sábado, março 20, 2010

MARIA CONÇEIÇÃO FIGUEIREDO

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 20 de março de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
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ENTREVISTADA: MARIA CONÇEIÇÃO FIGUEIREDO

Com seus 101 anos de idade, sorridente e elegante, Maria Conceição Figueiredo é uma das fundadoras do Clube da Lady, entidade assistencial composta por senhoras com elevado espírito de fraternidade. Sua idade cronológica destoa completamente da sua aparência, disposição e saúde. Mantém com naturalidade a posição importante que sempre ocupou, tratando a todos com a simplicidade dos bens nascidos, sem deslumbramentos ou devaneios. Por muitos anos a rádio de sua propriedade foi a única voz da cidade, até surgirem outras rádios que se integraram á comunidade. Fundada em 12 de outubro de 1933 por João Sampaio Góes a Rádio Clube que em 1944 passou a chamar-se Rádio Difusora, foi adquirida em 1950 pelo casal Aristides e Maria Conceição Figueiredo.

Onde a senhora nasceu?

Nasci em Batatais em 8 de dezembro de 1908, sou filha de Paschoal Pipa e Michelina Ricci Pipa. Papai nasceu em Nápoles, Itália, aos 18 anos de idade veio para o Brasil onde montou uma fábrica de móveis. Isso foi na cidade de Batatais, onde ele conheceu minha mãe. Meus pais tiveram quatro filhos. Três mulheres e um homem, eu sou a caçula das mulheres. Todos já faleceram! Só eu estou viva! E graças a Deus com a cabeça muito boa! Deus sempre foi muito bom para mim, me deu sempre saúde e cabeça muito boa.

Seus estudos foram feitos em Batatais?

Estudei em Batatais, onde conheci o meu marido e casei-me com Aristides Figueiredo Quando nos casamos ele trabalhava em um banco, depois passou a ter seu próprio negócio, isso já na cidade de São Paulo. Permanecemos morando em São Paulo por vários anos, no Jardim Europa. Um nosso representante o Seu Macedo, disse ao meu marido: “- Figueiredo tem uma rádio em Piracicaba, você não quer comprá-la?” Nós já tínhamos tido uma rádio em Uberlândia e a tínhamos vendido. Meu marido veio á Piracicaba, gostou, em cinco minutos fechou o negócio. Ele adquiriu de João Sampaio Góes.
O que levou João Sampaio Góes a vender a rádio?

Ele queria morar em São Paulo, junto aos filhos, um era médico, outro advogado.

A rádio situava-se no mesmo local que é hoje?
No mesmo local. Era Rádio PRD-6. Mudamos para Piracicaba, Figueiredo gostou daqui, achou a cidade muito boa. No primeiro mês Figueiredo já multiplicou o faturamento da rádio por seis vezes. Ele pessoalmente saia na praça para vender os anúncios.

Como foi o contrato com o João Belinaso Neto o famoso Léo Batista?

Figueiredo o trouxe! (Depoimento de Leo Batista para Observatório da Imprensa em 11 de julho de 2007: “Andei por mil lugares, até que um tio me mandou procurar um amigo dele, Aristides Figueiredo, que tinha acabado de comprar a Rádio Difusora de Piracicaba. Na época, o XV de Novembro, time local, tinha subido para a primeira divisão do Paulistão e ele buscava um locutor esportivo. Passei a acompanhar e narrar os jogos do antigo campo da Rua Regente (ainda não existia o estádio Barão da Serra Negra). Depois, comecei a ir para o Pacaembu, a Vila Belmiro... Eu era atrevido. Vim até para o Rio transmitir a Copa de 50”.)

Qual era a sua atuação na rádio?

Eu gostava da parte financeira! Trabalhei por cinquenta anos na rádio.

É difícil trabalhar com artistas?

É! Mas é também um ambiente gostoso, alegre. Vinham muitos artistas de fora, conversávamos. Trazíamos muitos shows da Rádio Nacional, fazíamos shows no Teatro Santo Estevão, a rádio transmitia de lá. Luiz Gonzaga fez um grande sucesso em Piracicaba. Ângela Maria, Celso Guimarães. Eram artistas da Rádio Nacional que faziam muito sucesso e Figueiredo os trazia á Piracicaba. Emilinha Borba cobrou um valor caríssimo para vir á Piracicaba, e mesmo assim deu lucro! Foi um alvoroço tão grande, que foi necessário proibir a entrada de todos que queriam vê-la.

Os políticos freqüentavam a rádio?

Uma coisa que meu marido não gostava era de político. Mesmo assim eles freqüentavam a rádio, era um movimento muito grande de políticos. Faziam propagandas, pagavam por essas propagandas. Faziam um palanque na Praça José Bonifacio, de onde os seus comícios eram transmitidos pela rádio. A sala de visita da cidade era a Rádio Difusora, lembro-me do Juscelino Kubitschek, muito simpático.

Qual é a sua religião?

Sou Católica Apostólica Romana. Sempre tivemos uma relação muito boa com a Igreja Católica, até hoje. Sempre tivemos muita união com os párocos, bispos. Monsenhor Rosa era muito querido. Monsenhor Jorge até hoje vai á rádio.

Como era a relação da Radio Difusora com as demais rádios da cidade?

No principio não havia outra rádio. Depois é que veio a Rádio A Voz Agrícola. Nossa relação sempre foi muito boa, e continua sendo, tanto com a Professora Ana Maria Meirelles de Mattos, como com o Dr. Jairo Ribeiro de Mattos. Sempre tivemos muita amizade.

A Rádio Difusora transmitia desfiles de carnaval?

Havia corso na praça, transmitíamos de cima de um palanque.

O ponto alto da Rádio Difusora era o auditório com transmissões ao vivo?

Havia muita alegria. O infantil era domingo ás 10 horas da manhã, enchia de crianças. E havia o auditório normal que era a noite. Havia também o cururu, o Nhô Serra era uma pessoa importante para as apresentações do cururu. Muitos valores musicais foram criados pela Rádio Difusora. Tenho saudades daqueles tempos.

Ari Pedroso foi um dos grandes nomes da Rádio Difusora.

Muito querido, ele fazia um programa que todo mundo gostava. Era muito amigo nosso.

E as famosas gincanas da Rádio Difusora?

Eu participava, era aquele movimento na rádio! O José Roberto Soave, casado com a minha sobrinha Conceição Soave, gostava de fazer essas gincanas.

Da sua parte havia algum programa preferido dentro da rádio?

A Rádio Difusora é como se fosse uma pessoa amiga. Até hoje eu quero muito bem a Rádio. Sempre que há algum evento importante eu vou até a rádio. Não costumo ir todos os dias por causa das escadas que tenho que subir no prédio.

Celso Ribeiro, um dos mais experientes profissionais em sonoplastia do rádio piracicabano é muito estimado pela senhora?

Ele é antigo na rádio! São quarenta e dois anos que ele trabalha lá. Permaneci cinqüenta anos trabalhando na Difusora, eu morava na Rua Alferes José Caetano, onde hoje é a Agencia de Turismo Monte Alegre. Ás 8 horas da manhã eu já estava na rádio, ia almoçar em casa e voltava permanecendo até as 6 horas da tarde. Fazia esse caminho a pé.

Quem fazia a programação artística da rádio?

Havia um profissional responsável pela programação, quando eu queria alguma coisa especial eu então falava com essa pessoa.

A Rádio Difusora é uma força muito grande?

Ela tem expressão na historia do rádio nacional, pelo fato de ser uma das mais antigas do nosso país. São 76 anos de existência, é uma tradição da cidade.

Quando surgiu a televisão, qual foi á reação das rádios?

Não sofremos tanta repercussão, talvez pelo fato da rádio possuir seu público determinado, o povo até hoje gosta do rádio.

Qual é a sua opinião sobre a internet, a televisão?

Televisão eu gosto, assisto algumas novelas da TV Globo. É uma distração, gosto de ver o drama. A internet não me atrai.

Como é a relação da Rádio Difusora com o XV de Piracicaba?

Sempre foi muito boa. Meu marido gostava do XV de Novembro. Demos sempre muito apoio ao time. Todas as entidades de Piracicaba receberam sempre muito apoio da Rádio Difusora. A Rádio Difusora é uma entidade de portas abertas, ela sempre ajudou, sempre colaborou.

As transmissões de futebol eram verdadeiras aventuras?

Eram sim! Era uma loucura! Mas sempre transmitimos futebol, basquete.

Em que ano faleceu Aristides Figueiredo, seu marido?

Foi em 30 de maio de 1962.

Uma das maiores tragédias já ocorridas em Piracicaba foi a queda do Edifício Luiz de Queiroz (COMURBA), que ruiu praticamente na porta da Rádio Difusora?

