domingo, junho 23, 2013

HERBERT BARBOSA DE MATTOS

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 22 de junho de 2013
Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
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ENTREVISTADO:HERBERT BARBOSA DE MATTOS

Herbert Barbosa de Mattos é filho de José Alves de Mattos e Lázara Pires Barbosa, nasceu a 8 de dezembro de 1940. Sua mãe era professora primária e seu pai dentista formado pela Faculdade de Odontologia de Piracicaba então denominada “Washington Luiz”. Após exercer a profissão como dentista, seu pai decidiu optar em ser proprietário de farmácia exercendo a atividade de farmacêutico. A sua primeira farmácia foi em Artemis, naquela época chamada de Porto João Alfredo, isso no tempo em que a malária afetava a saúde pública, década de 30. Inclusive ele foi vítima da doença. Um dos seus conhecidos era o pai do atual vice-prefeito de Piracicaba, João Chaddad. Em agosto de 1941 José Alves de Mattos transferiu-se montando uma farmácia ma Rua Benjamin Constant, ficava entre a Avenida do Café e a Avenida Dr. João Conceição.


Como se chamava a farmácia?


Era a Farmácia Mattos, a primeira farmácia da Paulista foi a dele. Até duas casas acima, antes de chegar na Avenida do Café do lado esquerdo não havia nada. Era o muro do pasto do Pedro Ferrari. Quando a minha família mudou-se eu tinha oito meses de idade.


Ali em determinada época foi o depósito de entulho da cidade?


Foi em um período anterior, nessa época as crianças iam lá garimpar ferro, osso, vidro, para vender para o ferro-velho situado na Avenida Independência entre a Rua Benjamin Constant e o Córrego Itapeva. Era o ferro velho do Rodrigues, descendo, do lado esquerdo da Rua Benjamin Constant.


Na Avenida São Paulo também havia pouca coisa?


Tinha o Pompermayer que morava em frente ao campo do Paulista, era um brejo, virando a Rua Benjamin Constant e entrando na atual Avenida São Paulo não havia ninguém, era estrada ali. Do lado esquerdo não existia nada, do lado direito havia a Fazenda do Ditoca, bem mais acima.


Seu pai montou a farmácia no tempo em que o farmacêutico manipulava os remédios?


Quase tudo era feito na própria farmácia. A maioria era através de receituário formulado pelos médicos da época: Dr. Correa, Dr. Samuel. A letra mais difícil de compreender era a do Dr. Samuel, lembro-me de que eu tinha até a pouco tempo um óculos que precisávamos usar para conseguir ler a receita. O meu pai estava acostumado, vinha de farmácia, tinha feito farmacologia.


Era o tempo em que na farmácia havia inúmeros frascos, cada um com uma finalidade, você conserva algum desses vidros?


Não tenho quase nada, conservo daquele tempo um aparelho em que naquela época fazíamos cápsula antigripal. Era preparada a aspirina, apertada bem no aparelho, colocava em uma cápsula. Havia um vidro com uma telinha, onde havia água, a outra parte da cápsula passava na água, colocava em cima, e fechava a cápsula. Fiz muito disso ai. Assim como pomadas, xaropes.


Havia um consumo muito grande de xarope?


Tinha! A nossa era a única farmácia que havia na Paulista, na Rua do Rosário não tinha nenhuma. Meu tio, Nelson Alves de Mattos, montou a Farmácia São Judas Tadeu bem depois. Ele foi sócio do meu pai em Artemis, meu tio começou a exercer a profissão em Gália, com o cunhado dele. Como só havia a farmácia do meu pai, todo o pessoal da zona rural vinha ali. Lembro-me de uma característica do Dr. Correa, ele ia atender o paciente de taxi, não utilizava seu automóvel. A corrida do taxi era paga pelo cliente. Muitas vezes a noite, chovendo, ele vinha com o marido da paciente ou alguém da família da pessoa enferma, parava na farmácia, desciam, para fazer a receita. As vezes meu pai dizia: “- Dr. não tem esse produto, posso substituir por este outro?”. O médico então dizia: “- Pode Mattos, pode sim!”. Ele fazia a receita enquanto a pessoa descia, para levar o Dr. Correa até a sua casa, meu pai preparava, deixava tudo pronto para a pessoa passar e levar. No sítio, na parte sul do município, todo mundo conhecia meu pai.


Na época ali era tudo chão de terra?


A Rua Benjamin Constant era calçada com pedregulho.

                                          José Alves de Mattos e Lázara Pires Barbosa

Em que escola a sua mãe lecionava?


No Grupo Escolar Moraes Barros, para ir lecionar tomava o bonde na Avenida Dr. Paulo de Moraes, ia até o centro e dali ia até o grupo. Nas imediações da farmácia já havia a Padaria Cruzeiro, a fábrica de barcos do Ferrari, a carpintaria e marcenaria do Chico Carretel em sociedade com o Gobeth.


Naquele tempo o farmacêutico era praticamente o médico das famílias?


Eu fui ao médico quando era nenê, no Dr. Tito. Depois em agosto de 1945 fui ao hospital quando quebrei a perna.


Como você quebrou a perna?


Todos os domingos eu e a minha mãe íamos à casa da minha avó. Minha tia também ia. A família reunia-se na casa da minha avó, lá no Bairro dos Alemães, no fim da Rua Saldanha Marinho, ela não continuava, parava na Rua São João. Minha mãe saiu, meu pai tinha saído, eu estava com uma peteca na mão, ia levar para brincar na casa da minha avó, bati a peteca, havia umas árvores com um quadradinho de madeira em torno delas como proteção, fui pegar a peteca, havia enroscado, sem querer bati a canela, trincou. Fui levado para casa, meu pai me levou no dia seguinte até a Santa Casa. Tiraram radiografia, estava trincada, engessaram. Era época da guerra, a gasolina estava racionada, Dr. Toledo que disse: “- Mattos! Eu os levo!”.


Na esquina da Rua Benjamin Constant com Avenida Dr. Paulo de Moraes havia casas?


Nas duas esquinas havia casas construídas uma de João Elias, que morava em um sobrado com sua irmã Amélia, ambos eram solteiros, além de uma irmã que casou-se com o Macluf, e na outra esquina era o Bar do Latiffe Naime, pai do Walter Naime, onde hoje é uma casa de peças. Do outro lado, onde hoje existe uma farmácia, residiam os barbeiros Nelson e Antonio Marconi, irmão do Milico, que mais tarde teve salão de barbeiro na Rua Governador Pedro de Toledo esquina com a Rua Joaquim André. Ali também havia o João Fustaino que tinha uma sapataria. Os Filetti já estavam estabelecidos com fecularia na Avenida Dr. Paulo de Moraes.


Até que ano seu pai teve a farmácia na Rua Benjamin Constant?


Ali ele ficou até 1951, nesse salão, ai ele mudou para outro quarteirão quase na esquina com a Avenida São Paulo. Onde hoje tem um bar. Era em frente ao Angeli, que teve ali um bar. Depois quem mudou ali foi a família do Cristóvão Martins. Para onde meu pai mudou era a fábrica de balas do Benedito (Dito) Baglioni. Ele teve inicialmente a fábrica de balas do lado direito, onde é a sapataria do Cella, passando um pouco, onde há uma bicicletaria ao lado, era a fábrica de balas do Benedito. Ele saiu de lá, comprou do lado esquerdo da Rua Benjamin Constant. Ele fechou a fábrica de balas e acabou vendendo para o meu pai que se mudou para o salão enquanto construía a farmácia ao lado. Onde era a fábrica de balas meu pai construiu um bar, com bocce, e alugou. Ali meu pai permaneceu até 1957. Foi quando ele vendeu para o “Lico da Farmácia Neves”. O meu pai foi para Santa Terezinha, bem na esquina da praça. Ali ele ficou até 1974, acredito que mais. Sempre com o nome de Farmácia Mattos.


Nesse período você cresceu e foi estudar em que escola?


