quinta-feira, outubro 13, 2011

ANTONIO JOSÉ QUARTAROLO (TONY JOSÉ)

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/

ENTREVISTADO: ANTONIO JOSÉ QUARTAROLO (TONY JOSÉ)
A voz marcante é a própria identidade de Tony José. Ele é tido como um dos monstros sagrados do rádio esportivo brasileiro. De origem humilde, com sua determinação atingiu um patamar de fama e glória, sem, contudo perder a humildade, preserva suas amizades. Nascido em 29 de março de 1953, filho de Aléssio Quartarolo e Arlinda Todeschini Quartarolo, natural do bairro Barreirinho, pertencente á hoje cidade de Saltinho, na época era um distrito de Piracicaba. Seu avô tinha um sítio logo após o famoso Bairrinho, célebre pelos fumos “de corda”. Filho mais velho do casal, são seus irmãos: Maria Bernadete, Luiz Carlos Quartarolo, Camilo Irineu Quartarolo, Aparecida Quartarolo, Aléssio Quartarolo e Fernando Quartarolo. Quando era muito jovem ainda, sua família se mudou do Bairrinho para o local denominado Glebas Califórnia, região onde havia muitas chácaras, mais tarde uma parte dessa região deu origem ao Bairro Jupíá O menino Antonio estudou em uma escola que hoje não existe mais, ficava no Bairro dos Marins, próxima ao Córrego dos Marins, junto a uma olaria. A escola não oferecia estudos até o quarto ano primário, era necessário freqüentar outra escola, Antonio José estudou na Escola Francisca Elisa da Silva, situada nas esquinas da Rua XV de Novembro com a Rua Antonio Correia Barbosa.
No Barreirinho qual era atividade principal dos seus pais?
Eles trabalhavam na produção de fumo de corda, eu ainda muito novo ajudava, na época não havia a proibição de criança trabalhar, considero que essa lei que proíbe o trabalho da criança está equivocada, caso a criança queira ela deve trabalhar. Como se dizia antigamente: “Serviço de criança é pouco, mas quem perde é louco!” Com 6 a 7 anos comecei a ir para a roça. Não havia outra opção. Eu tinha prazer em ajudar o meu pai, a “virar cambito” fazer corda de fumo. Essa onda de criança não poder trabalhar é um cuidado exacerbado. A criança deve trabalhar de acordo com sua capacidade física, com 14 anos eu carregava saco de 60 quilos, com isso desenvolvi minha musculatura. Como se dizia na época “peguei no guatambu”, puxei enxada, fiz tudo isso sem problema nenhum. O que mais me incomodava era a mesmice de sempre, Piracicaba era pequena demais. Não havia a facilidade de sair daqui como existe hoje.
Na área cultivada pelo seu pai nas Glebas Califórnia, o que mais se plantava?
Meu pai sempre foi interessado em buscar novidades, ele conheceu um japonês que lhe passou determinadas técnicas para o plantio de mamão. Ele plantou mil pés de mamão na chácara, eu o ajudei. Depois ele arrendou um terreno que ficava no alto da pedreira situada na Estrada do Bongue. Era um local com uma vista muito bonita, mas terrível para trabalhar, a inclinação do terreno era muito acentuada. Para o mamão era ótimo: a geada não pegava, o arejamento era fantástico, um terreno pedregoso, justamente o que o mamão queria. Para plantar o mamão tinha que fazer a cova, cercar com pedras, colocar pó de serragem, jogar as sementes e o pé de mamão nascia e crescia. Quando ocorria uma geada ela derrubava as folhas e o mamão amadurecia muito rápido, gerando grande oferta no mercado e caindo muito o preço pago ao produtor.
Como era feita a trajetória da sua casa no Bairro dos Marins até a escola onde você estudava?
Ia a pé! Descia pela Estrada dos Marins, passava pela Cerâmica Piracicabana, nas proximidades de onde hoje é o Carrefour, passava pela Chácara do Morato, a Rua do Porto não fazia a trajetória que faz hoje, era bem mais curta, só existia o caminho á beira do Rio Piracicaba, era tudo terra batida. Passei a usar sapato aos doze ou treze anos, até então ia descalço mesmo. No alto das Glebas Califórnia existia a chamada Chácara do Limão, próxima a Chácara Espéria, onde era mato hoje é um condomínio. Do outro lado tinha a Chácara Nazareth que era do Pacheco Chaves, hoje é loteamento residencial. Não existia o Bairro Nova Piracicaba, era tudo plantação de cana.
Esse trajeto diário ás margens do Rio Piracicaba não era um convite á banhar-se no mesmo?
Não! Minha mãe colocava tanto terror á respeito que eu não me arriscava. Nadei um pouco no Ribeirão dos Marins, escondido, ia para casa todo molhado, no caminho esperava secar. Meu pai tinha carroça, com roda de madeira e aro de ferro, só mais tarde é que passou a ter um carrinho com pneu, um conforto danado. Com a carroça lotada de mamão, íamos ao Mercado Municipal, a ida era feita a partir das quatro horas da manhã.
Eu ficava tomando conta do carrinho com os mamões enquanto meu pai ia negociar com os compradores. No Moratinho, perto da Ponte do Morato, muitas vezes o caminho enchia de água, na época das chuvas, a água batia na barriga do animal, nós torcíamos para que a ponte estivesse ainda ali, pois só dava para ver as laterais da ponte. Subíamos pela Rua Rangel Pestana, ás quatro e meia, cinco horas da manhã, a carroça lotada de mamões, meu pai pulava, ia conduzindo a pé o animal.
A sua família mudou-se para outro local?
Viemos morar perto da antiga revenda de automóveis Colina, na Rua Silva Jardim com a Rua Campos Salles, tínhamos comprado um terreno ali, construímos uma casa e mudamos. Só que o meu pai teve dificuldade em conseguir um emprego, até que ele resolveu fazer feira, arrendamos uma área de quase um quarteirão nos fundos de uma agencia Volkswagen, a Vepira, não tínhamos equipamentos, por 15 dias meu pai e eu cavoucamos aquilo tudo, transformando em canteiros de horta o que era um pasto, isso foi em 1966. Nós molhávamos o pasto e usávamos o enxadão. Meu pai tinha conhecimento técnico para produzir rabanete com 15 dias de plantio, alface com um mês. Aos domingos ficávamos até as duas horas, duas horas e meia da tarde, porque as pessoas iam buscar verduras frescas. A família toda trabalhava nessa horta, preparava-se a verdura para vender no dia seguinte. Com o tempo meu pai passou a ter um armazém na feira, permaneci na feira até os meus18 a 19 anos.
Em que locais eram realizadas as feiras?
Na terça-feira no Largo Santa Cruz, quarta-feira na Vila Rezende, quinta-feira na Paulista, sexta-feira na Rua Riachuelo atrás da Santa Casa, aos sábados era em um terreno onde jogaram as lajes do antigo Comurba, onde mais tarde foi construído o Hipermercado Jumbo Eletroradiobrás e a feira mudou para uma rua ao lado, domingo era atrás da Estação da Paulista e na Vila Rezende perto do Clube Atlético Piracicabano.
Quais veículos vocês utilizavam para levar as mercadorias a serem vendidas na feira?
Inicialmente tínhamos uma Kombi, quando virou armazém tínhamos duas Kombis e um caminhão Ford 36, mais tarde trocamos esse caminhão por um Chevrolet 1957, o famoso “Marta Rocha”, depois adquirimos um caminhão Chevrolet Brasil. Eu aprendi a dirigir em um Ford 1929, o marcador de combustível era um nível, igual ao nível de pedreiro. Essa maravilha era do Fernando Cardinali, eu trabalhei para ele na feira por um período de um ano e pouco. Minha função era vender óleo comestível, vinha em um tambor, colocava-se uma bomba manual e realizava a venda conforme o pedido do cliente: um litro, meio litro. O vasilhame era trazido pelo próprio cliente. Lembro-me que levava um tambor de 200 litros por 50 metros feira a dentro, o comentário geral era: “Esse garoto é muito forte!”. Na realidade tudo se resume na forma como você conduz o tambor, basta colocá-lo de quina no chão, dar dois pequenos impulsos e o próprio conteúdo impulsiona o tambor. Basta controlar o tambor de quina, com os dedos, o próprio tambor se movimenta. Na época foi lançado um produto novo no mercado, o Cardinali vendia sete pedaços por uma unidade monetária da época (1 cruzeiro), era o sabão Ypê, pelo fato de ser amarelo o pessoal dizia que era feito de fubá.
Você fez o Tiro de Guerra?
Na minha época era obrigatório, hoje infelizmente não é. Servi aqui na Paulista, na Avenida Dr. Paulo de Moraes, servi com o Waltencir, o comandante era o Guatura. Acho que todos deveriam servir o exército, inclusive as mulheres. No exército se aprende a ter amor a Pátria, o exército prepara o individuo para a vida. Entra moleque e sai um homem, em qualquer parte do mundo sem disciplina não se chega a lugar nenhum.
Você prosseguiu seus estudos onde?
Fui estudar na Escola Industrial, na época estavam construindo o segundo prédio. Fiz os cursos de torno, fresa. Eu queria fazer o curso de medicina, mas não era possível, tinha que trabalhar. Surgiu a vontade de buscar algo que trouxesse resultados mais rápidos. Eu tinha facilidade em ler textos, interpretando-os. Apareceu um amigo, João Barreto, que era locutor oficial da estação rodoviária “nova” e que precisava de alguém que o substituísse aos sábados e domingos á tarde. Fui para lá e passei a anunciar as partidas de ônibus. Apareceu um japonês, DuarteYamanaka, criamos coragem e fomos falar com Francisco Silva Caldeira que tinha adquirido a Voz Agrícola do Brasil, na Rua Moraes Barros 1191. O Caldeira me aprovou, dizendo: “-Eu não tenho nem verba e nem horário! Se você quiser a partir das 16 horas pode vir para cá e ler os textos comerciais”. Na época não eram gravados, quem programava as musicas era o Cesar Floriano que um ou dois anos depois saiu da rádio. O programa seguinte era apresentado pelo Paulo Roberto, irmão do Jayme Luiz, que tinha saído da rádio, foi trabalhar em São Carlos. O Paulo Roberto deu seqüência ao programa que na época era coqueluche em Piracicaba, chamava “Show das Cinco”. Tinha a participação do ouvinte pelo telefone no ar, era novidade e tinha grande audiência. O Antonio Carlos Pedrassi saiu da rádio, era um locutor com uma característica interessante, normalmente era gago, ao entrar no ar passava a ser um locutor normal. O Caldeira me ofereceu o horário dele e o salário possível da época. O meu sonho sempre foi de comer no restaurante Brasserie, eu passava pela porta, mas nunca tive dinheiro para entrar. Ao receber o meu primeiro salário na Voz Agrícola fui comer um filé á parmegiana na Brasserie! Depois fiquei “duro” pelo mês todo! Mas feliz por ter comido o parmegiana na Brasserie. Ai apareceu o Marcio Terra que tinha um programa das 18 ás 19 horas, o Panorama Esportivo, ele me puxou para o esporte, quem escrevia o programa era o Rubens Righetto, alguns meses depois o Righeto saiu da rádio, eu passei a fazer o programa com o Márcio e alguma coisa também no programa Jornada Esportiva. Disse ao Márcio que meu irmão tinha concluído o curso de datilografia, poderia escrever os textos do programa, assim Luiz Carlos Quartarolo passou a ser redator da Voz Agrícola. Ele fez com grande competência, conhece e gosta de futebol. Fiquei um bom tempo na Voz Agrícola, nessa época chegou por lá Tarcísio Chiarinelli, também apareceu um indivíduo com um gravador enorme nas costas, era o Rogério Aquiles. Naquela época estavam lá: Dinival Tibério, Márcio Terra, Osvaldo Onofre. Eu tinha 18 a 19 anos, vi que aquilo não oferecia melhores perspectivas financeiras. Fui trabalhar como gerente de cine, foto e som da recém inaugurada Jumbo Eletroradiobrás. Em seis meses percebi que não era o que eu queria. Fui trabalhar com Silvio Gonçalves Motta que era atacadista da São Paulo Alpargatas, passei a viajar pelo estado todo. Vendi muitas alpargatas, congas, havaianas, calças e camisas USTOP. Casei-me com Maria Nilcéia Spada, em 24 de dezembro de 1976, na Matriz da Catedral. Na época o carro chefe de vendas era o Ki-Chute, um calçado que utilizava derivado de petróleo, com a crise mundial nesse setor a demanda era maior do que a produção, com jeans acontecia a mesma coisa. Tinha que cobrir cotas vendendo havaiana e conga cujo valor agregado era bem menor. Decidi ir á São Paulo em busca de algo melhor, minha esposa permaneceu em Piracicaba. O Carlinhos Libardi era gerente do Messias que tinha comprado um depósito da Skol que havia falido, ficava na Vila Mariana, na Rua Tutóia. O Carlinhos disse-me: “ – Só preciso de você aqui na parte da manhã, você circula a Avenida Paulista e a Rua Brigadeiro Luiz Antonio, tira os pedidos, faz as notas e depois está liberado”. Ele ainda me ofereceu um aposento no próprio depósito, onde coloquei uma cama e passei a dormir no depósito de cerveja. Comecei a visitar todas as rádios de São Paulo. O que me ajudou é que em Piracicaba eu já havia trabalhado na Voz Agrícola, na Rádio Educadora.
Qual foi a primeira rádio em São Paulo em que você começou a trabalhar?
Certo dia fui a Rádio Gazeta, o Roberto Petri estava começando a comandar a equipe, entrou no lugar do Peruzzi que tinha saído. Ele precisava de alguém para ficar no lugar do Rui de Moura, lá encontrei Athayde Teruel que era de Santa Bárbara D`Oeste e já havia trabalhado em Piracicaba, isso deu uma certa empatia, foi ele quem me apresentou ao Roberto Petri. Athayde disse-lhe: “Esse é o cara que você precisa!”. Marcamos um teste para quinta feira. Eram 15 pessoas para uma vaga. Tinha um candidato do Mato Grosso, experiente, com um vozeirão. Outro de Jaú era fantástico. Mas deu certo, acabei sendo contratado. O Petri foi muito decente, disse-me que naquele mês e no mês seguinte ele só dispunha de metade da verba considerada o piso da categoria. Fiquei. No terceiro mês ele me deu mais do que o dobro de aumento. Na Rádio Gazeta fiquei de 1976 até 1982. O Petri saiu e o Flavio Araujo entrou no seu lugar, Darci Reis era o chefe na Rádio Bandeirantes, me chamou oferecendo um excelente salário, a Gazeta cobriu a oferta. O Darci Reis me chamou novamente, dobrando o meu salário. Em 18 de maio de 1983 fui á Bandeirantes onde permaneci até 1998. Quando o Darci Reis faleceu o Fiori Gigliotti assumiu a equipe, foi um grande chefe e amigo. Com o Eder Luis montamos uma equipe esportiva em FM, inicialmente para a Band FM, de lá fomos para a Transamérica, fiquei com o Eder até 2003. Dei uma parada, passei a fazer gravações de audiovisuais, apresentações de festas, comerciais, mestre de cerimônias, cheguei a fazer três formaturas no mesmo dia. Uma das cerimônias que fiz foi muito marcante, me contrataram para apresentar a cerimônia de ordenação de um padre. A duração foi de umas quatro horas, segui um script. João Thomaz, um amigo, é pai de uma menina portadora de Síndrome de Dow, ela sempre se motivou muito ao ouvir musica clássica, colocada em uma escola de ballet, hoje ela é a única portadora de Síndrome de Dow que realiza todos os movimentos de ballet, ela se apresenta no mundo todo. Na sua formatura fui convidado a narrar a sua apresentação.
Quando você retornou ao rádio?
O Deputado Roberto Moraes, em 2008 me convidou para ajudá-lo na apresentação de futebol aos fins de semana na Rádio Onda Livre, onde permaneci até maio deste ano, quando a Rádio Capital me chamou. Atualmente faço um programa diário das 20:00 ás 21:00 horas e faço futebol quarta, quinta, sábado e domingo. Em 1979 eu trabalhava na Gazeta aos finais de semana e a convite de José Roberto Soave vim para trabalhar na Difusora FM, que foi a primeira FM da cidade, eu e Olívio Pizzani já falecido, éramos as vozes oficiais da Difusora FM. Na Difusora AM eu fazia a parte policial. Quem faz futebol consegue improvisar no rádio. Quando um homem de rádio vai a campo, ele irá narrar geralmente mais de 90 minutos, o locutor tem que narrar tudo que está vendo, isso facilita o trabalho em festas, comerciais. Trabalhei em campo com o Faustão, quando ele fazia a Jovem Pan e depois a Globo, sendo que ele também trabalhava no Jornal O Estado de São Paulo. Naquela época não havia os recursos técnicos de hoje, no intervalo quando todo mundo ia comer um lanche ele ia ao orelhão passar matéria para a redação do jornal.
Você só se dedicou á área esportiva dentro do rádio?
A área esportiva me descortinou o Brasil e o mundo. Estive na América do Norte, Europa, Ásia. Em alguns países permaneci por mais de um mês, a trabalho. Consegui com o rádio ajudar alguns amigos: levei meu irmão Luis Carlos Quartarolo, foi trabalhar como plantão da Gazeta, logo depois foi o Roberto de Moraes, que voltou por ter deixado a noiva aqui, levei Tarcísio Chiarinelli, que depois voltou á Piracicaba, levei de Jaú o Luiz Carlos Bonzanini que também está de volta em Piracicaba.