Eu já estava viúva. Para ir até a Rádio Difusora precisava dar uma volta, não era possível passar pela praça. Demos todo apoio possível. O Caldeira era o gerente da rádio, foi quem assumiu o comando das ações desenvolvidas pela Rádio Difusora em um momento muito difícil para todos.

A prestação de serviços de uma rádio pode ás vezes se tornar quase um serviço social?

Sempre colaboramos com as instituições de caridade. Procurávamos encaminhar as pessoas para os órgãos de assistência social em casos especiais.

Até algumas décadas levavam-se horas para completar uma ligação telefônica, muitas vezes de péssima qualidade. O rádio foi muito importante nessa época?

Existia um programa chamado “Programa Ás Suas Ordens”, que consistia basicamente em mandar mensagens, recados de toda natureza, principalmente entre a cidade e a zona rural, ou entre localidades vizinhas. Mandavam-se lembranças para fulano. Avisava que beltrano estava doente. Cicrano foi operado. Eu devo dar Graças a Deus que a Rádio Difusora é uma emissora que mantém até hoje um nome bom, funcionários antigos, outros aposentados, as minhas sobrinhas gostam da rádio e tomam conta dela.

Qual sua visão do futuro do rádio como veículo de comunicação?

Acho que o progresso deve existir em todos os setores, para o rádio também. Ele não esmoreceu com o aparecimento da televisão. Ele manteve-se em seu patamar. Basta ver que a rádio funciona até hoje, com funcionários, propaganda.

Qual é o alcance da Rádio Difusora?

Ela está com uma potencia boa de 5.000 Watts. Isso significa que pode atingir até o Paraná. Tudo pertence á própria rádio, não há equipamentos alugados. O prédio onde se situa a rádio, a chácara onde fica localizado o transmissor, são aquisições que fiz após o falecimento do meu marido. Tive que ter muita determinação para poder realizar tudo isso.

A sua paixão por rádio é semelhante a que o seu marido tinha?

Ele gostava muito, era apaixonado pela rádio.

O fato de ser proprietária de uma rádio sempre implicou em receber um tratamento diferenciado?

Acho que sempre tive muito respeito. Meu nome é muito bom. A Rádio Difusora é uma emissora que tem um nome respeitado.

Já tentaram comprar a rádio da senhora?

Muitas vezes! Só que eu não vendo!

É comum uma pessoa aproximar-se de uma rádio com objetivo político?

O político quer a rádio. Nós sempre colaboramos, nunca tivemos preferência por um ou por outro. Trabalhamos com todos, mantivemos o padrão de justiça.
O radio é como uma cachaça?

Eu acho que é! É uma cachaça!

A senhora gosta de falar ao microfone?
Nunca falei! Nem eu nem meu marido!

A seleção de programas sempre foi rigorosa?

Sempre tivemos muito cuidado com as pessoas que iam apresentar um programa. Não pode ser qualquer pessoa, tem que ter muito critério.

O que a senhora acha do programa Hora do Brasil?

Acho que somos patriotas, temos que aceitar. É o Brasil!

Existe o Poder Legislativo, o Poder Executivo, o Poder Judiciário. A imprensa, e no caso em especial o rádio, é um quarto poder?

O rádio tem muito poder, muita força e se for criteriosa é melhor ainda. Não se pode fazer qualquer coisa, desmoralizar alguma pessoa, alguma entidade. É um instrumento muito perigoso.

No período de 1945 era proibida a posse de receptores de rádio aos estrangeiros, especialmente aos alemães, italianos e japoneses?

Lembro-me disso.

Como proprietária de rádio era difícil assistir a uma situação dessas?

Acho que é necessário ter muito critério. Critério é tudo para a sobrevivência de uma rádio.

A busca pela audiência pode comprometer o compromisso educativo do rádio?

Tem que se ter muito cuidado com pessoas explosivas, que empregam expedientes apelativos. O rádio tem o papel educativo. Sem prejudicar os ouvintes. Se pudermos fazer o bem, não devemos fazer o mal. Temos que ter um critério na emissora, para que ela não perca a sua utilidade.

A senhora acredita em horóscopo?

Como cristã não acredito!







domingo, março 14, 2010

MARCIO ANTONIO STANKOWICH

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 05 de dezembro de 2009
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.tribunatp.com.br/
http://www.teleresponde.com.br/

ENTREVISTADO: MARCIO ANTONIO STANKOWICH

Trazido em 1856 para o Brasil, pelo precursor Pedro Stankowich, atualmente é coordenado por Antonio Stankowich, sua esposa Miriam e os filhos Adriana, Márcio e Marlon, que construíram uma grande companhia considerada por críticos e empresários circenses como sendo um dos maiores circos da América Latina. São seis gerações empenhadas em manter viva a tradição do Circo Stankowich, a companhia mais antiga do Brasil. Para iluminar esta cidade viajante são necessários 10 km de cabos de eletricidade, projetores especiais para o picadeiro que possibilitam a realização de efeitos especiais. O circo também usa um gerador de eletricidade de emergência com uma saída de 150 quilowatts de força. O sistema de som tem 5 mil watts totalmente digital. No transporte, o circo utiliza 23 carretas, 35 trailers-moradia dos artistas, oito cavalos mecânicos (caminhões) que viajam por todas as estradas carregando cerca de 800 toneladas de equipamentos. A montagem da grande estrutura do circo leva apenas 8 horas. . Para acomodar tal estrutura é preciso um terreno de 30 mil metros quadrados. A montagem do circo leva apenas 8 horas. A gigantesca lona é antichamas e resiste a ventanias e temporais, trabalham no Circo Stankowich 155 pessoas, entre artistas e outros profissionais como administradores, publicitários, equipe de som e luz, técnicos, camareiros, motoristas, mecânicos, ajudantes e técnicos especializados para montagem. Com capacidade para 2000 pessoas que se acomodam com todo conforto e segurança, o Circo Stankowich também possui uma bela praça de alimentação acarpetada e que oferece uma ampla variedade de produtos. O Circo Stankowitch realiza cerca de 500 shows e não utiliza animais em suas atrações recebe anualmente mais de 130 mil pessoas. De origem romena, o Circo Stankowich mantém uma tradição na qual a arte circense vem transmitida de geração para geração. Em 1856, Pedro Stankowich chega ao Brasil somente com os animais amestrados, pois tinha perdido o circo que naquela época já existia na Romênia.. Juntamente com várias famílias circenses vieram para São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. No estado de Minas Gerais, a família ficou numerosa e teve que se dividir porque era difícil todos trabalharem juntos. Ao chegarem a Soledade, uma pequena cidade do Rio Grande do Sul, Constantino Stankowich, filho de Pedro Stankowich, conheceu Aurora que era professora na sua cidade. Ela tinha 21 anos quando o circo passou por ali, se casaram e seguiu com o circo. Antônio Stankowich, um dos filhos de Constantino e Aurora Stankowich, nasceu em 1935, na cidade de Guaíba, Rio Grande do Sul, faz parte da quarta geração da família Stankowich. Foi acrobata, malabarista, trapezista, equilibrista e palhaço com o nome de "Lamparina", nome esse herdado de avos e tios. Aos 23 anos teve o privilégio de ser o diretor e proprietário do circo, incumbido de ser responsável pela família e pelos funcionários. Ao passar do tempo, para que o circo não morresse, contrataram artistas para a segunda parte com altos dramas, além de grandes shows de rádio e televisão. Nessa época tratava-se de um circo de médio tamanho. São 6 gerações empenhadas em manter viva a tradição do Circo Stankowich, a companhia mais antiga do Brasil. Possuí uma grande estrutura empresarial e familiar que mantém a magia do circo da infância, mas também acompanha o dinamismo dos novos tempos..Nestes muitos anos trilhando as estradas deste país, tem muitas historias para contar, lembranças incríveis que revelam um pouco do povo de cada parte do país, um público que valoriza e ama a arte circense. Nas inúmeras viagens, não levam apenas uma gigantesca lona, toneladas de equipamentos e muitas pessoas que vivem pela arte, mas carregam principalmente, muitos sonhos ideais e um desmedido amor pelo trabalho. O amor pelo circo é um mistério para quem nunca viveu a sensação mágica de subir num picadeiro, uma incógnita para quem pretende decifrar o olhar satisfeito de um artista quando realiza seu numero. Para acomodar tal estrutura é preciso um terreno de 30 mil metros quadrados.
Marcio Antonio Stankowich você nasceu onde?

