sábado, dezembro 27, 2014

ELIAS SALUM


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 22 novembro de 2014.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/

ENTREVISTADO:  ELIAS SALUM

 


Elias Salum nasceu em Piracicaba a 20 de agosto de 1929. Filho de Issa Salum e Jamile Abdalla Salum que tiveram os filhos Antonio, Pedro,  Faride, Elias, João. Elias Salum é Ex-membro do Conselho de Ensino e Pesquisas da Unimep, Membro fundador do Primeiro Diretório da E.C.A. – Escola de Contabilidade e Administração, origem da Unimep, Ex-Chefe do Departamanto Municipal da Educação, Ex-Gerente Administrativo e Financeiro da CIPATEL, Companhia Telefônica de Piracicaba, Radioamador Classe “A”, remido da LABRE. Fundador de vários grupos de escoteiros em Piracicaba, Limeira, Americana, Fundador do Primeiro Jornal “O Funcionário Público” da municipalidade local. Membro do Conselho de Sentença do Fórum de Piracicaba. Membro fundador da ADERP (Associação dos Administradores de Empresas).  Membro fundador do Instituto Histórico e Geográfico do qual foi por duas vezes presidente. Membro fundador da Sociedade “Amigos do Museu Prudente de Moraes”. Presidente de Honra da Sociedade Sírio Libanesa. “Persona Grata” da Câmara de Comércio Árabe de São Paulo. Autor de dezenas de artigos jornalísticos.  Autor do livro “Memórias dos 20 anos do Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba”. Por mais de 10 anos atuou como Relações Públicas da UNIMEP. Detentor de dezenas de diplomas e certificados de conclusão e participação em cursos em diversas áreas. Colaborador na criação da Universidade Metodista de Piracicaba. Presidiu a fundação do Instituto Histórico de Rio das Pedras. Detentor de inúmeras medalhas de mérito e condecorações culturais. Orador oficial da Academia Piracicabana de Letras. Professor 1º,2º,3º graus, Contabilista, Radiotécnico, Administrador de Empresas com especialização em Engenharia Econômica, Graduado em Letras e Literatura Luso Brasileira, Orador oficial do Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba, Delegado da LABRE (Liga Brasileira de Radioamadores). Participou de Conferências e Debates sobre Cultura Brasileira em 1990 na Syria, (Universidade de Damasco), na Jordânia, Universidade de Ibert-Amã. Orientador de vários Congressos Culturais e Técnicos Radio amadorísticos.   

O senhor sempre teve uma das mais intensas participações em inúmeros setores educacionais e culturais de Piracicaba. O que o motiva a esse dinamismo?

Meu pai, após a Primeira Guerra Mundial, participou em Damasco, na assistência aos feridos e sepultamentos dos que morriam combatendo. Após o término da guerra ele casou-se, meu irmão Antonio nasceu quando ainda meus pais moravam na Síria. Em 1918, após o termino da guerra meu pai decidiu imigrar para o Brasil, onde meus tios já se encontravam. A princípio ele veio para São José do Rio Preto, na década de 20 ele veio à Piracicaba. Quando éramos crianças, ele reunia os filhos, que sentados ouviam seus conselhos, entre eles que devíamos seguir a religião praticada no Brasil, a Católica Apostólica Romana e deveríamos aprender e falarmos o português. Entre suas orientações, uma delas é de que nunca deveríamos nos entregar ao desafio. Deveríamos enfrentá-lo. Outro conselho que sempre orientou a nossa vida, e que ele sempre dava: “- Façam o que puderem pela terra que nos abrigou!”. Éramos ainda crianças, mas ele já perguntava-nos o que tínhamos feito por Piracicaba!

O senhor iniciou seus estudos em qual escola?

