sábado, setembro 11, 2010

THAIS DE ALMEIDA DIAS

JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
Sábado 11de setembro de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
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                                       ENTREVISTADA: THAIS DE ALMEIDA DIAS

A voz clara, com a entonação perfeita, é inconfundível, trata-se da locutora e apresentadora Thais de Almeida Dias. Professora em instituições de ensino, como USP, FIAM, ocupou importantes cargos em diversos veículos de comunicação, entre eles a direção da Rádio MEC no Rio de Janeiro, cuja origem é a primeira estação de rádio brasileira a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, fundada em 20 de abril de 1923 por Edgard Roquete Pinto e Henry Morize. Roquette Pinto ao doar ao Ministério da Educação a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, exigiu que a emissora sempre mantivesse sua missão educativo-cultural.
                                Os pioneiros da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro
                                 (Fotos do arquivo da Rádio MEC)
A Rádio MEC nasceu em 7 de setembro de 1936. Thais de Almeida Dias teve grande influência na Fundação Padre Anchieta, que engloba a TV Cultura e Radio Cultura AM e FM. Foi diretora da Rádio Cultura FM. Conviveu com celebridades do rádio e da televisão, sofreu com a tragédia abatida sobre o colega Vladimir Herzog, que tinha sido nomeado para dirigir o jornalismo da TV Cultura. Foi jurada de televisão, onde novos talentos se apresentavam buscando um lugar no meio artístico. Criou o programa “Viola, Minha Viola” no ar até hoje. Com licenciatura em História pela USP, mestrado de jornalismo, cursou jornalismo na Faculdade Cásper Líbero, Thais de Almeida Dias é eloqüente, cheia de novas idéias, daquelas pessoas que sempre estão criando, incentivando, pavimentando estradas para os talentos que surgem. Recentemente decidiu adquirir um chalé, que é na verdade uma casa confortável, decorada com muito bom gosto, situada na Primeira Cidade Geriátrica do Brasil, o Lar dos Velhinhos. Mal abriu as malas e já está pensando em instalar uma rádio comunitária nessa verdadeira cidade encravada na área central de Piracicaba. Natural de Assis, onde nasceu em 14 de outubro de 1935, com um ano de vida Thais de Almeida Dias passou a morar em Itu, cidade que adotou como se fosse a sua terra natal. È filha de Zeni de Almeida Dias, musicista, organista da igreja e de Euclides de Marins e Dias, poeta, escritor, radialista, que tinha o pseudônimo de Humberto de Mattos. Estudou na Escola Regente Feijó, onde cursou o primário e a escola normal, na época no interior não havia faculdades como existem atualmente.
Após a conclusão do curso normal, onde a senhora foi lecionar?                                            
Como professora primária, fui lecionar na região da barranca do Rio Paraná, na divisa com o Mato Grosso. Entrei em um programa desenvolvido pela Universidade de São Paulo que mandava professores para o Norte e o Nordeste do país. Trabalhei dois anos em São Luiz no Maranhão, onde voltei a fazer rádio, na Rádio Educadora Rural, de São Luiz. Voltando para São Paulo fui convidada para trabalhar na Rádio Cultura de São Paulo, isso foi no final da década de 60, o diretor era Antonio Augusto Soares Amora, mais conhecido como Professor Amora, o presidente era José Bonifácio Coutinho Nogueira, ficava na Rua Carlos Spera, 179. Eu fazia a produção de programas educativos, como “Encontro com a História”, “Saúde Para Todos” e assumi um programa sertanejo-educativo que levava mensagens para o agricultor, chamava-se “Almanaque Rural”, levei ao ar este programa por nove anos, era o programa que abria a emissora. Eu vinha do folclore, fui assistente do Prof. Rossini Tavares de Lima, já tinha uma formação para a música caipira, não a música sertaneja e sim a caipira.
(Da esquerda para a direita: Cid Moreira, Sérgio Chapelin, Haroldo Costa, Ricardo Cravo Albin)
Qual é a diferença entre musica sertaneja e musica caipira?
A caipira é a música realmente folclórica, criada espontaneamente, com aceitação coletiva, que foram as primeiras músicas gravadas por Cornélio Pires, inclusive com a turma de Piracicaba. A mídia apropriou dessa música caipira e foi-se transformando na música sertaneja seguindo os modismos até chegar hoje no famoso sertanejo universitário.

O que é sertanejo universitário?

Na verdade, estou tentando entender.
                                                Fachada recente da Rádio MEC
                                                (Fotos do arquivo da Rádio MEC)
Na Cultura a senhora permaneceu por quantos anos?

Trabalhei lá por 25 anos, mas nesse período estive no Rio de Janeiro, eles me emprestaram para dirigir a Rádio Ministério da Educação e Cultura do Rio de Janeiro, era uma rádio muito gostosa para trabalhar, com mais de 200 profissionais, como Artur da Távola (pseudônimo de Paulo Alberto Moretzsonh Monteiro de Barros), Sérgio Vieira Chapelin, Cid Moreira, Maestro Isaac Karabitchevsk, Miguel Proença, Ricardo Cravo Albin, Haroldo Costa, um time de primeira. A Rádio Cultura ficava no centro, quase em frente à Central do Brasil, na Praça da Republica, 141. Foi a primeira rádio criada no Brasil, pelo Roquette Pinto, em 1936 ela foi doada para governo, na época era Getulio Vargas, sob duas condições: a sede deveria ser sempre no Rio de Janeiro e a rádio deveria ser sempre educativa. Vargas mandou um telegrama á Roquette Pinto agradecendo pela doação da rádio, ao que ele respondeu: “-Não estou doando ao governo, mas ao povo brasileiro”.
                                                               Arquivo LPs
                                                           (Fotos do arquivo da Rádio MEC)
Após um período no Rio de Janeiro a senhora voltou á São Paulo?
Permaneci no Rio de Janeiro por dois anos, voltei para a Cultura, onde passei por um período na Televisão Cultura, quando criei e produzi por dois anos o programa “Viola, Minha Viola”, que permanece no ar até hoje, na TV Record eu era jurada do programa “Canta Viola” do Geraldo Meirelles.

Após aposentar-me, por 14 anos morei na cidade de Treze Tílias, em Santa Catarina, lá há a Rádio Tropical FM, que apesar de ser uma rádio pequena, faz um bom trabalho. Eu assessorava essa rádio.
Em Piracicaba a senhora já está atuando em alguma rádio?
A senhora sente falta do seu trabalho em rádio?
Faz apenas um mês que estou em Piracicaba, ainda não deu tempo!
A senhora tem seus planos para essa área?

Tenho!

Na Rádio Cultura a senhora criou diversos programas?

Após voltar do Rio de Janeiro, passei a fazer na Rádio Cultura AM o programa “Canto da Terra”, que era líder de audiência da AM, e fui chamada a dirigir a Rádio Cultura FM que só toca musica erudita, eu trabalhava com os dois pólos, a música clássica e a música sertaneja.

Qual é o público da Rádio Cultura?

Eu fazia pesquisa de audiência, quando fui diretora da Rádio Cultura FM era editado um boletim por assinatura, com toda a programação da rádio, na época chegamos a ter nove mil assinantes, se projetarmos significa muito mais em audiência, quando eu queria fazer a pesquisa mandava dentro desse boletim para os assinantes, não era nem frete pago, mas eles iam até o correio, me enviavam, faziam questão de responder o questionário. Tudo isso era tabulado, sabíamos quais eram os horários em que ouviam a programação da rádio, as preferências do ouvinte, e o tipo de público. Em São Paulo oitenta por cento do público da Radio Cultura FM tinha escolaridade de nível superior, é interessante observar que os arquitetos e engenheiros davam preferência á nossa rádio, seguidos pelos professores, músicos, tínhamos também um público menos escolarizado, pois a cultura independe da escolaridade, era formado por pessoas que também aprenderam a gostar de música clássica.
A rádio comercial faz uma programação voltada a atingir o seu público e dar o melhor retorno financeiro. A emissora com respaldo governamental pode definir a programação voltada para a educação e cultura. Há possibilidades de a rádio comercial voltar-se também para a cultura e educação, sem prejuízo financeiro?
Perfeitamente! É só começar, não precisa ser no horário inteiro. Tenho a certeza de que se uma rádio comercial lançar uma vez ao dia um programa de uma hora ou duas horas que seja a transmissão de uma música mais elaborada, com letras melhores, um programa bem cuidado, programa com entrevistas bem cuidadas e interessantes, naturalmente que irá ter audiência. A Rádio Tropical de Treze Tílias começou a fazer isso, lançando os programas opcionais aos domingos, ela passou a ter uma enorme audiência. Você pode fazer um programa cultural com música sertaneja, fui amiga do Pedro Chiquito, Parafuso, Nhô Serra, Horacio Neto, convivi com todo esse pessoal. A minha tese de mestrado em jornalismo foi sobre a informação através da música sertaneja. Essas músicas mais antigas contam sempre uma história. “O Menino da Porteira” é um jornal! É um jornal policial, mas é um jornal! A música “Disco Voador” em sua letra conta: “Tem gente que não acredita. Acha que é fita os mistérios profundos Quem tem um filho pode ter mais filhos. O Senhor também pode ter outros mundos.” Com isso muita gente que não acredita em disco voador, passa a acreditar, porque ela transfere a informação no nível do entendimento do público. Usa a linguagem para fazer a interpretação da notícia para ele.
É uma forma de levar cultura sem impor uma linguagem?