Em Nilópolis, Estado do Rio de Janeiro, terra da campeã do carnaval do Rio de Janeiro, Beija Flor de Nilópolis. Flamenguista de coração. Nasci a 20 de janeiro de 1960. Sou filho de Antonio Stankowich e Altamira da Silva Stankowich. O Circo Stankowich neste ano de 2010 comemora 170 anos de vida! A minha família permaneceu no porto Rio Grande no Rio Grande do Sul. Foi uma época em que as famílias que tinha condições financeiras fugiam da Europa, quem não tinha meios acabava morrendo lá. Quando eles chegaram ao Brasil passaram a trabalhar como saltimbancos, em praças públicas. Temos a documentação referente á época. Hoje possuímos outra unidade de circo, que está no momento no Vale do Paraíba. Esta que trouxemos á Piracicaba, Rio das Pedras e que se apresentará neste sábado em Santa Terezinha é uma unidade com apenas seis anos de existência.
Hoje você é representante da classe dos artistas de circo no Brasil?

Já por seis anos sou representante do Circo de Lona junto ao Ministério da Cultura.
 
                                                               

Qual é a principal atração de um circo?
Até hoje são os animais. Philip Astley é considerado o pai do circo moderno. Ex-integrante da cavalaria do Exército inglês aplicou as rígidas regras do quartel a seu novo negócio, inventou o picadeiro e juntou nele números com seus cavalos, palhaços, malabaristas e outros artistas que costumavam se apresentar nas feiras das cidades para ganhar a vida. As apresentações com o uso de animais remontam os tempos de Nero, da própria China. Eu faço parte do Colegial Setorial de Circo, teremos a Segunda Conferencia do Congresso Nacional de Cultura, teremos lá representados os setores de teatro, dança, música. Represento o setor do circo. Estamos lutando para o circo ter melhores condições legais, maiores condições de vida, para que seja tombado como patrimônio histórico. Para que haja áreas destinadas á recepção de circos, que alguns prefeitos tenham um respeito maior. Quando não havia televisão, rádio, o circo era a grande atração. Hoje abandonaram um pouco o circo.

Mas é emoções diferentes, um espetáculo de circo ao vivo com relação a outros meios de diversão!

Por determinação dos pais e responsáveis, as crianças acabam permanecendo presos, enjaulados dentro de casa! Eu sou suspeito para falar sobre o circo, mas é uma emoção que o artista passa através de sua arte, da sua alma.
 
                                                              
O senhor é um estudioso da arte circense?

Procuro me informar muito sobre o assunto, uma das grandes fontes são as pessoas com mais tempo de vida dentro do circo. São verdadeiras enciclopédias. Contam histórias que trazem muita emoção. Hoje temos trailers que são verdadeiras casas ambulantes, com ar condicionado, água quente, água fria, chuveiro, forno microondas, banheiro, DVD. Antigamente moravam em barracas, na época nem a disponibilidade de tratores era fácil. Vinham pela estrada Rio-Santos com os Ford 29, hoje são utilizadas carretas. Naquela época os artistas viajavam em cima dos caminhões, pegando poeira no rosto. Hoje está tudo mais fácil.

Quanto mede a lona desta unidade do circo?
São 52 metros, comporta 1500 pessoas.
Se a mídia divulgasse melhor a arte circense haveria maior freqüência?

Tivemos uma campanha onde era dita a frase ”Receba O Circo De Braços Abertos”. Foi veiculada uma campanha com a participação de Tarcisio Meira, Glória Menezes, Renato Aragão, Cid Moreira, procurando incentivar a participação do público junto aos espetáculos circenses, considerados uma forma de arte. O Ministro Juca Ferreira, o próprio Presidente Lula, estão incentivando a arte. Resta a dúvida de que se após o término do mandato haverá continuidade no sentido de incentivo ao circo.
 
 
                                                                        
 

O seu circo anda pelo Brasil todo?

Não só pelo país como pela América do Sul. Já levamos o circo á Argentina, Uruguai, Paraguai, Chile. A receptividade é muito boa.

Fora dos grandes centros brasileiros a receptividade ao circo é maior?

Por incrível que pareça, hoje no Estado de São Paulo deve estar rodando mais de 250 circos! Existem muitos circos ruins com boas propagandas. As pessoas são induzidas pela propaganda, como você paga antes de saber o produto que irá ver poderá ter uma decepção. O Stankowich leva um publico bom porque estamos sempre lutando para manter um alto nível de qualidade.

Qual é a tradução para a palavra Stankowich?

O meu avô falava que significava espingarda em iugoslavo.

Quais atividades você exerceu como artista no circo?

Como a minha família, todos exercemos atividades artísticas, meu pai hoje tem 74 anos de idade, ele foi palhaço, malabarista, domador, trapezista, mágico, acrobata. Eu e meu irmão também seguimos essas carreiras, fomos palhaços, trapezistas, malabarista.

Qual era seu nome como palhaço?

Chelito! Não sei nem o quer dizer isso!

Qual é a atividade mais difícil dentre essas?

A mais difícil é dirigir um circo. O palhaço é uma das profissões mais difíceis. Muitas vezes a pessoa tem problemas de natureza pessoal, mas ela tem que rir e fazer com que a platéia ria! Para fazer o ser humano dar risada é difícil, fazer chorar é fácil.

Seus filhos estão seguindo a carreira circense?

Dos meus quatro filhos, três estão seguindo a profissão no circo, um não está, talvez por ser ainda muito novo, tem apenas quatro anos de idade.

O que atrai na arte do circo?

Aprendemos desde criança a trabalhar no circo, fazemos amizades, aparecem os filhos, os ensinamos, acaba sendo uma atividade para a qual fomos qualificados.

O profissional do circo tem reconhecimento profissional pela legislação trabalhista?

O domador, o malabarista, o palhaço tem suas funções reconhecidas pela CLT. Existe até uma situação peculiar, o domador tem sua profissão reconhecida, porém não pode exercer sua função pela proibição de existir animais no circo.

Qual é o critério para escolher o local onde irão montar um circo?

Estivemos em Piracicaba, teremos que esperar no mínimo oito ou dez meses. Quanto maior for o intervalo para a montagem entre um circo e outro melhor será o resultado. As épocas ruins para circo são novembro, dezembro, janeiro, fevereiro. Há a interferência de chuvas, férias escolares.

Na praia há muita procura pelo circo?

Depende muito da praia. Já foi muito bom, o horário de verão permite que o banhista permaneça maior tempo na praia.

O diretor de circo tira férias?

Não. Nunca.

O custo do ingresso para o circo é acessível?

Já faz uns 10 anos que não aumentamos o valor do ingresso.

Você já chegou a propor a bolsa-circo?

Algumas empresas estão lançando o ticket circo. Já saiu a lei. As empresas irão comprar uma quantidade de ticket e doar aos funcionários. É um ticket cultura que poderá ser utilizado em cinema, teatro e até circo.

Dizia-se que fulano tinha fugido com o circo quando ele ia embora da cidade. Como é isso hoje?

As coisas mudaram muito. Se um menor engaja-se a um circo as conseqüências para o responsável pelo circo certamente serão muito graves. Hoje só trabalhamos com elementos profissionais, não há espaço para amadores. Os maiores trapezistas que se apresentam na Europa saíram do Brasil, inclusive três sobrinhos meus, os irmãos Marcelo, Marlon e Alex que formam o grupo de trapezistas Flying Michaels em janeiro conquistaram um troféu Clown de Prata no 34o Festival Internacional de Circo de Monte Carlo, o prêmio do Flying Michaels foi entregue pela princesa Stéphanie. Esses meninos saíram do Stankowich.

O palhaço é ladrão de mulher?

Isso é folclore. Houve uma época em que os palhaços tinham que ser bonitos, olhos verdes. O palhaço sempre chamou a atenção em um circo. O palhaço é um ponto principal. As moças ficavam admiradas. Nós temos engolidores de espadas. Já tivemos homem-bala, estamos pensando em reativá-lo.

Pessoas importantes que já estiveram no Circo Stankowich?