Minha primeira escola foi o Externato São José, localizado no prédio onde mais tarde funcionou a Escola de Odontologia de Piracicaba, Ali fiz o primeiro ano e metade do segundo ano, minha primeira professora foi Ruth Pilli , foi ela quem me alfabetizou. Eu descia de bonde, na época dava certo, ia com a minha mãe. Descia na esquina, ia pra o colégio e minha mãe seguia para a escola para lecionar. Na volta ela passava e me pegava. Íamos até a esquina da Rua XV de Novembro com a Rua Boa Morte, pegávamos o bonde e íamos para casa. Na esquina da Rua D. Pedro II com a Rua Boa Morte, havia um posto de gasolina, do Lú, o nome dele era Rocha, sogro do Samir que é professor da Faculdade de Odontologia. O prédio existe até hoje. O segundo semestre do segundo ano fui estudar no Grupo Escolar Moraes Barros, minha professora foi Dona Helena Pousa. No terceiro e quarto ano foi Maria José (Zizinha) Verderesi. O irmão dela, João Verderesi, foi assessor do deputado Pacheco Chaves. Em 1950 me formei. Ano do cinqüentenário do Grupo Moraes Barros. Tive a satisfação de cinqüenta anos, depois em 2000, participar das comemorações do centenário do Grupo Moraes Barros. Conclui o grupo com nove anos, naquela época a lei não permitia que aquele que fizesse dez anos depois de junho entrasse no ginásio. Com isso não pude prestar exame para entrar no ginásio. Estudei um ano inteiro de curso preparatório por causa da idade. Fiz na primeira turma do Colégio Dom Bosco, que funcionava ao lado da Igreja dos Frades. No “coléginho” como chamávamos. Na esquina da Rua Alferes José Caetano com a Rua São Francisco de Assis (que antes se chamava Rua Saldanha Marinho) tinha um salão de reuniões, de catecismo, era também onde havia um cineminha onde domingo a tarde passavam filmes para a turma que estudava catecismo. No fundo tinha um campinho de vôlei que a turma do Dom Bosco ia jogar antes de começar a aula. As quermesses eram feitas em frente a Igreja dos Frades, na praça. Só que era fechado. Tinha grade, porque o pessoal do sítio naquela época vinha de charrete e deixava o carrinho com o cavalo no lado interno.


Ao lado do coléginho, na década de 60 havia quermesses, o que funcionava ali anteriormente?


Era o campo de futebol dos cordigeros. Ali embaixo, atravessando a Rua Alferes José Caetano havia um túnel que levava ao vestiário no outro lado da rua.


Você chegou a passar por esse túnel?


Oh! Joguei muita bola lá. O túnel deve existir até hoje, devem ter fechado ambas as entradas. Esse túnel saia do campinho de futebol e ia do outro lado, no vestiário atrás da igreja. Ao lado da Igreja dos Frades, além da calçada, existe um degrau com uma segunda calçada, era fechado com muro e aberto em cima sem telhado. Ali era o vestiário da turma que jogava bola. O vestiário não tinha comunicação com a igreja.


Esse túnel era iluminado?


Não era pelo fato de ser aberto em ambas as extremidades e relativamente pequeno. Só para passar debaixo da rua.


Você chegou a ser coroinha?


Fui coroinha um ano na capela das freiras do Lar Escola Maria Nossa Mãe, na Rua da Boa Morte, no Do Bosco, no Colégio Assunção, eu não era coroinha na Igreja dos Frades. Eu tinha 10 anos, foi quando entrei no Colégio Dom Bosco, em fevereiro de 1951. Os padres do Dom Bosco passaram a dar assistência religiosa tanto na Colégio Assunção como no Lar Escola, a missa era as seis horas da manhã no Lar Escola. No Assunção era aos domingos, onde havia a missa dos alunos. Eu morava na Rua Benjamin Constant, saia de casa as 5:30 da manhã, naquele tempo a Avenida Dr. Paulo de Moraes era uma escuridão, tinha muitas árvores, era uma rua calçada com paralelepípedo com um enorme tanque onde os animais que tracionavam as carroças vinham beber água. A missa terminava a sete horas, as irmãs davam café, eu andava pelo pomar que existia lá e depois vinha embora para casa. Fiz isso todos os dias nesse período de um ano e pouco. Com a mudança do Dom Bosco para o local onde se encontra, passei a ajudar missas apenas lá. O Colégio Dom Bosco tinha o compromisso de iniciar suas atividades naquele local em 1952 ou perderia a concessão do terreno. Lá estudei o ginásio e o curso científico.


Você chegou a conhecer Mamãe Cecília, ou Madre Cecília?


Conheci, ela é parente nossa. Tanto que quando fizeram a documentação para o processo de canonização dela vieram conversar com o meu pai.


Ao terminar o curso científico, você já sabia qual seria a carreira a seguir?


Conclui em 1959 o científico, meu pai queria que eu fizesse medicina. Com uns três colegas fomos fazer cursinho para prestar vestibular, morei em uma pensão em frente ao Cine Regina que depois se tornou auditório de TV do Silvio Santos, na Avenida Brigadeiro Luiz Antonio, o cursinho era na Liberdade. Ao lado da pensão onde morava ficava o Restaurante Zillertal, a Federação Paulista de Futebol. Permaneci por dois anos morando em São Paulo. Percebi que não tinha vocação para fazer medicini, prestei exame na ESALQ e em 1963 entrei para a faculdade. Sou formado na turma de 1967. O CALQ – Centro Acadêmico Luiz de Queiroz mudou para prédio próprio no ano em que entrei. Antes era na Rua Prudente de Moraes onde hoje é o HSBC. Ficava no andar superior. No meu tempo foram diretores da ESALQ o Malavolta, o Salim e o Galli.


Ao sair formado como engenheiro agronomo qual foi o seu primeiro emprego?


Sai da faculdade e fui trabalhar na Ultrafertil o presidente da empresa era Pery Igel.Era uma empresa multinacional de origem norte mericana. A Ultrafértil veio com a mentalidade da venda técnica, contrataram agrônomos, que iam conversar com os fazendeiros em suas fazendas, realizavam análises de solo e recomendavam o uso do produto adequado. A Ultrafértil trouxe o que não existia na época: adubo concentrado, a quantidade utilizada era muito menor do que a quantidade utilizada normalmente.


A origem da matéria prima do fertilizante é totalmente nacional?


Não. Fósforo existe alguma coisa, mas a maioria vinha do Marrocos. Potássio, Nitrogênio e o Fósforo é o básico de qualquer fertilizante. Permaneci um ano e meio na Ultrafértil. O Dr. Dimer Accorsi, irmão do Dr. Walter Acccorsi, era diretor do Ensino Agrícola, em São Paulo, eles estavam ampliando, só existiam Colégios Agricolas em São Manoel, Jaboticabal, Jacarei e Espírito Santo do Pinhal. Contratado fui dar aula no Colégio Agrícola de Santa Rita do Passa Quatro. Lá fiquei pouco tempo, saiu o concurso do Instituto de Zootecnia de Nova Odessa, que é do Parque da Água Branca. Passei no concurso, permaneci de 1969 até outubro de 1993, onde me aposentei.


Você conheceu sua esposa em que ano?


Conheci minha esposa Maria Cecília Teixeira de Mattos no carnaval do Clube Cristóvão Colombo, quando ainda era na Rua Governador Pedro de Toledo, em fevereiro de 1964. Casamos na Igreja São Judas Tadeu, no dia 29 de junho de 1969. Temos dois filhos: Waldssimiler e Wlastmiler.


Você pratica algum esporte?


Pratiquei até 2004, jogava futebol, pratiquei todo tipo de esporte, mas a minha paixão sempre foi jogar bola.


Como você vê a realidade dos Centros Acadêmicos atuais?


Algumas decadas passada, por exemplo, o estudante que estava em Piracicaba e tinha sua família em Ribeirão Preto, para sair daqui e ir até lá, o estudante levava quase um dia de viagem. Ia daqui para Limeira, de Limeira à Pirassununga e de lá para Ribeirão Preto, os horários de onibus não coincidiam. Sábado tinha aula até meio dia. Então ele saia ao meio dia e ia chegar a noite em Ribeirão. No outro dia tinha que sair cedo para vir embora, segunda feira cedo ele tinha aula. Quando ele ia visitar a família? Ou por necessidade, quando tinha feriado ou nas férias. Não havia onibus de meia em meia hora para Campinas, a maioria do pessoal de Campinas morava aqui. Iam aos finais de semana porque era mais perto. Sábado após o almoço pegavam carona, naquele tempo dinheiro não era como hoje. Poucos tinham carro. Para ir a São Paulo levava-se tres horas e meia quatro horas. Com isso o pessoal permanecia mais em Piracicaba, acabava a aula de sábado vinham para a Brasserie, Bar do Tanaka, tomar chopes, caipirinha. A vida social do estudante era na cidade de Piracicaba. A noite iam ao cinema, quadrar jardim. Por isso essa foi a época em que o Centro Acadêmico mais cresceu.








domingo, junho 16, 2013

ALAIDES PUPPIN RUSCHEL

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 15de JUNHO DE 2013.
Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/


