveis Noiva da Colina. Eu passei a trabalhar como frentista no posto de gasolina situado na Avenida Saldanha Marinho, eu tinha uns 20 anos. Fiquei uns três anos trabalhando no posto. Fui trabalhar em uma empresa de comércio de combustíveis, meu serviço era o de limpar piche desses tanques que são colocados no solo e funcionam como depósito de combustíveis de postos de gasolina. Eu tinha que tirar aquele piche com querosene.

Pelo lado externo ou interno do tanque?

Entrava no do tanque, sozinho, sujeito a um mal súbito, era um ambiente bastante tóxico, sem ventilação, usava uma mascara de enfermagem, botas, bermuda e sem camisa. Depois voltei a trabalhar no posto de gasolina. Embora trabalhasse aos sábados até as oito horas da noite o salário era melhor e o serviço mais saudável. Após algum tempo, com uns 22 anos, fui morar no bairro rural Limoeiro, adiante de Artemis.

Como você foi parar no Limoeiro?

Eu tinha amizade com um grupo que era da família Broggio, eram proprietários da indústria Santin, eles tinham uma chácara onde sempre tinha festas e eu freqüentava. Em um carnaval teve uma festa, acabei perdendo a hora de trabalho no posto de gasolina, perdi o emprego. Passei a trabalhar para a família, como trabalhador rural, cuidando de porco, do jardim, era um serviço mais sossegado, a alimentação era melhor. Morei na Fazenda Santo Antonio por quatro anos mais três anos na chácara. Foi na fazenda que aprendi a trabalhar com implementos agrícolas, domar cavalos, cuidar de gado.Curava bezerros, por uma ano tratei de um touro nelore que tinha tido uma briga com um touro holandês. Ganhei experiência em aplicar injeções em animais. Voltei para a cidade, fui trabalhar na Nechar  em Rio das Pedras, saia as 4:15 da manhã de casa, pegava o ônibus da empresa as 5 horas da manhã na Avenida Armando Salles, tinha voltado a morar com minha tia Vilma, na Rua Bernardino de Campos. Essa minha tia foi importantíssima na minha vida. Meu irmão mais velho nos deixou, foi seguir a carreira esportiva. Eu fiquei com a incumbência de olhar pelos meus irmãos. Na Nechar eu era terceirizado através de uma agência de Piracicaba, fui admitido como funcionário da Nechar para trabalhar no estoque da empresa. Lá eu vi a primeira greve na minha vida. Fui convidado a voltar a trabalhar na Fazenda Santo Antonio, no Limoeiro. Voltei. Só que a minha visão sobre as coisas eram diferentes, as coisas tinham mudado na fazenda. Voltei a morar com a minha tia. Lembro-me que teve um domingo em que chorei o dia inteiro. Identifico-me muito com o problema de outras pessoas. Na segunda feira consegui trabalho na Gramarmo, de propriedade de José Benedito Longo. Ele me deu uma oportunidade, eu cortava aproveitamento. Pedrinhas de 10X10; 5X5 centímetros. E assim por diante. Eu não era serrador, era ajudante. Trabalhava em máquinas perigosas como serrador e cortando aproveitamento sem experiência nenhuma. Fui pleitear meu direito, o serrador tem o melhor salário de uma marmoraria. Vendo meu nível de trabalho, colocaram-me no acabamento, na entrega, Sai da serra, que era uma qualificação profissional em que deveria ter sido mantido e passei a ser ajudante de entrega. Fui conhecer o mundo. A empresa era muito forte. A Gramarmo tinha até premiações concedidas por órgãos do setor de rochas e granito. Fizemos o serviço de mármore na casa do banqueiro dono do Banco Safra, em São Paulo. Colocamos muito mármore em mansões nos bairros Morumbi, Interlagos.

Você chegou a fazer um trabalho em que abaixo do piso de mármore havia uma serpentina de cobre para aquecimento do mármore no inverno?

Fizemos esse trabalho na mansão do Jair Coelho, “Rei das Quentinhas”, no Rio de Janeiro. (Famoso fornecedor de refeições que servia a 6.500 presos do Estado do Rio de Janeiro) Era mármore transparente, mármore-ônix, importado. Durante essas viagens ficava hospedado em hotel. Permaneci na Gramarmo por uns seis anos. Fui trabalhar na Casarin, logo em seguida trabalhei na Marmo Itália Mármores E Granitos Ltda. Fui convidado por um sindicalista de Campinas de nome Alcides e por Sebastião Antonio de Moraes. O sindicato existe desde 1947. Em 1999 vim prestar serviços no sindicato. Em 2003 assumiu a presidência do sindicato Edson Batista dos Santos que exerceu dois mandatos. Em 25 de agosto de 2010, após eleito, assumi a presidência do sindicato. 