Eu estudava no Grupo Escolar Alfredo Cardoso, localizado na Rua São José esquina com Alfredo Guedes, entrava no portãozinho, já ouvia meus coleguinhas alvoroçados dizendo: “ Turquinho chegou! Turquinho chegou!”. Eu chorava. Um dia cheguei em casa chorando, meu pai não tinha saído para o trabalho, ele quis saber o que tinha acontecido. Ele então me disse: “-Amanhã, antes de ir à escola fale primeiro comigo!”. Ele fez uma bandeirinha da Síria, que conservo até hoje. Disse-me então: “Amanhã quando for à escola, leve esta bandeira, abra o portão e fale em alto e bom tom: “-Turquinho chegou! Turquinho chegou!”. Era uma forma de neutralizar uma brincadeira que para os demais garotos era uma brincadeira inocente. Meu pai nos orientou bastante na vida, participei de dezenas de entidades. (Só os descendentes de sírios e libaneses sabiam qual era o sentimento de serem erroneamente chamados de turcos. A Turquia dominou uma grande região pelo terror. Nos passaportes dos imigrantes sírios e libaneses vinha o carimbo da Turquia que dominava politicamente a região. Portanto denominar de turco um sírio ou libanês trazia-lhe as lembranças dessa época, em que ele ou seus antepassados viveram).

O senhor nadou no Ribeirão Piracicamirim?

Aprendi a nadar no Piracicamirim, quando fui com o Gatão, célebre jogador de futebol e o meu irmão Pedro. Por muitos anos freqüentei o Clube de Regatas de Piracicaba, eu competia em salto do trampolim. Junto com Francisco Caldeira fomos classificados em primeiro lugar no salto em trampolim. Eu praticava halteres, um dia o Cantarelli pediu que eu simulasse uma luta com o ator Milton Ribeiro, estavam fazendo uma filmagem, só que ele não me explicou que deveria simular a vitória do Milton, acabei por colocá-lo em terra, fugindo do roteiro da gravação. Só depois é que o Cantarelli explicou-me como deveria ser feito.

O senhor atuou como cobrador de ônibus?

Na época do empresário João Marchiori, eu era criança quando tinha o ônibus que fazia o trajeto do centro até o cemitério indo pela Rua Moraes Barros. Depois voltava descendo a Avenida Independência que era chão de terra. Eu apanhava o ônibus que passava em frente a minha casa, não havia cobrador, o motorista pedia que eu cobrasse dos passageiros, facilitava o seu trabalho, com isso ele acabava não cobrando a minha passagem! Ainda criança, quando havia festa na Igreja Bom Jesus eu era engraxate. Por um ano fui engraxate, às vezes ia até a Praça José Bonifácio. No início lutamos com muita dificuldade.

Quando a Catedral de Santo Antonio pegou fogo o senhor chegou a ver?

Isso aconteceu quando eu morava perto do cemitério. Alguém passou e disse que estava pegando fogo na catedral. Peguei o cavalo, desci a Rua Moraes Barros, quando cheguei vi que o incêndio estava controlado. A Sociedade Sírio Libanesa doou uma parte dos vitrais das janelas, posteriormente.

O senhor lembra-se onde ficava o Hotel Orsini?

Ficava na Rua D.Pedro I com a Rua Boa Morte, o Hotel dos Viajantes situava-se na Rua D.Pedro II com a Rua Governador Pedro de Toledo, ao lado do Mercado Municipal. O Hotel Jardineira foi demolido há poucos anos, situava-se na Rua XV de Novembro esquina com a Rua Governador Pedro de Toledo.

O senhor é um dos primeiros radioamadores de Piracicaba?

Fundei a Associação dos Radioamadores de Piracicaba, na década de 1970,  radioamadorismo foi muito importante na época em que não havia televisão, telefone era precário, as comunicações eram muito difíceis, através do radioamador comunicava-se com o mundo todo. Guardo cerca de 1.000 cartões que foram enviados por radioamadores do mundo todo. Recebi do Japão uma homenagem de bronze. (O Professor Elias nesse momento profere palavras em japonês).

Quantos idiomas o senhor fala?

Português e árabe. Aprendi alguma coisa da língua japonesa.

O senhor tem uma paixão pela fotografia?

Sempre gostei muito, tirei muitas fotos, o Bishoff é quem revelava

Quando houve a queda do Comurba o senhor já era radioamador?