Quando você dá uma noticia no rádio, cada um interpreta de acordo com sua capacidade de entendimento. Mesmo que você faça um programa sertanejo e coloque esse tipo de letra, analise essa letra, o ouvinte irá entender. Essas músicas mais atuais, que chamamos de “música urbaneja” onde aborda temas como “de dia a gente briga, á noite a gente beija” (Leandro e Leonardo: E se de dia a gente briga. À noite a gente se ama.), isso mostra um aspecto violento da periferia. Se você analisar a letras dessas brigas todas irá analisar a periferia, a violência dela. Você tem como interpretar através da própria musica sertaneja a violência.

A senhora nunca se imaginou fora do rádio?

Quando eu fazia o programa “Viola, Minha Viola” na TV Cultura, em uma ocasião eles me disseram que eu estava acumulando rádio e TV, que deveria escolher um ou outro veículo de comunicação, a minha resposta foi de que se tivesse que me definir iria escolher o rádio. Acho o rádio muito mais criativo, mais interessante de se fazer, desde que seja o rádio em que você possa realmente colocar uma produção programada, não o “vitrolão”!

O que a senhora denomina de “vitrolão”?

É colocar uma música para tocar e dizer uma bobagenzinha qualquer, colocar o ouvinte ao telefone, com aquela conversa boba. O ouvinte pode participar pelo telefone, com alguma coisa mais interessante.

As rádios dos grandes centros estão passando por um período de transformações?

Rádio atualmente deve ser voltado para a comunidade, deve pensar muito nos problemas da comunidade, daquela sua audiência e fazer os programas dirigidos para ela, é muito importante a participação da comunidade.

Há uma clara definição de ouvintes de rádios do interior e rádios da cidade de São Paulo?

A rádio do interior tem um público bem variado e programas diversificados, para várias camadas sociais, vários horários. As rádios paulistanas são segmentadas. Há rádios para público sertanejo, erudito, para público entre 30 e 40 anos, para público mais jovem, para mais antigos, aquelas que têm som ambiente, as rádios que fazem mais jornalismo, outras se dedicam mais aos esportes. O jornalismo está em alta, temos a Jovem Pan, Bandeirantes, CBN, Eldorado. São exemplos de rádios que estão se dedicando muito ao jornalismo. É mais fácil atingir ao público para o qual ela está dirigida, ela vai direto aquele segmento. Não conheço muito bem a estrutura das rádios do interior, mas acredito que estão voltando-se mais para o “vitrolão”, que é mais fácil tocar música, colocar um comercial e pronto. A mão de obra necessária é encontrada mais facilmente. A rádio de Treze Tílias ganhou um grande público com o jornalismo, embora seja uma cidade com apenas cinco mil habitantes, ficava em um ponto estratégico, entre outras cidades do seu tamanho e também próxima a grandes cidades. As festividades existentes na região ela cobria, fez um acordo com as câmaras municipais para noticiar o que acontecia nessas cidades, com isso pegou uma audiência muito grande com excelente resultado financeiro. Outras rádios pequenas da região não faziam esse tipo de trabalho.

O seu ingresso em rádio deu-se em que cidade?

Foi como locutora da Rádio Emissora Convenção de Itu - AM - Prefixo ZYE-3. Abria o programa agradecendo a audiência, ao microfone fulano de tal, aquela coisa meio antiga que hoje não se usa mais, era tudo ao vivo, comerciais, de vez em quando rádio-teatro, se tivesse vontade de tossir tinha uma chavinha que desligava o microfone, tossia voltava a ligar. Qualquer erro saia no ar, não havia outro jeito. Em rádio-teatro as folhas ao serem lidas tinham que ser viradas com o máximo cuidado para o ruído não ser transmitido pelo microfone. Muitas vezes ao virar uma folha acabava virando-se duas, o narrador se perdia e todos que o acompanhavam perdiam-se juntos. Tinha que voltar a folha, todos ficavam inventando alguma coisa para ir ao ar até regularizar a leitura. A sonoplastia era feita ao vivo, aconteceram em várias emissoras, diversos erros clássicos. Na Radio Cultura quando fazíamos as séries educativas elas eram dramatizadas, falar ao ouvinte questões de saúde apenas como uma leitura ou uma entrevista ficava chato, inventava-se uma historinha para chegar ao núcleo do assunto tratado. O produtor recebia o texto seco e árido em linguagem médica, ele tinha que inventar uma historinha para colocar uma historinha agradável ao ouvinte.

A senhora tem músicas de sua autoria que foram, gravadas?

Sou a letrista de “Campos e Manhãs”, gravadas por Chico Rei e Paraná, “Vaqueiro Velho”, com Carlos Cesar e Cristiano, “Tapete de Couro” com Brazão e Brazãozinho, há também uma gravada por uma cantora portuguesa.

Quem apresenta programa sertanejo deve utilizar um sotaque apropriado?

Acho que o apresentador deve ser autêntico, não há a necessidade de forçar um sotaque. Lembro-me que o meu pai até brincava dizendo: “Barbina, muié do sordado, de sarto arto na carçada”.

Como à senhora vê a relação da internet com o rádio?

O pessoal tem baixado muita música pela internet, temo mais pelo futuro das gravações em mídias como disco, CD, ou DVD.

Algumas noticias veiculadas pela internet, muitas vezes são lidas para o ouvinte, qual sua visão a respeito?

É uma nova versão do Gillette-Press! (Os chefes de reportagem liam os jornais da manhã e recortavam as notícias com lamina de barbear). Ainda existe um grande público que não está acessando a internet naquele momento, o seu trabalho não inclui acesso ao computador, porém está com o radinho ligado.




