sexta-feira, abril 24, 2015

JOSEFINA HORTÊNCIA DE CAMARGO E MARIA INÊS CAMARGO

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS 

JOÃO UMBERTO NASSIF 

Jornalista e Radialista 
joaonassif@gmail.com 
Sábado 25 de abril de 2015.

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana 

As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/ 

ENTREVISTADAS: JOSEFINA HORTÊNCIA DE CAMARGO E                                     MARIA INÊS CAMARGO



                                Da esquerda para a direita as irmãs Maria Inês e Josefina


Duas irmãs, uma advogada e uma jornalista, buscam resgatar a passado da família. Pesquisadoras incansáveis nasceram e residem em São Paulo, decididas, tomaram como rumo a cidade de Piracicaba. Sabem que muito da história de seus ascendentes está em nossa cidade. Revelam ainda que a família foi proprietária de dois ícones do comércio piracicabano, as lojas “A Porta Larga” e “Loja Duas Âncoras”.
Qual é o seu nome?
Josefina Hortência de Camargo, meu nome tem origem no nome da minha avó, a piracicabana Josephina Hortência Soares de Camargo, casada com o piracicabano João Baptista de Camargo. Eles residiram em Piracicaba até 1920. Sou a neta mais nova dela, em sua homenagem recebi o seu nome. Eu nasci na cidade de São Paulo, no bairro da Lapa a 4 de outubro. Meu pai, Ismael Camargo, filho do casal João Baptista e Josephina. Ele nasceu em Piracicaba, foi ainda muito jovem para São Paulo, estudou no colégio São Bento. Fez o curso de medicina, e acabou não voltando mais para Piracicaba. Minha mãe, Maria Paula Camargo, nasceu no Rio de Janeiro e mudou-se ainda menina para São Paulo.
Maria Inês Camargo, você nasceu em São Paulo onde exerceu qual profissão?
Nasci em São Paulo a 18 de setembro, sou jornalista.
Maria Inês como surgiu o interesse em fazer essa pesquisa com tanta dedicação de ambas?
Acredito que com o passar do tempo passamos a sentir saudade de todos nossos entes queridos que já nos deixaram. Coloco a cabeça no travesseiro e lembro-me de uma frase qualquer, penso: “Isso aqui o meu pai dizia e é a realidade!” Os anos passam a tecnologia muda, tanta coisa mudou, mas continuo pensando “- É aquilo mesmo que meu pai falou! Ele estava certo!” Ou foi algo que alguma tia falou. Esse sentimento despertou o interesse em pesquisar a história mais próxima, que é a da sua família, e descobre várias pérolas.
O que vocês descobriram, por exemplo?
Descobrimos que o nosso avô João Baptista de Camargo teve treze filhos: Nasceram em Piracicaba: João Baptista Jr, Maria Angélica Camargo Almeida, Antonio Bento de Camargo Neto, Josephina Camargo Silveira, José de Camargo, Ismael Camargo, Joanna D!Arc Camargo Jany. Nasceram em São Paulo: Isabel Camargo Simões, Paulo de Camargo, Beatriz de Camargo Pujó, Eliza de Camargo, Helena Soares de Camargo e Jorge de Camargo.  Os oito primeiros filhos nasceram em Piracicaba, os outros cinco nasceram em São Paulo, quando meu avô vendeu seus negócios em Piracicaba e transferiu-se para São Paulo.



Maria Inês, o seu avô atuava no comércio em Piracicaba?
Meu avô fundou a Loja “A Porta Larga” em sociedade com o irmão dele José Basílio de Camargo. (Cabe observar que o livro ACIPI 80 anos, editado em 2013, na página 58, cita que o nome “Porta Larga” surgiu em fevereiro de 1884 quando Eduardo de Paula Carvalho abriu uma sapataria a rua do Commercio (Governador Pedro de Toledo) canto (esquina) com a rua Direita ( Moraes Barros).O proprietário trazia as últimas novidades das melhores lojas da Corte, calçados e também armarinho, chapéus de sol e “lindíssimos artigos da moda”. O texto prossegue afirmando que no final de 1887 João Baptista de Camargo e seu irmão José Basílio de Camargo, compraram a loja e participaram seus fregueses que estavam mudando seu depósito de secos para o prédio onde ficava a Porta Larga. Em 1895 a loja passa por uma reforma). A loja ficava inicialmente na esquina da Rua Governador com Moraes Barros, ao lado direito da Rua Moraes Barros no sentido centro para o bairro, mais tarde ali funcionou a Farmácia do Povo. João Baptista de Camargo e seu irmão José Basílio de Camargo fundaram “A Porta Larga” em um prédio na mesma esquina do lado esquerdo da Rua Moraes Barros, onde funcionou até se dar o seu encerramento em 2006.  Em 1921 foi vendida para Pelippe Zaidan Maluf com a ajuda de Elias Zaidan, Jorge e Hide Maluf).