Quando fazemos grande captais temos a presença de artistas famosos. A Xuxa já veio assistir a um espetáculo. Zezé de Camargo e Luciano. Geralmente eles ligam para deixarem os lugares reservados entram com a luz apagada, muitas vezes sentam-se usando um boné. O Marcos Frota trabalhou muito tempo no nosso circo. Os Trapalhões trabalharam com a gente. Roberto Carlos começou no nosso circo. Silvio Santos trabalhou conosco, Carlos Alberto da Nóbrega, seu pai Manoel da Nóbrega. Tonico e Tinoco, Milionário e José Rico, Chitãozinho e Xororó, Nhá Barbina. Gugu Liberato fazia o Show Viva a Noite no Stankowich, isso foi na época em que um dos planos econômicos congelou os recursos de praticamente todo mundo. Lima Duarte era de circo. Zé do Caixão, Chacrinha, Jerry Adriani, Erasmo Carlos, Sérgio Reis, Nelson Ned todos esses artistas trabalharam no Circo Stankowich. Nelson Ned era espetacular, vinha no circo, sentava no colo da minha avó e a chamava de mãe!






sábado, março 06, 2010

JORGE RASERA

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 6 de março de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
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                                           JORGE RASERA E SUA ESP Da. MARIA JOSÉ
ENTREVISTADO: JORGE RASERA
A Rua do Rosário, na sua continuação após a Avenida Dr. Paulo de Moraes conserva forte tradição do passado. Por muito tempo foi corredor de passagem para quem se dirigia á zona rural. Derradeiro posto para se fazerem as compras. Duas máquinas de beneficiar arroz a do Barbosa e Grella e a do José Grella funcionavam ainda na base do benefício em troca de parte do produto. As lojas de sapatos, tecidos, bares onde se tomavam refeições rápidas, armazéns como o de propriedade de Vitório Fornazier. Os moradores da zona rural além de se abastecerem de alimentos adquiriam peças de vestiário, armarinhos, freqüentavam o barbeiro e acima de tudo era ali que se informavam das ultimas novidades. Os ônibus, então chamados de jardineiras, faziam ponto na Praça Takaki. O bairro era uma grande família, onde todos se conheciam, riam e choravam juntos, dependendo da ocasião. Religiosos, dividiam a freqüência entre a Igreja dos Frades e a Igreja São José. Gostavam muito de acertar os relógios com o som do apito do trem da Companhia Paulista que partia na hora exata. Uma profunda mistura de raças, a Paulista tem entre seus moradores descendentes de italianos, espanhóis, portugueses, árabes, suíços, alemães e provavelmente concentre o maior número de imigrantes japoneses de Piracicaba. É o único bairro da cidade cuja praça principal chama-se Praça Takaki. Hoje descaracterizada por um enorme reservatório de água em seu canteiro central. Um mastodonte de gosto duvidoso. Muitos cresceram no bairro vendo Jorge Rasera andando com sua inseparável bicicleta. Inicialmente em conjunto com seu irmão Pedro Rasera, possuía uma loja de tecidos e armarinhos, na Rua do Rosário, do lado direito, entre a Avenida Edgar Conceição e Avenida do Café. Ali Jorge se estabeleceu ainda bem moço, permaneceu por longos anos até mudar para o quarteirão seguinte. Provavelmente seja o comerciante mais antigo do bairro, embora a família siga com as atividades, o olho comercial de Jorge segue de perto o movimento. Filho de Pedro Rasera e Rosa Trevisam Raseira, Jorge nasceu no dia 12 de abril de 1931.
Onde você nasceu?
Nasci em Piracicaba, em uma chácara situada onde hoje é o Jardim Elite, meu pai tinha gado de leite nessa propriedade. Éramos oito irmãos, cinco homens e três mulheres. Na época aquela região era formada por chácaras, havia apenas uma entrada para entrar no saibreiro, era pela rua D.Pedro II. Quem ia para o bairro Dois Córregos subia pela Rua Moraes Barros. Da Rua Benjamin Constant até chegar nas chácaras lá em cima era tudo fechado, não havia caminho.

Quem trazia o leite para ser vendido na cidade?

Meu pai, meu irmão, eu mesmo. Trazíamos com um carrinho, a venda era feita para o próprio consumidor.

Você lembra-se do tempo em que o leite era transportado em um litro comum, tampado com um sabugo de milho envolto em palha de milho?

Lembro-me sim! Depois vieram os laticínios Ideal e Piracicabano.

Quando freqüentou a Escola de Comércio?

Eu tinha uns vinte anos de idade quando freqüentei a Escola do professor Zanin. Nessa época passei a ser proprietário de loja. Era um salãozinho pequeno que meu pai deu para mim e para meu irmão Pedro tocarmos nosso comércio. Depois nós aumentamos nessa época eu era solteiro ainda.

Como foi essa mudança para o ramo de tecidos e armarinhos?

Quem montou essa loja para mim foi o Toninho Sallum. Com um empregado da loja dele, pegou um pouco de cada mercadoria que ele tinha, e abriu a lojinha lá. Isso foi em 1951. Na época a Rua do Rosário era uma rua com duas mãos de direção, os veículos subiam e desciam por ela. Até que um dia na Avenida do Café com a Rua do Rosário um caminhão carregado de areia matou uma menina. Após aquele dia a Rua do Rosário passou a ser mão única.

O comerciante, já falecido, Alcides Saipp, também tinha um estabelecimento comercial na época?

Começamos a trabalhar na mesma época. O estabelecimento dele era na Rua do Rosário esquina com a Avenida Dr. Edgar Conceição.

Como conheceu sua esposa?

Naquele tempo era habito entre os jovens quadrar o jardim, foi assim que a conheci Maria José Barbelli Rasera. Casamos em 1957, na igreja da Vila Rezende, o celebrante foi Monsenhor Martinho Salgot.
Ela trabalhava onde?

Ela trabalhou na Fábrica Boyes, desde os 14 anos de idade até casar-se, ela é nascida em 29 de outubro de 1934, filha de Salvador Barbelli e Vitória Volpato. Meu sogro Salvador trabalhava no Engenho Central.

Era habito levar o almoço para seu pai, Maria José?

Eu ia levar o almoço para ele, ia buscar leite na cocheira. Havia aqueles montes de açúcar escuro, pegávamos aqueles pelotes para comer. Uma vez por ano havia um churrasco lá na Santa Rosa. Foi um tempo muito gostoso. A Boyes deu emprego á muita gente na cidade. Eu trabalhava na fiação, trabalhei um ano como aprendiz, depois passei a contramestre da seção. O horário era feito de forma alternada. Uma semana entrava ás 5 horas da manhã e saia á uma hora e trinta minutos da tarde. Na outra semana entrava a uma hora e trinta minutos da tarde e saia ás 10 horas da noite. A produção basicamente era de sacaria para ser utilizada em usina de açúcar. Uma das coisas que guardo é fruto de uma semente de abacate que meu pai trouxe do Engenho Central e que produz abacate até hoje! É um abacate muito gostoso.

Jorge, no tempo em você abriu a loja havia uma relação de confiança muito grande entre comerciante e freguês?

Vendia fiado para todo mundo e recebia de todos. Vendi muito tecido. Os clientes compravam de peça inteira.

Quando você montou a loja as construções existentes no bairro eram poucas e esparsas?

Quando cheguei ao bairro já existia o primeiro sobrado da paulista, que permanece até hoje, na Rua do Rosário, 2547. Ali havia também uma bomba para abastecimento de gasolina, que ficava junto ao meio fio, a bandeira era Texaco. O proprietário era José Nassif.

Jorge, você conheceu o Nhoca?

Nhoca era muito conhecido! O nome dele era José Vicente, era cego de um olho. Benzia todo mundo, pessoas, animais, cavalos! Vinha gente de longe para ser benta por ele. A mulher dele era Dona Idalina. Eram pais de dois filhos.

O Manoel Castilho era morador do bairro quando você mudou-se para cá?

Ele já morava na Paulista. Ele fazia sapato, colocava meia sola, era um sapateiro muito habilidoso. Onde é hoje a Igreja Assembléia de Deus existiam duas casas, foi o Nino Ferreiro quem vendeu para a construção da igreja. Mais a frente morava uma senhora italiana a Dona Lucrecia. Onde foi a Alvarco existia uma casinha no fundo.

Onde hoje é a loja Capital o que era antes?

Antes da Antonieta adquirir a propriedade e construir a Boutique Antonieta, era um imóvel de propriedade de Crispim Durrer, um terreno com muitos pés de banana. A casa onde mora Benedito Baglione foi construída por Alcides Fornazier. Estudei com Valdemar Fornazier no Zanin. O bonde tinha como ponto final em frente a Padaria Cruzeiro, quase em frente onde hoje é o Toninho Lubrificantes. Quando o bonde vinha no sentido do bairro para o centro, isso á noite, víamos o farol aceso que se aproximava, eu e o Valdemar corríamos bastante para poder pegar o bonde em frente a Estação da Paulista., e assim ir para a escola. Corríamos o máximo que conseguíamos e pegávamos o bonde correndo. Onde hoje é o posto Petrobras, na esquina da Avenida Dr. Paulo de Moraes com Rua do Rosário, tinha o bar da Dita Pé Grande, quando voltamos da aula parávamos ali, onde tomávamos uma cerveja caracu com pão.

Quando você veio morar na Paulista, em 1948 havia água encanada?