sábado, setembro 04, 2010

MARIA MAGALI GUIDOLIN E JOSÉ ADROALDO GUIDOLIN

JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 04 de setembro de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
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                                                                       Magali e José
ENTREVISTADOS: MARIA MAGALI GUIDOLIN E JOSÉ ADROALDO GUIDOLIN
A Avenida 31 de Março em Piracicaba é hoje uma das mais movimentadas artérias que cortam a cidade, com seus enormes galpões abrigando estabelecimentos comerciais que atuam nas mais diversas áreas. Onde hoje é o Bairro Higienópolis até algumas décadas era uma região de muitas chácaras, com as características próprias de imóveis de zona rural, animais de grande porte, água de poço, criação de aves, caprinos, suínos, plantas frutíferas. Rancho Alegre é um nome que permanece na lembrança dos piracicabanos nascidos há 50 anos ou mais. Um confeiteiro húngaro, Luiz Acs, deixou seus país, veio para o Brasil, foi encaminhado para a lavoura de café, onde suas mãos de artista adaptaram-se ao trabalho pesado. Após algum tempo saiu do campo e foi para São Paulo onde acabou indo trabalhar no Fasano, templo gastronômico que até hoje aguça o refinado paladar de clientes portadores de carteiras bem recheadas, a elegância e a mística do Fasano sempre acompanhou a evolução da cidade de São Paulo, em mais um século de existência ocupou diversos endereços em uma clara demonstração de sintonia com sua clientela. Nesse ambiente de muito glamour Luiz Acs exerceu o ofício de confeiteiro, aprendido em sua pátria. Determinado dia, acompanhado de seu pai, veio até Piracicaba, provavelmente em prospecções de novas oportunidades, e acabou permanecendo em Piracicaba. A cidade de São Pedro é conhecida no Brasil e em outros países pela qualidade e beleza dos seus bordados.
Museu Gustavo Teixeira - São Pedro
O inicio dessa atividade que veio a ser um cartão de visita de São Pedro, foi pelas mãos de Joana de Barros Furlani, que em 1929 começou a ministrar aulas de bordado a dezenas de alunas, os famosos trabalhos em ponto cruz, que requer habilidade e muita paciência de quem se propõem a bordar.
                                    Ponto-cruz: um bordado típico de Dona Joana
Quando dona Joaninha mudou-se da cidade, uma de suas alunas, Ana Hermelinda Baltieri prosseguiu seu trabalho, que teve, a partir de 1940, reconhecimento público. A partir dessa época, o bordado produzido em São Pedro tornou-se um importante ramo de negócio devido às muitas compras feitas por turistas. O Museu Gustavo Teixeira guarda trabalhos e objetos de uso pessoal de Dona Joana uma alusão ao “Museu do Bordado Joana de Barros Furlani”. Dona Joana casou-se em São Pedro. Contraiu segundas núpcias em Piracicaba, com Luiz Acs, ambos construíram o Rancho Alegre, que fabricava doces e salgados, tinha amplas instalações para festas sociais, além de um restaurante freqüentado por muitos piracicabanos ilustres. As coxinhas, empadinhas, croquetes, bom bocados, folhados, caçarola italiana bolos com decoração artística minuciosa, assados muito comuns na época, leitoas, patos, cabritos, o famoso frango com polenta. Em 25 de maio de 2008, o prefeito Barjas Negri esteve no Jardim Higienópolis onde junto à comunidade e, demais autoridades entregou oficialmente o novo centro de lazer do bairro denominado “Joana de Barros Furlani” com área de 2.575 metros quadrados, totalmente gramada, um campo de areia cercado por alambrado, brinquedos, bancos de madeira, iluminação, lixeiras, calçadas e pista de caminhada, mesa de jogos, bebedouro e total iluminação. Nesta entrevista sua filha mais nova, Maria Magali Guidolin nascida em Piracicaba a 25 de março de 1943, juntamente com seu marido o engenheiro agrônomo José Adroaldo Guidolin nascido em Piracicaba a 26 de novembro de 1940 ajudam a resgatar lembranças do Rancho Alegre.                                                         
A mãe da senhora é muito conhecida na cidade de São Pedro?
Minha mãe, Joana de Barros Furlani, nasceu em 24 de junho de 1914 e faleceu em 20 de março de 1996, foi ela quem levou o bordado para São Pedro, atualmente tem seus trabalhos em bordados no “Museu do Bordado Joana de Barros Furlani”, de São Pedro, há até a cadeirinha utilizada por ela para bordar quando ainda era interna do Lar, foi doada pelas irmãs para o Museu do Bordado. Minha avó faleceu quando minha mãe era ainda criança, o meu avô ficou viúvo com os filhos para criar e educar, naquela época a melhor opção foi encaminhá-la para o Lar Escola Maria Nossa Mãe. Ela foi criada e educada pelas freiras, recebendo a sua formação e inclusive aprendendo a bordar. Saindo do Lar, ela foi morar em São Pedro com uma família, e foi onde também se casou. Em São Pedro ela passou a ensinar as pessoas a bordar, na rua, nas calçadas, na praça. Á tardezinha as pessoas se aproximavam dela e com ela aprenderam a bordar. Essa história foi pesquisada e publicada pelo jornal O Estado de São Paulo.
Ela mudou-se para Piracicaba?
Juntamente com meus três irmãos, frutos do seu primeiro casamento, ela passou a morar na Rua São José em Piracicaba, bordando, fazendo doces e salgados para manter a casa. Após algum tempo ela conheceu o meu pai, Luiz Acs.
O pai da senhora nasceu onde?
Meu pai, Luiz Acs, veio da Hungria, imigrou com seus pais, ao chegar ao Brasil foi trabalhar na lavoura de café em São Manoel, mesmo tendo feito o curso de confeiteiro na Hungria, ele dizia que quando começou a trabalhar na lavoura “pegava no guatambu”! Conforme melhorou a situação foi morar em um sítio adquirido pela sua família em Mogi das Cruzes. O meu avô paterno faleceu em Piracicaba em 1956. Antes de vir morar em Piracicaba meu pai foi confeiteiro no Fasano em São Paulo, isso em uma época em que tinha que ter muito conhecimento para ser confeiteiro. Em Piracicaba ele trabalhou entre outros lugares, como gerente na Fábrica de Massas Cacique, de propriedade de Augusta Maigton, que fabricava macarrão, bolachas. (José Aldroaldo lembra-se de que entre os doces feitos pelo seu sogro, a elite piracicabana da época consumia muito o bolo folhado, e o Apfelstrudel que é um folhado de maçã).
                                              Livro de receitas de Luiz Acs
A senhora realizou seus estudos onde?
A Pré-Escola eu estudei no Externato São José, o primeiro ano no Sud Mennucci, depois no Instituto Piracicabano, e o curso técnico na Escola Cristovão Colombo a Escola do Zanin. Morávamos na Rua São José, quando em 1948 mudamos para a chácara que passou a ser o Rancho Alegre. Lembro-me que eu e minha irmã íamos para a Escola Sud Mennucci caminhando pela linha do trem da Sorocabana. Era uma verdadeira viagem! De manhãzinha caminhávamos em direção da escola quando víamos o trem da Companhia Paulista passar, indo para São Paulo.
O Rancho Alegre surgiu como?
Lembro-me que antes de ser adquirida a área da chácara, havia a opção de comprar uma casa muito grande, localizada a Rua Voluntários de Piracicaba, entre a Rua Governador Pedro de Toledo e a Rua Santo Antonio, outra opção que surgiu na época era adquirir a Padaria Jacareí, que existe até hoje com esse mesmo nome. Meus pais decidiram por adquirir área da chácara. Passamos a fazer doces e salgados, como folhados, empadas, coxinhas, croquetes, torta de banana, mil folhas, sonhos que eram entregues em vários colégios de Piracicaba como no Dom Bosco, Piracicabano, Colégio Assunção e outras escolas, eram levados, em um tabuleiro, por carrinho de tração animal. Eu estudava na Escola Zanin, levava meu lanche, meus colegas queriam também, com isso passei a levar uma bolsa com material de escola e outra com doces e salgados. Passava uma listinha onde meus colegas escreviam quais doces ou salgados iriam querer que eu levasse. Eu ia a pé, caso chovesse tinha levar um par de calçados para trocar.
                                                           Festa de casamento no Rancho Alegre
José Adroaldo algumas pessoas vendiam os doces e salgados produzidos no Rancho Alegre, de porta em porta?
Lembro-me de Dona Justina, com seu avental impecável, uma cesta grande, vendia bom-bocado, creme, empada. Era uma das pessoas, e ficou na história da cidade que ela percorria, eu era um garoto de uns 10 anos.
                                                                      Apfelstrudel            
O acesso ao Rancho Alegre era por onde?
Pela Rua Benjamin Constant, até a Avenida Dr. João Conceição, continuando até a Avenida Bairro Verde, nesses trechos as ruas eram calçadas com pedregulhos, a Rua Benjamin Constant era utilizada nos dois sentidos de direção. Caminhando pelos trilhos atingíamos a Avenida Independência, algumas vezes sentíamos medo de alguém desconhecido, e dávamos uma volta, indo sair na mesma Avenida Independia, só que na altura da Santa Casa, uma volta enorme. Era uma área formada por chácaras, muitas com mangueiras, as ruas existentes hoje não havia na época. A própria Avenida Independência era apedregulhada, não era asfaltada. Onde hoje é o Teatro Municipal Dr. Losso Neto era o campo de futebol do Ipiranguinha. Na Avenida Independência as construções existentes eram a Santa Casa e o Seminário Seráfico São Fidélis, muitas casas foram construídas depois. No começo da Avenida Luciano Guidotti havia uma vilinha de casas, ainda há alguns vestígios dessas casas. Na esquina da Rua Riachuelo com a Avenida Independência surgiu uma das primeiras construções, um sobrado que ficava do lado esquerdo da Riachuelo.
José Aldroaldo, em que ano o senhor começou a namorar a sua esposa Magali?
Foi em 1960, eu morava na Rua Moraes Barros, 1410, tomava o ônibus que subia a Moraes Barros, da Auto Viação Marchiori, descia no ponto em frente a Santa Casa e de lá vinha cortando o caminho para chegar até o Rancho Alegre.
Magali, a senhora lembra se ao mudar para a chácara que veio a ser denominada de Rancho Alegre, havia alguma construção?
Tinha que ter uma casa, porque se nós estávamos mudando da Rua São José para uma chácara, éramos sete pessoas, meu pai, minha mãe, meus três irmãos, minha irmã e eu, a casa existente deveria ser o suficientemente grande para comportar todos nós. As melhorias foram sendo feitas, até que se resolveu fazer esse rancho enorme, ai passou a ser uma atividade industrial, onde tudo era dimensionado para atender uma grande demanda. O movimento maior era aos fins de semana. No período em que o Comendador Antonio Romano presidiu o XV de Novembro, os jogadores tomavam suas refeições no Rancho Alegre. Muitos casamentos celebrados em Piracicaba tinham suas festas feitas no Rancho Alegre. Pode-se dizer que era o que hoje chamamos de buffet, contratávamos garçons para o serviço, a capacidade era para atender até duzentas pessoas, com toda estrutura necessária, as louças eram brancas, talheres de inox. O fogão era enorme, a lenha, com uma característica interessante, ele não ficava em um canto como encontramos sempre os fogões a lenha, foi construído de forma que permitisse o acesso por ambos os lados. Lembro-me que ainda criança, colocava um caixote de madeira para alcançar as panelas.
Qual foi o período de atividades do Rancho Alegre?
O inicio foi em 1948, época em que não havia nem energia elétrica, permaneceu com a família toda trabalhando até 1965. Não houve continuidade por parte dos filhos, meu pai ainda permaneceu trabalhando por mais alguns anos, minha irmã foi lecionar em São Sebastião, no litoral norte, a minha mãe dividia-se entre São Sebastião e Piracicaba. Meu pai fazia muitos salgados para a Célia Perches, ele ia entregar a pé. Os salgados servidos no Clube de Campo de Piracicaba eram feitos por ele. As festas finas de Piracicaba eram abastecidas com salgados, doces, bolos confeccionados pelo meu pai. Além de atender a encomendas de varias partes da cidade, tivemos duas casas de lanches, uma na Rua XV de Novembro e outra na Rua Moraes Barros, funcionando ao mesmo tempo.
No Rancho Alegre eram criados animais para serem abatidos e servidos aos clientes?
Criávamos muitos perus, cabritos, carneiros, porcos. Havia uma horta, era uma chácara muito grande. Meu tio João e minha tia Gertrudes Garcia moravam na chácara, os animais eram cuidados por ele. O Nestor foi uma das pessoas que trabalhou por muitos anos conosco, mais tarde ele trabalhou na Tutti Bonna Massa.
Como surgiu o nome Rancho Alegre?
Minha mãe que deu esse nome, ela gostava de muita gente reunida. Aos sábados e domingos eram realizados os almoços freqüentados por muitas famílias. Nós tínhamos uma nascente de água maravilhosa na nossa chácara, meu pai servia muitos professores da ESALQ, que vinham almoçar no Rancho Alegre, a água da nascente em analise feita por eles foi considerada potável. Telefones só existiam o da Paróquia Imaculado Coração de Maria (Igreja da Paulicéia) e o nosso, que era o número Rural 20, servia a todos os moradores vizinhos.
Há quem ainda se lembre dos doces e salgados feitos no Rancho Alegre?
Até hoje me procuram, querem que eu faça um daqueles bolos que meu pai fazia, infelizmente não posso atender.
A senhora gosta de futebol?
Gosto muito, eu ia assistir aos jogos no Estádio Roberto Gomes Pedrosa, a famosa “Panela de Pressão”, tinha a minha carteirinha de associada do XV de Novembro.