Quando caiu o Comurba eu era radioamador, um fato pitoresco é que todas as emissoras de rádio e televisão divulgavam que tinha caído o Edifício Luiz de Queiroz, nome oficial do prédio, pessoas das mais longínquas localidades, como Ceará, Bahia, Amazonas, queriam maiores informações, muitos tinham filhos e parentes estudando na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz. Junto com Arnaldo Ricciardi montamos uma estação de radioamador na Praça José Bonifácio e começamos a atender o público. Ficamos dois dias praticamente sem dormir, comunicando-nos: “ PY2-CLZ (Canadá,Londres,Zelândia - CLZ) Piracicaba. O radioamadorismo deu uma grande contribuição à Piracicaba, eu entrevistava muitas pessoas, eles vinham para cá, nos comunicávamos. Aproximava e ampliava o nome de Piracicaba no Brasil e no mundo.

O senhor apresentou um programa no rádio piracicabano?

Fui o primeiro técnico da rádio “A Voz Agrícola do Brasil de Piracicaba”, sou formado como rádio-técnico e em eletricidade também. Quando foi fundada a “Rádio A Voz Agricola” ficava no andar superior do local onde atualmente é um supermercado, na esquina da Rua XV de Novembro, atrás da Catedral de Santo Antonio. Comecei a trabalhar como técnico e depois como locutor de alguns programas, inclusive infantil. Depois reuni a Sociedade Sírio Libanesa de Piracicaba e todos os comerciantes de origem árabe passaram a patrocinar, participavam das aulas que eu lecionava em árabe, musicas árabe, chamava-se “Jóias Árabes”. Quando chegou um novo gerente da rádio, ele encarregou-me de ir até Uberaba entrevistar Chico Xavier. Antonio Cantarelli me incentivou a ir. Fui até Uberaba, expliquei à Chico Xavier , fui muito bem recebido, tirei umas fotografias junto a ele. Quando nasceram meus filhos voltei a Uberaba. Chico Xavier era uma das maiores luzes fulgurantes da humanidade. Lembro-me de uma passagem, onde havia muitas pessoas, todas tentando expor seus problemas. Ele as organizou, e passou a orar com elas: “Pai nosso que estais no céu, o pão nosso de cada dia e repetiu, o pão nosso de cada dia, até que alguém complementou a continuação da oração “perdoai as nossas ofensas assim como perdoamos a quem nos tem ofendido”, Chico Xavier então afirmou: “-De nada adianta orar se não praticar! Se você souber  apenas reclamar não adianta nada, tem que perdoar!”. Todos entenderam a mensagem, em 10 minutos esvaziou o salão que antes só tinha pessoas se lamentando. Chico Xavier era uma pessoa muito humilde, muito simples. Teve um episódio muito cômico, eu trabalhava como técnico na Rádio A Voz Agrícola de Piracicaba, levei todo o material para fazer a transmissão do jogo do XV de Novembro, o jogo era no Estádio Roberto Gomes Pedrosa, o locutor que ia transmitir o jogo não chegava, telefonei para o gerente da rádio, ele simplesmente disse-me: “Então você transmite o jogo!”.  Disse-lhe: “- Mas eu não entendo nada de futebol!”. Ele disse-me: “ Não tem problema, irradie assim mesmo!”. Transmiti o jogo inteiro: “ A bola está de posse de Piracicaba, agora está de posse de Itu, novamente está de posse de Piracicaba, Itu domina a bola agora!” Foi assim o jogo todo! Foi a primeira e última vez que narrei uma partida de futebol!

O senhor foi presidente do Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL) em Piracicaba?

Fui presidente e membro fundador. Foi um movimento muito importante na vida de muitas pessoas, durante anos, jovens e adultos frequentaram as aulas do MOBRAL, cujo objetivo era propocionar alfabetização a pessoas acima da idade escolar convencional

Quantos filhos o senhor tem?

Sou casado com Maria Alice de Paiva Salum, temos dois filhos: André de Paiva Salum, médico, e minha filha Eliana Salum.