ENTREVISTADA: ALAIDES PUPPIN RUSCHEL




A artista plástica Alaídes Puppin Ruschel é a representação gritante do potencial do ser humano e em especial do Brasil. Com sólida formação acadêmica em área totalmente diversa, mais uma vez ela prova que os gênios não se limitam, alimentam-se do saber, seja qual for sua origem. Durante décadas atuou em pesquisas científicas. Quando encerrou sua atuação profissional, quase por acaso, se é que existe acaso, descobriu ser exímia escultora, com composições de vanguarda, obras inovadoras, formas coerentes e arrojadas. Peças de volume respeitável, compostas por materiais diversos se interligando em perfeita harmonia, Alayde, seu nome artístico, sem nunca antes ter tido contato com esculturas, aos 60 anos iniciou uma carreira de artista plástica gloriosa, fundamentada em rigor científico e extrema sensibilidade. Alayde não é apenas uma artística plástica a mais no mercado, nem uma senhora da sociedade que ocupa seu tempo ocioso com figuras imaginárias. Ela é o verdadeiro exemplo da energia que cada ser humano tem em seu interior. Premiada e homenageada, em Piracicaba, no exterior, infelizmente ela segue a trilha determinada pela sina dos que fazem arte com vocação: o verdadeiro valor do artista só é reconhecido de fato após deixar de existir fisicamente. Seja por falta de conhecimento das obras do artista, por ego envaidecido de terceiros, por fatores culturais, interesses comerciais, grandes nomes vão para a vala comum até que algum estudioso resgata seu valor e o coloca em seu merecido lugar. É então declarada a temporada de caça a obras do artista, alcançando às vezes cifras inimagináveis. São incensados no altar da fama e glória.
Filha de Santos Puppin Neto e Emília Bressan Puppin, nasceu a 12 de dezembro de 1931, no distrito de Araguaia, pertencente ao município de Alfredo Chaves, no estado do Espírito Santo. São seus irmãos Luiz Puppin Neto e Edson Puppin. Seu pai era agricultor, com a crise do café ele enfrentou uma derrocada, que o levou a trabalhar na cidade de Cachoeiro de Itapemirim onde passou a ser vendedor de títulos de capitalização, profissão que o levou a morar em Itajubá, no sul de Minas Gerais.


Que idade a senhora tinha quando a família transferiu-se para Itajubá?


O curso primário eu fiz em Cachoeiro do Itapemirim, no Grupo Escolar Graça Guardia, em Itajubá fiz o ginásio e o científico. Meu pai incentivava-nos a estudar. Éramos pessoas simples, sem grandes recursos que permitisse ir estudar longe de casa. Eu tinha uma amiga, Elenita Sobral do Nascimento, cujo pai, Augusto, era militar, e ele a levou até a escola de agronomia onde até hoje ela é professora, situada próxima a 47 quilômetros do Rio de Janeiro, distrito de Campo Grande, era a Escola Nacional de Agronomia. Ela iniciou na Praia Vermelha, no Rio de Janeiro, depois foi transferida para esse local, um campus construído pelo paulista Fernando Costa.


Em que ano a senhora prestou o vestibular?


Foi e 1951 e formei-me em 1955 como engenheira agrônoma.


Na época não era comum mulher estudar agronomia.


Era raro. Naquela época houve um “boon” dentro da universidade porque uma escola da Colômbia fechou, muitos colombianos vieram para cá, éramos três alunas, eu, a Elenita e outra aluna isso no meio de outros 55 alunos do sexo masculino. Moramos em um alojamento que tinha sido construído naquela época, dentro da própria escola. Os rapazes, todos moravam nos alojamentos antigos, mas as meninas não tinham alojamento próprio, então foi feito um alojamento feminino, enquanto isso nós moramos a dois quilômetros da escola, o Ministério da Agricultura tinha muitas casas onde residiam seus funcionários. Íamos à escola de carona, desde aquela época aprendi que a carona é uma das coisas politicamente correta de ajudar as pessoas. De manhã vinha um carro e nos pegava, morávamos em sete moças nessa casa. À tarde esse carro nos trazia, se quiséssemos vir almoçar em casa tínhamos que conseguir uma carona. Embora na escola houvesse um refeitório maravilhoso.


Ao formar-se em que local a senhora foi trabalhar?


O único jeito era trabalhar no Ministério da Agricultura. Lá existia o Instituto de Ecologia, era antigo, tinha vindo da Praia Vermelha. Fui trabalhar com microbiologia do solo, tinha uma alemã chamada Johanna Döbereiner (Johanna Liesbeth Kubelka Döbereiner), no tempo da guerra ela refugiou-se no Brasil, mas ela tinha feito cursos semelhantes a agronomia, ela tinha estudado com um francês muito importante no estudo de microbiologia do solo. Ela trouxe todas as práticas que eram feitas no laboratório, fomos indicados a trabalhar e conhecer bacterias que fixavam nitrogênio do ar. Nós respiramos o nitrogênio existente no ar, assim como oxigênio, carbono. Mas nós só usamos o oxigênio. O nitrogênio que está no ar tem a fórmula N2, ele passa pelo nosso organismo e não faz nada. Existem umas bactérias que são responsáveis por tudo isso que você vê de natureza. Essas bactérias pegam esse nitrogêncio e transformam em amônia, que é um produto que toda planta precisa ter para se formar a proteina, que é oxigênio, nitrogênio e hidrogênio. Toda a fotosintese é dependente desse nitrogênio que é assimilado do solo. Essas bactérias são as mais importantes para a formação de toda a natureza.


Isso significa que bactéria não são só prejudiciais?


Posso lhe dar uma aula sobre os benefícios realizados pelas bactérias. Ela está no seu corpo, estômago, intestino, são as bactérias e fungos existentes em nosso corpo que fazem com que ele funcione e absorva tudo que é bom. Quem destroi o lixo? São as bactérias, os fungos, os microrganismos. São os seres mais poderosos e benéficos para o homem e para a natureza toda.


O homem tem consciencia disso?


Nós que estudamos isso sim, mas eu tenho a certeza de que a maioria dos seres humanos não sabe disso. É ilógica a pecha que dão aos microorganismos como destruidores. O nosso pão, só fermenta e se transforma em pão por causa de um fungo.


Como a senhora vê a industrialização dos alimentos, a existência de produtos enlatados, por exemplo?


Acho isso até certo ponto bom. Pessoas que não estão convivendo na natureza podem ter certo tipo de alimento. Só me revolto quando vejo quem vai levar todos os dias alimento aos quinze milhões de habitantes que moram em São Paulo. Quem? É o fruto do trabalho do homem que está no campo que vai chegar através de algo que é uma rodovia, onde milhares de pessoas estão trabalhando para trazer isso para cá. O homem não pensa. Como por exemplo, quando destruiu toda a via férrea no Brasil, o que ele fez de prejudicial ao nosso país. Hoje gastamos tanto combustível para transportar tudo, estamos poluindo a natureza. Eu vivi essa época, nós já tínhamos as estradas de ferro, mas começamos a importar o petróleo dos Estados Unidos. O solo do Brasil central é um solo paupérrimo e tem deficiência só de um elemento: o zinco. A EMBRAPA se expandiu através de Brasília, alguém que veio do exterior, fazendo pesquisas no solo descobriu que tinha que colocar zinco. A agricultura se expandiu, agora temos a melhor agricultura do mundo.


O Brasil tem petróleo?


Tem e muito! Sabemos que na Amazônia há muito petróleo.


No Nordeste pode haver muito petróleo?


Acho que pode ser que tenha. O petróleo é fruto das grandes florestas que haviam em um passado muito remoto, sucumbiram, os microorganismos produziram o petróleo que é a decomposição de toda matéria orgânica. Aquilo que foi enterrado. A nossa capacidade de trabalho é muito grande, um exemplo disso é a EMBRAPA.


O fato do Brasil mais do que duplicou a sua população em um curto espaço de tempo é um fator positivo?


Acho que só seria positivo se a população tivesse condições de receber uma educação perfeita. Atualmente está se tentando fazer isso, o governo tem oferecido escolas boas como SESC, SENAI, ETEC, está tentando melhorar o ensino primário, mas não consegue melhorar o salário dos professores. Se esse processo evoluir como é feito pelo americano, aonde as crianças vão para a escola onde permanecem oito horas por dia, as crianças recebem uma alimentação adequada, muito boa, praticam esportes. No Brasil só se pensa que o aluno vai para a escola para estudar. Ler. O professor não tem nem a capacidade de fazer isso porque ele não tem instrumentos. Enquanto não isso não existir no Brasil no sentido de que ela evolua sem ser pela televisão, que só traz coisas erradas. Eu tenho pena da juventude atual.


Há estatísticas que apontam que a maior fonte de lazer da população brasileira é a televisão.


As mensagens que são passadas através das novelas são criticas. Tudo é uma negação. A mensagem que eles estão passando agora, meninas com 12 anos apresentando uma sensualidade fora do normal. Não é uma questão de moralismo, é definição do que é certo e do que é errado. O certo é não ser desse jeito. Eu assisto a novelas da TV Globo, ela tenta passar uma coisa de arte, os atores são bons, os diretores também são mais ou menos bons, quem escreve uma novela é que deturpa as coisas. O pensamento do homem em chamar a mídia dentro das casas.


Na opinião da senhora os autores de uma novela a deturpam?


Deturpam! Impõem um pensamento negativo.