Não existia! A água era tirada de poço. A água era puxada do poço com uma corrente de ferro, de vez em quando quebrava, tinha que ficar pescando a corrente no poço. O fogão era a lenha.

A Avenida Dona Jane Conceição terminava onde?

O fim dela era onde hoje é a Rua Campinas. Dali em frente era plantação de cana de açúcar. A Avenida Madre Maria Teodora era a rua com mais movimento, depois havia apenas algumas casinhas dispersas. Era tudo propriedade da família Conceição.

Na esquina da Avenida Da. Jane Conceição com a Rua do Rosário, onde hoje existe uma farmácia Drogal existia o que?

Era uma sapataria! Onde hoje estão os bancos do Brasil e Itaú havia duas casinhas.

Qual era seu esporte preferido?

Eu tinha um timinho de futebol, União paulista, todo domingo jogávamos.

Onde era a sede do time?

Em cima do caminhão! O Pitão era o treinador.

Em que posição você jogava?

Não tinha posição determinada, já usávamos chuteira. Íamos jogar em muitos lugares.

Você gostava de passear quando era jovem?

Eu saia passear todas as noites.

Como era a história do Porunga?

Porunga era nosso amigo, um vira lata pequeno. Eu tinha uma cestinha, escrevia um bilhete fazendo o pedido que queria e ele ia até o açougue. A vantagem é que pelo fato de ele ser pequeno, entrava entre as pernas dos clientes e era o primeiro a ser atendido pelo açougueiro. A cestinha não era amarrada e sim presa por ele entre os dentes. Ninguém conseguia tirar essa cesta dele. Ele trazia o pedido que estava escrito no papel. O mais interessante é que ele nunca mexeu na carne, o açougueiro era o Rubens Zillio. Infelizmente o Porunga um dia morreu atropelado por um carro na esquina da Rua Sud Mennucci com a Avenida Dona Jane Conceição.

Na esquina da Rua do Rosário com a Avenida Dona Jane Conceição, onde hoje existe uma diversidade de lojas era um terreno vazio, que era usado para lazer?

Ali se apresentavam circos, eram instalados parques de diversões, e até comícios políticos foram feitos nesse local. Um dos circos que esteve aqui foi um grande cliente meu de fitas de tecido. Era fita número 5, o palhaço enchia a boca de fita e ia tirando, pareia que não ia terminar mais, a molecada vibrava. Ali onde hoje é a caixa d`água na Praça Takaki passava um caminho de terra que ia até perto da estação. Existia a carregadeira de boi, hoje uma área fechada ao público, ao lado do Restaurante Frios Paulista, os bois eram conduzidos pelas ruas, fechavam-se os portões das casas para evitar que eles entrassem. Um dia um boi escapou na hora da saída do pessoal da missa, esse boi desceu a Rua Alferes José Caetano causando uma grande polvorosa.

Lembra-se da Chácara Nazareth quando ainda não tinha sido loteada?

Lembro-me sim. Eu tinha uma namorada que morava lá embaixo, próximo a sede. Eu tinha que levá-la até lá, á noite, no meio daquele bosque escuro, era uma caminhada memorável.

O senhor fuma?

Eu fumava cigarros industrializados e cigarro de fumo de corda. Fiz uma bateria de exames médicos, após isso passei a fumar só cigarro de fumo de corda. O fumo da nossa região, o fumo do Bairrinho é um fumo fino, o fumo Arapiraca é um fumo mais grosso. É interessante observar que hoje a palha de milho em que é enrolado o fumo é mais cara do que o próprio fumo.
 
 
 

                                                    JORGE RASERA CORTANDO FUMO DE CORDA PARA FAZER SEU CIGARRO DE PALHA DE MILHO
Você tinha uma bicicleta?

Andei muito de bicicleta, tinha uma de marca Philips, preta, eu a comprei quando ainda era mocinho. Todo domingo aos o almoço ia andar de bicicleta, ia lá para o Taquaral.

Você acompanhava os jogos do XV de Novembro?

Fiz muitas viagens acompanhando os jogos do XV. Uma delas foi marcante. Fui á São Paulo assistir a um jogo do XV contra o Paulista de Jundiaí. O XV perdeu o jogo. Eu e o falecido Alcides Saipp conseguimos uma carona para voltar á Piracicaba, era uma pessoa que estava de caminhonete. Não marquei o tempo que levamos para chegar, mas acho que ele fez o percurso em uma hora de viagem. Foi uma viagem de terror! O motorista estava revoltado com a derrota do XV. Quando chegamos á Piracicaba, e descemos do veículo demos graças a Deus.

O Milton Novello foi um personagem folclórico da Paulista?

Ele era mecânico, tinha uma grande facilidade para divertir-se e divertir os outros. Criava situações cômicas, como arrancar minhoca do solo com eletricidade. Havia um farmacêutico no bairro, que sofria de deficiência auditiva, o Milton arrumou uma boneca grande, embrulhou em um xale, pediu ao farmacêutico que medisse a temperatura da “criança”, que estava toda embrulhada. Após uma demorada aferição, o farmacêutico deu o diagnóstico: “Não tem febre nenhuma!”. Para espanto e horror do farmacêutico Miltinho jogou a “criança” no chão, deixando aparecer que se tratava apenas de uma boneca! Na feira livre havia um japonês muito zeloso com suas frutas, e ficava bastante contrariado quando alguém as apertava para testar a maciez. O Miltinho que tinha amputado parte de um dedo resolveu fazer uma brincadeira. Vendo um mamão muito bonito, apenas encostou a ponta do dedo amputado na fruta, dando a entender que tinha enfiado parte do dedo no mamão. Chamou o japonês e disse-lhe: “Esse mamão está bem mole né!” Furioso o proprietário usou todo o seu vocabulário de impropérios, até o Miltinho mostrar que a fruta estava intacta. Outro da família Novello era o Zico Novello, ele conseguia matar (desligar) o motor de um caminhão apenas encostando os dedos no contato elétrico de alta voltagem.

MATERIAL NECESSÁRIO PARA "PITAR" UM CIGARRO DE CORDA









sábado, fevereiro 27, 2010

RUBENS LEITE DO CANTO BRAGA

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 27 de fevereiro de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.tribunatp.com.br/
http://www.teleresponde.com.br/




Rubens Leite do Canto Braga e sua esposa Maria Cleusa Gatti Braga



Pin do famoso "A" Encarnado da ESALQ- Escola Superior de Agronomia Luiz de Queiroz



Pin da campanha de JK em 1965



Rubens Braga e equipe de veteranos, verdadeiras feras do basquete! Entre eles agachados, da esquerda para a direita o segundo é Gustavo Jacques Dias Alvim e o ultimo é o lendário Pecente.
ENTREVISTADO: RUBENS LEITE DO CANTO BRAGA
O Prof. Rubens Leite do Canto Braga tem presença marcante na vida esportiva de Piracicaba. Conviveu e trabalhou com verdadeiras lendas do esporte como Maria Helena, Heleninha, Delcy, Zilá, Angelina, Magic Paula, Branca, Pecente, Vlamir. O seu desempenho na política o tornou protagonista de uma série de fatos relevantes da história recente da Noiva da Colina. Rubens Braga juntamente com o prefeito eleito, mas ainda não empossado, Dr. Adilson Benedito Maluf, voaram juntos com o presidente mundial da Caterpillar na ocasião em que ele veio até a nossa cidade para escolher o local aonde seria implantada a unidade de Piracicaba. Como vereador atuou por treze anos na Câmara Municipal, sendo por duas vezes o seu presidente. É autor de inúmeros projetos, entre eles da criação da Guarda Mirim, uma instituição que tem formado muitos jovens, que passaram por ela e hoje são pessoas de grande destaque na sociedade em que convivem. Propôs projeto de lei que autoriza o município a dar incentivos fiscais para a atração de novas indústrias, proporcionando o aparecimento do Primeiro Distrito Industrial de Piracicaba. Por sua iniciativa foi criado o COMEDI- Conselho Municipal de Desenvolvimento Industrial, do qual foi vice-presidente, e que foi um órgão responsável pela vinda de grandes indústrias para Piracicaba. Foram atitudes corajosas, na época havia a predominância de empresas locais que não viam com muita simpatia a vinda de novos postos de trabalho. Nos anos 70, o Prof. Rubens Braga apresentou o projeto que deu a origem a leis que criaram, por exemplo, o Corpo de Vigilantes do Meio Ambiente, onde através da criança levava aos adultos a compreensão da preservação da natureza cuidando dos rios, fontes e lagos, dos animais, do hoje tão decantado verde. Isso em uma época em que nem se falava em ecologia! É de sua autoria o projeto que aprovou o plano de implantação do Sistema de Áreas Verdes do Município, bem como o que dispõe sobre a Industrialização do Lixo. O Velório Municipal surgiu de projeto de sua autoria, assim como outros projetos: o uso do taxímetro nos chamados de “carros de praça”, hoje conhecidos como taxi; a criação da Drogaria Municipal; dos Centros de Recreação Populares, construídos em grande número pela atual administração; a lei de Auxílio aos Clubes Esportivos Amadores da Cidade, que vigora desde 1966; o decreto lei que estabeleceu o “Dia do Médico” no âmbito municipal, e organizando o concurso literário alusivo a data. No exercício do seu cargo recepcionou o então presidente da república Emílio G. Médicci, os governadores Abreu Sodré, Laudo Natel (de quem é amigo próximo). Rubens Braga pratica até hoje o basquetebol, em sua categoria, participando de campeonatos que são realizados pelo Brasil afora. Atualmente ele está elaborando um livro sobre o basquetebol em Piracicaba. Meticuloso, ele procura preservar a história do esporte com sua coleção de selos temáticos. Possui uma das mais representativas coleções de pequenos botons de lapela, chamados de pin, e que foram feitos por times de futebol, políticos, indústrias automobilísticas. Foi locutor e comentarista esportivo na Rádio Educadora de Piracicaba, com o programa “A Opinião de Rubens Braga” e por um breve período na então Rádio “A Voz Agrícola”. Foi um dos fundadores da Associação dos Cronistas Esportivos de Piracicaba. Recebeu um grande número de títulos e homenagens concedidos pelo seu trabalho. Rubens Braga tem uma vida dinâmica e participativa, com grande e representativa folha serviços prestados á Piracicaba.