sexta-feira, outubro 07, 2011

Jorge Luis Uzcátegui

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 08 de outubro de 2011
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
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ENTREVISTADO: Jorge Luis Uzcátegui
“É da nossa natureza sentir mais satisfação ao atingir uma meta quando a tarefa é mais difícil. As coisas fáceis trazem um prazer superficial. As músicas mais simples, rapidamente ficam irritantes e deixam de ser estimulantes”, conforme afirma Nicholas Hudson, biólogo. Boa parte das pessoas ouve músicas eruditas com uma freqüência maior do que imagina sem saber, no entanto, que está diante de uma composição clássica. É o caso da famosa “música do gás”: todos a conhecem, mas poucos sabem que se trata de Für Elise de Ludwig van Beethoven. Filmes e novelas há muito tempo, também utilizam a música clássica. Segundo Charles Sanders Peirce: “Quando se atrela a melodia erudita a um produto, várias e várias vezes (pois a publicidade é repetitiva), o público alvo começa a relacioná-los. Primeiro, é apenas som; depois de certo tempo, a música já é automaticamente ligada ao produto. As sensações que ela provoca, dessa maneira, também se ligam àquele objeto que se quer vender”. A música “erudita” ainda gera um bloqueio, por ser considerada um fenômeno inatingível para as pessoas comuns. Musica erudita é uma das únicas formas de composição que continua a vigorar por séculos. As pessoas que gostam de música "padronizada", simplesmente não perceberam a riqueza e beleza da musica erudita, e o fato dela ser acessível. É interessante observar que para alguns jovens a música erudita é estereotipada como "coisa de velho rico", sendo que muitos deles de forma quase clandestina escutam clássicos em seus aparelhos mp3. Jose Antonio Abreu é o carismático fundador de um sistema de orquestras de jovens que já transformou a vida de milhares de crianças na Venezuela. Em 1975 fundou a Orquesta Sinfónica Nacional Juvenil, criou orquestras infantis e juvenis pelo território venezuelano, especialmente nas localidades mais carentes. A organização dessas orquestras serve como um mecanismo de inclusão social, utilizando a música clássica como meio de integração. Essa iniciativa compreende um conjunto de mais de cento e oitenta conservatórios musicais, contando atualmente com 350.000 músicos profissionais. Uma verdadeira revolução cultural, que desmistifica o acesso a cultura vinculado ao poder aquisitivo, ou a castas de pseudo-intelectuais. Piracicaba dá um grande passo nessa direção. Graças a piracicabanos altruístas, e com rara percepção do futuro, o milagre que José Antonio Abreu realiza na Venezuela passa a ser implantado em nossa cidade com a Orquestra Filarmônica Tchaikovsky, tendo a participação entre outros dos maestros Fernando Ortiz de Villate e Jorge Luis Uzcátegui, regente da Orquestra Sinfônica da Universidade da Califórnia, em Los Angeles (Estados Unidos), nascido em 8 de janeiro de 1983 em Caracas, Venezuela.