sábado, agosto 28, 2010

Maria de Fátima Carvalho Esteves

JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 29 de agosto de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
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http://www.tribunatp.com.br/
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ENTREVISTADA: Maria de Fátima Carvalho Esteves
Por inspiração do Ano Internacional das Pessoas Deficientes em 1981, o conceito em relação ao deficiente foi alterado: não é o deficiente que tem que adaptar-se à sociedade, mas a sociedade tem que adaptar-se às pessoas "diferentes". A deficiência não é então um atributo do indivíduo, mas está relacionada à forma como a sociedade o vê. Esse processo pelo qual a sociedade se adapta para poder incluir em seu contexto as pessoas com necessidades especiais é denominado inclusão. Incluir alguém em um grupo é dar-lhe condições para que possa participar ativamente das idéias e atividades do mesmo.


A segunda colocada no concurso Miss Brasil 2008, Vanessa Vidal é deficiente auditiva desde que nasceu. Para ela, é importante aproveitar a visibilidade para apresentar ao mundo as comunidades que são minorias, como os deficientes. “É preciso mostrar para a sociedade que somos todos capazes, mesmo com as diferenças.” Sobre as coisas que aprendeu com o concurso Miss Brasil 2008, ela completa: “A maior lição é que somos todos capazes de alcançar nossos sonhos. Temos apenas que lutar, sermos perseverantes e não desistirmos desses sonhos. Com humildade e determinação podemos realizar tudo o que quisermos”. Desde 1991 existe uma lei no Brasil que obriga as empresas com mais de 100 funcionários a contratarem pessoas portadoras de deficiências. A lei prevê que uma determinada quantidade de vagas, que varia de 2% a 5% do número total de funcionários, deve ser reservada para pessoas deficientes. Com isso, um número crescente de portadores de necessidades especiais está entrando com força total no mercado de trabalho. Junto com esse fenômeno, vem também a necessidade de adquirir habilidades e conhecimentos para exercer tais funções. No Brasil a história da educação de surdos iniciou-se com a criação do Instituto de Surdos-Mudos, o atual Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES). Fundado em 26 de setembro de 1857, pelo professor surdo francês Ernet Hwet, que veio ao Brasil a convite do Imperador D. Pedro II para trabalhar na educação de surdos e mudos. Segundo a FENEIS (Federação Nacional dos Surdos), o surdo–mudo é a mais antiga e incorreta denominação atribuída ao surdo, e infelizmente ainda utilizada em certas áreas e divulgada nos meios de comunicação. Para eles o fato de uma pessoa ser surda não significa que ela seja muda. A mudez é outra deficiência. O surdo é alfabetizado e tem a Libras, Língua Brasileira de Sinais, como sua língua própria. Em Piracicaba a Apaspi, Associação de Pais e Amigos de Surdos de Piracicaba tem realizado um trabalho de inclusão social dos mais proveitosos e representativos. Dezenas de profissionais atuantes em empresas localizadas em Piracicaba foram freqüentadores da Apasp. A presidente da Apasp Maria de Fátima Carvalho Esteves é um exemplo de quem se mobiliza por uma causa sem motivação de cunho espiritual, religioso, político ou de qualquer outra ordem a não ser a abnegação. Os progressos realizados por cada deficiente auditivo trazem uma satisfação tão imensa que todos os seus esforços para conciliar sua vida profissional, doméstica e de voluntária na Apasp são extremamente compensados. Nascida em Piracicaba a 5 de abril de 1953, filha de Antonio Pinto Carvalho e Helena Lopes Carvalho, é casada com o advogado José Aref Sabbagh Esteves. É diretora da empresa Delta Org que exerce atividades nos setores de contabilidade, imobiliário e advocacia.

Há alguém com deficiência auditiva em sua família?

Não! Muitas vezes eu me pergunto o que me levou a participar da Apaspi, Associação de Pais e Amigos de Surdos de Piracicaba, simplesmente eu passava em frente, quis conhecer, entrei, e lá já estou a dezessete anos como voluntária e há seis anos como presidente. Júlio Lázaro Sierra foi presidente de Apaspi por 22 anos, ele era gerente de uma agencia bancaria em Piracicaba, ficou sabendo que a Apaspi iria encerrar suas atividades caso alguém não assumisse a sua direção. Sensibilizado pela situação ele assumiu a direção da entidade permanecendo como presidente por 22 anos.

A Apaspi arrecada seus recursos de qual forma?

As prefeituras das cidades que assistimos contribuem, recebemos doações de pessoas e empresas que contribuem com valores indeterminados, de forma voluntária, realizamos eventos como bazar, bingo, venda de pizzas, tudo visando cobrir nossas despesas. Mantemos um quadro de profissionais qualificados para atender aos nossos alunos, a nossa folha de pagamento com os encargos legais, torna-se bastante representativa diante do nosso orçamento.
A Apaspi recebe também crianças de outras localidades?
Atendemos crianças de Tietê, Charqueada, Santa Barbara D`Oeste, Rio das Pedras. Recebemos a todos que nos procuram.

Como são as atividades com os alunos?

Cada criança tem uma necessidade própria, tendo para ela a sua atendente habilitada. Conforme a necessidade individual é dado o tratamento adequado. Atendemos desde recém nascidos até pessoas com 21 anos. Os recém nascidos atendemos na Santa Casa de Misericórdia de Piracicaba, a nossa fonoaudióloga que realiza o “teste da orelhinha”, nos moldes do “teste do Pezinho”. Atualmente é uma exigência legal que se realize a avaliação auditiva do recém nascido. Dispomos de uma sala na Santa Casa, ao nascer a criança é conduzida para que façamos o teste da orelhinha, não apresentando nenhuma anormalidade auditiva emitimos uma carta de responsabilidade atestando a plena capacidade de audição do recém nascido. Caso a criança apresente alguma deficiência ela é assistida gratuitamente.

Além dos jovens a Apaspi é procurada por pessoas de outras faixas etárias?

Estamos sendo procurados por pessoas da terceira idade, muitas vezes são problemas auditivos decorrentes de diversos fatores característicos da própria idade. Todos são atendidos gratuitamente.
Atualmente quantas pessoas são assistidas pela Apaspi?