APÓS TER VOADO PELA CIDADE PARA ESCOLHER A ÁREA ONDE FOI INSTALADA A CATERPILLAR EM PIRACICABA, FORAM TOMAR UMA REFEIÇÃO.
Da esquerda para a direita: Rubens Leite do Canto Braga, o então Presidente Mundial da Caterpillar Mack Vehriden, o prefeito eleito Adilson Benedito Maluf, o famoso fotografo piracicabano Idálio Filetti, na extremidade direita Quartim Barbosa.


O senhor é piracicabano?
Nasci em Piracicaba, no dia 23 de novembro de 1929. Sou filho de Ernani Leite do Canto Braga, farmacêutico, professor da antiga Faculdade de Odontologia e Farmácia “Washington Luiz” que funcionava no prédio onde hoje é o Museu Histórico e Pedagógico Prudente de Moraes. Ele atuou como jornalista, sendo redator chefe do “Diário da Manhã”, foi colaborador do Jornal de Piracicaba e “O Estado de São Paulo”. Minha mãe, Maria Ferraz de Toledo Braga, conhecida pelo cognome de dona Mariquinha Mó, foi uma das primeiras piracicabanas a formarem-se pela conceituada escola Caetano de Campos localizada em São Paulo. Foi professora na Escola Normal de Piracicaba, hoje denominada Sud Mennucci. Lecionou também em um dos mais eficientes cursos preparatórios, o Curso de Admissão ao Ginásio. Meu avô materno era conhecido como Nho-Nhô Mor, isso em decorrência da origem da minha família que descende de capitães mor. Sou descendente do primeiro presidente da câmara municipal da Vila Nova da Constituição, como era então conhecida a cidade de Piracicaba. Ele era capitão mor e seu filho que foi o segundo presidente também era capitão mor. Com o tempo a letra erre do “mor” deixou de ser pronunciada e passou a ser apenas “mó”.
Quantos filhos os seus pais tiveram?
Éramos três filhos, dois homens e uma mulher. Meu irmão Arnaldo Braga é um ano mais velho do que eu, é dentista e ainda trabalha! Parece-me que seus clientes são contemporâneos que se acostumaram com seu atendimento! Minha irmã, Iolanda Braga Rodrigues Coelho já é falecida.
Como farmacêutico Ernani Leite do Canto Braga manipulava fórmulas?
Entre os medicamentos que ele produzia havia um tônico muito conhecido na época, chamava-se Biogol. Para cefaléia tinha a Sorbelina. Conheci esses remédios porque sobraram em minha casa, cheguei até a tomar o fortificante Biogol. Meu pai faleceu quando eu tinha apenas 1 ano de idade. Minha mãe era professora na Escola Normal, onde lecionava em todas as disciplinas. Quando houve a necessidade de fazer a opção por uma matéria a ser ensinada, por influência do professor Francisco Godoy, que chegou a ser secretário da educação do município de Piracicaba, ela fez a opção de lecionar educação física. Francisco Godoy incentivou-me a estudar educação física, jogou como meia-esquerda do XV de Novembro, ele foi campeão do interior de futebol em 1936. Desde criança eu já tinha uma forte tendência para praticar atividades lúdicas e competitivas, desde a bolinha de gude, futebol com bola de meia, jogo de futebol de botão. No curso ginasial participei da organização desportiva, ajudando na formação de campeonatos internos, organização da equipe juvenil para representar a Escola de Agronomia, o famoso “A” encarnado, no campeonato da Liga Piracicabana de Futebol.
Como foi ingressar na Faculdade de Educação Física da USP?
O curso de Educação Física só existia nessa escola, que era ainda a Faculdade de Educação Física do Estado de São Paulo, que funcionou inicialmente no Pacaembu e mais tarde foi para o Espéria, um local onde havia infra-estrutura para prática de atletismo, natação. Na ocasião éramos quatro estudantes de Piracicaba, e constituímos uma república onde moramos, um desses estudantes é o Francisco de Assis Carvalho Ferraz, conhecido como Chiquinho ou ainda Rosquinha. Outros dois estudantes piracicabanos eram o Gad Aguiar e Francisco Mezzacappa. Ainda criança eu recebi o apelido de Bolacha, foi adotado por mim para poder jogar futebol contrariando a opinião da minha mãe que não queria que eu praticasse esse esporte. Eu jogava no melhor juvenil da cidade, a equipe formada pelo médico Dr. Manoel Gomes Tróia, o Juvenil Horizonte. Quando fui estudar em São Paulo, jogava no Juvenil da Agronomia. O XV de Novembro de Piracicaba ao entrar para a divisão profissional, a federação exigiu que os clubes tivessem um quadro de juvenil. Havia a necessidade de compor um time de futebol no mesmo nível para disputar as partidas de futebol, a Liga Piracicabana de Futebol, cujo presidente era Vicente Marino, criou o campeonato juvenil da cidade, todos os clubes amadores da cidade montaram o seu quadro de futebol juvenil. A ESALQ, rival do XV de Novembro, não tinha como compor um time de futebol juvenil, os jogadores do quadro principal eram os estudantes de agronomia. Através do Grêmio Normalista da Escola Normal comecei a administra esporte, fazendo o Juvenil da Agronomia. Eu jogava como ponta direita ou ponta esquerda e era o dirigente do time. A camisa era emprestada da Agronomia.
A república dos quatro estudantes de Piracicaba ficava em que bairro de São Paulo?
Situava-se no bairro Santa Ifigênia. Para ir até a faculdade que funcionava no Espéria eu apanhava o bonde, ia pela Rua Turiassu, até a Ponte Grande hoje Ponte das Bandeiras. Joguei muito voleibol no Espéria e no Tietê. Eu gostava mais de futebol e futebol de salão. Um dos alunos que jogava no Espéria achou que eu tinha toque de bola muito bom, me convidou para jogar na Associação Atlética Floresta, nome adotado pelo Espéria no período da guerra. Participei de diversas modalidades esportivas como futebol, basquete, vôlei, hand e atletismo. No voleibol defendi as equipes do Floresta, do C. A. Paulistano, Tietê, São Paulo F.C.
Onde foi seu aprendizado de natação?
Para poder fazer a faculdade de educação física eu fui obrigado a aprender a nadar na piscina do Colégio Piracicabano, era uma piscina com 22 metros comprimento, ao lado havia um rinque de patinação, uma quadra de tênis, quadra de basquete. Era uma área enorme, situada á Rua do Rosário.
De quanto tempo foi a sua permanência em São Paulo?
Permaneci morando lá por 10 anos. Após terminar meu curso de graduação permaneci por mais quatro anos na USP, especializando-me em Técnicas Esportivas, nas modalidades de Futebol, Atletismo, Basquetebol e Voleibol, ao mesmo tempo em que apitava jogos colegiais, universitários como Pauli-Poli, Mack-Medi, tornando-me Secretário Geral da Federação Paulista de Voleibol. Os dirigentes do Departamento de Educação Física do Estado de São Paulo o DEFE, tiveram sua atenção despertada para o trabalho que eu vinha realizando. O Major Sylvio de Magalhães Padilha foi convidado a trabalhar no DEFE como responsável pela organização do esporte amador no Estado de São Paulo, foi Presidente do Comitê Olímpico. Ele me viu apitando jogos, arrumando quadras para as partidas, marcar pistas para atletismo na ocasião do Troféu Brasil, foi quando me convidou para trabalhar no DEFE.
Após o casamento da Iolanda, sua irmã, ocorreu a sua mudança de domicilio?
Ela casou-se com um paulistano, eu passei a morar com eles, em seguida meu irmão foi cursar odontologia, minha mãe aposentou-se e foi morar em São Paulo, passamos a morar no Tucuruvi. O Mendonça Falcão nomeou-me professor de educação física no colégio Albino Cezar, no Tucuruvi. Foi o primeiro colégio em que dei aulas.
Quando funcionário do DEFE foi organizado jogos?
A Secretaria tinha uns 15 funcionários técnicos desportivos, nós organizávamos os campeonatos colegiais do Estado de São Paulo, Jogos Abertos do Interior. O Major Padilha mandava os técnicos para cidades do interior com o objetivo de orientar os técnicos da localidade visitada. Nós chamávamos aqueles que iam nessa missão de “Bandeirantes da Nova Geração”. Os técnicos que eram casados não gostavam de viajar, como eu era bem jovem, solteiro, acabava viajando muito para o interior do Estado. O meio de locomoção mais utilizado era o trem, o governo fornecia os passes para as viagens.
Como era o basquetebol de Piracicaba?
Sempre foi bom! Talvez o fato da Escola de Agronomia Luiz de Queiroz atrair estudantes de outras cidades, vinha pessoas com conhecimentos em diversas modalidades de esportes. O Clube Regatas funcionava muito bem. Naihim Coury de Mello professor de educação física do Mackenzie veio á Piracicaba, isso em 1942, quando fomos campões dos Jogos Abertos, graças a presença de um técnico competente. Piracicaba sempre foi muito expressiva no futebol e no basquete.
Como foi defender a camisa do São Paulo Futebol Clube?
Eu treinava futebol diariamente no DEFE, fui jogar no São Paulo, que na época tinha o Estádio do Canindé, hoje pertencente á Portuguesa. Ocorreu um fato interessante nessa época, no dia da colocação da pedra fundamental do Estádio do Morumbi, o Major Padilha, como o ma maior autoridade do esporte no estado deveria estar lá representando o DEFE. Uma forte gripe o impediu de ir, ele me pediu que fosse em seu lugar. Como sãopaulino eu fui muito orgulhoso da missão. Tive a felicidade de ver ser colocada a pedra fundamental do Estádio do Morumbi, um local que ficava a quilômetros do centro da cidade, na época era só mato! Pensei o que será que vão fazer nesse mato? Monsenhor Passos, Porfírio da Paz, Cícero Pompeu de Toledo, Laudo Natel, eram alguns dos presentes. Hoje além do Estádio do Morumbi, esta lá o Palácio do Governo, e é um dos locais onde os imóveis têm valor expressivo. Cabe ressaltar que o Major Padilha foi atleta, um dos primeiros brasileiros a se classificar para uma olimpíada, correndo 400 metros com barreira.