Em seu ponto de vista há interesses externos de que o Brasil não avance em seu progresso?


No passado, tempo de D.Pedro II, os europeus vieram para o Brasil, fizeram várias coisas boas, mas também levaram muitas riquezas do Brasil. Quando vou à Europa e vejo lugares com aquele ouro todo, fico pensando: “Meu Deus! Veio lá da minha terra!”. Consegui através do estudo, melhorar muito meu entendimento do mundo. Meu pai gostava de ler, comprava jornais, líamos, quando eu perguntava algo, porque determinada coisa estava acontecendo ele dizia: “– Minha filha leia sempre nas entrelinhas!” Se você ler um jornal você tira suas conclusões, A imprensa deveria ser sucinta, dando a mensagem correta e final.


A senhora acessa a internet?


Através do Google consegui acessar dois PowerPoint muito interessante. O local da ciência também me instruiu bastante. As noticias veiculadas pelo meio eletrônico é só no sentido negativo.


Qual é a opinião da senhora sobre a construção dos estádios para a Copa de Futebol?


Me lembro do dia em que foi aprovado que a Copa viria para o Brasil, o Lula fazendo aquela festa toda. Eu pensei: “-Será que essa pessoa não esta sabendo o que está acontecendo no Brasil?” E agora está acontecendo! Dinheiro jogado fora! Algumas pessoas irão frequentar aqueles estádios, algumas vezes, vão ficar felizes ou infelizes. Esse dinheiro poderia ser canalizado para pesquisa de alta tecnologia.


O Brasil tem fontes de pesquisas?


Eu acho que tem, mas tudo direcionado para ganhar dinheiro. O pesquisador tem que ser protegido, através do seu trabalho é que tudo evolui. Até a política pode evoluir.


Há interesse político em evoluir?


Diante agora da competição com outros núcleos na Europa, Estados Unidos, eu acho que deveria haver um interesse.


A senhora aposentou-se em que ano?


Aposentei-me em 1994, na EMBRAPA. Trabalhei 38 anos como agronoma, hoje os grandes agricultores estão apoiados na EMBRAPA. A EMBRAPA foi criada no Rio de Janeiro, nessa ocasião eu trabalhava no Instituto de Ecologia, houve um grande movimento da EMBRAPA ser fundada dentro do Ministério da Agricultura, muitos pesquisadores americanos chegaram ao Brasil e viram que nós tinhamos uma agricultura o ano inteiro, issso abriu os olhos dos brasileiros, tinha um instituto que trabalhava com a cana-de-açucar ha trinta anos no Ministério da Agricultura, em Campos. Eles viram o potencial que existia no Brasil para tudo. Fundou-se a EMBRAPA em 26 de abril de 1973, o banco de germoplasma, todas as sementes do Brasil, ia ser em Piracicaba, meu marido Renato Ruschel foi convidado para ser o presidente. Éramos colegas de turma e casamo-nos em maio de 1957 no quilômetro 47 da Via Dutra, Estrada Velha Rio-São Paulo, a igreja era dentro do anfiteatro da universidade. Tivemos quatro filhos: Regina Celi, Ricardo Henrique, Rosane e Roberto.


A senhora chegou a fazer cursos fora do Brasil?


Fiz o meu Master of Science nos Estados Unidos, na Purdue University Soil Science. Quando fomos já tínhamos quatro filhos, sendo que o mais novo tinha sete anos. Permanecemos lá por dois anos e pouco. Meu marido fez PhD. Quando voltei fiz doutoramento na ESALQ. Ai fui trabalhar no CENA, onde permaneci por 10 anos., trabalhava com microbiologia. Voltei para a EMBRAPA onde permaneci por mais 10 anos. Tive projeto durante doze anos, eu ia à Viena representar o CENA.


Em que ano a senhora mudou-se para Piracicaba?


Foi em 1971, tinha ocorrido a queda do Comurba, não havia quase edifícios na cidade.




 
 

Quando a arte passou a ser uma atividade para a senhora?


Começou quando eu estava para me aposentar em Goiás. Eu gostava muito de Goiânia, tenho muitas saudades de lá. Construímos uma casa em Caldas Novas, havia umas freiras que tinham uma espécie de mini hotel, no período em que estávamos construindo ficávamos hospedados lá. Eram dominicanas, fizemos uma amizade maravilhosa, nos fins de semana ou feriados nós íamos lá. Após a conclusão da nossa casa íamos fazer as refeições no mini hotel das freiras. Um dia uma das freiras me disse “-Alaides, queria que você levasse esse santo para a Irmã Letícia consertar!”. Ficava no centro de Goiânia, onde moravam essas freiras dominicanas. Levei esse Cristo para essa freira consertar, estava todo quebrado. Quando cheguei lá não encontrei a freira, mas deixei o Cristo lá. Na outra semana fui lá e peguei o Cristo, coloquei no meu colo, abri o embrulho, vi que era tão lindo! Mas era tão lindo! Até hoje tenho aquela imagem na minha cabeça. Pensei: “-Vou aprender a fazer isso!”. Falei com a freira de Goiânia, pedi que me apresentasse à Irmã Letícia. Em um sábado falei com ela: “-Eu queria aprender a fazer esculturas, pinturas”. Ela disse-me; “-Toma esse pedaço de barro e faça alguma coisa para que veja como você faz. Na semana seguinte levei um rosto de boneca que eu queria dar de presente para a minha neta. Ela pegou, olhou, falou assim: “-Alaides, não está bom! Você vai melhorar!”. Tive mais duas aulas com ela, ai soube que lá perto tinha um escultor que era filho do presidente do Lions que nós pertencíamos. Falei com esse rapaz se ele podia me ensinar a fazer esculturas maiores, ele me ensinou por três aulas. Aprendi a fazer esculturas grandes. Ele “queimou” a minha primeira peça. Trouxe essa peça para cá, soube que vinha uma pessoa de Campinas à Piracicaba para fazer na fundição a queima das peças dela. Fiquei lá uns quatro a cinco meses. Fui fazendo as minhas peças, fui crescendo, via as peças do pessoal que vinha do exterior e produzia esculturas. Assim fui evoluindo. Sozinha. O prateado das escultura é uma liga de alumínio com sílica, nunca fica escuro. Algumas peças são só em alumínio. Eu faço a minha peça na argila, quando a queimo vira cerâmica. É o mesmo principio de fazer tijolo, pega-se o barro, põem no forno e queima. Eu levo para a fundição a cerâmica ou só no barro mesmo. Eles tiram o molde e fazem o que eu quero.




Isso aqui em Piracicaba?


È a Fundiarte, a melhor fundição da América do Sul. Vem pessoas de todo lugar para fundir suas peças ali. Esse negócio de fundir em uma só peça prateado com dourado fui eu que comecei. Na minha tecnologia eu uso o buraco, chamo de “buraco vazio”, eu pintei o buraco com tinta automotiva. Com isso dei uma nova estrutura na minha obra. Eu uso a linha helicoidal. Há escultores que realizam obras sem nenhum vazio. O meu primeiro trabalho está em nosso museu no Lar dos Velhinhos, eu o levei para a Europa, ele foi apresentado lá. Fui assistir a abertura da mostra, em Roma, tinha muita gente em volta da minha obra e não tinha gente em volta da obra de ninguém. Sabe por que? Porque tinha essa tecnologia: bronze e alumínio. Todos que estavam lá eram artistas plásticos da cidade que queriam ver a artista que tinha feito aquela obra. Isso foi em 1975. Eu fiz isso porque o Luiz da Fundiarte me ajudou a fazer, aqui em Piracicaba! Lá eu ganhei o primeiro prêmio. Tenho obra que ganhou medalha de bronze em São Paulo., no Salão Paulista de Belas Artes. Tenho vários prêmios, até medalha de ouro.








BIGETO - JOSÉ ADROALDO GUIDOLIN

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 18 de maio de 2013
Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/


ENTREVISTADO: BIGETO - JOSÉ ADROALDO GUIDOLIN




José Adroaldo Guidolin é a pessoa mais indicada para falar de uma figura lendária em Piracicaba há algumas décadas, o seu pai, Bigeto. O escritor, historiador e jornalista Cecílio Elias Netto chegou a experimentar e registrar as delícias gastronômicas do bar do Gigeto. Publicou em 9 de dezembro de 2004 um belo texto sobre elas: “Massas suculentas acompanhadas de caipirinha e cerveja. O inesquecível bar do Gigeto, na Rua Moraes Barros, próximo a Igreja Bom Jesus. Era bar, restaurante, casa de massas, com o inevitável e essencial espaço para jogo de bocha.”- Cecílio prossegue: “ Quem não comeu dos pratos preparados pelo Bigeto perdeu a alegria de saborear, por exemplo, polenta de reis. O Tone Kraide testemunha ocular de nossa história, no seu fulgor octogenário ainda conta com detalhes como foi o grande jantar do Bigeto, aos piracicabanos campeões do mundo de 1958. De Sordi e Mazolla. Duvido, porém, houvesse mulher boba ou inteligente, não importa, que resistisse ao encantamento rústico de um jantar no Bigeto: macarronada com sangria, sabe lá o que é isso madama? E filé com fritas e cerveja? Ou bife a cavalo com caipirinha? Haverá, ainda, quem saiba fazer bife a cavalo?” O autor prossegue: “Sangria do Bigeto, essa foi para poucos”.