São 56 crianças. É interessante que existem ex-alunos que já estão aptos para seguirem seus caminhos, costumamos dizer que estão “de alta”, mas que permanecem conosco, não querem se desligar da Apaspi. Muitos nos ajudam em eventos, em atividades promovidas pela Apaspi. Tínhamos cerca de 110 pessoas assistidas pela Apasp, a empresa Nabisco contratou umas 50 delas para trabalhar na empresa. Temos outras pessoas educadas por nós trabalhando no Supermercado Jaú, no Hospital da Cana. Hoje há uma grande demanda do mercado, que necessita contratar deficientes, por força de lei. Para o deficiente são as oportunidades que ele nunca teve e que agora aparecem. Antes, ninguém queria contratar um deficiente auditivo.
Como é o desempenho profissional dos deficientes auditivos?

É ótimo! Ao iniciarem suas atividades em uma empresa, há um acompanhamento por parte da Apaspi, com uma pessoa do nosso quadro de funcionários monitorando até ocorrerem às perfeitas adaptações do contratado ao serviço.
Os deficientes auditivos que passam pela Apaspi constituem família?

Levam uma vida normal. Há até o caso de uma professora nossa que se casou com um deficiente auditivo que foi aluno da Apaspi. Conheceram-se, casaram e hoje tem um filho.

A senhora acredita que em Piracicaba e cidades da região existam mais deficientes auditivos que não conhecem a entidade?

Acredito que existem deficientes auditivos que não nos conhecem Estamos realizando um trabalho de divulgação junto a creches, escolas, procurando levar informações sobre o trabalho que a Apasp realiza. Queremos trazer todos os deficientes auditivos para dar-lhes melhores condições de vida. A lei que abriu as perspectivas de trabalho para os deficientes proporciona melhores expectativas ao mesmo tempo em que valoriza o ser humano.
Os deficientes auditivos assistem a filmes?

Chamamos de “interprete” a pessoa que os acompanha e através da língua dos sinais faz a ponte de comunicação, há grupos de deficientes auditivos que vão ao cinema no Shopping Piracicaba, após assistirem ao filme tomam lanches no Mac Donalds. Estamos com um curso disponível á todos os interessados, não precisa ser deficiente auditivo para freqüentar, é o curso de língua dos sinais.

Todo surdo é mudo?

Nem todos, alguns ao colocarem o aparelho auditivo passam a falar. Temos as mais diversas situações possíveis. Recebemos um menino com uma série de problemas, entre eles a deficiência auditiva. Era uma criança que não tinha a capacidade física de sustentar-se em pé. Hoje ele com o auxilio de aparelhos já caminha. Para nós isso é extremamente gratificante.

Entre muitas passagens marcantes de situações com alunos há alguma que a senhora lembre-se no momento?

Foi com uma menina, conseguimos adquirir um aparelho auditivo para ela, a mãe não sabia. (nesse momento Maria de Fátima fica com a voz embargada, revive com muita emoção o fato). Quando a mãe veio buscar essa criança a emoção foi muito forte, a criança disse: - Mamãe! Isso me marcou muito, são situações como essa que compensam todo nosso esforço, nos motiva a trabalhar cada vez mais.

Os alunos da Apaspi são alegres?

São muito alegres, cantam, temos o nosso coral! São cerca de doze pessoas. Para nós é uma grande alegria.

Os alunos freqüentam a Apaspi em que dias da semana?

De segunda a quinta feira, nos horários das 8 ás 11 horas e das 13:30 ás 16:30 horas.

É significativo o custo de um aparelho para audição?

Conforme a necessidade do paciente é um tipo de aparelho e um custo, mas são valores significativos.

Como surgiu a vocação da senhora para prestar serviço voluntário?

É algo que existe dentro de mim, nem imagino em deixar de prestar esse tipo de serviço. Podem tirar tudo de mim, mas as minhas crianças não! (Maria de Fátima refere-se aos alunos da Apaspi como “minhas crianças”). Há muitas entidades necessitando de voluntários.

A Apaspi recentemente recebeu a visita de representantes de uma grande empresa?

Representantes da empresa Hyundai estão percorrendo todas as entidades assistenciais de Piracicaba, no nosso caso passaram o dia 11 de agosto conosco, acompanhando as nossas atividades. Mostramos o nosso trabalho e eles nos mostraram o que a empresa faz. Acredito que tanto nós como eles saímos muito emocionados, participamos juntos dos trabalhos realizados nesse dia.
A senhora acredita que dessa visita resulte alguma parceria entre a Apaspi e a Hyundai?

Acredito que sim, embora não exista nenhum protocolo de intenções.

A Apaspi recebe apoio de alguma grande empresa ou indústria?

Não recebemos nenhum apoio dessa natureza.

A Apaspi segue alguma crença religiosa?
Não temos vínculos com nenhuma religião.

Como os seus familiares vêm a sua dedicação á entidade?

A minha família participa ativamente de todos os eventos que são realizados lá, eles me apóiam muito. Na ultima segunda feira realizamos uma passeata com os deficientes pelo centro da cidade, saímos do Mercado Municipal e fomos até a praça central, o objetivo foi de sensibilizar as demais pessoas de que os deficientes podem participar ativamente da sociedade, a inclusão do deficiente é muito importante. Na terça feira a noite, no Shopping Piracicaba, foi realizado um desfile de modas só com modelos portadores de deficiência.
Qual é a visão do mundo do deficiente auditivo?

Eles não se entregam, estão sempre felizes. Digo que sempre que vou á Apaspi recarrego minhas baterias! Cada rostinho está sempre feliz, eles nos transmitem segurança, nos apóiam!

Há vagas para voluntários?

Estou recebendo de braços abertos. Os únicos pré-requisitos é ter vontade e gostar de exercer o voluntariado. Temos grande necessidade de voluntários que atuem voltados para a área de informática, estamos montando uma sala, mas ainda não temos professores. Aqueles que queiram fazer doações de equipamentos de informática, mesmo que sejam usados, estamos aceitando. Contamos com um gabinete dentário, porém atualmente estamos sem dentista, os profissionais que desejarem ser voluntários serão muito bem recebidos. Realizamos a Feira da Economia no Teatro São José que é cedido graciosamente.

É longa a durabilidade de um aparelho de audição?

A vida útil de um aparelho sofre variações conforme a faixa etária, geralmente crianças tendem a se descuidarem mais do que adultos.









sábado, agosto 21, 2010

Victor José Ferreira

JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
Sábado 21 de agosto de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
ENTREVISTADO: Victor José Ferreira
A concorrência comercial entre países é bastante acirrada, centavos de dólar é um fator decisivo em negociações de grande magnitude. O Brasil é um país de dimensão continental sendo o seu principal meio de transporte o rodoviário. É de conhecimento público que a relação custo/beneficio do transporte ferroviário de cargas é uma das mais atraentes, em qualquer parte do mundo. O transporte de passageiros tem no metrô um dos maiores exemplos de viabilidade econômica, desde que planejado com o devido cuidado, e não como em alguns casos ocorridos no passado em que um traçado ferroviário ia de parte alguma para lugar nenhum, obedecendo mais o caráter político do que técnico para a dispendiosa implantação de uma ferrovia. Os desacertos, a estagnação, interferências políticas, foram uma bela vidraça que o transporte ferroviário ofereceu para os defensores de setores rodoviários atirarem as suas pedras. O que vimos foi uma verdadeira dilapidação do patrimônio ferroviário, o desmantelamento das redes de alimentação elétrica para as ferrovias, a malha ferroviária foi preterida em função do transporte rodoviário, em um momento em que diversos países buscaram a solução do transporte intermodal, integrando transporte ferroviário, fluvial e rodoviário, e conseguindo reduzir o custo de transporte, tornando os produtos mais competitivos no mercado interno e externo. Pessoas de reconhecida projeção acreditam na viabilidade econômica do trem, preservam com muita dedicação a memória do que o trem de fato representou em nossa sociedade até algumas décadas. Essa memória não foi de toda varrida, ela existe e é preservada, não apenas no aspecto saudosista, mas na importância econômica e social que o trem teve no Brasil. Um dos grupos mais representativos é o Movimento de Preservação Ferroviária, que tem entre os seus objetivos, divulgar junto aos formadores de opinião a verdadeira importância econômica e social do transporte ferroviário em nosso país. Um trabalho feito por abnegados voluntários, que dão sua cota de contribuição em beneficio de todos. Piracicaba tem uma participação efetiva nesse processo. O lançamento do livro "Trilhos & Letras, o Trem na literatura" aconteceu no dia 20 de agosto, sexta-feira no Centro Cultural Martha Watts. Organizado por Victor José Ferreira, Presidente do Movimento de Preservação Ferroviária., com 232 páginas, desdobra-se em três partes: Trem dá Prosa, Trem da Verso e Trem dá Música. A obra contém trabalhos de Adélia Prado, Affonso Romano de Sant'Anna, Almir Maia, Arnaldo Niskier, Fernando Brant, Ferreira Gullar, Gustavo Alvim, Hélio Dias, Ivan Lins, Martha Medeiros, Paulo Coelho, Rubem Alves e diversos ferroviários. A programação incluiu além da sessão de autógrafos, um painel sobre o tema "Nos trilhos da memória", com os autores de Piracicaba Almir Maia, Gustavo Alvim e Hélio Dias.