Quando João Baptista de Camargo vendeu a loja "A Porta Larga" entre outros itens comercializava louças importadas, estas duas peças ainda existem e a fotografia é uma cortesia da proprietária.   
Maria Inês essa loja trabalhava com o que?
Eles tinham várias coisas, vi referências, anúncios de jornal da época, dizendo que eles tinham desde gêneros alimentícios até produtos para uso doméstico, agrícola.
Josefina complementa:
O que as tias contavam é que o pai (João Baptista de Camargo ou então o irmão e sócio João Basílio de Camargo) ia de navio para a Europa, para adquirir louças finas, porcelanas, sedas, essas coisas mais sofisticadas. Ele fazia as compras e trazia para serem comercializadas pela sua loja.
Em que ano faleceu João Baptista de Camargo?
Ele nasceu a 16 de junho de 1870, faleceu em 1940.
Qual é a origem da família?
Josefina responde: “- É o que estamos pesquisando!” O pai da minha avó Josephina Hortência Soares de Camargo era português. Veio de Portugal para Piracicaba, ele trabalhava como lavrador. O pai do meu avô João Baptista de Camargo, não tenho certeza se era piracicabano ou não, mas eles tinham vinculo com Piracicaba através do Antonio Bento e do irmão Joaquim Cipriano de Camargo. Joaquim Cipriano de Camargo foi o padre que celebrou a missa na inauguração do Cemitério da Saudade. Na família todos tratavam como “tio padre”, descobrimos isso recentemente. Ele tinha uma tia, Maria Justina de Camargo, diziam que era uma excelente quituteira. Procurei saber quais eram os quitutes da época, eles comiam o que plantavam e o que criavam. Tinha muitas receitas a base de porcos e frangos, muitos alimentos feitos a base de mandioca: sopas, ensopados, farinha de mandioca era utilizada em lugar do trigo, que praticamente não existia. Conhecer os costumes da época despertou-me muita curiosidade.  Maria Justina de Camargo, tia do meu bisavô, isso por volta de 1870. A maior dificuldade é encontrar documentos dessa época.
Josefina, qual era a principal fonte de lazer dessa época?
Percebi que o grande divertimento deles era em função da igreja. Divertiam-se através das festas religiosas. Era o núcleo deles. Até a proclamação da república os registros eram todos feitos nas igrejas. Consegui ver os registros de nascimento de João Baptista de Camargo, de Josephina Hortência Soares de Camargo, do falecimento do Antonio Bento de Camargo, pai de João Baptista de Camargo. Antonio Bento de Camargo está sepultado aqui no Cemitério da Saudade de Piracicaba. Há uma rua com o nome dele aqui em Piracicaba.
Maria Inês, como era o seu avô João Baptista de Camargo?
Seus pais foram Antonio Bento de Camargo e Sebastiana do Amaral Gurgel, que tiveram cinco filhos: Antonia, José Basílio, João Baptista, Pedro e Maria Angélica. Um fato curioso é Pedro de Camargo foi o fundador e proprietário de uma loja muito conhecida na época: a loja “Duas Âncoras” que de certa forma concorria com “A Porta Larga”.  Pedro de Camargo permaneceu em Piracicaba até por volta dos anos 50. Meu avô João Baptista, ao voltar para São Paulo, acabou envolvendo-se com o comércio novamente. Teve uma loja chamada “Ao Bandeirante”, que ficava no chamado “centro velho” nas proximidades da Praça Julio de Mesquita. Era similar ao que foi a Porta Larga. Nessa loja ele acabou contratando um rapaz para ajudar no atendimento ao público. Esse rapaz chamava-se Gabriel Gonçalves, que com aquele aprendizado, acabou montando seu próprio negocio e tornou-se um grande nome do comércio de São Paulo, montou uma rede de lojas chamada Gabriel Gonçalves conhecido como “GG Presentes”. Na Revolução Constitucionalista de 1932 meu avô aderiu plenamente na luta de São Paulo contra o Governo Federal. São Paulo queria uma constituição, Getulio Vargas negava. Meu avô já era uma pessoa mais idosa, na faixa de mais de 60 anos, os filhos foram lutar na frente de batalha paulista, meu avô ficou em São Paulo e fazia a Ronda Noturna, percorria o quarteirão onde morava, na Rua General Jardim, na Vila Buarque. Havia o temor de que como a maior parte dos homens estava servindo em combate, alguém se aproveitasse disso para invadir alguma residência. Os homens mais velhos das famílias, quase em sua totalidade circulavam durante a noite em cada quarteirão. No inicio da Segunda Guerra Mundial meu avô já estava idoso, vendeu seus negócios e encerrou as atividades comerciais.