O senhor tem um carinho muito especial pela Sociedade Sírio Libanesa.

Nas décadas de 40 e 50 eu auxiliava o Padre Abdalla que vinha de Campinas celebrar a missa ortodoxa, na própria sede. Eu ajudava o padre, pegava o turíbulo e ele em árabe me dizia para colocar incenso. Eles falavam só em árabe e eu entendia muito bem. A Sociedade Sírio Libanesa teve como fundamento associar os imigrantes, acolheu e apoiou esses imigrantes. A grande maioria assim que chegava, queria ser mascate, assim como meu pai foi. Diziam a algum membro, como disseram para mim: “ –Elias, você vai com fulano e mostra onde fica o Bairro do Taquaral, Batistada, Tupi”. Por uns 15 dias acompanhava o imigrante recém-chegado, ia de carroça e cavalo. Meu pai foi mascate quase a vida inteira. Um fato curioso aconteceu no Bairro Taquaral, existe a linha da Estrada de Ferro da Companhia Paulista, eu estava na carroça, com meu pai, comendo um lanchinho. Chegou um garotinho e disse-nos: “- Dá uma esmolinha!”. Meu pai perguntou-me em árabe o que ele queria. Respondi a meu pai, em árabe, que o menino queria dinheiro. Meu pai tirou quinhentos réis e perguntou-me se era muito ou pouco. Entreguei. O menino curioso perguntou-me: “ – O que ele está falando?”. Disse-lhe que era em árabe. O menino aterrorizado disse: “-É turco!”, jogou o quinhentos réis no carrinho e disparou na estrada de ferro. Gritou: “Turco come gente!”. (Essa é mais uma lenda que segundo os estudiosos tem sua origem no fato de árabes apreciarem o quibe cru). Fui coroinha na Igreja Bom Jesus, com o Monsenhor Martinho Salgot. Já mais mocinho me formei como rádio técnico, montei alto-falantes dentro da Igreja Bom Jesus. O Monsenhor Martinho Salgot não gostou da forma como foi montado. Na época criticou meu trabalho. Só que esses alto falantes funcionaram por muito tempo. Com o passar do tempo tirei os alto falantes, subi no forro da Igreja Bom Jesus, até hoje meu alicate de corte deve estar lá, eu o esqueci! O Frei Paulo do Seminário Seráfico interessou-se pelos alto falantes, levamos para a Igreja dos Frades, e passamos a usá-los durante as missas.

A família do senhor teve um estabelecimento comercial?

Na Rua Governador Pedro de Toledo, ao lado onde atualmente é a Casas Bahia havia a loja Casa da Paz, trabalhava com tecidos e armarinhos, pertencia a nossa família. Não havia o trânsito que existe hoje. As pessoas vinham do sítio, eram convidados a entrar e normalmente adquiriam produtos. Naquele tempo havia muita troca de mercadorias por produtos agrícolas, animais, ovos. Aos sábados eu levava para Fernando Gutierrez as mercadorias, que ele iria despachar. Ele estava estabelecido próximo ao Teatro Municipal, em uma travessa. Naquela época eu fazia tudo a cavalo, levava mercadorias a cavalo. Meu pai às vezes trocava mercadorias com cavalo xucro, eu tinha o dom de amansar cavalo. Nessa época morávamos na Rua Moraes Barros esquina com a Avenida Independência. Onde hoje há uma árvore enorme era um bosque, daquela região tiravam saibro para fazer construção. Faziam muito buraco, os caminhões depositavam lixo nesses buracos. Onde hoje é o Estádio Barão de Serra Negra havia o Bosque Barão do Rio Branco. Eu vivia dentro do bosque, tinha muitos tipos de frutas, coquinho.  Quando dava tempestade e caiam os galhos, trazia para colocar em nosso fogão que era a lenha. O bosque era um lugar de lazer para as crianças da região. A Rua Moraes Barros era chão de terra, na década de 30 começaram a colocar paralelepípedo.

O cemitério era logo adiante?