Victor José Ferreira, em que cidade o senhor reside atualmente?
Sou natural de Volta Grande, Minas Gerais onde nasci em 11 de fevereiro de 1943. Volta Grande é também a terra onde nasceu o cineasta Humberto Mauro. Em 1967 mudei para o Rio de Janeiro onde resido até hoje.

Qual era a profissão dos seus pais?

Sou filho de Durval Nazário Ferreira e Maria Moreira Ferreira meu pai era barbeiro e minha mãe, dona de casa.

Quando foram os seus primeiros contatos com o trem?

Antes de completar 14 anos, fui selecionado e admitido como aluno-aprendiz na Escola Profissional Ferroviária de Além Paraíba, em Minas Gerais, mantida pela Estrada de Ferro Leopoldina associada com o SENAI. Conclui o curso de torneiro mecânico e por 4 anos fui professor no Centro de Formação Profissional de Governador Portela, em Miguel Pereira, Rio de Janeiro. Dentro da Rede Ferroviária Federal quais funções o senhor exerceu?

Trabalhei exercendo funções gerenciais em diversos escalões, chefiei a Divisão de Administração de Pessoal da RFFSA, Rede Ferroviária Federal S/A, até 1984, quando passei a Diretor de Recursos Humanos da CBTU – Companhia Brasileira de Trens Urbanos. Em maio de 1985 voltei a REFFSA onde exerci outras funções, como Chefe do Departamento de Desenvolvimento da Organização, Chefe do Gabinete da Presidência, Superintendente Geral de Informática e Superintendente Geral de Pessoal. Aposentei-me e desliguei-me da empresa em 1994.

E na área educacional?

Fui voluntariamente membro dos Conselhos Diretores do IEP, Instituto Educacional Piracicabano, mantenedor da UNIMEP, Universidade Metodista de Piracicaba e do Colégio Piracicabano; do Instituto Metodista Granbery, do IMB – Instituto Metodista Bennett, mantenedor do Centro Universitário e do Colégio Bennett onde exerci também as funções de Diretor Geral, Reitor e Diretor do Colégio. Fui Diretor Executivo do Cogeime, Instituto Metodista de Serviços Educacionais, entidade que integra e supervisiona a Rede Metodista de Educação. Voluntariamente, presido o MPF – Movimento de Preservação Ferroviária e sou Coordenador do GFPF, Grupo Fluminense de Preservação Ferroviária.

O senhor ainda trabalha no setor ferroviário?

Desde 2008 trabalho em uma autarquia federal vinculada ao Ministério dos Transportes, a Sesef, Serviço Social das Estradas de Ferro. De 1994 até 2008 trabalhei como consultor, fiz inclusive consultoria para a área rodoviária também, além de prestar consultoria á Vale do Rio Doce, Ferrovia Centro Atlântica.

Como surgiu o Movimento de Preservação Ferroviária?

Em março de 1994 aposentei-me, com alguns companheiros ferroviários fundamos o Movimento de Preservação Ferroviária, que nasceu em 1997 em Passa Quatro, no sul de Minas Gerais. Em 2003 ele formalizou-se como uma associação. Contamos com muito apoio da UNIMEP que tinha como seu reitor o Prof. Almir Maia, o Prof.. Gustavo Alvim era o vice-reitor, o Prof. Eliezer Barreto, também vice-reitor, nos deram muito apoio, assim como o Prof. Helio Dias, na ocasião diretor da Faculdade de Arquitetura. A UNIMEP foi fundamental para fortalecer esse movimento.

Quais são as premissas básicas desse movimento?
Trabalhamos com dois vetores, um é a preservação do patrimônio histórico cultural ferroviário, o resgate, a valorização a difusão de patrimônio tanto material denominado como patrimônio construído, oficinas, galpões, caixa d`água, carros de passageiros, locomotivas, estações, assim como o patrimônio imaterial, que é o folclore ferroviário, as tradições, musicas que tem o trem como tema, literatura. Além de trabalhar nessa linha, outra é a de apoiar projetos que tangem revitalizar o transporte sobre trilhos no país, principalmente os que visam o transporte de passageiros, assim como os trens turísticos e culturais.
O transporte ferroviário de passageiros é economicamente viável?
No mundo inteiro é viável, na Europa viaja-se para todos os lados de trem, o Japão e a China estão investindo fortemente nisso, a China já têm alguns e está construindo mais quinze trens de alta velocidade, inclusive um que opera com levitação magnética, está em fase de desenvolvimento de projeto de um trem com levitação magnética para atingir a velocidade de 1.000 quilômetros por hora, um verdadeiro avião. No mundo inteiro o transporte ferroviário funciona. No Brasil é que um conluio entre empreiteiras, indústrias do petróleo, indústrias automobilísticas, autoridades corruptas, a partir do final da década de 40 literalmente fez com que o nosso pais saísse literalmente dos trilhos. A nossa matriz de distribuição de transporte contradiz o que acontece no mundo. Em nenhum lugar existem caminhões e ônibus que façam viagens tão longas! O normal no mundo é que o transporte rodoviário faça as pontas e as partes urbanas, sendo que nos centros urbanos predomina o transporte por metrô. No Brasil somos exceção. Mas estamos retomando, vendo perspectivas boas principalmente para transportes de passageiros, há alguns projetos como o trem de alta velocidade do Rio de Janeiro á Campinas, há um projeto denominado de “trens regionais de passageiros”, são 64 trechos que o BNDS identificou na malha ferroviária brasileira que tem potencial para trens regionais. Não os trens tradicionais pesados, mas sim o VLT, Veiculo Leve sobre Trilhos, para transporte de passageiros, com vários horários por dia, para ser uma alternativa para o transporte de passageiros. O trecho entre Piracicaba e Campinas é um dos 64 selecionados. E temos os trens turísticos e culturais, são trens de pequenos percursos que funcionam aos fins de semana e feriados, já temos mais de 20 funcionando em todo o país que transportaram mais de 2 milhões de passageiros por ano.
O que a Petrobras pensa a respeito?

A Petrobras tradicionalmente foi parceira da RFFSA, inclusive a RFFSA foi uma grande transportadora de petróleo antes de serem construídos oleodutos. A Petrobras é uma empresa que tem que estar afinada com a política do governo. A política do governo atual é de fortalecer a ferrovia.

Quem pode participar do Movimento de Preservação Ferroviária?

Qualquer pessoa, o movimento é constituído por voluntários, não cobramos mensalidades, basta a pessoa participar dos nossos eventos, visitar com freqüência o nosso site www.trembrasil.org.br, fazemos vários seminários todos os anos, no inicio de março de 2009 fizemos em Piracicaba um encontro regional, agora em setembro faremos o XI Seminário Nacional que denominamos de Preserve 2010, é um seminário que abrange todas as nossas áreas de preservação. O primeiro dia será no auditório do CREA no Rio de Janeiro, o segundo dia será no Teatro Universitário do Instituto Metodista Bennett, vem participantes de todo o país. Nosso movimento não opera trem e nem nasceu para isso, ele estimula pesquisas, projetos, organizar seminários, livros, trabalhos acadêmicos. Temos um bom relacionamento com o Ministério Público Federal, por isso quando acontece uma ameaça ao patrimônio, locomotivas, carros de passageiros e temos conseguido que eles acionem a justiça para protegê-los.

Recentemente tivemos o caso de uma concessionária literalmente picar vagões ferroviários, a APF acionou o Ministério Público?

Soubemos e denunciamos a Procuradoria Geral da Republica e eles estão sendo processados por isso. Fizemos a mesma denuncia também para a Agência Nacional de Transportes Terrestres que tem aplicado multas. A America Latina Logística, ALL, foi recentemente multada em um por cento do seu faturamento por ter destruído uma ponte tombada pelo patrimônio histórico e ao reconstruí-la não ter observado as características de origem. Estamos vigilantes, temos denunciado os casos que tomamos conhecimento e temos obtido sucesso.
O que se faz com as vias permanentes ( linhas de trem) abandonadas?