Josefina com relação a “A Porta Larga” também havia uma vigilância à noite?
Isso eu descobri na pesquisa, ele e outros comerciantes da região faziam a ronda também com o intuito de segurança, era um grupo de comerciantes que se revezavam, cada noite ia um deles. Eles trabalhavam na loja durante o dia e a noite faziam essa ronda. Foram os primeiros guardas-noturnos. Essa ronda deu origem a Guarda Municipal, isso deve ter sido entre 1890 a 1900.
Em sua busca pela origem dos seus antepassados até que época sua pesquisa abrange?
Chegamos até por volta de 1500, com um ascendente nosso chamado Fernão Ortiz de Camargo, ele era espanhol. Percorrendo a linha do tempo chegamos a Marta de Camargo, que teve treze filhos. Uma das suas filhas é Maria Joaquina de Camargo, que supostamente seria a mãe do Padre Diogo de Feijó. O Padre Diogo de Feijó seria o provável pai de Antonio Bento, na época era muito comum terem filhos, eles não eram a favor do celibato.
Existe alguma documentação a respeito?
Descobri recentemente em Piracicaba, um primo que é filho de José Basílio, esse meu primo disse que toda documentação que tinham sobre Feijó foi entregue à Cúria. Estive nas Cúrias de Piracicaba e de São Paulo, mas não consegui levantar nada a respeito. Em alguns livros, Feijó se declara filho de Maria Gertrudes, que era filha da Marta e irmã de Maria Joaquina. Feijó era uma pessoa muito culta, com grande participação política, foi o fundador de uma loja maçônica, mas com o seu envolvimento com a Corte, com o Império, ele não levou adiante suas atividades maçônicas.
O que motiva vocês duas a se deslocarem de São Paulo a Piracicaba apenas para pesquisar o assunto?
Tudo começou comigo, Josefina. Embora a Inês goste muito também.  Comecei a perguntar-me: Como era o meu passado? Quais informações eu tenho? Vi que tinha muito pouca história. Baseei-me um pouco na história do meu marido, a família dele é espanhola, por parte de pai e de mãe, ele conseguiu fazer a árvore genealógica dele, no ano passado tivemos a felicidade de poder ir para a Espanha e nós fomos à cidade, à igreja, vimos os livros dos registros dos avós, bisavós, dele, aquilo me acendeu uma chama.
Maria Inês, você é jornalista, trabalhou na grande imprensa paulista por alguns anos.
Trabalhei, estudei jornalismo na Universidade de São Paulo – ECA, meu primeiro emprego foi no Jornal da Tarde, do Grupo Estado de São Paulo, permaneci por 10 anos na empresa, trabalhava na reportagem de “Cidades” principalmente. Trabalhei em outros veículos de comunicação, em revistas, em jornalismo especializado na área de construção. Trabalhei no então Diário Popular, que foi vendido e passou a se chamar Diário de São Paulo.
Como era o seu pai?
Meu pai Ismael Camargo, médico, nasceu em Piracicaba, era o sexto filho do casal João Baptista de Camargo e Josephina Hortência Soares de Camargo. Ele estudou na Faculdade de Medicina de Pinheiros, incorporada mais tarde a Universidade de São Paulo. Foi um grande médico, cirurgião, fazia a área de ginecologia e obstetrícia, ele foi assistente do médico que introduziu a cesárea no Brasil, Raul Briquet. Quando meu pai formou-se em 1928 a sua tese já era sobre cesárea. Ele era um médico que se dedicava integralmente a profissão. Ele teve consultório no centro de São Paulo, na Rua Barão de Itapetininga,  trabalhou muito tempo no Hospital Matarazzo, na Maternidade São Paulo, que era uma referência na área, depois trabalhou na rede publica de saúde, inclusive no Hospital Sorocabana.
Maria Inês lembra-se de uma particularidade a respeito do seu pai.
Ele saiu de Piracicaba ainda criança. Conheceu minha mãe em São Paulo, onde se casou. Uma particularidade dele era quando estava chateado ou aborrecido punha-se a cantar o Hino de Piracicaba, lembro-me de um trecho: “Ninguém compreende a grande dor que sente o filho ausente a suspirar por ti...”