Maestro Jorge Luis Uzcátegui quais gêneros de música se praticam na Venezuela?

Temos as músicas típicas como salsa, merengue. Já faz 35 anos que temos uma boa tradição de música erudita. Crianças de qualquer estrato social estão praticando musica erudita.
Quem é o responsável em despertar tanto o interesse pela musica erudita na Venezuela?
O Maestro Jose Antonio Abreu é a pessoa que fundou o Sistema de Orquestras Infantis e Juvenis da Venezuela. Essa missão está encarregada de agrupar todos os jovens em cada localidade, cidade ou povoado da Venezuela para executar música clássica, retirar ou evitar que esses jovens se envolvam com crimes, drogas, através da música de grande nível.
A Venezuela está atualmente em um regime político diferenciado isso influi nessa ação?
O mais interessante disso é que há uns 10 anos quando o Presidente Chaves havia começado o seu mandato era opositor da cultura. Ele achava que a musica clássica não era importante para a sociedade. A partir do momento em que viu a obra do Maestro José Antonio Abreu e o impacto social que pode ter a música erudita ele redobrou o apoio dado em todos os sentidos para a orquestra.
Quantos jovens venezuelanos estão envolvidos com a música clássica?

Hoje perto de 350.000 jovens são músicos, a população do país é cerca de 30 milhões de habitantes, com isso afirmamos que temos o maior número “per capita” de músicos do mundo, mais de um por cento da população pode tocar em uma orquestra profissional em qualquer parte do mundo. Eles começam a estudar ainda bem novos, a partir de 3 a 5 anos, com 12 anos já são jovens formados, que podem executar música de alto nível. O contrabaixista Edicson Ruiz foi convidado para integrar a prestigiosa Orquestra Filarmônica de Berlin aos 16 anos de idade, se não fosse por essa obra ele talvez nunca tivesse a chance de tocar um instrumento musical. Outro exemplo é Gustavo Dudamel que é o Diretor Titular da Orquestra Filarmônica de Los Angeles.

Como surgiu esse trabalho aqui no Brasil?

O maestro peruano Fernando Ortiz de Villate está tratando de realizar uma obra semelhante a que foi feita na Venezuela. Recrutando pessoas de todos os extratos sociais e idades, para integrarem essa ação musical. Hoje estamos iniciando um ensaio com a orquestra e o coral ás três horas da tarde e deve terminar por volta das 10 horas da noite. Notei que em Piracicaba falta apoio por parte de pessoas particulares, de empresários, do estado brasileiro. Falta muito apoio para se formar em Piracicaba um movimento que se espalhe para todo o país e seja motivo de orgulho para o Brasil. Temos que compreender que essa iniciativa pode mudar o mundo.

Qual a faixa etária dos músicos venezuelanos envolvidos nesse sistema?

As orquestras são classificadas por idade dos seus integrantes: maternal, pré–infantil, infantil, juvenil, profissionais. Qualquer integrante de uma orquestra juvenil venezuelana toca em orquestra profissional.

Eles têm alguma outra profissão ou são apenas músicos?

Os menores ainda são estudantes de escolas convencionais. Muitos exercem outras profissões além de serem músicos, e em muitos casos se não fosse pela música não teriam tido a oportunidade de se qualificarem intelectualmente, academicamente, espiritualmente. O acesso ao instrumento musical supriu toda a sua vida: através de uma bolsa de estudo para que estudassem em um colégio, para se alimentarem. A música é a única linguagem que não sofre barreiras, todo mundo pode falar com o coração: sem impor diferenças de religião, cor, econômico, social. Para fazer musica pode ser a pessoa muito rica ou a muito pobre, a finalidade de ambos é a mesma, a qualidade sonora, capaz de cativar o coração do ser humano.
Qual é a semelhança do brasileiro com o venezuelano?

Há muitas semelhanças! O Brasil é um país ideal para iniciar um projeto assim, somos latinos, muito parecidos, temos a mesma cultura, somos pessoas que se doam por completo para conseguirmos nossos objetivos. Temos humildade suficiente para entendermos que temos que melhorarmos a cada dificuldade encontrada. A música é a única forma onde se encontra igualdade social, tão propagada politicamente como socialismo.

O projeto no Brasil está começando em Piracicaba?

No Brasil existem lugares que são inspirados na obra da Venezuela. Na Bahia há um movimento já bem avançado, e está em um estágio avançado por ter recebido apoio do governo, apoio privado e inclusive recebeu apoio da Venezuela. Isso mostra que pode se conseguir resultados. O Maestro Fernando Ortiz está encontrando uma maneira de que músicos de 12 a 70 anos se exercitem aqui. O coral tem uma média de idade mais elevada. Uma pessoa empenhada em participar em um projeto desses envolverá nele sua família, sua vida irá mudar. Ela irá encontrar a magnitude e a força da música.

O sonho do senhor é realizar um evento com música erudita do porte do Rock in Rio?

Absolutamente! Essa é a idéia! Na Europa acontecem eventos onde são executadas musicas clássicas e músicas eruditas com público de 300.000 pessoas, isso ocorre porque essas músicas são as musicas populares dessas nações. Qualquer musico formado em musica erudita tem nível para fazer musica popular, compreende todos os pormenores da musica ele estudou harmonia, solfejo, composição, contraponto. Para ele a música popular pode parecer um pouco simples demais. A música erudita quando se torna um hobby de uma criança, desenvolve 30 por cento do cérebro, que não irá se desenvolver em quem não pratica esse tipo de atividade, intelectualmente ele estará mais bem preparado para atuar em qualquer área.
Como um povo sem tradição em gostar de música erudita pode mudar tanto?

Através de trabalho árduo e muito apoio. Muitas pessoas ao ver as mudanças ocorridas com os participantes desse projeto, ela também quer participar. Todos querem ser mais felizes. Com a música temos resgatado pessoas que vivem em absoluta pobreza e extrema violência, que seriam possíveis criminosos. O que vemos são resultados, rapazes que trocaram os vícios, as ruas, pelos instrumentos. Temos até uma orquestra dentro de um presídio, estamos ensinando musica clássica aos presos, para acalmar um pouco a violência.

Na década de 60 em diversos países surgiram movimentos jovens de contestação, a era hippie e a contracultura. Estamos vivenciando uma versão repaginada?
Me considero uma pessoa altamente entusiasta e ao mesmo tempo objetivo. Se eu achasse que tudo que estamos falando agora, não vou conseguir, não estariamos perdendo tempo. As pessoas daquela época queriam mudanças, mas não tinham claramente como mudar, queriam a paz e o amor. Só que não sabiam como conseguir isso. No processo que estamos realizando as pessoas estão desenvolvendo sua mente, sua disciplina, na Venezuele é um fato, é algo concreto. Deixou de ser um sonho, hoje é realidade.

O senhor mora em que país?

Moro nos Estados Unidos, em Los Angeles, dirijo a Orquestra da Universidade da Califórnia.

Nos Estados Unidos o senhor está desenvolvendo projeto semelhante?

Sim, atualmente estou elaborando um projeto com o Maestro Fernando, em Los Angeles, formando orquestra com crianças, para resgatá-los, e unificar as culturas, Los Angeles é uma cidade com população composta por pessoas vindas de todas as partes do mundo, muitos extratos sociais distintos. A idéia é criar união entre tantas diferenças, através da musica.

O senhor acredita que no Brasil o sistema deve repetir o sucesso realizado na Venezuela?
Existe todo o potencial para que isto aconteça. Assim como foi na Venezuela irá exigir muito esforço, foram 35 anos de trabalhos.
Porque Piracicaba foi escolhida para a implantação do projeto?

Piracicaba tem uma grande virtude, além de ser uma cidade acessível, pesquisamos qual o local ideal para se prestar a implantar esse projeto, além dos recursos naturais da cidade, o povo aqui parece ser especial, isso é muito importante, a população deve sentir orgulho de que aqui se originou algo muito grande. Há empresas e pessoas importantes que podem colaborar muito, com poder aquisitivo, que contribuam com a sociedade. Hoje em Piracicaba temos o coro, o balé e a Orquestra Filarmônica Tchaikovsky, envolvendo 100 artistas é um grupo que se originou em pouco tempo. Deve seguir crescendo, necessita e requer urgentemente o apoio do povo de Piracicaba.

Como é a relação da Orquestra Filarmônica Tchaikovsky com outras orquestras de Piracicaba?

Existe uma espécie de resistência, por algo novo, que surgiu há pouco mais de um ano, como pessoa eu penso que se me oferecem algo, com muita boa vontade, no mínimo devo provar. Se não der certo abandono. É preciso que apóiem, aprendam, contribuam, escutem. Algum dia as coisas serão movidas por si mesmas, é melhor unir-se, poderá ter o orgulho de ter participado do sistema desde o seu início.

Há algum pré-requisito para entrar para a Orquestra, coro ou balé?

Há! Muita vontade de trabalhar e muito otimismo. Não existem aqui os recursos que temos na Venezuela, mas buscamos conforme a necessidade.

Quanto é cobrado do aluno?

È absolutamente gratuito! Com o devido apoio há a intenção de remunerar o estudante, como fazemos na Venezuela. Há a concessão de bolsas de estudos. O único requisito é que tem que estudar e participar dos ensaios diariamente. Todos os dias de segunda a sexta depois do colégio tem três horas de ensaio.

O senhor está fazendo uma verdadeira revolução!