Mário Guidolin, o Bigeto, nasceu em Rio das Pedras, a 13 de maio de 1917, exatamente no dia do aparecimento de Nossa Senhora de Fátima aos três pastores em Portugal. Mário casou-se com Leonésia Galesi Guidolin, tiveram os filhos José Adroaldo Guidolin e Creuza Maria Guidolin. A origem da família é Padova, na Itália, José Guidolin e Antonia Pesato Guidolin, tiveram os filhos: Renato, Filipe, Romilda, Angelina, Adele, Paula, Mário (Bigeto), Antonio Durvalino. Imigraram para o Brasil instalando-se em Rio das Pedras. Grande parte da família foi para a cidade de São Caetano do Sul, onde havia muitas fábricas de cerâmicas, porcelanas, a industrialização estava florescendo, foi na época em que havia muitas vagas para trabalhar na General Motors, praticamente todos os seus tios trabalharam na General Motors em São Caetano do Sul, isso foi na década de 40. Quando menino passava as férias em São Caetano do Sul. Permaneceram em Piracicaba os filhos Mário, Paula e Antonio Durvalino.


 

O senhor lembra-se onde morava a sua avó, em Piracicaba?


Após morar inicialmente em Rio das Pedras a família mudou-se para Piracicaba, sendo que a maioria foi trabalhar em São Caetano do Sul. Na minha infância eu ia com freqüência na casa da minha avó, ela morava em uma casinha na Avenida Independência, logo após a curva do Lar Franciscano de Menores. Não era asfaltada, a casa era bem pequena, tinha um banco de pedra na frente e ao lado uma árvore que fazia sombra. Meu avô trabalhava como jardineiro em Piracicaba, ele faleceu em setembro de 1940. Permaneceram em Piracicaba os filhos Mário, Paula e Antonio Durvalino.


Onde o senhor iniciou seus estudos?


Foi no Grupo Escolar Dr. Alfredo Cardoso, situava-se na Rua São José, onde mais tarde foram as instalações do Café Morro Grande. Depois passou para a Rua Moraes Barros onde permanece até hoje. Minha primeira professora foi Dona Olga Iatauro, mãe do médico Dr. Carmo Iatauro. Outras professoras foram: Dona Lourdes, Dona Belica Canto, Dona Branca Sachs Motta de Toledo. O ginásio eu fiz no Colégio Salesiano Dom Bosco que ainda não era no Bairro Alto, funcionava em um local emprestado que nós chamávamos de “coléginho”, ficava na Paulista, vizinho a Igreja dos Frades. Mais tarde ali funcionou o Grupo Escolar Dr. João Conceição e em seguida o Colégio Dr. Jorge Coury. Eu pegava o ônibus da Viação Marchiori, o Circular, na esquina do Orlando Françoso, na Rua Moraes Barros esquina com a Rua Visconde do Rio Branco descia na esquina da Igreja dos Frades. Entrei no Colégio Dom Bosco em 1951. Eles construíram parcialmente o novo prédio, estudei lá até 1958. Em 1959 prestei vestibular na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto. Não passei, voltei para Piracicaba. Alguns colegas disseram que era o único ano que estava tendo a segunda chamada na ESALQ, as 80 vagas não tinham sido preenchidas. Prestei vestibular, escrito e oral. A prova oral era constituída por uma banca com três professores, eles chamavam o candidato que retirava um ponto, era um saquinho com números de 1 a 15, por exemplo, eu retirei o número 12, tive que falar sobre o Teorema das Forças Vivas. (Relação entre o trabalho mecânico e a energia cinética, forças vivas era a expressão antiga para energia cinética). Quem deu esse ponto para mim foi um dos professores da banca: Jesus Marden dos Santos. Fui até a lousa demonstrar o teorema. Em 1960 entrei no primeiro ano de agronomia da ESALQ.


O seu pai exerceu diversas atividades, sendo uma pessoa muio conhecida em Piracicaba.


Meu pai foi padeiro por muito tempo, ele não fabricava o pão e sim entregava pela cidade toda, com carrinho de tração animal. Trabalhou na Padaria Bom Jesus, do Juca Monteiro. Nessa época deveia ter seus vinte e cinco a vinte e seis anos. Depois ele trabalhou por longo tempo na Fábrica Aurora como vendedor de macarrão, massas, bolachas e biscoitos de pão de mel. A Fábrica Aurora ficava na hoje Rua Dona Felisbina Monteiro, no Largo do Bom Jesus. A concorrente era a Cacique. Era um concorrente forte, uma empresa dirigida por uma mulher, naquele tempo uma novidade, era Dona Augusta Maicon. Parece que a fábrica Aurora era maior em tamanho e produção. O logotipo da fábrica tinha um galo, por isso se chamava Aurora, o galo cantava na aurora. Meu pai deixou o carrinho de tração animal que entregava o pão e passou a trabalhar com um caminhão. Devia ser um furgão Ford da década de 40. O caminhão era pintado de azul escrito “Macarrão Aurora” Depois tinha uma faixa onde estava escrito: Massas, bolachas, biscoitos e pão de mel. A bolacha Maria era tradicional, havia o macarrão comum, o cortado, o Padre Nosso, o macarrão Ave Maria, usado mais para fazer sopa, não chamava espagueti, chamava macrrão comprido, vinha em uma pacote azul, pesava um quilo. Quando eu estava de férias ia ajudar meu pai, mais por brincadeira. Quanto macarrão comprido meu pai vendeu, ele conhecia os armazéns da cidade inteira, hoje foram sustituidos por quatro ou cinco supermercados.


José, lembra-se de alguns desses armazéns?


Subindo a Rua Moraes Barros havia o Munhoz, era o maior armazém da época, meu pai vendia para ele. No Bairro Alto tinha o Zé de Freitas, depois tinha o Orlando Françoso, em seguida vinha o Luiz Guirado, que era vizinho do Cemitério da Saudade. Na Vila Rezende, no começo era o Luiz Viliotti, no centro, o Dova, na rua Governador tinha o Café Brasil, de propriedade de Lélio Ferrari., proprietário do Armazém Brasil. Na Rua Benjamin Constant tinha a Casa Nê. Um pouco antes do meu pai trabalhar na Aurora ele trabalhou com o Zézinho Hellmeister que tinha uma fábrica de mortadela, onde mais tarde veio a ser o Bar do Bigeto, quase me frente ao Bar Cruzeiro, na Rua Moraes Barros.


O senhor chegou a ver a fabricação de mortadela?


Vi, a carne é picada, moída, ensacada, é um processo entre forno e defumada. Na época de frios só havia a mortadela, salsicha e lingüiça. Era isso que a fábrica produzia. Meu pai trabalhou bastante tempo lá, sempre na área de vendas. Depois ele passou para a fábrica de macarrão, o lugar onde ele permaneceu maior tempo.


O seu pai era um dos grandes nomes do esporte amador de Piracicaba?


Isso foi nos anos 36, 37,38 e 39. Ele era goleiro. Tem gente que diz que naquele tempo não é como hoje, que se for bom de bola ele vai para a linha do time, segundo informações, meu pai chegou a ser um goleiro conhecido, tão bom, que foi convidado para treinar no Ipiranga de São Paulo. Lá já tinha um goleiro chamado Osvaldo. Naquele tempo, só de ser chamado por um time era muito significativo.


O senhor sabe se ele se arrependeu em não ter seguido a carreira esportiva?


Naquele tempo futebol não corria dinheiro como hoje, jogava e tinha que pagar, tinha que lavar o uniforme, a bola, não tinha quem pagasse. Acredito que o Zé Tejada e o Toninho Pimenta não pagavam, um era lenhador, outro sapateiro. O Romano naquele tempo acho que ainda não era rico, acho que ele trabalhava em oficina mecânica ainda. O Xoxo mexia com pedra, fazia túmulos e revestia com pedras. O Becari tinha comércio de miudezas.


Quando seu pai abriu o restaurante?