O Presidente da Republica deverá assinar por esses dias um decreto autorizando a revisão dos contratos de concessão e as concessionárias terão que responder por esses trechos que elas abandonaram. Nos trechos em que elas abandonaram e houve depredação elas deverão ser responsabilizadas por isso, porque quando assinaram o contrato de concessão assumiram o compromisso de devolver da maneira que receberam. O Ministério Público Federal tem chamado a responsabilidade a Superintendência de Patrimônio da União, a ANTT, e alguém irá responder por isso. Nenhuma área pública da União pode ser utilizada sem autorização. Nós da APF quando recebemos alguma denuncia concreta se possível com fotografias, havendo a confirmação de agressão ao patrimônio fazemos a denúncia ao Ministério Público Federal imediatamente.
Com relação ao trem bala ligando Campinas ao Rio de Janeiro há questionamentos sobre a viabilidade comercial?

Existem alguns dados que foram levantados afirmando que a demanda está superestimada, mas a experiência existente no mundo inteiro é de que à medida que o projeto é implantado a demanda cresce. O passageiro vê que o trem de alta velocidade, a partir dos 250 a 300 quilômetros por hora é altamente competitivo com o avião. Sai do centro da cidade, não está sujeito a fenômenos climáticos, não exige a chegada antecipada como nos aeroportos, é muito confortável, seguro, permite uma liberdade que o avião não oferece.

O que falta para que o trem de alta velocidade seja implantado no Brasil?

Acho que era a vontade política, e agora está acontecendo, no atual governo está havendo uma retomada do transporte ferroviário. Esta começando a ser construída a ferrovia Oeste-Leste na Bahia, esta dando prosseguimento mais acelerado a Norte-Sul, o governo do estado de São Paulo está investindo fortemente no transporte metropolitano, o metrô de São Paulo está transportando 2,2 milhões de passageiros por dia. A Companhia Paulista de Trens Metropolitanos, CPTM, mais 2,2 milhões de passageiros com perspectivas de chegar a transportar em curto prazo a 2,5 milhões. Na região serrana do Rio de Janeiro, em Nova Friburgo, abriu a licitação para construir um sistema urbano sobre trilhos, há uma retomada á ferrovia, o chamado Custo Brasil é muito onerado pela opção rodoviarista, a saída está nos trilhos.

Na safra da soja ocorre um congestionamento de dezenas de quilômetros de caminhões transportando o produto para o porto de Paranaguá, qual é a saída para isso não ocorrer?
O caso do Paraná é muito sério, mas até agora não se tem nada de concreto, a solução é a duplicação da ferrovia no trecho da serra, é uma obra muito cara, que um dia deverá ser realizada. A atual situação dificulta a competitividade da nossa soja no exterior.
Qual é a perspectiva para o transporte intermodal?

Dentro do principio em que o caminhão faz as pontas e o trem fazendo as distancias mais longas é um principio praticado no mundo inteiro. Isso já ocorreu no Brasil com a primeira ferrovia construída em nosso país. O Barão de Mauá quando implantou a primeira ferrovia brasileira inaugurada em 30 de abril de 1854, no fundo da Baia de Guanabara ligando o Porto da Estrela até a raiz da serra de Petrópolis, já era um transporte intermodal. O imperador saia do Rio de barca da Praça Mauá e iam até o Porto da Estrela, pegavam o trem até a raiz da serra e de lá faziam os seis quilômetros restantes de carruagem. D. Pedro II era o Imperador Ferroviarista, dizemos que ferroviário é quem trabalha ou trabalhou na ferrovia e ferroviarista é quem se empenha em favor do trem tendo sido ou não ferroviário. Durante o governo de D. Pedro II a malha ferroviária expandiu muito e ele ia às inaugurações até de estações.













domingo, agosto 15, 2010

Tereza Takagi Sato e Susumu Sato

JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 14 de agosto de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/



ENTREVISTADOS: Tereza Takagi Sato e Susumu Sato

A comunicação imediata de qualquer acontecimento no planeta colocou por terra as grandes distâncias entre os povos de cada nação, um fato impensável há um século. A mobilidade de massas populacionais pelas mais variadas razões, fatos políticos, pouca disponibilidade de recursos naturais para a sobrevivência, discriminações religiosas, e algumas vezes o espírito de buscar novas oportunidades fez com que os países da América ganhassem uma nova face, uma fenomenal mistura de raças que conserva as melhores características de cada uma delas. No Brasil os japoneses e seus descendentes são respeitados pelo profissionalismo e honestidade de propósitos com que atuam nas mais diversas áreas. Os descendentes já nascidos no Brasil são carinhosamente denominados também de japonês. Ninguém questiona a qualidade de um pastel feito por um japonês, da mesma forma que confia no projeto estrutural de um edifício feito por um engenheiro calculista japonês. O imigrante japonês sempre foi muito criativo, adaptou-se logo ao Brasil, transformou o que seriam dificuldades em oportunidades, á custa de uma dedicação obstinada avançou com coragem e firmeza, conquistando o respeito e admiração, evoluindo rapidamente na pirâmide econômica e social. Uma enorme diferença cultural, de hábitos alimentares, costumes, barreira do idioma, foram obstáculos demolidos pelo imigrante japonês, a custa de muito suor, com raríssimas exceções podemos afirmar que é um povo que veio, viu e venceu. O bairro da Liberdade em São Paulo é um pedaço do Japão no Brasil, em Piracicaba o bairro com maior presença de japoneses e seus descendentes é a Paulista, que exibe entre outros, sobrenomes como Takaki, Sato, Ito, Nishimura, Kawai, Kubo, Otsubo, Icizuka, Mizutani, Takematsu, Hara, Yamashita, Komatsu, Nishide, Kamiyama, Hayashi, Onishi, Sudo, Miyazaki. Nas esquinas da Avenida do Café com Rua Sud Mennucci está a sede do Clube Cultural Nipo Brasileiro de Piracicaba, que preserva os costumes e tradições japonesas. Tereza Takagi Sato nasceu no Porto João Alfredo, hoje Ártemis, em 10 de junho de 1930, Susumu Sato nasceu em Yokohama, Japão, a 27 de outubro de 1924 casaram-se há seis décadas conforme o antigo costume japonês, onde a futura esposa era escolhida e após a concordância paterna celebrava-se o casamento. Ela é filha de Shigueki Takaki, o primeiro imigrante japonês falecido em Piracicaba, cujo nome denomina uma das mais conhecidas praças de Piracicaba situada na Paulista. Takaki em japonês significa “árvore grande”.

Susumu o senhor veio com quantos anos para o Brasil?

Ao completar seis anos vim com a minha família composta pelos meus pais e mais cinco filhos. Descemos em Santos, de onde seguimos para Piracicaba, ao chegarmos havia uma recepção festiva com banda de música e tudo, ficamos contentes achando que era pela nossa chegada, quando na realidade era em homenagem ao Governador do Estado que vinha naquela composição. Fomos para a Fazenda Pau D`Alho de propriedade de Paulo Moraes Barros, médico e político piracicabano, era colônia de café. No Japão não se carpia o mato, e sim se arrancava com a mão, aos imigrantes carpir era quase uma novidade. Plantávamos arroz no Japão, para consumo próprio.

Ao chegar à fazenda foram residir em casa?

Cada família passou a residir em uma casa da colônia, já havia japoneses que havia chegado antes. O primeiro impacto que sofri foi com a barreira da língua, próximo a minha casa moravam uns meninos negros, tínhamos vontade de brincar, mas não havia forma de nos comunicarmos pela palavra. Tanto a linguagem como as brincadeiras eram muito diferentes. Logo que cheguei já fui para a escola, só que por três anos permaneci estudando no primeiro ano, simplesmente não sabia falar português! Alguns colegas japoneses, que tinham chegado antes, tinham um pouco mais de domínio da língua e nos ajudavam. Em matemática conseguia excelentes notas, mas quando o professor fazia o “ditado”, onde ele lia e nós tínhamos que escrever, eu recebia péssima nota. A professora era a Dona Candinha.

Com que idade o senhor passou a trabalhar?

Minha família após permanecer por três anos no Bairro Pau D`Alho, mudou-se para o Bairro dos Marins, fomos tomar conta da chácara do Sr. Emilio Fabri. Minha mãe estava grávida, logo nasceram meus irmãos gêmeos, a Maria e o Mario, seu Emilio queria batizar as crianças, ele e a sua filha batizaram a menina, a sua esposa e o filho batizaram o menino. Com seu Ford 1929 ele ia sempre ao sitio, era proprietário de um armazém situado onde hoje está o Bradesco da Paulista, ali ele tinha uma área que abrangia boa extensão do quarteirão, além do armazém tinha um salão onde estocava algodão que adquiria de plantadores da região. Nossa família mudou-se para Tanquinho, de lá mudamos para o bairro da Assistência, próximo a Rio Claro. Com doze anos passei a trabalhar na lavoura, arar, gradear, em lavoura de algodão, isso na Fazenda Itaúna, onde permanecemos por sete anos.

No período da Segunda Guerra Mundial os japoneses no Brasil sofreram algumas restrições?