Estou de acordo! Totalmente! Tudo que fazemos é documentado, para aperfeiçoarmos cada dia mais. Minha tese de doutorado em Los Angeles é sobre nosso projeto. A música é a manifestação artística mais poderosa que existe. Mesmo antes do ser humano aprender a falar havia música, havia ritmos. Quando trabalho com o coral, quero ter a certeza de que eles cantando em qualquer idioma saibam o significado de cada letra, de cada palavra e a sua pronuncia correta. Como cantar se não sabem o que estão dizendo?

Falta divulgação do trabalho feito em Piracicaba?

Falta apoio, divulgação, pessoas que se juntem a nós com o mesmo entusiasmo que temos pela música, há aqueles que têm tempo disponível, outros que possuem recursos financeiros, outros podem ter um instrumento disponível, sem uso. As pessoas têm que se contagiarem acreditando que podem realizar muito através da musica.

Esse trabalho com a música pode ser uma alternativa a dependência química?

Claro que isso pode ser feito! Um rapaz que pode tocar Mozart ou Beethoven e que entende o significado dessa música, e como funciona o comportamento de comunidade de uma orquestra, interdependente, ele também irá compreender como a sociedade vive em harmonia. A droga se converte na música e a música se converte na nossa droga, na nossa paixão, queremos fazer musica o tempo todo, a diferença é que a droga nos mata e a musica nos dá mais vida, mais força.






domingo, outubro 02, 2011

Dr. Lister André Barrichello Tosello Presidente do Conselho Municipal de Saúde do Município de Rio das Pedras

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
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http://www.teleresponde.com.br/

ENTREVISTADO: Dr. Lister André Barrichello Tosello Presidente do Conselho Municipal de Saúde do Município de Rio das Pedras
Dr. Lister existe um canal democrático e legal para a população manifestar suas satisfações ou insatisfações com relação á saúde no Município de Rio das Pedras?
Perfeitamente, esse canal é o Conselho Municipal de Saúde de Rio das Pedras.
Essa via de comunicação é divulgada junto as camadas mais carentes ou até mesmo ao munícipe que é usuário do Sistema Municipal de Saúde?
A grande maioria desconhece as vias legais e democráticas existentes para encaminhar suas reivindicações básicas, aquilo que lhes cabe por direito constitucional. O Conselho atual está empenhado em fazer essa divulgação, conscientizando os usuários, foi criada uma sala específica para atender aqueles que necessitam de informações, essa sala situa-se onde foi a antiga DG Import, lá há uma secretária atendente para receber reivindicações e reclamações. Ela irá protocolar essa ocorrência e encaminhar á Presidência do Conselho, o assunto será então levado ás reuniões plenárias. Nossa intenção é manter um canal de acesso junto às autoridades para que cheguem até elas as insatisfações dos usuários do sistema.
Por exemplo, um atendimento na área de saúde, que não satisfaça as expectativas do paciente qual é o procedimento correto?
Ele dirige-se até esta sala e protocola sua reclamação.
Qual é o tempo de resposta previsto?
Nossas reuniões são mensais. Toda reivindicação protocolada por esta nossa auxiliar será levada na próxima reunião do Conselho.
Quando foi criado o Conselho Municipal de Saúde de Rio das Pedras?
Foi criado conforme a Lei Municipal 004/2005 de 28/04/2005 e resolução 333 de 04/11/2006 do Conselho Nacional de Saúde e Ministério da Saúde.O Conselho Municipal de Saúde terá composição paritária com representação de usuários (Setores da Sociedade Civil Organizada) e Prestadores de Serviços (Público, Governamental, Privado, Filantrópico, Conveniado ou Não Lucrativo, bem como Trabalhadores da Área da Saúde).
Qual é a Composição do Conselho Municipal de Saúde de Rio das Pedras?
A composição paritária corresponde a:
50% de Usuarios da Saúde
25% de Profissionais da Saúde
25% de Prestadores de Serviços ao SUS e Gestores
As entidades componentes do Conselho são escolhidas ao acaso? As pessoas que participam são voluntárias?
As entidades representam segmentos da sociedade. Participam a Maçonaria, Igrejas Evangélicas e Católica, Clubes de Serviços e instituições filantrópicas. As pessoas representantes são designadas por estas entidades. São cidadãos participantes sem remuneração alguma.
Como o senhor vê a saúde em Rio das Pedras?
Ela vem melhorando, está sendo investido além do valor determinado pela lei, de 15% (quinze por cento), neste último mês foi aplicado 22% (vinte e dois por cento) da receita.
Rio das Pedras está crescendo bastante, a saúde tem como acompanhar esse crescimento?
Não tem, embora esteja sendo feito o possível para melhorar, a saúde é uma área que requer muitos recursos, não só técnicos como também financeiro.
Algumas cidades de pequeno porte investem no transporte para que seus pacientes sejam conduzidos á centros com maiores recursos. É uma medida correta?
O ideal era que cada cidade tivesse o seu atendimento pleno, um hospital com UTI, para dar todo acolhimento ao usuário paciente. É o nosso caso aqui. Nós não temos UTI, os casos que necessitam o uso de UTI são encaminhados para Piracicaba.
Os atendimentos de alta complexidade são feitos em um centro com infra-estrutura apropriada?
No nosso caso recorremos aos recursos disponíveis em Piracicaba.
Qual é a entidade assistencial com maior atuação em Rio das Pedras?
É o SUS – Sistema Único de Saúde, que é prestado pela Prefeitura, sendo o Hospital o prestador de serviço. Ele tem o Pronto Socorro que dá plantão 24 horas. Por ser a única porta que está aberta 24 horas é onde existe a maior concentração e o fluxo de atendimentos. No mês de agosto foram realizados 5.367 atendimentos no Pronto Socorro e 1.467 atendimentos em Sistema Ambulatorial nas especialidades oferecidas, totalizando 6834 atendimentos no período.
Como o SUS – Sistema único de Saúde participa?
É o sistema que coordena as Ações voltadas para o cuidado com a saúde da população Brasileira. A função do SUS é garantir acesso Integral, Universal e Igualitário à população Brasileira do simples atendimento ambulatorial ao transplante de órgãos.
Qual é a importância do Conselho para o município?
É muito importante. Os conselhos foram criados em três níveis: Federal, Estadual e Municipal.
A função do Conselho não é executiva?
O Conselho faz um acompanhamento é um elo entre os poderes gestores: Prefeitura com o Secretário de Saúde, O Centro Médico, o Centro Odontológico, os ambulatórios de especialidades e o poder gestor do hospital, que é o complexo do hospital e pronto socorro. Temos o elo com o Departamento Regional de Saúde- DRS, tudo isso é ligado ao SUS. A finalidade do Conselho é acompanhar os problemas de saúde da cidade. Ao detectar um problema o Conselho tem a obrigação de levar ao conhecimento dos gestores, do departamento de saúde, e ao SUS, para que seja solucionado e resolvido.
O Conselho de Saúde tem uma força muito grande?
Sem dúvida. Ele pode interferir em situações desde que sejam respeitados os aspectos legais. O Conselheiro não pode diante de uma reclamação, em uma atitude individualista, tentar resolver algum tipo de situação. Ele deve levar ao conhecimento do Conselho para que em uma sessão plenária seja apreciada a questão. A prestação de contas por parte dos gestores são mensalmente analisadas por uma comissão formada por quatro conselheiros e depois são levadas ao conhecimento de todos os Conselheiros em Reunião Plenária para aprovação. Os Conselhos representam a oportunidade que a sociedade possui de participar das políticas de saúde e controlar a execução dessas políticas, inclusive em relação a aplicação dos recursos públicos na saude, tanto na etapa do planejamento e no final do processo com a fiscalização de como estes recusrsos foram aplicados.
A força do Conselho está na participação da população?
Tem que existir a participação de todos os segmentos da sociedade dentro da representatividade. O usuário deverá buscar esse local já determinado aonde irá levar sua reivindicação. Essas reclamações podem ser atraso no atendimento, atraso do profissional, a falta de determinados medicamentos que são adquiridos através de pregões.
O senhor participa desse Conselho há quanto tempo?
Sou membro do Conselho desde 2005, quando o atual Prefeito Marcos Buzzeto assumiu o primeiro mandato, assim que foi instituído o Conselho comecei a participar.
Em que data o Senhor foi eleito Presidente do Conselho Municipal de Saúde de Rio das Pedras?
Fui eleito Presidente do Conselho no dia 28 de junho de 2011, para um mandato de dois anos, estou sendo o terceiro Presidente Conselheiro, os anteriores foram Osmair Manesco e Dr. Marcílio Coelho
Qual motivo o levou a participar do Conselho?
É uma forma de estar acompanhando a saúde da cidade. Como sou Cirurgião Dentista, atuo na cidade e tenho vivenciado os problemas, achei que era interessante também participar do Conselho. Embora eu tenha nascido em São Paulo, onde residi até 1969, a partir dessa época passei a morar em Rio das Pedras, onde os meus avôs e meus pais residiram. Entrei na Faculdade de Odontologia de Piracicaba (UNICAMP) e me graduei em 1972.
O cuidado na condução do Conselho de Saúde é muito importante para a própria administração do Município?
Sem duvida. É necessária a colaboração de todos os membros do conselho, a iniciar pela presença em todas as reuniões. A ausência do conselheiro á reuniões pode acarretar em sua exclusão do mesmo, conforme dita o regimento.
Quais algumas das metas que o Conselho busca atualmente?
Aprimorar o atendimento, aumentar o número de especialidades, proporcionar á população um atendimento mais amplo com uma cobertura maior.
O senhor pode citar alguns dos projetos e programas da esfera federal que contemplam o Município de Rio das Pedras?
Em Reunião Plenária Extraordinária realizada no dia 14 de setembro de 2011, foi aprovado pelo Conselho Municipal de Saúde de Rio das Pedras as Cartas Consultas protocoladas na FUNASA (Fundação Nacional de Saúde) sobre os recursos provenientes do Programa de Aceleração do Crescimento PAC 2 num total de 9.000.000,00 (Nove milhões de reais) para serem investidos no sistema de Abastecimento de Água de Rio das Pedras. Este projeto refere-se ao Sistema Armazenagem de água tratada no município e no Sistema de Esgotamento Sanitário.
Estes recursos sem a aprovação unânime do Conselho Municipal de Saúde não são liberados, prejudicando o Município.