No lugar onde a minha sogra e meu sogro tinham a doceria, na Rua Moraes Barros vizinha ao nosso campeão mundial De Sordi, meu pai acabou montando uma mercearia. Quase toda semana ele ia para São Paulo, o João Carlos Rocha que dirigia para ele, a mercearia para aquele tempo era bem montada, tinha um sortimento grande de frios, começou a vir salaminho, copa, presunto. Começou a sofisticar perto do que existia. Era uma mercearia pequena. Foi até certo ponto, depois parou. Ai ele abriu o restaurante, isso porque meu pai gostava muito de cozinhar nos ranchos, e uma das coisas que ele fazia com freqüência para vários grupos, era a feijoada. A churrascaria acabou quase por ser especializada em feijoada. Segundo um amigo meu, professor da ESALQ, que vinha comprar feijoada, dizia que era a melhor feijoada da cidade servida inclusive em porções generosas. O restaurante do Bigeto foi um dos mais tradicionais da cidade. Era chamado de Churrascaria do Bigeto. A feijoada era feita aos sábados, durante a semana eram feitos churrascos, peixes.


De onde surgiu o nome Bigeto?


Eu já fiz essa pergunta ao meu tio nem ele soube responder. Em certos ambientes se falasse sobre Mário Guidolin ninguém conhecia, mas se falasse sobre o Bigeto, na hora se lembravam. O apelido sobrepujou o nome. Os banheiros eram impecáveis, isso era uma obsessão da minha mãe. Chamava a atenção de quem freqüentava.


Por quantos anos existiu a Churrascaria do Bigeto?


Uns seis anos. Meu pai era uma pessoa muito boa. Délio Lovadini, distribuidor da Brahma em Piracicaba foi um irmão para o meu pai. Ele levou o meu pai para trabalhar com ele, depositando confiança total na honestidade que sempre foi a marca registrada do meu pai. Toda a movimentação de numerário junto aos bancos era feita pelo meu pai. Isso lhe proporcionou uma aposentadoria digna.


Quais eram as bebidas da moda na época?


Água Tonica de Quinino, Gim Tonica, Run, Cuba Libre, Fernet.


O senhor cozinha também?


Sou um colecionador inveterado de receitas, tenho mais de 6.000 receitas catalogadas. Até o momento tenho 92 cadernos de receitas.


Como engenheiro agrônomo em qual empresa foi seu primeiro emprego?


Foi na Nestlé. Quando me formei na ESALQ em 1964, já podíamos escolher o curso optativo, fiz a opção por tecnologia de alimentos, que é uma matéria que eu gosto muito. Dos 86 alunos, 14 ganharam uma viagem de 40 dias para os Estados Unidos. Visitamos as indústrias de alimentos daquele tempo nos Estados Unidos. Um exemplo mais gritante para nós foi a soja, aqui no Brasil não havia nem o cultivo de soja. E lá eles já faziam carne de soja. Cinco professores da ESALQ nos acompanharam nessa viagem. Um dos que colaboraram para que viajássemos foi o Dedini. Meu pai tinha muita amizade com o Jordão, que era professor do Senai e tinha excelente relacionamento com o Comendador Mário Dedini, Meu pai falou com o Jordão sobre a nossa necessidade de complementar recursos para a viagem. O Jordão falou com Mário Dedini, eu e outro colega fomos até a casa do Comendador Mário Dedini que autorizou o seu departamento financeiro a colaborar no complemento de verbas para viajarmos. A estadia foi paga pelos americanos. O ponto alto dessa visita é que cada professor americano era especialista em um assunto, e aqui no Brasil havia professores com conhecimentos genéricos. Os americanos ficaram assombrados em saber que um só professor conhecia tecnologia de óleo, de carne, de frutas, açúcar e álcool. Só que o especialista americano conhecia determinado assunto com profundidade. Quando voltei fui trabalhar na Nestlé em Araras. Permaneci lá por uns quatro anos.


Depois da Nestlé qual foi seu próximo local de trabalho?


Fui para o Instituto Brasileiro do Café, o IBC, onde permaneci por oito anos. Trabalhei em Nova Esperança, a 30 quilômetros e Maringá. Quando cheguei lá tinha 18 milhões de pés de café só na redondeza de Nova Esperança. Setenta por cento da produção mundial do café é Coffea arabica, outros trinta por cento do consumo é do café conilon.


Quantas espécies de café existem?


Umas 18 ou 20. Comercialmente falando no Brasil predomina o Coffea arabica. O Brasil até certo tempo vendia o café commodity, de um tempo para cá, de uns 10 anos para cá, o Brasil acordou para um nicho de cafés especiais. Ai entra um conjunto comerciantes de café americano, produtores de café brasileiro. O café foi deslocado para Minas Gerarais na região do serrado, o diretor da Associação da Indústria Brasileira do Café – ABIC, fez uma comparação do café com a produção do vinho francês, ou seja, agregar valores ao café. Isso está sendo feito.


Quais são os efetos do café no organismo humano?


Há controvérsias. Poucos sabem que a cafeina contida no café é menor do que no chá.


O Brasil depende muito ainda da exportação do café?


Em torno de vinte por cento das exportações brasileiras são de café, parece que não porque a soja cresceu muito. Chegamos a exportar oitenta e oito por cento do café consumido no mundo. Existe um trabalho feito no México onde conclui que o aproveitamento do café ao fazer a infusão (café) o aproveitamento é de apenas seis por cento. Desse resíduo era tudo jogado fora, Hoje estão procurando fazer uma série de indústrias baseadas no resíduo do café.








domingo, junho 02, 2013

LUIZ CARLOS BONZANINI

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 01 de junho de 2013.
Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/


ENTREVISTADO: LUIZ CARLOS BONZANINI




Luiz Carlos Bonzanini é a imagem perfeita do profissional que trabalha naquilo que gosta de fazer. Apaixonado por rádio, dono de uma voz marcante, conhece desde a mesa de som até como gerenciar uma emissora, atividades que exerceu. Mestre de cerimônias ancora de jornal, apresentador, narrador de esportes, narrou até mesmo algo inusitado, um sepultamento. Grandes estrelas da comunicação partilharam do seu convívio profissional. Talvez um dos mais conhecidos do grande público seja o apresentador Carlos Nascimento. Nascido na cidade de Dois Córregos a 10 de dezembro de 1952. (É, portanto dois-correguense), na língua indígena Mokoi-Yembú significa Dois Córregos. Luiz Carlos é filho de Luiz Bonzanini e Maria Aurora Quero Bonzanni que tiveram ainda as filhas Aparecida Maria e Maristela. Luiz Carlos Bonzanini hoje apresenta o programa “ONDA CIDADE” das 13 ás 14 horas de segunda a sexta.


Qual eram as atividades dos seus pais?


Minha mãe era do lar e meu pai ferroviário. Ele começou trabalhando o que na época chamavam de “soca”, depois passou para o vagão troley, para a manutenção da caternária (linha aérea de energia), depois ele foi para o vagão solda, que soldava os terminais na linha do trem. Mais tarde ele voltou para o vagão troley como encarregado e aposentou-se como inspetor. Ele trabalhava na Companhia Paulista de Estradas de Ferro, mais tarde denominada Ferrovias Paulista S/A FEPASA.


Você chegou a morar em casa que a Companhia Paulista oferecia à seus funcionários?


Por um período moramos em casa de nossa propriedade, depois fomos morar na casa oferecida pela Companhia Paulista, era uma casa bem confortável, tinha dois dormitórios, sala, copa, cozinha, como de hábito na maioria das casas da época o banheiro ficava na área externa da casa.


Seus estudos foram realizados em que cidade?


Estudei em Dois Córregos, no Grupo Escolar Francisco Simões. Minha primeira professora foi Dona Leonor Guerreiro, no segundo ano foi Dona Letícia Poletti, no terceiro ano foi uma professora de sobrenome Capuzzi e a professora do quarto ano foi Dona Neide Francisconi. Ao concluir o primário, fiz um curso preparatório e ingressei na Escola Prática de Contabilidade, eu tinha uns 12 anos.


Com que idade você começou a trabalhar em rádio?


Comecei novo no rádio! Naquela época havia os comitês políticos, colocavam uma vara de eucalipto e a corneta (alto-falante) lá na ponta. Era montado um estúdio, como se fosse um estúdio de rádio. Com toca discos, microfone, eu tinha nove anos quando falei pela primeira vez em um microfone. Aos nove anos ia até o comitê, ficava ali por curiosidade e prazer, não ganhava nada. Era o comitê do Osvaldo Cazzonato candidato a prefeito e do Clineu Alves de Lima candidato a vice-prefeito. Eu tinha muita amizade com um locutor da Rádio Cultura de Dois Córregos, eu ficava ali, ele dizia: “- Fale um pouquinho!”. Fiz até um slogan para um vereador: “Vote bem, votando assim: para vereador Pedro Burin”. Eu tinha apenas nove anos. Foi um mandato “tampão” que eles cumpriram. Eu não tinha nenhuma remuneração era apenas o prazer de estar lá. Dalí a dois anos veio outra campanha, ai eu voltei com tudo. Tinha uns treze anos de idade, nessa ocasião ancorei mesmo o comitê político. Eu já estava lá, o outro apresentador disse-me: “Durante o dia você comanda”, a noite eu não podia ficar em função da idade, não era permitido.