Josefina complementa
Lembro-me que meu pai não gostava de dirigir, como tínhamos acabado de nos habilitarmos, adorávamos sair. Ele então pedia para levá-lo para fazer as visitas aos seus pacientes no hospital. Chegou uma época que ninguém mais queria levá-lo nessas visitas, nós ficávamos aguardando no carro dentro do estacionamento, alguém chamava ele entrava em cirurgia. De tanto que ele gostava ficava fazendo cirurgia e ficávamos lá em baixo esperando! Não era uma cirurgia que estava programada, alguém o chamava e ele entrava na sala cirúrgica. Nós às vezes ficávamos horas esperando por ele.
Quando seus pais se casaram foram morar onde?
Na Avenida Dr. Arnaldo, no bairro Sumaré, eles tinham uma diferença de 30 anos de idade. Uma diferença muito grande, mas era um casal muito harmonioso. Ele tinha 50 anos, minha mãe 24. Davam-se muito bem, ficaram casados quase 30 anos. Ele faleceu em 1980. A minha mãe está com 84 anos, uma cabeça excelente!
Maria Inês, com sua experiência e vivencia em grandes veículos de comunicação, a seu ver, porque Piracicaba encanta tanto?
Acho que Piracicaba é uma grande metrópole. A primeira vez que estive aqui foi há uns 30 anos, ao retornar notei que a cidade cresceu muito. As grandes empresas deram um eixo econômico para a cidade. A cana-de-açúcar deu um grande impulso. A Escola de Agronomia Luiz de Queiroz é uma referência para o país todo. Foram dois grandes marcos. È uma cidade que parece oferecer uma qualidade de vida muito boa.
Josefina, o que significa para você esse mergulho ao passado?
Acho que é a busca pela minha origem. De onde vim. Comecei a descobrir na família personagens que me chamaram muito a minha atenção, uma delas é a Maria Justina de Camargo, tia de Antonio Bento de Camargo e Joaquim Cipriano de Camargo. Não me considero uma boa cozinheira, mas descobri um livro chamado “As Receitas do Imperador”, ele é rico em fotos e curiosidades, mostra como faziam as comidas naquela época. Usavam banha que chamavam de “manteiga de leite”. Os doces eram feitos a base de frutas. Faziam compotas. Tentei cozinhar alguns pratos baseando-me naquelas receitas. Tive que fazer algumas adaptações de ingredientes. Tem uma receita de peru recheado que desperta a salivação.  Eles faziam a farofa com pão colocavam diversos ingredientes, aquilo parece que deve ficar muito bom! Era comum ele comerem muito peru. Outra coisa que me chamou muito a a atenção é que nessa época eles descobriram o banho-maria. Os banquetes eram feitos para muitas pessoas, as mesas das famílias eram muito grandes, com isso preparam tudo com antecedência, havia a dificuldade em aquecer o alimento na hora de servir. Descobriram aquela tampa usada para o prato não esfriar. (Cloché ou abafador).
Qual religião era seguida pela família?

Pode-se afirmar que há dois ramos: O irmão do João Baptista, o Pedro, era espírita, teve uma participação muito grande na Federação Espírita em São Paulo. Meu avô João Baptista também era espírita, embora não tivesse a mesma dedicação que seu irmão Pedro teve. Outro lado da família é católico. Meu pai era muito engraçado no que ele falava: “Eu sou ateu, graças a Deus!”. Duas gerações anteriores, dentro da família Camargo, têm muitos familiares que foram padres. Sebastiana do Amaral Gurgel era casada com Antonio Bento de Camargo, pais de João Baptista de Camargo, ela tinha um sobrinho Manoel Joaquim do Amaral Gurgel, isso por volta de 1870, ele era padre, deu o nome a Rua Amaral Gurgel, é tido como um excelente deputado. 

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