sexta-feira, setembro 30, 2011

VOVÔS VOADORES - HELENA MENDES FERNANDES E JOSÉ FERNANDES MERLO

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado de setembro de 2011
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/

ENTREVISTADOS: HELENA MENDES FERNANDES E JOSÉ FERNANDES MERLO

Segundo o Professor Luiz Machado, Ph.D.: “Estamos equipados com estruturas cerebrais para encontrar meios de ultrapassar obstáculos e vencer desafios. Precisamos distinguir entre obstáculos-ameaça e obstáculos-desafio. Desafios são obstáculos, dificuldades que não ultrapassem os limites até onde podem estender-se as capacidades humanas. Como viver é vencer desafios, a natureza equipou-nos para isso. Se não estamos aceitando os obstáculos como desafios, não estamos realmente vivendo e não estamos sendo felizes. Em situações normais, o ser humano usa apenas uma pequena parte de seu potencial, de suas reservas cerebrais”. O casal Helena Mendes Fernandes e José Fernandes Merlo é exemplo de disposição invejável. Residem no Lar dos Velhinhos, onde são conhecidos como “Vovôs voadores”, embora possuam automóvel ambos cortam a cidade diariamente em cima de uma motocicleta, trabalham na administração de um pensionato. Não haveria nada de extraordinário se ambos não contassem com mais de setenta anos! Helena é natural de Tabapuã, próximo a Catanduva, onde nasceu em 1 de novembro de 1932, filha de Raul Mendes e Clara dos Anjos de Souza Lobato, José nasceu em 17 de dezembro de 1933, em Catanduva, filho de Guilherme Fernandes Pastor e Maria Pastora Merlo.

 

Sr. José até que idade o senhor permaneceu morando em Catanduva?

Eu era criança de colo quando a nossa família mudou-se para São Paulo, fomos morar no bairro Itaim-Bibi na Rua Urupês (atual Rua Jesuino Arruda). Estudei no Grupo Escolar Aristides de Castro que na época ficava na Rua Joaquim Floriano (O antigo prédio dessa escola, chamada de “Grupo Escolar do Itahim”, ainda na Rua Joaquim Floriano com a Rua Urussuí, foi inaugurado em 1925.). Éramos em 10 irmãos. Meu pai era negociante. Naquele tempo era tudo chão de terra, a condução mais fácil era o bonde que passava pelo Jardim Europa. O meu pai cortava lenha no meio do mato que havia ali no Jardim Europa, para usarmos no fogão á lenha da nossa casa. Ainda muito jovem quando fui trabalhar na garagem de ônibus da CMTC que existia no Itaim Bibi. Minhas irmãs trabalhavam na Fábrica de Chocolates Kopenhagen localizada na Rua Joaquim Floriano, ao lado havia um rinque de patinação. Em frente á Kopenhagen havia um cinema. O meu pai vendeu a nossa casa no Itaim Bibi, a área do terreno era 1.000 metros quadrados, com esses recursos ele adquiriu duas casas em São Caetano do Sul.

O Senhor permaneceu trabalhando na CMTC?

Por ser muito distante de São Caetano eu sai da empresa, meu chefe queria me transferir para a garagem do Brás. Meu pai queria montar um comércio para todos nós trabalharmos juntos, mas infelizmente ele faleceu, isso foi em 1945. Fui trabalhar na Cerâmica São Caetano, era ajudande de prensista, recolhiamos os ladrilhos que a máquina prensava. Em 1957 passei a trabalhar na DKW Vemag, onde permaneci por oito anos e meio. Lembro-me dos testes que eles faziam subindo nos morros para ver se os veículos tinham potência necessária. De lá eu fui trabalhar na Mercedes-Benz, nessa época tomei uma vacina e peguei hepatite, permaneci tres anos “de molho”! Trabalhei na Ford, na Divisão de Caminhões que ficava na Rua Henry Ford no Ipiranga. Fui funcionário da General Motors. Em 1965 entrei na Volkswagen onde me aposentei em 1983. Quando produziam algum carro para exposição, para deixar o carro no capricho, eu era convidado para trabalhar a parte de tapeçaria, estofamento e vidros. Eu trabalhava na Ala 13 da Volkswagen da Via Anchieta.

O senhor participou das famosas greves do ABC?

Eu era lulista até debaixo de água. Por causa das greves chegamos a levar cacetadas da polícia, época em que o Paulo Maluf era governador do Estado de São Paulo. Connheci Vicentinho, Jair Meneghelli e outros sindicalistas que se tornaram famosos.

Até que idade a senhora permaneceu em Tabapuã?

Fiquei na fazenda de propriedade da nossa família até os meus 31 anos. Em 1975 nos casamos e fomos morar na Vila Califórinia em São Caetano do Sul. Meus irmãos tinham se casado, só eu e um irmão estavamos solteiros. Eu trabalhava na roça, ia com o carro de boi enchia de milho, trazia até o paiol. Plantava e colhia mamona, vinha sentada em cima da carga. Tudo sózinha. Esse boi que puxava o carro era lindo, chamava-se Galante. Eu galopava a cavalo, lembro-me da Pampinha.

Após se casar a senhora foi trabalhar onde?

Fui trabalhar na Chocolate Pan. Quando fui me candidatar á vaga, passei na cabelereira, mandei cortar o cabelo no estilo franja, fiz um penteado. Já funcionária da Pan, comprei uma enceradeira na Eletroradiobraz a Chocolate Pan ficou sabendo que eu era casada. Fui mandada embora, eles só admitiam mulheres solteiras. Depressa fui trabalhar na Alpargatas, na Avenida Radial Leste. Houve um inicio de incêndio, fui até a cozinha tirei rapidamente as toalhas da mesa, molhei e abafei o fogo. Eles me colocaram para fazer curso de bombeiro, recebi o certificado com nota 10. Nessa época a Alpargatas fabricava entre outros produtos, o jeans, faziam a famosa alpargatas de sola de corda. Ao deixar a Alpargatas fui trabalhar nas Linhas Correntes, na Rua do Manifesto, no Ipiranga. O chefe chamava-se Eduardo, disse-me que não tinha serviço para mim, só tinha vaga para varredeira. Disse-lhe que aceitava, eu precisava do emprego. Antes de 90 dias de empresa passei a encarregada da seção de tubos. Funcionárias com anos de empresa não gostaram da minha promoção tão rápida. Desci o “Chico Reio”! Mostrei serviço, fiquei magrinha. Quando tinha que levar o óleo nos regadores para as meninas colocarem nas poçinhas e lubrificarem as máquinas eu era rápida. Dois anos depois, minha perna travou, não andei mais. Meu filho pequeno que fazia a comida e trazia para mim. Eu fiquei deitada. Voltei, passei pelos médicos, após cinco anos me aposentaram.

Dona Helena o que os trouxe á Piracicaba?

A nossa filha veio estudar na Esalq, em 1983 mudamos para Piracicaba, alugamos uma casa de propriedade do Ludovico Trevizan. Chegamos aqui não tinhamos o que fazer, eu coletava papelão, um carrinho de papelão dava para comprar uma caixa de óleo. Íamos a São Paulo, compravamos carros lá e trazíamos para vender em Piracicaba. Com o tempo o lucro já não compensava. Inventei de colocar um pensionato, vi umas casinhas velhas, entrei em uma divida enorme,devagarinho fui ajeitando e aluguei para estudandes. Na época a TAM tinha muitos pilotos, instrutores, em Piracicaba e eles passaram a se hospedarem lá. Foi o que me ajudou muito.

Quando foi a decisão de virem morar no Lar dos Velhinhos?

Era meu sonho! Diz Dona Helena. Dia de São Pedro vai fazer 13 anos que vim falar com a Rose, aqui no Lar dos Velhinhos. Nosso chalé é amplo e confortável, no quintal plantei muitas frutas.

Como surgiu a moto na vida do casal ?

Dona Helena responde: “Meu filho anda de motocicleta desde pequeno, meu neto, minha filha ia para a faculdade de moto”. Seu José completa: “A primeira vez que andei foi em Piracicicaba, eu já tinha uns quarenta e poucos anos. Decidi tirar a carteira de habilitação de motociclista.” Andamos todos os dias de moto, em tempo de matrícula da Esalq já chegamos a ir de moto cinco vezes ao dia até o pensionato.

A senhora ganhou uma medalha recentemente?

Foi nos Jogos Abertos das Ollimpíadas da Terceira Idade, ganhei a medalha de ouro de Miss Simpatia e Luxo. Aprendi sozinha a trabalhar com bijouterias, faço colares, lenços, pego caixa de fósforos, encho de lantejoulas fica muito bonito para festas juninas

Seu José o senhor navega na internet?

Quando conheci um computador, gostei. Comprei monitor, depois teclado, CPU montei um equipamento. Passei a digitar. Resolvi entrar na internet. Gosto muito disso ai. Se eu tivesse uns quarenta anos iria fazer de tudo para me aprofundar no campo de informática, já mexo com a internet há uns tres anos, eu sou muito persistente. Coloquei webcam para falar com a minha filha no exterior. Hoje já tenho também um notebook.

O senhor acha que independente da faixa etária a pessoa tem que estar atualizada?

Eu acho, com 77 anos sou atualizado, moderno. Ando de moto entro na internet, onde inclusive pesquiso preços de viagens.

Nas Festas Juninas do Lar dos Velhinhos a senhora é a noiva?

Todos os anos me escolhem para noiva. Eu e meu marido que puxamos a quadrilha. Eu mesma que costuro as roupas minhas e do meu marido.

Qual é a receita que vocês dão para chegar nessa idade com essa disposição?

Dona Helena diz: “ A receita é trabalho, trabalho, trabalho!” Seu José completa: “A pessoa tem que se atualizar, velho parado é velho atrofiado. Tem pessoa com menos idade do que a minha e que está toda bombardeada, porque não pratica nenhuma atividade”.

No Natal a senhora usou uma fantasia especial?