ISAIAS GERMANO

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF

Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 13 de janeiro de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
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ISAIAS GERMANO
com o capacete de proteção e o jaleco da FEPASA
ENTREVISTADO: ISAIAS GERMANO
Isaias Germano é piracicabano, filho, neto de ferroviários, nasceu no dia 30 de janeiro de 1939, na Vila Saraiva que ficava na Avenida Armando Salles entre a Rua Prudente de Moraes e Rua 13 de Maio, onde hoje só tem prédios comerciais, havia uma série de casas antigas. É um dos 15 filhos de Sudário Germano e Joana Leite. Seu pai após ficar viúvo casou-se em segundas núpcias e teve mais 13 filhos. Pelo lado paterno Isaias teve 27 irmãos, incluindo 2 que faleceram logo após o nascimento. Esportista, defendeu a camisa de três importantes times de futebol amador de Piracicaba: Vera Cruz, Regente Feijó, Unidos Clube, Palmeirinha, E. C. São João da Montanha. Seu pai trabalhou na via permanente da Estrada de Ferro Sorocabana, como guarda-passagem, ou guarda-nível, assim era denominado o responsável pela cancela que impedia o transito de veículos e pedestres quando o trem se aproximava. Cada rua por onde a linha do trem cruzava havia uma porteira de madeira que corria sobre um trilho, acionada pelo guarda. Seu pai trabalhava na Rua Voluntários de Piracicaba. Isaias trabalhou na equipe de trem de ponte, onde ocupou o cargo de chefe. Casou-se em Piracicaba, com Eunice Almeida Germano, filha, neta de ferroviários.

Como o guarda-passagem sabia que deveria fechar a porteira?

Na guarita onde ficava o guarda, havia uma campainha que tocava quando o trem partia da estação, alertando os guardas da aproximação da composição. O controle era feito pelo tempo que o trem levaria para chegar e pela visão. A noite quando trem estivesse a uma distancia de uns trezentos metros já poderia ser fechada a porteira.
 
 
Isaias Germano com o lampião utilizado pelo seu pai para sinalizar a passagem do trem

O que era “socar-linha”?

Era assim que se denominava o trabalho na via-permanente. Naquele tempo era tudo feito na moqueca, no braço mesmo. Tirar dormentes, nivelar a linha, era feito com a picareta, não havia máquinas.

Quais madeiras eram mais utilizadas para fazer os dormentes onde eram assentados os trilhos?

Eram usados dormentes de peroba. No trecho nosso aqui não havia dormente de eucalipto. Nos últimos tempos da ferrovia havia uma usina de tratamento químico de dormente, com caldeira. A linha era toda de terra, não havia a utilização de pedras britadas entre os trilhos, como mais tarde passou a existir. Ás vezes era socado quinhentos metros de linha, se a noite chovesse era necessário fazer todo o trabalho novamente.

Em que ano o senhor ingressou na Estrada de Ferro Sorocabana?

Foi em 1963, eu tinha 22 anos de idade, parei de jogar futebol para trabalhar na Sorocabana.

O senhor estudou onde?

Estudei no Grupo Escolar Moraes Barros. A minha primeira professora foi Dona Edith, fui aluno da Professora Dijanira casada com Sr. Nestor, ambos são pais da Professora Marly Therezinha Germano Perecin, lembro-me que a Dona Joana, sua avó materna, gostava muito de mim. Frontino Brasil foi diretor da escola, lembro-me do Professor Perpétuo.

Quais eram os locais do centro que eram mais freqüentados pelo senhor na sua juventude?

Eu era ainda bem moço, gostava de freqüentar a Brasserie, Gioconda, Sorveteria Paris que ficava na esquina da Rua Prudente de Morais com a hoje Praça José Bonifácio, local que veio a ser ocupado pelo Banco Safra.

Como foi a sua participação no futebol do Vera Cruz?

Silvio Alarcom, irmão de Manoel Lopes Alarcom, foi praticamente quem fundou o time de futebol Vera Cruz, compondo os quadros infantil, juvenil e amador. No tempo em que joguei no Regente Feijó, quem tomava conta do time era Roberto Canoa, professor universitário.

Em que posição o senhor jogava?

Eu era centro-médio, hoje equivale hoje a posição de quarto zagueiro.

O senhor era um craque?

Não era! Tinha gente que jogava melhor do que eu. Eu tinha vontade própria, jogava com amor a camisa dos times em que participei, não ganhava nada para jogar, o meu uniforme eu levava para ser lavado na minha casa. O uniforme do Vera Cruz era como é atualmente, branco com faixas prestas. O uniforme do Regente Feijó era camisa zebrada, branca, vermelha e preta. Um grande técnico de futebol era do Unidos Clube, chamava-se Enio Mônaco. Era um time muito bem organizado, unidos mesmo. O segundo quadro em 1957 além de Enio Mônaco como treinador, era composto por alguns nomes como: Airton, Abe, hoje cirurgião dentista, Chico Pio mais tarde dono do famoso Pastelão, José Nascimento, Ademar Pavaneli, Heitor Zipe, Du, Homero, Toniquella, Zuza, Caipira, Lefon, Nelson, Neno. Os jogos eram realizados no Estádio El Tigre, onde atualmente é o Pão-de-Açucar, no Bairro Alto. Nós chamávamos o campo de “ralador”, não tinha nenhuma grama plantada, só havia a piçarra, quando chovia a bola passava a ter o dobro do peso! Em 1957 jogamos uma partida contra o time Progresso, cujo presidente era Felício Maluf, e ganhamos marcando 6X1.
 