Você continuou trabalhando sem nenhuma remuneração?


Não ganhava nada. Sempre diziam o seguinte: “Quem nasceu em Dois Córregos e não trabalhou na Rádio Cultura não é dois-correguense” Todos os jovens da cidade tinham o sonho de trabalhar na Rádio Cultura, a única que havia na cidade, 100 watts de potência, “ZYR-54 Rádio Cultura de Dois Córregos”. A freqüência era boa 650 khertz. No “dial” (mostrador de rádio) você encontrava um número pequeno de emissoras, não era congestionado como hoje. O que eu fazia na rádio do comitê já era o caminho que eu havia encontrado, já fui me preparando. Colocava músicas do Tonico e Tinoco, Tião Carreiro, Teixeirinha, Zilo e Zalo, Nelson Ned e fazia a campanha do candidato.


Já trabalhando na rádio você era procurado por artistas querendo divulgar suas músicas?


Nelson Ned gravou um compacto simples e ele foi até a emissora para promover a música “Será, Será” e na outra face do compacto era a música “Domingo a Tarde”, essa música estourou nas vendas. Nelson Gonçalves esteve lá divulgando seu trabalho, era de fato gago.


Você formou-se no curso de contabilidade?


Formei-me, mas não exerci. Nasci para o rádio. O candidato a vice-prefeito era o gerente da rádio, o Clineu, o meu sonho era conversar com o Clineu, pedir uma oportunidade na rádio. Uma determinada tarde eu estava fazendo a locução no comitê quando um cidadão parou logo atrás de mim, com o queixo apoiado em sua mão, ficou olhando. Perguntou-me se eu tinha a intenção de trabalhar na Rádio de Dois Córregos. Quase cai da cadeira. Respondi-lhe: “É o meu maior sonho”. Ele perguntou-me por que eu não ia. Disse que era por não conhecer o Seu Clineu. Ele disse-me: “Seu Clineu sou eu! Amanhã ás seis horas da manhã você vai até a emissora, estará lá o Compadre Vadô que apresenta o programa Aurora Sertaneja. As 5 horas e quinze minutos da manhã eu já estava na porta da rádio. O Sergio Cazonato era o técnico dele, eles entraram , entrei junto, já sabiam da minha ida. Como eu já tinha experiência na mesa de operação do comitê, com dois pick-up, fui para a mesa, o Cesar deu-me uma explicação, foi fácil para desenvolver. No dia seguinte o Sérgio que era o técnico não apareceu para trabalhar, passei a ser o técnico de som. Era para que eu praticasse a mesa para depois ganhar um horário. Nesse meio tempo se aprendia a “Humildade” que o Seu Clineu falava: varrer o salão da rádio. Tinha que fazer cobrança também para a emissora. Depois aprendemos como um transmissor trabalhava. Tinha um programa chamado “Variedades Musicais”, composto por uma música nacional, uma internacional e uma executada por uma orquestra. Era um programa para formar locutores, fui então fazer o “Variedades Musicais”, começava as nove horas da manhã e ia até as onze horas. As onze horas tinha um programa chamado “Instante Social”, era o clímax da programação da emissora. Eram noticiados os aniversários, batizados, comunicados, festas diversas , bailes. O locutor que fosse apresentá-lo era tido como o melhor locutor da rádio. Tive o prazer de apresentar esse programa durante dois anos, isso com quinze anos de idade. Passei a ser funcionário, ganhava 600 cruzeiros. Na época era um valor significativo, além disso tínhamos o livre acesso a cinema, clubes, carnaval. Bastava apresentar a carteirinha da emissora.


Por quanto tempo você permaneceu na Rádio Cultura?


Permaneci na rádio até os 18 anos, nesse meio tempo meu pai adquiriu um escritório de contabilidade e despachante policial. Eu e um colega que tinha sido técnico de som meu, o Carlos Alberto Soriano do Nascimento, que é o Carlos Nascimento hoje no SBT, ele foi operador de som em um programa que eu apresentava, chamava-se “O Comando é dos Brotos”, o prefixo era “Tijuana” com “The Clevers” e o fundo musical era “O Milionário” com os “ Os Incríveis”


O Carlos Nascimento é de Dois Córregos também?


Ele é nascido em Jaú só que cresceu em Dois Córregos, o pai dele é o Lalito, que faleceu em Piracicaba. A mãe dele é da família Soriano de Jaú, ela foi professora em Dois Córregos. O Nascimento tem uns dois anos a menos do que eu. O Nascimento tinha um trauma, o sotaque dele era piracicabano, ele não queria falar em rádio de jeito nenhum. Foi difícil. Eu apresentava o programa, animava e ele lia os comerciais. Um dos comerciais era da “Biga, Calçados de Pneus Ltda.” Era uma fábrica que havia em Dois Córregos. Outra empresa que anunciava era a “Distribuidora de Bebidas Santana” que era do Osvaldo Casonato. Fomos para um teste na emissora Jauense, emissora coligada. Fizemos o teste, após dois dias cheguei a minha casa e a minha mãe me entregou uma chave, dizendo: “É para você ir para o escritório que o seu pai comprou em sociedade”. Disse-lhe que não queria, estava esperando a Rádio Jauense me chamar! Meu pai era duro na queda, com isso fui contrariado para o escritório. Naquele dia o Seu Alides Fabris que era o gerente da Rádio Jauense me procurou, expliquei-lhe que estava comprometido com o escritório. Ele levou o Nascimento, só que a mãe dele era contraria a ele fazer rádio. Na época havia discriminação com quem fazia rádio não era considerada uma profissão. O Nascimento acabou não indo para a Jauense. Logo em seguida ele foi para São Paulo para estudar, foi quando ele ingressou na Rádio ABC do falecido Lombardi que trabalhava com o Silvio Santos. O Nascimento trabalhou muito tempo na Rádio Nacional, hoje Globo, ele cobria noticias do aeroporto. Depois ele foi para a TV Globo. Eu fiquei no escritório um ano. Abandonei, disse que ali não ficava. Vendi o escritório e fui trabalhar no escritório da Usina Santa Adelaide em Dois Córregos, Fazia dois meses que eu estava trabalhando, naquela época havia o jornal Gazeta Esportiva, o chefe da seção após o almoço abriu a Gazeta, foi quando vi escrito: “Campeonato Paulista Começa Domingo”. Bateu-me um desespero danado, pedi demissão na usina. Meu tio Eduardo Quero teve gráfica na Rua Alferes José Caetano disse que a Dedini estava contratando para o almoxarifado. Decidi vir para Piracicaba, isso foi no período entre 75 e 76. Passei nas provas, a tarde tinha entrevista no almoxarifado da Dedini. Quando entrei na sala assustei, pensei: “Agnaldo Rayol!”. Era Erotides Gil, idêntico a Agnaldo Rayol. Conversando ele me perguntou se eu era locutor de rádio, disse-lhe que era. Ele me disse: “-Então o que você veio fazer aqui?”. Mandou que fosse esperá-lo em frente à Rádio Difusora de Piracicaba as 17:50 horas. Entramos, ele me apresentou para o Luiz Hercoton, José Suave, pediram para que eu fizesse um teste, o operador era Claudinei Vaz. Gravei, ouviram e eu fui contratado pela Rádio Difusora de Piracicaba. Na Dedini eu ia ganhar um valor que na moeda da época era de cinco unidades, na Difusora passaria a ganhar cinco e meio. Nessa época eu já estava casado, casei-me aos 18 anos, eu já tinha meu filho. Naquela época tínhamos as taças Ouro, Prata e Bronze. A nossa equipe era composta pelos narradores: Ary Pedroso, Erotides Gil, repórteres de campo era Orlando Murilo e eu. O saudoso Luiz de Oliveira era o plantão. Recebi um convite dentro do Estádio Barão de Serra Negra em um jogo entre XV de Novembro e Vasco da Gama para me transferir para a Rádio Piratininga de Jaú, acabei indo para Jaú. Em Jaú permaneci por 15 anos, trabalhando ora na Rádio Piratininga de Jaú ora na Jauense.


Você jogava futebol?


Joguei no time Associação Atlética Mokoi-Yembú ( Dois Córregos) como lateral esquerdo, volante e ponta esquerda.


Em que ano você voltou para Piracicaba?


Em 1983 voltei para a Rádio Educadora de Piracicaba, quando o XV de Novembro subiu em uma partida contra o Bandeirantes de Birigui. Ainda na Educadora fui contratado por Adhemarzinho de Barros( Filho de Adhemar de Barros), ele havia instalado uma rádio em Bariri. Fui para gerenciar a emissora, permaneci lá por uns seis ou sete anos. Voltei para Jaú. De lá fui para a Rádio Gazeta em São Paulo, Tony José me levou, a família não se adaptava em São Paulo. Voltei para Jaú. Ao todo passei por 19 emissoras de rádio. Inclusive fiquei por algum tempo na Bandeirantes em Salvador, Bahia. Acabei indo para Igaraçu do Tietê onde gerenciei a rádio por 10 anos. Em 1998 o radialista Roberto de Moraes ne buscou, voltei para a Rádio Difusora de Piracicaba, fui para a Rádio Educadora, passei pela MIX de Limeira,


Você atualmente está na Rádio Onda Livre, já ha quantos anos?