Mostrando várias fotografias ela diz: “Neste último Natal me vesti de àrvore de natal, a roupa ia até os pés cheia de contas, entreguei ás velhinhas cadeirantes quarenta e poucos colares que eu mesma fiz, a minha roupa pesava mais de cinco quilos, para o José fiz a roupa de Papai Noel, compramos sabonetes e ele levando o tradicional saco de presentes distribuiu aos velhinhos, foi o melhor natal da minha vida. ”. Qualquer evento que acontece no Lar o pessoal já nos inclui. Um dos hobby do José é a fotografia. Somos conhecidos como “Vovôs Voadores” ou “Casal 20”. Quando há blitz policial nós nem somos parados. Trabalhos muito, não dá tempo de ficar olhando o que passou. Eu já estou fazendo as roupas que vamos usar no próximo ano, utilizo muito babados de cortinas.

Dona Helena, vocês gostam de dançar?

Muito! Há uns cinco ou seis anos vencemos um Concurso de Dança por Resistência, quem ficasse mais tempo dançando ganharia o primeiro lugar. Foi uma promoção do Shopping Piracicaba, nós dois dançamos mais de duas horas. O prêmio foi um fim de semana no Hotel Fazenda Fonte Colina Verde, localizado na Estância Turística de São Pedro, o taxi nos levou na sexta feira e foi nos buscar no domingo, fomos tratados como principes.

A senhora acha que a falta de participação nas atividades coletivas piora a vida da pessoa?

A pessoa vai ficando velha! A pessoa se entrega, dorme o dia todo. Aos sábados temos o Clube do Vinil, depois tem o bingo. As quinta feiras temos um bailaço. Á noite eu fico fazendo minhas bijouterias, colares, e o meu marido fica na internet. Vamos dormir lá pela uma hora da manhã. No dia seguinte lavantamos as 8 ou 9 horas.
    
                                      

terça-feira, setembro 20, 2011

VANESSA DE GODOI CHIODI – GUARDA MIRIM

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 17 de setembro de 2011
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/

ENTREVISTADA: VANESSA DE GODOI CHIODI – GUARDA MIRIM
As descobertas tecnológicas dos últimos 50 anos revolucionaram a humanidade. Tudo ocorre cada vez mais rápido. Se para o indivíduo adulto administrar seu comportamento diante de tantas inovações é difícil, para o jovem em formação é algo mais complexo. Isso é um fenômeno mundial. A força da mídia conduz como carneiros milhões de consumidores ávidos por símbolos de sucesso e bem estar, os resultados dessa busca desenfreada produz consumidores vorazes em uma sociedade onde o ter á mais valorizado do que o ser. Milhares de jovens vivem em situação de risco, envolve obstáculos individuais ou ambientais que aumentariam a vulnerabilidade dos jovens para resultados negativos no seu desenvolvimento. A família vem mudando muito nos últimos tempos, família hoje se resume em pessoas que dividem o mesmo teto tendo laços parentescos ou de afinidades. A família constitui o primeiro e o mais importante grupo social de toda a pessoa, bem como o seu quadro de referência. Piracicaba tem um grande privilégio, do qual muito se orgulha, é a Associação Guarda Mirim Municipal de Piracicaba. Fundada em 21 de abril de 1966 pelo prefeito Comendador Luciano Guidotti e representantes da Sociedade Civil entre eles Rotary Club, Lions, Maçonaria e Guarda Civil, conforme projeto de Lei 1.161 de 1962, apresentado pelo Vereador Prof. Rubens Leite do Canto Braga. O Sub Inspetor da Guarda Civil Elias Domingos da Silva, o “Sub Elias” teve importante participação na implantação inicial da Guarda Mirim. “Não obstante tenha entrado em atividade há somente pouco mais de três meses, a Guarda Mirim, criada pela lei 1262-64 e alterada pela lei 1404-66, já se tornou uma corporação admirada e respeitada pela prestação de excelente serviço á coletividade, principalmente no setor de auxiliar da fiscalização de trânsito.” (Jornal de Piracicaba, 31 de julho de 1966). Conforme entrevista concedida ao jornalista e radialista João Umberto Nassif pelo Capitão da Policia Militar do Estado de São Paulo Frederico Ciappina Neto, que foi responsável pela Guarda Mirim desde a sua fundação até 2 de abril de 1984 ele diz: “Era formada por 30 meninos, mas um desistiu. Eram meninos terríveis! A metade deles era muito difícil. O inicio foi na cozinha da Guarda Civil. Não tinha nenhuma cadeira para sentar! Na cozinha era o comando. Eu consegui junto a duas empresas uma mesinha e um armário. Uma cadeira emprestada da Guarda Civil.Uma máquina de escrever emprestada. No fundo tinha um barracão de uma água só, aberto por sinal, esse prédio ficava na Rua Moraes Barros, 527. Enquanto a Guarda Civil ficou ali nós ficamos juntos. Dando instrução e preparando. Precariamente, porque não existia nada. Devagar fomos conscientizando a sociedade, a prefeitura, a Guarda Mirim nasceu municipal, a prefeitura é que mantinha, dava 20% do salário mínimo para o menino ficar 4 horas no transito.Ele tinha que estudar em um período. Se não estudasse não tinha direito ao ingresso”.Ele prossegue: “A função da Guarda Mirim quando foi criada era de ser auxiliar de transito. Os meninos trabalhavam cortando o transito da rua, faziam isso na Rua Governador Pedro de Toledo e outras principais ruas. Criamos até uma guarita, o menino manipulava aquilo, era um orgulho! Os meninos eram elegantes, simpáticos, o povo adorava a Guarda Mirim!” Ciappina continua : “A idade mínima era de 12 anos.É fantástica a responsabilidade da criança. A criança tem uma cabeça bonita, boa, limpa. Com 12 anos a criança esta começando a ser púbere. Não sabe nada ainda. Mas tem uma inteligência fantástica. Assimila rapidamente o que é ministrado.Se ele ficar solto irá adquirir costumes que a sociedade impõe, o meio impõe, e se ele ficar no lugar adequado ele irá receber a educação que o meio oferece. Essa lei que proíbe o trabalho ao menor de 16 anos é boa. Porém esdrúxula! A lei é boa desde que haja uma separação do ponto de vista. Separação de situações. Você não vai comparar o menino que trabalha em uma carvoaria aos 12 anos de idade com um guardinha que sentia a felicidade de participar da Guarda Mirim! Ele tinha prazer, era uma loucura, temos testemunhos fantásticos, um testemunho de João Batista Alves que foi cientista econômico, proprietário de duas casas comerciais em Piracicaba, esse menino fala o que ele viveu. O Vanderlei Jangrossi que foi vereador em São Paulo, pastor, esse menino diz: - A época mais feliz da minha vida foi a que eu passei na Guarda Mirim! Ele entrou com 12 anos de idade. Vários médicos foram guardas mirins. Eram garotos problemas! O meio iria destruí-los. Em 1966, na primeira turma, tivemos o Wilson Roberto de Barros falecido recentemente aos 49 anos de idade. Ele foi um médico psiquiatra muito famoso em Piracicaba, clinicava em vários hospitais, tem uma família bonita, ele morava em Rio das Pedras, os seus três irmãos passaram pela Guarda Mirim, um viajou o mundo inteiro, ele aprendeu a trabalhar em gráfica junto comigo, ele foi para a Esalq, acabou administrando uma tipografia, foi trabalhar em uma grande multinacional, acabou conhecendo o mundo viajando por todos os paises a serviço dessa empresa. O terceiro irmão foi para o Correio. Já deve estar aposentando. A Guarda Mirim tinha um coral fantástico. Temos aqui um panfleto do festival Internacional de Coros, realizado em outubro de 1977, participaram 47 corais de toda a América do Sul, a Guarda Mirim foi classificada entre os 20 melhores corais que se apresentaram!”.A Guarda Mirim acaba de inaugurar um prédio próprio, na Rua Gonçalves Dias, 721. São dois andares de instalações físicas com recursos adequados. A Assistente de Relações Públicas Vanessa de Godoi Chiodi traça um perfil da instituição nos dias atuais.
Qual é o nome oficial da Guarda Mirim?
Associação Guarda Mirim Municipal de Piracicaba.
Qual é a idade mínima para ingressar na Guarda Mirim?
Temos dois projetos, o Centro de Educação Profissional, que é o projeto de aprendizagem na área administrativa e o Projeto Banda Escola, é um projeto de banda onde a criança entra com doze a treze anos, os meninos vêm aqui, tem aulas de palheta, metais, temos dois maestros que trabalham conosco, um professor de percussão, eles tem aulas práticas e teóricas na área musical. Nesse projeto temos aulas de cidadania, valorização pessoal. Para ser aprendiz o aluno deve ter de 15 para 16 anos, estamos selecionando os nascidos em 1996. Ele irá ficar conosco no Centro de Educação Profissional durante dois anos, as aulas são aqui na Guarda Mirim e faz a pratica de aprendizagem em 60 empresas conveniadas todos na área administrativa, o curso que oferecemos é de Assistente Administrativo. Hoje temos aproximadamente 400 alunos, sendo metade meninos e metade meninas. Integram a banda cerca de 70 alunos. De acordo com a Lei 10097 eles têm que fazer a prática de aprendizagem que é o trabalho nas empresas e o curso teórico. Temos aprendizes que trabalham de quatro a seis horas, eles passam uma hora conosco e depois vão trabalhar.
Quais são os locais de origem dos componentes da Guarda Mirim?
O nosso público alvo do Projeto Profissionalizante está na faixa dos 15 a 16 anos, com renda familiar de zero a quatro salários mínimos, trabalhamos com adolescentes em vulnerabilidade social. Ele tem que estar freqüentando a escola regular. São requisitos básicos para seu ingresso na Guarda Mirim. No processo de matricula em nossa instituição eles passam por uma entrevista com a nossa assistente social. Temos que dar oportunidade aqueles que mais necessitam. Eles vêm dos mais diversos bairros, inclusive das cidades de Rio das Pedras, Saltinho.
A locomoção do Guarda Mirim obedece a alguma regra especial?
Estando uniformizado eles não pagam passagem de ônibus, o ingresso é feito sem passar pela catraca, no caso entram pela porta traseira.
Quais são as mantenedoras da Guarda Mirim?
Ela se mantém com esses convênios que admitem os aprendizes. Os Guardas Mirins são contratados pelas empresas através da nossa entidade.
Como é a procura de candidatos á Guarda Mirim?
No ano passado disponibilizamos 210 vagas, houve uma procura por parte de 500 adolescentes. Hoje estamos inaugurando uma sede nova com quatro salas, sendo três salas de aulas e uma de informática. A Guarda Mirim é uma Organização Não Governamental, ONG, seu presidente é José Sérgio De Favari.
Você percebe que quando o aluno ingressa tem um comportamento, e ao longo do tempo vai mudando seu comportamento?
Isso é muito perceptível. No inicio, por três meses, damos um treinamento de noções básicas, ele permanece na nossa sede. Aprende desde a atender a um telefone, postura, até noções de higiene pessoal. A Guarda Mirim é que oferece o uniforme, calça azul marinho, camisa azul clara, jaqueta azul marinho e sapatos. Eles só podem trabalhar em ambiente salubre.
Você percebe que os Guardas Mirins têm um comportamento diferenciado dos jovens da mesma idade que não freqüentam a Guarda?
Eles são mais responsáveis, esse processo de trabalhar e estudar, acaba provocando uma responsabilidade mais cedo. Nós temos o Projeto Iandê. (Segundo Cleuza Pio e Fernanda Aguillera a palavra 'Iandê' vem da língua Tupi Guarani e significa 'você'. A escolha do nome para o projeto desenvolvido na Associação Guarda Mirim Municipal de Piracicaba, se deu a partir do próprio significado e da constatação de que não era dada nenhuma orientação em termos de mercado de trabalho e recolocação profissional para o adolescente desligado da entidade. O adolescente em meio ao processo de saída em que deixa amigos, uniformes, cursos profissionalizantes, se vê de repente, sem rumo. Terrivelmente se sente só, desamparado e sem saber qual caminho seguir. Assim, a intenção do Projeto Iandê é orientar esse (essa) adolescente a trilhar um novo caminho agora com as próprias pernas. Porém, esta orientação educacional é a curto-prazo e tem o intuito de preparar o adolescente para que este consiga um trabalho fora da entidade).
Quando é mencionado que esse adolescente está em circunstância de risco, se ele não tivesse sido acolhido pela Guarda Mirim possivelmente estaria correndo um risco maior?
Aqui eles seguem o melhor caminho, que é o da educação, da assistência social, da valorização humana, trabalhamos nesse sentido.
Qual é a postura dos pais?
Os pais incentivam o ingresso de seus filhos.
Como é a apresentação da Banda da Guarda Mirim?
É sempre emocionante, temos um concerto todos os anos, “Viagem Através da Musica” acontece no mês de julho, a apresentação é no Teatro Municipal, com a presença dos pais, convidados. A Banda é o cartão postal da Guarda Mirim. Músicos famosos iniciaram sua carreira na banda, alguns seguem carreira fora do país. Nesse último concerto tivemos a participação de muitos músicos profissionais que foram guardas mirins. Marco Abreu que é um músico consagrado dá aulas aqui. Isso é um incentivo para os meninos.
Para eles o que significa a banda?
Eles são apaixonados pela musica! Alguns continuam na Banda e fazem o Conservatório de Tatuí.
Eles recebem alimentação?
Existe o restaurante da Guarda Mirim, fica na Rua Dom Pedro II, eles almoçam lá diariamente. Há uma médica para atendê-los todos os dias. Assim como psicóloga, assistente social, pedagoga. Temos também um projeto com os pais, achamos importante fortalecer esse vinculo familiar. Procuramos fazer com que os pais participem mais da vida dos seus filhos. Nesse sentido temos dois projetos: O Grupo de Diálogo Para Pais onde discutimos temas sobre o relacionamento familiar. Procuramos trazer um especialista sobre o tema que eles trazem.
Com as mudanças ocorridas na sociedade o adolescente está mais exposto ao assédio da mídia em todos os sentidos, como isso é trabalhado aqui?
Por isso temos o atendimento social e psicológico. A maioria colabora com a renda familiar. Nas aulas com a psicóloga há um grupo de diálogos, incluindo mídia, estimula os meninos a pensarem, a questão da cidadania é um traço muito forte aqui dentro. Aqui eles se sentem incluídos.
A paternidade precoce tem ocorrido com maior freqüência, isso acontece aqui?
Aqui não temos nenhum Guarda Mirim que seja pai! Trabalhamos temas como planejamento familiar, sexualidade na adolescência, saúde do adolescente. Eles têm atividade o dia todo, trabalham, estudam, fazem atividades aos sábados. A Guarda Mirim é uma entidade que muda a vida do adolescente. Mais de 70% ao sair da Guarda Mirim já estão empregados. Quem já foi Guarda Mirim acaba criando uma identidade.
Para quem trabalha com eles qual é o sentimento?
É ai que se vê como é gratificante trabalhar na área de assistência social. Os depoimentos de adultos muito bem sucedidos que foram da Guarda Mirim é altamente gratificante.
Há outro projeto desenvolvido com os pais?
Coordeno um projeto que é de culinária, chama-se “Projeto Sabor”, onde dividimos em módulos durante o ano, trabalhamos com as mães, pai ainda não apareceu nenhum, o curso é das 17:00 ás 20:00 horas, o primeiro módulo foi de panificação, padaria artesanal, outro foi de culinária trivial, e agora estamos fazendo o curso de salgadeiro e especial de Natal. São cursos de três meses, incentivamos as mães a comercializarem os produtos que elas aprendem a fazer, durante o curso trabalhamos também a questão do vinculo familiar, conversamos sempre sobre isso. A maioria das mães trabalha fora de casa.
Há muitas crianças com pai ausente?
Na própria sociedade é reduzido o numero de família modelo: papai, mamãe e filhinho. Hoje a família estruturada é composta por uma mãe que batalha, que luta para criar seus filhos, uma avó dedicada, ou até mesmo filhos criados só pelo pai. O importante é os pais se fazerem presentes na vida dos filhos, acompanharem, incentivarem.
O que afeta mais o adolescente?
É a falta de participação dos pais na vida dos filhos, muitas vezes gerada pela necessidade dos pais trabalharem e se ausentarem por longos períodos.
A Guarda Mirim tem um grupo de teatro?
É o Grupo Ronaumrose formado por Guardas Mirins, Ex-Guardas Mirins e aberto á comunidade. Quem dá as aulas é a Rosangela Pereira e a Magna Eliez do Grupo Guarantã, a Rosangela também é Ex-Guarda Mirim. Atualmente eles estão apresentando a peça “Acompanhe a Vida Escolar do Seu Filho”. É uma peça dinâmica e educativa, conta com uns 12 atores. Quem tiver interesse, basta encaminhar um ofício á Guarda Mirim, não necessita de palco especial. Tem a duração de 40 minutos.