 
Isaias Germano, capitão do time de futebol Unidos Clube, campeão de futebol amador em 1957.
Em pé, o terceiro atleta da esquerda paraa direita é o conceituado cirurgião dentista Dr. Antonio Abe


Como foi prestar o serviço militar?

Servi em Piracicaba, no Tiro de Guerra, que ficava no Largo da Sorocabana, onde hoje é o Terminal de Ônibus, no local onde hoje estão os camelôs. O armazém da Sorocabana ficava em frente.

Com que idade foi o seu primeiro trabalho?

Ainda moleque, saia da escola e ia trabalhar em uma oficina de artesanato. Aos 12 anos de idade já estava trabalhando como ajudante de encanador, o meu patrão era Erasmo Diehl, quinzista roxo, que mais tarde veio a falecer durante um jogo do XV de Novembro, no campo de futebol da Portuguesa Santista, em Santos. Dali eu fui trabalhar na Estrada de Ferro Sorocabana.

Trabalhou com sifão de pia ainda feito em chumbo?

Não havia encanamentos em PVC, ou plásticos. O encanamento era feito com ferro fundido e chumbo. Esgotos eram todos em ferro fundido, para fazer as curvas com o cano de chumbo era necessário primeiro enche-lo com areia, se curvasse vazio ele amassava. A areia tinha que ser muito seca, ás vezes tinha que ser colocada no fogo para secar. Na tubulação de esgoto com ferro fundido de 4 polegadas, as emendas eram feitas com o chumbo derretido.

Como foi a sua admissão na Sorocabana?

Prestei concurso para entrar na via permanente. Trabalhava na “soca” da linha, batia o bico da picareta para tirar o dormente, que era arrastado dessa forma. Entrei como trabalhador de linha, fui promovido a encanador. Trabalhei com o trem de ponte, era uma turma que trabalhava só com pontes ferroviárias, fazia reformas e pinturas de pontes. Era necessário ter carpinteiro, encanador, eletricista. As pontes em sua grande maioria eram feitas em madeira, o marceneiro era quem entalhava a madeira, seno a peroba e o ipê as mais utilizadas.


O trem passava sobre as pontes de madeira?

Eram vigas de 40X40 centímetros. As estacas eram erguidas pelo guindaste, que também tinha um dispositivo, o martelo, para enterrá-las no solo. Cheguei a bater estacas com 18 metros sobre leito de rio, na ponta era colocado um capacete de ferro, uma cuia, que se atingisse uma pedra não se deslocasse.

De Piracicaba á São Paulo quanto tempo demorava a viagem pela Sorocabana?

Levava de 12 a 13 horas de viagem. Quem trabalhava na Sorocabana se viajasse pela Companhia Paulista tinha que pagar uma diferença, além de preencher uma requisição.

Como era composto o trem de ponte?

A tração era feita por uma locomotiva, inicialmente a vapor, nos últimos anos era uma máquina a diesel. Havia o vagão de cozinha, o dormitório, de ferramentas e um vagão gôndola. Nos anos mais recentes as estacas passaram a utilizar trilhos, eram três trilhos soldados em forma de triângulo. Se fosse um serviço de emergência eram utilizadas estacas de eucaliptos.

O que era “troca-truque”?

Um dispositivo para passar de bitola larga para bitola estreita e vice-versa. Foi muito utilizado na FEPASA, que unificou várias estradas de ferro do estado. Nós batemos estacas para fazer o lugar próprio para esse trabalho, fizemos isso em Campinas, em Bauxita, em Bauru. O trem chegava pela bitola estreita, era suspenso o vagão, saía a bitola estreita e entrava a larga. Isso era feito só para vagão, carregados ou vazios, carro de passageiros não.

A correspondência que chegava pelo trem como eram transportadas?

Naquele tempo era feito o transporte por carroças. A família do Cardoso Monteiro que jogava no XV de Novembro, eram funcionários da Companhia Paulista e do correio. A família Monteiro trabalhava no correio.

Havia alguns ciúmes entre os funcionários da Companhia Paulista e os da Estrada de Ferro Sorocabana?

Eles tinham ciúmes de nós! O salário da Sorocabana era maior! Eles eram “mais bonitos” porque o trem deles corria dentro do horário, o nosso não cumpria rigorosamente o horário, mas tinha a maior linha de trem! A Sorocabana tinha mais de 5.000 quilômetros de linha.

Lembra-se do episódio em que o Dr. Francisco Salgot Castillon participou junto com os funcionários da Sorocabana?

Lembro-me sim, durante a primeira greve eu não era funcionário ainda. Na segunda greve que houve eu já trabalhava na empresa. Não cheguei a assistir o episódio em que Dr. Salgot participou, mas lembro-me do fato.

Como eram os comícios do ex-governador Adhemar de Barros?

Ele esteve realizando comícios em Piracicaba, conseguia empolgar o público.

Ao quadrar o jardim havia uma determinada área ocupada por determinados grupos?

Havia sim, uma área delimitada pelos próprios ocupantes do local, ao passear quadrando o jardim entre os diversos grupos e setores percorridos, os negros faziam o trecho da Rua Governador, Rua São José, Praça José Bonifácio e Rua Moraes Barros.

O famoso Bar do Buriol antes de ser na Rua Boa Morte era onde?

Ficava na Rua Voluntários de Piracicaba, esquina com a Rua Benjamin Constant, o prédio existe até hoje.

Onde era o Hotel Paulista?

O prédio foi derrubado, ficava na Rua Boa Morte, esquina com a Rua Joaquim André, em frente onde hoje é a Padaria Asságio.

Teve um episódio muito interessante e com final feliz, quando um vagão tombou, dentro da cidade?

Ocorreu com um vagão carregado de açúcar, vinha da Usina Costa Pinto, no meio da passagem de nível ele saiu do trilho, correu sobre os dormentes e tombou. Por sorte o vagão desengatou-se da locomotiva, caindo em um lugar vazio, entre as casas que estavam aos lados. Algumas crianças brincavam nas proximidades da linha de trem, um dos meninos cavou, fazendo um buraco até a cabeceira do dormente. Quando ele percebeu que o trem ia tombar, entrou embaixo, na cavidade que ele tinha feito, ficou preso ali, como se estivesse em uma gaiola. Foi um desespero muito grande, todos achavam que tivesse morrido. Ele está vivo até hoje! Foi uma grande correria para tirar a criança, até que meu pai o tirou de lá.

Onde o trem da Sorocabana jogava lixo?

Um pouco para frente de onde hoje é o viaduto da Rua Governador Pedro de Toledo, sobre a Avenida Armando Salles de Oliveira. Era feita a limpeza da estação, recolhidas as cinzas, estopas, ali havia um local que sempre estava desbarrancando, uma locomotiva trazia um vagão gôndola com o que deveria ser jogado no lixo. O encarregado pelo depósito era Juvenal Gallendi, nosso vizinho na Rua 13 de Maio, ele parava o trem, nós éramos crianças, subíamos em cima do vagão e íamos ajudá-lo a descarregar, com pás. Éramos dez ou doze moleques que íamos pelo prazer de passear de trem. Isso acontecia a cada 15 ou 20 dias.

Ao longo da linha havia casas dos funcionários da ferrovia?

Onde havia uma colônia de casas de ferroviários era dado um número. O avô da minha esposa, Manoel Marcelino de Almeida era mestre de linha, morava na Turma 18, as casa existem até hoje, ficam atrás onde hoje é o Atacadão Munhoz, na Avenida 31 de Março. No local onde hoje funciona o Pronto Socorro da Vila Rezende, havia a Turma 19. No pátio da Usina Costa Pinto era a Turma 21. Eu fui trabalhar era a Turma 26, quase na divisa com o município de São Pedro.

A Estrada de Ferro Sorocabana tinha quantos túneis na descida da serra para Santos?

Eram 21 túneis! A manutenção dentro de um túnel é feita da mesma forma que era feita fora dele, apenas tinha que ser providenciada a iluminação. O projeto original era para ser construída uma segunda linha, que nunca foi feita, o que de fato existiu foi um terceiro trilho, possibilitando o trafego de trens com bitolas (distâncias das rodas) diferentes.

A FEPASA encampou os funcionários da Sorocabana em que ano?

Passei a ser funcionário da então FEPASA em 1971, em 1979 passei a ser o Chefe do Trem de Ponte.

O trabalho com o guindaste do Trem de Ponte é muito perigoso?

Eu tinha a habilitação para operar o guindaste, é um serviço muito perigoso, principalmente se for um trabalho na curva da ferrovia, a lança do guindaste tinha 11 metros de comprimento, se perdesse o equilíbrio poderia tombar e arrastar todos nós que estávamos trabalhando.






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