Quando era ainda criança cheguei a lavar túmulos no cemitério. Lá não havia água, eu levava de casa. Por uns dois anos lavei sepulturas. O pessoal que vinha do sítio guardava as carroças e os cavalos na nossa casa, era uma área grande, ocupava meio quarteirão. Uma verdadeira chácara.

Não havia um pouco de superstição com relação ao cemitério?

As moças que moravam no Piracicamirim vinham quadrar o jardim, na Praça José Bofácio, à noite. Quando eram umas nove horas da noite elas subiam, nós garotos, pregávamos sustos nelas, com objetos imitando caveiras. Elas ficavam com medo, eu as acompanhava, embora fosse apenas um menino. Elas sempre e davam algo como recompensa, geralmente uma moeda. O cemitério fechava as seis horas da tarde ao toque de um sino. O porteiro era o Seu Antônio, que morava em uma rua próxima ao cemitério.  Algumas vezes ele fechava o portão e a pessoa fica dentro, ela batia o sino, eu ia correndo e quem tinha ficado pedia que abrisse o portão. Eu chamava Seu Antonio, ele abria o portão e a pessoa saía. Era muito comum acontecer isso.

O caixão com o falecido era carregado por pessoas que subiam a Rua Moraes Barros?

Quando mudamos para lá eu disse ao meu pai: “-Porque viemos morar aqui, pegado ao cemitério?”. Ele disse-me: “Morrem duas a três pessoas todos os dias, passam, nos cumprimentam, onde você vê coisa igual?” Os enterros eram todos feitos a pé, iam revezando na condução do caixão, todos seguiam caminhando, mais tarde providenciaram uma carroça funerária, depois passou a ser um carro fúnebre.

De certa forma era uma estratégia de marketing colocar a loja em um local onde algum dia obrigatoriamente alguém passava acompanhando o enterro?

Exato. No dia de finados vendíamos velas.

O que o senhor ia fazer na Estação da Companhia Paulista quando era menino?

Com 10 a 12 anos eu carregava malas, quando o passageiro chegava com o trem das 10 horas da noite eu carregava a mala e levava até o carro de praça que ficava estacionado em frente a estação. Ou então até o ponto do bonde que ficava logo na esquina em frente. Com isso eu ganhava duzentos réis, quinhentos réis.

Quais eram as atividades realizadas na Sociedade Sírio Libanesa?

Jogavam baralho, jogavam taule, um tradicional jogo de tabuleiro árabe para dois jogadores, por vezes chamado de "gamão árabe". O objetivo era a aproximação e convivência dos associados.A visitação entre as famílias árabes era muito constantes. Faziam a aproximação familiar, nessa aproximação acabava saindo casamentos. A Sociedade Sírio Libanesa tinha como principio agradecer, retribuir, o que o Brasil ofereceu aos imigrantes. Na época de Natal era feita a distribuição de presentes para pessoas mais necessitadas.

A Sociedade Sírio Libanesa tem sua sede na Rua Governador Pedro de Toledo, foi sempre ali?

A Sociedade Sírio Libanesa quando começou foi em um prédio a Rua Treze de Maio, 52. Proxima ao Grupo Escolar Moraes Barros. A Sociedade Beneficente Sirio Libanesa foi fundada a 16 de novembro de 1902 sendo a primeira reunião realizada na casa de Mansur Elias Zina, a reunião foi composta por vinte e oito pessoas. Naquela época os ônibus que se dirigiam à zona rural saiam do Largo São Benedito, próximo a Rua Treze de Maio. Foram abertos diversos estabelecimentos comerciaiais de sirios libaneses nas proximidades, até hoje existe o prédio onde foi o estabelecimento de Mario Neme na Rua Treze de Maio. Em 1926 Luiz Coury e outros membros da Sociedade Sirio Libanesa tiveram a iniciqativa de adquirir um prédio a Rua Governador Pedro de Toledo, o prédio foi reformado e a Sociedade Sirio Libanesa mudou-se para lá. A rua do comércio passou a ser a Rua Governador Pedro de Toledo, no sentido do centro para o bairro da Paulista. Os sirios libaneses passaram a abrir lojas na Rua Governador Pedro de Toledo. O prefeito Dr. Francisco Salgot Castillon cedeu a àrea onde situa-se a Praça Sirio-Libanesa. Entre a Rua Governador Pedro de Toledo e a Avenida Armando Salles de Oliveira. No centanário da Sociedade Sirio-Libanesa foi feita uma escadaria, com um portal artístico, unindo a Avenida Armando Salles de Oliveira com a Rua Governador Pedro de Toledo, simboliza a entrada dos árabes pela Rua Governador que era a rua do comércio. Por um longo período a maior parte do comércio na Rua Governador Pedro de Toledo era composta por árabes e seus descendentes. No livro Sociedade Beneficente Sirio Libanesa, Sua Gente e Sua História, que publiquei, há a relaçõao de todas essas casas comerciais e seus proprietários. Poucas pessoas conhecem isso.