domingo, agosto 07, 2011

LUIS CARLOS JUSTI

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS

JOÃO UMBERTO NASSIF

Jornalista e Radialista

joaonassif@gmail.com

Sábado 7 de agosto de 2011

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana

As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

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ENTREVISTADO: LUIS CARLOS JUSTI

Afirmar que música erudita é uma manifestação cultural da elite poderia soar de forma estranha na antiga U.R.S.S. fonte de inspiração para regimes socialistas implantados em muitos países. Antes de esfacelar-se, a poderosa União Soviética tinha até como peça de propaganda músicos exímios, orquestras de altíssimo nível, orgulho da população. Hoje há uma inércia contemplativa com a qual o Brasil convive diante de uma mídia voraz, que por incompetência ou absoluta visão distorcida de valores básicos educa grande massa da população conforme o tilintar da moeda fácil em seus caixas. O compromisso dos veículos de comunicação é de educar, a medida que esse principio básico é relevado, compromete não só a si mesmo como também o futuro de uma nação. Os exemplos são claros, as grandes potências investem muito na formação cultural do seu povo, em um regime democrático não se pode interferir na preferência cultural do individuo, mas é obrigação do Estado e dos veículos de comunicação arcar com suas responsabilidades. Um exemplo de iniciativa bem sucedida é o Quinteto Villa-Lobos conjunto musical brasileiro de sopros, fundado em 1962, com a proposta de divulgar a música de câmara brasileira. Atualmente é formado por Antonio Carrasqueira (flauta), Luis Carlos Justi (oboé), Paulo Sérgio Santos (clarineta), Philip Doyle (trompa) e Aloysio Fagerlande (fagote). São profissionais com profundos conhecimentos de música, que encantam as mais exigentes platéias dos inúmeros paises em que se apresentam, assim como executam concertos e realizam oficinas em comunidades carentes, com público de todas as faixas etárias. Um exemplo de que a musica erudita não é um privilégio de uma casta, e nem é necessário ter o ranço dos pseudo inteletuais para vivenciar a beleza da musica erudita. Luis Carlos Justi nasceu em.Piracicaba, a 26 de janeiro de 1955, é um dos cinco filhos de João Justi e Olga Rovina Justi. Seu pai era metalúrgico, trabalhou por muitos anos na MAUSA onde aposentou-se, sua mãe até se casar trabalhou na Fábrica de Tecidos Boyes. Cursou o Sud Mennucci, onde sua primeira professora foi Da. Terezinha Kraide. Da. Cléia Manfrinato foi sua professora de inglês, e mais tarde tornou-se sua sogra.

Luis Carlos você ingressou inicialmente em qual curso superior?

Comecei a fazer agronomia na Esalq, onde permaneci por dois anos e meio, até descobrir que o meu curso iria ser concluido em nove ou dez anos. Eu não me aprovava nas matérias, só estudava música. Ia para as aulas de cálculo que eram ministradas no prédio da engenharia, que tem um lago na frente, contemplando o maravilhoso lago eu ficava após o almoço fazendo exercícios de harmonia musical, para mais tarde entregar ao Maestro Ernst Mahle. Acabei por desistir de cursar agronomia.

Quando foi o seu primeiro contato com a Escola de Musica de Piracicaba?