Quantos diretores tem o sindicado?

São 16 diretores, sendo que 14 permanecem trabalhando nas respectivas empresas e apenas dois estão afastados dedicando-se exclusivamente ao sindicato. Temos um grupo de 15 funcionários que trabalham no sindicato. No período em que o Edson foi presidente assumi a pasta da Co-Emprego, do Conselho de Saúde, Comitê Permanente Regional sobre Condições e Meio Ambiente do Trabalho na Indústria da Construção – CPR, Comsepre (Conselho Municipal de Prevenção de Acidentes do Trabalho), Comitê Permanente Nacional – CPN e a Feticom- SP (Federação dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção e do Mobiliário no Estado de São Paulo) onde fui diretor regional, diretor de formação e hoje sou diretor tesoureiro.

Você tem um lema?

Tenho: “Quem quer faz, que não quer fazer cria problemas”, esse ditado me foi passado pela minha tia-mãe, a tia Vilma. Ela disse isso em uma ocasião em que argumentei algo sobre a dificuldade em fazer determinada tarefa Nunca mais esqueci isso na minha vida. Por isso fiquei um pouco arrojado. Somos o que desejamos ser.

Quantos associados existem no sindicato?

Começamos no ano 2.000 com 380 associados. Hoje temos 6.500 associados com carteirinha, de um total de 11.000 sendo que a Categoria Geral de Trabalhadores são 20.000 trabalhadores.

Qual é a região que abrange o SINTICOMPI?

Abrange São Pedro, Águas de São Pedro, Santa Maria da Serra, Ipeuna, Charqueada, Rio das Pedras, Anhembi, Torrinha. Estamos abrindo sub-sede em São Pedro e outra sub-sede em Rio das Pedras. Há um projeto de 2016 sair de Santa Maria da Serra a primeira barcaça. Essa é a promessa dos governos estadual e federal.

O SINTICOMPI oferece uma série de cursos e campanhas aos seus associados, pode citar alguns?

Temos um grande número de cursos de formação profissional, além de campanhas como a do fim da marmita.

A mulher está despontando no setor da construção civil?

Tivemos no passado na direção uma mulher. Hoje o sindicalismo é muito dinâmico e muitas vezes exige estar fora de casa, o que nem sempre é possível a mulher que acumula tarefas, profissionais e domésticas. No canteiro de obra a presença da mulher já é uma realidade.

Como é a relação da mulher com relação aos colegas do sexo masculino?

Esse é um dos primeiros impactos. Por natureza a mulher é mais dedicada aos estudos do que o homem. Ela tem a sensibilidade mais apurada. Ela vai para o canteiro de obras com grande s vantagens sobre o elemento masculino.

A mulher realiza serviços com mais perfeição do que o homem?

Faz. E ela assume a responsabilidade pelo que faz. Ela se propõe a desafios, temos mulheres que trabalham em cadeirinha de balanço fazendo pinturas externas em prédios. O SINTICOMPI é um sindicato participativo, um sindicato cidadão. Oferecemos aos associados colônia de férias, dentistas, Cabeleireiras, médicos, advogados, oftalmologistas, cursos de computação. Nosso desejo é “Peão não! Cidadão!”. Esse é o nosso projeto na saúde, segurança e direito relacionado ao trabalho. Através do sistema “S” de serviço, como se trata da indústria da construção, temos o SESI como ponto de lazer. Temos dentro das instalações do sindicato um curso de alfabetização para os associados, temos a ConsFort, que é uma parceria terceirizada, onde qualquer pessoa interessada pode participar, é um curso livre, sem custo, com os cursos de Mestre de Obras, Pedreiro de Alvenaria, Pedreiros de Revestimento Argamassa, Pedreiros Pisos Cerâmicos, Paisagismo, Controladores Lógicos Programáveis, Comandos Elétricos, Eletricista Instalador (Predial), NR 10, NR 10 Reciclagem. O maior piso salarial da categoria no Estado de São Paulo é o de Piracicaba.

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