Qual é a importância da Sociedade Sirio-Libanesa para a comunidade piracicabana?

É a beneficência, solidariedade, cultura. Na década de 70 dei o primeiro curso de língua árabe. Recentemente Elias Nader deu um curso completo sobre a língua árabe. Comemora as datas cívicas da independência da Síria, dia 16 de abri e do Líbano dia 19 de novembro.

Como é a relação de convivência entre árabes e judeus em Piracicaba?

Eu tenho uma fotografia com o Jayme Rosenthal, ele freqüentava muito a Sociedade Sirio Libanesa e eu freqüentava muito as iniciativas dele. Ele mandou cópia dessa fotografia para o Muro das Lamentações, colocou lá. A nossa amizade é muito fraterna. Não há problema de nenhuma natureza entre judeus e árabes em Piracicaba. Sempre houve muito respeito mutuo. É um exemplo de confraternização.

Piracicaba não tem mesquita, há alguma razão?

O que temos em Piracicaba é uma missa ortodoxa celebrada uma vez por mês na Igreja Nossa Senhora da Boa Morte, junto ao Colégio Assunção-Dom Bosco, os padres maronitas vem na Catedral de Santo Antonio onde são recebidos pelo Monsenhor Jamil Nassif Abib, e celebram missas maronitas ai também.

Piracicaba teve uma sinagoga?

Teve uma sinagoga construída em 1926, na Rua Ipiranga, entre a Rua Governador Pedro de Toledo e a Rua da Boa Morte, que deixou de ser utilizada em 1946. Foi demolida e atualmente só existe o terreno vazio no local.

O senhor tem uma trajetória como professor universitário. Quantos livros os senhor publicou?

Praticamente três. Um sobre a Sociedade Sírio Libanesa, outro sobre o histórico do Instituto Histórico e Geográfico, e sobre a atuação administrativa dos militares, fui secretário do Serviço Militar, fiz a Escola Superior de Guerra. Junto com o prefeito Luciano Guidotti trouxemos para Piracicaba a apresentação do Batalhão de Campinas.

Como o senhor observou a Segunda Gurerra Mundial?

Em 1939 eu trabalhava na Casa Espéria. Era caixeiro. (vendedor). Saiu uma lei determinando que as entidades estrangeiras localizadas no Brasil não poderiam mais realizar reuniões. A chave da Sociedade Sírio Libanesa ficou sob meus cuidados. Desde essa época dedico-me à Sociedade Sírio Libanesa, são mais de sete décadas. A Sociedade Portuguesa ainda se reúne em uma casarão na Rua do Roásio, nós professores formados em 1950 as vezes nos reunimos lá.

Em Piracicaba é pequeno o número de imigrantes portugueses?

É pequeno. A grande força de Piracicaba é a imigração italiana e espanhola. Não tenho esses dados estatísticos, mas acredito que depois seja a colônia árabe, seguida de alemães e japoneses.

O senhor foi presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba?

Fui membro fundador. Assim como fui do Observatório Astronômico.

O Observatório Astronômico de Piracicaba foi uma grande luta para consegui-lo?