Pelo fato de morarmos no sitio sentimos pouco as medidas tomadas em relação aos imigrantes. Como era natural, tínhamos armas de fogo para a defesa contra possíveis ataques de animais silvestres. Meu pai tinha um revolver Smith & Wesson que ele deu para o administrador da fazenda guardar. Desmontamos as espingardas, acondicionamos em papel e as colocamos debaixo do paiol. Não podíamos ter rádio, os japoneses, italianos e alemães eram chamados de “quinta-coluna”. (Quinta coluna é um termo usado para se referir a grupos clandestinos que trabalham dentro de um país ou região, ajudando a invasão armada promovida por outro país em caso de guerra).

Qual foi o próximo trabalho que o senhor realizou?

Meu pai percebendo que a rentabilidade do trabalho na lavoura estava ameaçada pela ambição do proprietário das terras arrendadas, decidiu que deveríamos mudar, ou para nossa própria terra ou para a cidade. Estávamos cansados de tanto trabalhar com agricultura, decidimos mudar para a cidade, adquirimos o Restaurante Central, na cidade de São Pedro. Não entendíamos nada de cozinha brasileira, conhecíamos a comida japonesa, permaneceram trabalhando conosco o cozinheiro e dois garçons. Eu e meu cunhado tomávamos conta do restaurante, fomos adquirindo prática.

Nessa época que o senhor e sua esposa se conheceram?

Minha esposa morava com a família em Artemis, ia sempre á São Pedro para visitar um irmão que morava lá.

O namoro japonês é diferente?

Naquela época não havia namoro, os padrinhos é que ajeitavam o casamento. O Chico, que era verdureiro, foi quem ajeitou meu casamento. Toda vez que a Tereza ia visitar seu irmão, passava em frente ao bar onde eu trabalhava. O Chico falou com o pai dela, ela nem sabia que iria se casar comigo.

Dona Tereza, como a senhora recebeu a noticia que iria se casar com uma pessoa que praticamente nem conhecia?

Eu tinha dezenove anos, o Susumu tinha quase vinte e cinco anos, eu disse que não queria me casar, mas meu pai me convenceu a aceitar. O padrinho falou com o meu pai e já marcaram a data do casamento. O casamento foi realizado na igreja de São Pedro no dia 28 de março de 1951.

Após o casamento o senhor trabalhou no que?

Permaneci trabalhando no restaurante de nossa propriedade. Após algum tempo fui plantar em uma área de terras cujo administrador era o Sr. Orestes, por um ano cultivei arroz e algodão, ia para lá na segunda feira, retornava na quarta feira, na quinta feira já ia de novo para a lavoura, era próxima a Santa Maria da Serra, ia de caminhão com o encarregado da fazenda, isso foi em 1952. Minha esposa permanecia trabalhando no restaurante. Terminada a colheita, um conhecido que tinha uma leiteria ofereceu-me uma área de terras para cultivar verduras, assim passei a fazer, e ajudando-o a entregar leite para a sua freguesia, era litros fechados com sabugo e palha de milho. Meu pai voltou para a fazenda Itaúna e me convidou para ir fazer uma lavoura de dez alqueires de mandioca, sempre fui muito bom para riscar a terra. Meu sogro em uma visita que nos fez achou que eu poderia ter melhores condições trabalhando na cidade, meu cunhado Julio ajeitou um trabalho com o Seu Maneco, um português que tinha um bar e restaurante na esquina da Rua Governador Pedro de Toledo com a Rua D.Pedro II, onde hoje está à loja de roupas Hot Point. Trabalhei lá por um ano como pasteleiro, fazia coxinhas. Dia 15 de junho de 1953 mudei para uma casa de propriedade do Sr. Vecchini, situada na Avenida do Café, 533, onde morei por três anos, as ruas eram de terra, com pedregulhos.

Qual é o segredo de um bom pastel?

Pastel é a coisa mais simples de se fazer, não adianta ensinar, mesmo ensinando nunca fazem igual, a massa de pastel é feita com farinha, água, sal e óleo, não se acrescenta mais nada, nem fermento, pinga, ovos. Fazíamos pastel de carne e queijo. Comprava no mercado frangos, galinhas, abatia-as e fazia coxinhas.

Em seguida o senhor trabalhou onde?

Comprei banca no mercado, no tempo em que tinha mesas de um metro, parte do prédio era descoberta, nessa época o mercado foi reformado, por três anos fiquei no mercado. Eu tinha trabalhado como pasteleiro com o Abe, pai do Antonio, Ricardo e do Fernando, aos sábados e domingos ele me chamava para ir trabalhar na pastelaria. Os irmãos Plínio e João Zaia tinham um bar situado atrás da Catedral, chamava-se Americana, encostado ao bar existia a agência de viagens da Viação Piracicabana, ele ofereceu-me porcentagem sobre as vendas de pastel para ir trabalhar com ele. Entrava às seis horas da manhã e ficava até as onze horas da noite, nessa ocasião eu morava no Jaraguá. Até a esquina da Rua do Rosário com a Avenida Dona Jane Conceição havia casas, da Rua do Rosário para baixo, sentido do Jaraguá não havia nada, apenas pastos. Cheguei a jogar futebol no Campo do MAF, no campo do Jaraguá Futebol Clube. Na quadra entre a Rua da Palma, Rua Campinas, Avenida Dona Jane Conceição e Avenida Dr. Edgar Conceição era o campo do MAF. As ruas estavam com suas quadras definidas, mas era tudo mato. Quando eu tinha horta, como havia muitos animais soltos, vacas, cavalos eu catava esterco por essa região onde hoje é o Bairro Jaraguá. Após para com a horta aprendi a trabalhar como cabeleireiro, montei um salão na Rua Prudente de Moraes entre a Rua do Rosário e a Rua Tiradentes. Corto cabelo até hoje. Meu cunhado Ângelo fez o curso de cabeleireiro em São Paulo veio trabalhar comigo, uma mocinha era a manicure. Eu penteava os cabelos de senhoras, fazia permanente. Minha esposa passou a trabalhar também como cabelereira.Uma das minhas freguesas era funcionária da Ultralar na Rua Governador Pedro de Toledo, eles precisavam de uma pessoa para trabalhar lá. A princípio eu fui trabalhar com botijão de gás. Aprendi a montar e desmontar fogões a gás e passei a cuidar dsso, fazia entregas, tive a oportunidade de conhecer a cidade de ponta a ponta.

Sr. Susumu o senhor era católico?

Pelo fato de ser japonês, tinha o budismo como religião em minha terra natal. Quem nos casou foi o padre Peroni, era muito conhecido na cidade de São Pedro. Em Piracicaba, participei do Movimento dos Cursilhos de Cristandade, queriam me batizar. Fui batizado quando tinha 52 anos, pelo Cônego Luiz Gonzaga Juliani.

Da. Tereza o seu pai, Shigueki Takaki veio morar onde?

Ele dirigiu-se a Fazenda Pau D`Alho, em seguida ele adquiriu uma área na Fazenda Cachoeira.

Como se deu a denominação da Praça Takaki em homenagem ao seu pai?

Meu pai foi o primeiro imigrante japonês a falecer em Piracicaba, em junho de 1958, fizeram essa homenagem a ele e a colônia japonesa, a Praça Takaki foi inaugurada em 17 de abril de 1960, a Paulista é o bairro onde existe a maior concentração de japoneses. Meu pai foi um dos fundadores do Clube Cultural Nipo Brasileiro de Piracicaba.

Qual é o objetivo principal do Nipo Brasileiro?

Quando o meu pai fundou o objetivo principal era fortalecer a união entre os japoneses, desde aquela época existe a gincana, onde há a participação de concorrentes em diversas modalidades de atrações com premiação aos melhores colocados. O baseball já existia. Festas de casamentos eram realizadas ali, naquele tempo era um clube destinado exclusivamente á japoneses, atualmente temos até diretores brasileiros, como o nosso Vice-Prefeito, o médico Dr. Sergio Pacheco.

Sr. Susumi como surgiu o grupo da terceira idade dos japoneses?

Na administração do prefeito José Machado, a primeira dama Janete Machado disse que seria interessante montar um grupo de terceira idade dos japoneses, na época uns trinta associados nessa faixa etária participava do baseball, incluímos essa turma toda no novo grupo. Com o tempo foram aproximando-se mais associados, inclusive brasileiros. Tanto eu como a Tereza por vários anos fomos diretores do grupo da terceira idade.

Dona Tereza, a senhora como cabeleireira conheceu muitas pessoas importantes da sociedade piracicabana?

Conheci, a esposa de Erotides de Campos foi minha cliente, senhoras francesas esposas dos diretores do Engenho Central, moças da família Kraide, Ana D`Abronzo, moças e senhoras da família Ometto.







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