Quem me levou para a escola de música foi meu irmão mais velho, o Paulo, que havia estudado como aluno interno no Seminário Diocesano, situado na antiga estrada para Botucatu, em Piracicaba, lá ele aprendeu a tocar piano. O seminário foi extinto, meu irmão foi estudar biologia em Rio Claro. Na época um dos jornais publicou que a escola de música estava oferecendo bolsas de estudo para trompete, trombone, contrabaixo, oboé, fagote. Me interessei em estudar trompete, eu não sabia o quera fagote, oboé. O Mahle então disse-me: “- Vamos experimentar o oboé, o trompete muitas vezes o aluno me abandona, vai tocar em carnaval, eu fico sem o musico para tocar na orquestra”. O Mahle foi o meu primeiro professor, me deu uma palheta, ensinou-me o básico, e eu comecei a tocar oboé. Me apaixonei! N aépoca eu tinha 15 anos. Flauta doce fui aprender posteriormente.

Quantos instrumentos você toca?

Na verdade só toco oboé. Estudei um pouco de piano com a Da. Cidinha Mahle.

Qual foi a reação do seu pai ao vê-lo tocando oboé?

Acho que meu pai ficou feliz ao ver que eu tinha descoberto alguma coisa que eu gostava apaixonadamente. A única reação negativa que ele teve nessa história da musica e da vida “normal” foi quando eu decidi sair da Esalq. Na sua visão ele não conseguia entender como uma pessoa poderia deixar uma escola publica de agronomia, considerada como futuro certo dos piracicabanos, para ir tocar oboé! Na época ele ficou muito bravo.

Você trabalhava na ocasião?

Até então eu só estudava, mas como meu pai não considerava a música como um estudo propriamente, ele disse: “-Aqui em casa quem não estuda trabalha!”. Ai eu tive que trabalhar. Felizmente o Mahle compreendendo essa situação disse-me: “-Então venha trabalhar na Escola de Musica!”. Isso foi decisivo para que eu continuasse estudando musica. Fui organizar a biblioteca da escola, aprendi a datilografar, posso afirmar que datilografo super rápido e super bem, herança daquela época. Aprendi a tocar flauta doce, passei a dar aulas de flauta doce. E auxiliava o Mahle em algumas coisas que ele necessitava, o que foi fundamental para o meu desenvolvimento. Uma série de atividades que aparentemente na época não pareciam ter muita importância mais tarde mostraram terem sidi esssenciais. A convivência com o Mahle mostrou-me que para mim ele é uma referencia que extrapola a musica, é uma refencia de vida. Conhece-se muito pouco do trabalho realizado pelo Mahle. As vezes ele faz um arranjo simples, para as crianças tocarem, a principio quem ouve comenta: “-Ele fez uma arranjo que usa corda solta, e as crianças estão juntas”. O pensamento do Mahle vai muito além daquela realização estritamente musical, ele esta colocando juntas crianças que tem que conviver, tem que ouvir. “-Agora você fala mais alto!, é o seu instrumento que está tocando” ou então “-Agora você se retrai tem que ouvir, porque é outro instrumento que está tocando”. É uma educação implicita nesse trabalho, é uma coisa absolutamente maravilhosa, até hoje não sei se alguém olhou para esse lado da importancia pedagogica, social, formadora de carater, de relacionamento, de educação global.

Se O Maestro Mahle estivesse realizando seu trabalho em algum centro maior, como São Paulo, Rio de Janeiro ou em alguma cidade do exterior, a visão a respeito seria outra?

Houve um período em que cheguei a perguntar ao Mahle e á Cidinha porque cargas d´agua vocês vieram á Piracicaba? Por que não foram para um centro maior? Em São com certeza haveriam mais pessoas que compreenderiam esse trabalho, inclusive a importancia do Mahle como compositor. Em Piracicaba o Mahle sempre foi criticado por determinadas pessoas, que dizem que ele faz composições de uma maneira muito hermética, que fugiam da compreensão das pessoas. Na verdade, quando você se aprofunda na música vê que o Mahle é um compositor tradicional no aspecto formal, harmonico da musica. O Mahle batia em uma muralha de incompreensão, derivada da ignorancia do mundo musical, que certamente deve ter provocado alguma diferença para ele. Pelo fato de ele ser uma pessoa muito consciente do que ele pretendia realizar, e por considerar que o destino dele estava ligado no trabaho na Escola de Musica de Piracicaba, na educação que ele de fato prpoporcionou, nas obras que ele realizou, ele não se abalou. Talvez se ele estivesse tido mais recnhecimento e maior incentivo do que teve em Piracicaba as coisas fossem diferentes. Mas foi aqui que ele fez isso, e graças a Deus por isso eu toco, e muitos outros assim o fazem.

No fundo o Mahle tomou a atitude correta?

Acredito quie sim. A Escola de Musica sempre foi uma escola privada, mas eu nunca paguei um centavo para estudar lá. Apesar de ser uma escola pequena comparada á outras, o numero de bons músicos, e músicos relevantes que sairam daqui e estão pelo Brasil e pelo mundo afora, é um número muito expressivo. Onde está o segredo de um trabalho de uma pessoa, de uma escola privada, com um numero menor de alunos, mas que forma proporcionalmente muito mais gente e muito boa, a ponto de estarem ai afora, em Campinas, em São Paulo, no Rio de Janeiro, em outros países.ocupando cargos importantes. Isso é fruto do trabalho do Mahle, que na minha opininão é absolutamente indossiável do trabalho da Cidinha. O Mahle não existe sem a Cidinha, e vice-versa. O Mahle não seria e não teria feito tudo que fez sem a Cidinha. Ela é a viabilização do potencial humano, artistico, pedagogico, do Mahle, sendo ela própria uma pedagoga. Ha uma incompreensão da cidade com relação ao casal, a Cidinha sempre carregou o fardo da chata, ela carrega até hoje uma fama injusta da pessoa que impedia o Mahle de fazer certas coisas, e é exatamente o contrário, a Cidinha viabilizou o Mahle. Ela é uma pessoa determinada, que sabe onde pretende chegar e tira as pedras do caminho, amparadas pelo fato de que ela sim sempre teve consciencia do valor e da importancia do trabalho do Mahle. Tudo que foi realizado é fruto do trabalho dos dois, na verdade eles reunem duas pessoas em uma única de grandiosidade maior. É possível que com o passar do tempo as pessoas venham a entender.

Por quanto tempo você permaneceu na Escola de Musica de Piracicaba?

Sai daqui em 1976 para a Alemanha, de onde retornei em 1979. Em Piracicaba tinha a Dona Brigitte Folz que foi minha professora de alemão.

Você fala quantos idiomas?

Falo italiano, espanhol, inglês, alemão e francês por causa de Dona Levica Meirelles, esposa do Dr. Meirelles., Ela era uma pesoa que merece um destaque em Piracicaba, ela sabia francês muito mais do que eu sei portugues, ela era genial, era uma pessoa culta, bonisssima, não me lembro de nunca ter pago por uma aula dela. Li todos os grandes classicos francêses. Sei muito frances por conta dela, é a lingua que falo melhor. Dona Levica ocupa um lugar muito especial para mim.

Como você foi á Alemanha?

Pedi uma bolsa ao governo alemão, na segunda vez em que pedi, consegui com o DAAD. Isso foi em 1976. O governo brasileiro só atrapalhou. Fui para Hanover. Na Alemanha, por um período fiz regência, tinha a intenção de me tornar maestro. Posteriormente o oboé começou a me abosrver, e eu queria tocar muito bem. No seu intrumento você se realiza, você se expressa musicalmente, a regencia não é uma coisa direta,voce tem que levar as pessoas a fazerem a musica que você pensa. Isso para mim é um bloqueio, eu teria que deixar o oboé de lado. Com o oboé eu tenho muito prazer de me expressar. A regencia envolve outras qualidades, relações pessoais, muita psicologia, muita coisa que os regentes costumam não ter.

Quando você voltou da Alemanha?

Após três anos e meio, meu professor me aconselhou a permanecer ele acahava que eu tinha grandes possibilidades de integrar qualquer orquestra alemã. Um fato curioso, foi no inicio da constituição da Comunidade Européia, fizeram uma orquestra com convidados de vários paises, e tinha uma violinista, uma menina muito bonita, uma alemã, que eu estava de olho, e que eu sabia que tinha sido chamada para tocar violino na orquestra. Fui lá e implorei ao meu professor que me colocasse nessa orquestra. Ele me disse: “-Como vou colocar um brasileiro em uma orquestra da Comunidade Eurpéia?” Respondi: “-Me coloca como português!” Ele me colocou na orquestra, viajamos até Genebra, e outros lugares. Foi uma ótima experiencia musical. Com a menina não tive nenhum progresso. Posso dizer que toquei na orquestra da Comunidade Européia.

Voltando da Alemanha você radicou-se onde?

Vim á Piracicaba, achei até uma forma de mostrar a minha gratidão ao Mahle, quando tinha ido a Alemanha, eu não tinha nem instrumento, o Mahle foi quem me emprestou.

Com as economias que fiz com a bolsa dada pelo governoa alemão consegui comprar meu instrumento e pude devolver o qua havia emprestado. Em1980 permaneci em Piracicaba, e passei a ser professor de oboé na Unicamp, até 1985 fiz esse trabalho. Acontecia em Blumenau uns festivais de musica quem organizava era o Norton Morozowicz, Jose Botelho. Fazer musica de câmera com eles foi fantástico. Fiquei fascinado com aquilo. Eles me disseram que havia uma vaga na Orquestra Sinfônica Brasileira, no Rio de Janeiro, quem tocava com eles era o oboísta Paolo Nardi, que tinha voltado á Itália. Conversei com a minha esposa Lilia Manfrinato Justi, e decidimos ir ao Rio de Janeiro.

Atualmente quais atividades musicais você exerce?

Há seis anos sai de todas as orquestras das quais participava, sou professor universitário há muito tempo na UNIRIO e toco no Quinteto Villa Lobos, uma entidade que fará no próximo ano 50 anos de existência. Eu estou no Quinteto há 26 anos.


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