Fiquei dez anos lutando para conseguir, até que a prefeitura apoiasse, após 20 a 30 reuniões na Esalq, para que  que cedesse aquela área para nós o que ocorreu em 1992. Moacyr de Oliveira Camponês do Brasil, me ajudou bastante, fazia as reuniões lá na Esalq. Continuamos pedindo um local para instalar o observatório, tinha que ser um lugar escuro, movimentado, de acesso fácil. Em 1992 colocamos a pedra fundamental.

Qual é a capacidade do observatório?

Posso dizer que é um verdadeiro exemplo para o Brasil e para o mundo. Um dos maiores telescópios do Brasil está em Piracicaba. Juntamente com Nelson Travnik fundamos o observatório. O Observatório Astronômico de Piracicaba foi criado a partir de um convênio assinado entre a Prefeitura de Piracicaba, Associação dos Amadores de Astronomia de Piracicaba (AAAP) e a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz . A construção do prédio com 150.08m2 foi concluída em quatro meses e a inauguração ocorreu em 2 de outubro de 1992. No dia 17 de agosto de 2002 foi inaugurado um novo prédio: o Pavilhão de Observações, que abriga três novos telescópios oferecendo mais opções na observação dos corpos celestes.

Quem pode freqüentar o observatório?

É aberto ao público e é um dos maiores pontos turísticos de Piracicaba. Aos sábados, após as sete horas da noite, vem muita gente. As escolas levam centenas de alunos para assistirem palestras.

Quando será montado o planetário?

Já faz 30 anos que estou lutando pelo planetário, recentemente pedi uma audiência com o prefeito Gabriel Ferrato, o vereador José Aparecido Longatto está nos apoiando. Dei todo o planejamento ao Vice-Prefeito, Arquiteto JoãoChaddad, com os custos, cronograma, sugestão de localização.

Qual é a importância de um observatório para Piracicaba?

É despertar na consciência do ser humano a existência universal, a criação de um fato desconhecido que atribuímos ser criação de Deus. Somos muito limitados quanto ao conhecimento do universo. Já existe pessoas interessadas em irem à Marte.

Qual é o alcance dos equipamentos existente nesse observatório?

É de alcance quase ilimitado dentro do universo conhecido.

Pelas observações do senhor, pode-se afirmar que existe vida além da Terra?

No meu ponto de vista, para acreditar na existência de vida além da Terra teríamos que ver. Há uma busca de planetas onde exista água, o ser humano sem água não vive.

O senhor participou do Coral dos Funcionários da Prefeitura Municipal de Piracicaba?

Participei.

O senhor participou da implantação da AFPMP?

Fui membro fundador da AFPMP - Associação dos Funcionários Públicos Municipais de Piracicaba.

O senhor pertence a maçonaria?

Pertenço a Loja Maçônica, posso dizer que fui membro da fundação de três Lojas Maçônicas: a “Luz e Sabedoria”, a “Liberdade e Trabalho e a Loja Maçônica de Rio das Pedras. Sou maçom ativo desde 1970, grau 33.

O senhor foi fundador do escotismo em Piracicaba?

Fui. Fundei três grupos, entre eles o Tamandaré e o Paulista.

O senhor conheceu o Palacete do Barão de Serra Negra, situado na Rua Alferes José Caetano esquina com a Rua São José, que foi demolido e atualmente é um estacionamento?

Trabalhei naquele prédio! Lá funcionava a Prefeitura Municipal.

O que leva Piracicaba a demolir prédios históricos?

É a chamada modernização, como os engenheiros diziam. Onde era um palacete virou um estacionamento. D.Pedro II hospedou-se nesse palacete. Eu comecei a trabalhar lá junto com o prefeito Luciano Guidotti.

No ponto de vista do senhor, não existe algumas lacunas, o poder público tomba um imóvel, mas não oferece contrapartida que incentive o proprietário a manter as características originais do mesmo

Como professor universitário por quarenta anos, na Unimep, eu dava aulas sobre administração. Iniciava as aulas dizendo: prever, planejar, organizar, comandar e coordenar. Trabalhei com o Prefeito Luciano Guidotti, que me chamava de “Beduino”. Tínhamos um dialogo aberto e franco, sugeri a ele que um dia na semana dedicasse a ouvir a opinião pública, da própria população. Toda terça-feira ele ouvia o público. É ter a sensibilidade de sentir quais são as aspirações e interesses da comunidade. Deu um bom resultado.

O senhor conheceu o Teatro Santo Estevão?

Eu freqüentava muito! Gostava de ouvir o pai do nosso vice-prefeito, arquiteto João Chaddad.  Manoel Chaddad, seu pai, cantava cururu em português, mas com sotaque árabe. Ele participava do cururu que existia lá geralmente aos sábados à noite. Manoel Chaddad se destacava bem, era um bom cururueiro.

O Teatro Santo Estevão era bonito?

Era muito bonito, freqüentei muito. Quando Leandro Guerrini ficou secretário da Educação tinha seu escritório lá e eu freqüentava constantemente seu escritório.

O Teatro Santo Estevão foi derrubado porque oferecia algum risco?

Não. A alegação é de queriam fazer a praça. Atrás do Teatro Santo Estevão eu fazia toda solenidade festiva. Derrubaram provocando a revolta da maior parte da população, foi derrubado na calada da noite.

Na ante-sala do gabinete do prefeito havia um sofá, é verdade que determinado vereador simulava ler um jornal e ficava escutando pela porta entreaberta, as ordens do prefeito. Imediatamente esse vereador dirigia-se ao bairro objeto das melhorias e anunciava com antecedência as benfeitorias que seriam feitas como se fosse fruto da sua atuação?

Era o vereador (Elias dá o nome do vereador, já falecido). Isso era comum, e não foi atitude apenas desse vereador. A pessoa tinha a sensibilidade de sentir o que o prefeito iria planejar e com essa informação sobressaiam junto ao eleitorado. Luciano Guidotti foi uma mensagem de Deus para Piracicaba. O número de escolas que ele abriu, o Ribeirão Itapeva que cortava a cidade e ele canalizou, o número de ruas, avenidas, que ele fez. O advogado Jacob Dhiel Neto costumava me perguntar “-Beduino, o que vocês vão fazer em tal lugar?” O Jacob queria saber tudo que o Luciano iria fazer, ele era contra. Havia uma rivalidade pessoal entre os dois. . Dizia-lhe que não sabia e que tinha que fazer o que o prefeito pedisse.

O Monsenhor Jorge, da Matriz Imaculada Conceição, qual é seu sentimento em relação a ele?

É patrício. Nasceu para ser sacerdote. Tem a sensibilidade de ouvir as pessoas. Muito estimado pela população piracicabana. Pertence a Sociedade Sírio Libanesa, Continua dando às pessoas uma verdadeira luz de conhecimentos para uma vida melhor. Converso muito com ele, somos muito amigos. É uma pessoa de grande valor para a nossa cidade.

O que o senhor diz sobre Monsenhor Jamil Nassif Abib, pároco da Catedral de Santo Antonio?

É meu afilhado da Sociedade Sírio Libanesa. Semanalmente estamos juntos! Ele tem muito interesse no idioma árabe. É uma pessoa de cultura excepcional.

O que o senhor diz a respeito do escritor, jornalista, historiador, advogado, Cecílio Elias Netto?

Cecílio Elias Netto empresta o brilho da sua inteligência, registra a história de Piracicaba de uma maneira ampla, de conhecimento não só dos grandes intelectuais, como as pessoas mais simples. É um verdadeiro exemplo. Eu trabalhava com Tuffi Elias, que é o pai dele, lembro-me da persistência de Cecílio, é uma pessoa determinada. Um idealista. Admiro muito a cultura do Cecílio.

Elias Salum, quando encontro uma pessoa amiga de que forma devo cumprimentá-la?

(O Professor Elias Salum responde em árabe, pedimos que traduzisse, é o que se segue).

“Suas palavras passam a residir em meu coração, em minhas palavras, em minha boca, e em meu pensamento”. A resposta deverá ser: “Tomara a Deus que seja assim!”

 

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