Já estou ha quatro anos. Vim convidado pelo Roberto de Moraes e pelo Edirley Rodrigues.


Qual foi o primeiro jogo profissional que você narrou?


Foi do XV de Jaú contra o São Bento de Sorocaba. Jaú tinha uma dificuldade muito grande para ter narradores de partidas de futebol, o gerente da Piratininga na época Angenor Zago, perguntou-me se eu conhecia alguém, disse-lhe que sim, um amigo meu. O falecido Jamil Netto que morava em Piracicaba. No jogo XV de Jaú e São Bento de Sorocaba o Jamil teve um problema de saúde, fui comunicado pela sua esposa, avisei o gerente que perguntou quem indicou o homem. Disse-lhe que fui eu, ele então me disse: “-Então você se vira, você vai narrar esse jogo!” Narrei. Fui bem. Fiquei como narrador.


Qual é a maior dificuldade que um narrador de futebol enfrenta?


Nos dias atuais é o número da camisa. A confecção delas impossibilita o narrador enxergar o número da camisa. Esse número dourado é de difícil visualização à noite. O narrador em pouco tempo memoriza os nomes e posições de cada jogador. Cada jogador tem algo que diferencia de outro jogador.


Uma partida que envolva jogadores de um país estrangeiro com idioma muito diferente do nosso dá mais trabalho na hora de narrar?


O bom narrador consegue fazer isso de forma natural, existe algumas técnicas que ajudam. Temos casos de narrador que em um jogo ele utilizou apenas quatro nomes do time adversário. Geralmente isso pode ocorrer se ele tiver dificuldade na escalação, sem tempo de deixá-la correta.


Qual foi o primeiro jogo que você narrou?


Narrei muitos jogos amadores, o primeiro foi um jogo do "Scratch do Rádio", da Rádio Bandeirantes onde estavam jogando entre outros: Fiori Giglioti, Oslain Galvão, em um jogo contra o Barra Funda Futebol Clube. O melhor narrador do futebol esportivo estava ali, Fiori Giglioti, deu para tremer. Mas narrei, no final ele veio, me abraçou.


Narrar futebol é uma característica profissional muito pessoal?


Ser narrador é um dom. Não se aprende a narrar, quantos querem e não conseguem.


Você já foi mestre de cerimônia?


Muitas vezes.


São atividades que grandes nomes do rádio não exercem.


Existem locutores de um potencial incrível dentro do estúdio, inclusive alguns trabalharam comigo, se for expô-lo em público, subir em um palco ou algo que o valha, ele trava. Assim como existem locutores famosos que não tem a menor intimidade com a mesa de operações. Isso está mudando, o rádio com a mania de contenção faz com que o locutor passe a operar a mesa de som. Sempre houve o técnico de som e o locutor, hoje o estúdio é um ambiente só. Não tem mais a divisória entre estúdio e técnica.


Você narra outros esportes?


Gosto de narrar basquete, vôlei, futsal.


A célebre história de microfone aberto e conversa informal já aconteceu alguma vez?


Isso acontece. Ouvi certa vez uma frase que memorizei: “Antes de abrir a boca ligue o cérebro”. Às vezes entra em um estúdio pessoas que não são do ramo, algum convidado e no bate papo solta até alguma palavra mais forte.


Luiz Caarlos Bonzanini você construiu um nome forte no rádio.


Isso não me preocupa, considero mais as amizades que fiz. Gosto dos amigos. Fora do rádio tenho uma relação bastante simples com as pessoas que conheço. Conheci muitas personalidades esportivas, grandes astros, guardo algumas fotos de alguns desses momentos, narrei jogos com Zé Carlos que jogou no Cruzeiro, Sócrates, Rivelino, Clodoado, Airton Lira, Pedro Rocha, Zenon.


Hoje a tecnologia mudou, mas até pouco tempo narrar uma partida de futebol exigia uma logística que jamais o leigo poderia imaginar?


Para você ter uma idéia, quando narrávamos futebol na Rádio Cultura, você ia para Bariri transmitir o jogo, ao chegar ao campo tinha um rapaz da telefônica lá, nos identificávamos e perguntávamos onde estava a nossa linha. Ele respondia: “-Está lá naquele poste”. O locutor tinha que arrumar uma escada, subir, puxar o fio, engatava em uma maleta, era telefone magnético naquela época, girava uma manivela, falava com a telefonista: “ – Telefonista, é da Rádio de Dois Córregos, me liga no 18”. Era o número da rádio. Ligava, falava com a técnica, dizia que estava tudo em ordem. O gerente perguntava se os times estavam em campo, se estivessem, contava até cinco e mandava bala, passava a transmitir o jogo. Naquela época não tinha retorno. Não sabia se estava no ar ou não. Era como navegar no escuro. Com o tempo houve a evolução, apareceu o retorno, na Rádio Difusora, Arildo José, um grande técnico, nos dava condições de retorno no gramado.


Você trabalhou com Benedito Hilário?


Em 1983 ele apresentava comigo um jornal falado na Rádio Educadora. Atinilo José foi uma pessoa memorável. Apresentei muitos anos Jornal da Difusora, Segunda Edição, com Atinilo José. Desde que passamos a apresentar o jornal nunca fechamos de forma séria, sempre tinha algo pra sair rindo, tanto ele como eu. Sinto saudades das apresentações feitas com Atinilo José. Ele dizia “Dezooooiiito horas!”. Ele tinha um programa chamado “Show das Três e Meia” em nome do Arroz Fortuna, pedia para levar alguma coisa inusitada até a rádio, quem levasse dentro do horário pré-estabelecido ganhava um prêmio. Em 1976 quando trabalhei na Difusora trabalhavam: Nhô Serra, que abria a rádio, depois eu e J. Roberto cujo nome completo é José Roberto de Souza, apresentávamos o “Jornal da Difusora Primeira Edição” às sete horas da manhã, vinha o Ary Pedroso, terminado o programa do Ary vinha o esporte, que eu, Orlando Murilo, Ary, Gil, Luiz de Oliveira, apresentávamos. Depois vinha eu e o J. Roberto com o Jornal Falado, na seqüência do esporte, das onze e meia até o meio dia. Ai entrava o programa do saudoso Waldemar Billia, depois voltava o J. Roberto com o programa “Difusora, Rádio Tudo Bem”. Em seguida vinha o Atinilo com o programa “Varandão da Casa Verde”. À tarde J.Roberto e Atinilo apresentavam o jornal, em seguida vinha o esporte. A noite tinha o programa do Craveiro e Cravinho, e o Edirley Rodrigues que tinha o programa dele da noite. Em 2004 fui narrador esportivo na Rádio Brasil de Santa Bárbara D`Oeste, o Paulo Edison era o plantão esportivo. Edvaldo Tietz deu seus primeiros passos como repórter ali conosco. Outro foi Luiz Adalberto Nascimento, o Beto Pastor. Fui eu quem o apelidou. Foi em um jogo no Estádio Barão de Serra Negra, eu estava narrando e ele estava estreando, achei que chamar “Luiz Adalberto” era estranho, como ele era ligado a uma determinada religião eu chamei: “- Agora o destaque do repórter Beto Pastor!”. Se ele pudesse vir pela linha ele viria, ficou bravo, pegou o apelido. Um profissional que tem tudo para estar no rádio mas que fez a opção de trabalhar com publicidade.


Rádio dá dinheiro?


Deu. Ganhei dinheiro em rádio, mesmo no interiorzão. Na época combinava-se: “Quero você na minha equipe”. Hoje dizem: “Eu pago o piso salarial”. Nunca fiz só uma coisa no rádio, apresentava o esporte, tinha o meu programa musical, e fazia jornalismo.


Você ajudou a promover muitos nomes que hoje são estrelas no cenário nacional?


Na Rádio Canoa Grande de Igaraçu do Tietê Daniel e João Paulo com frequencia estavam lá, estavam começando. Sou da época em que os artistas e cantores apresentavam espetáculos em circo. Tinham que apresentar um drama. Lembro-me de Zé Fortuna e Pitangueira com o drama “O Punhal da Vingança”. Tinham que apresentar o show deles e um drama. Havia o Circo e Teatro Ascope.


Se você não fosse radialista o que faria?


Se não fosse radialista gostaria de ter trabalhado na FEPASA Ferrovias Paulista S/A. Meu pai dizia: “Onde o pai trabalha o filho não pode trabalhar”. Para não haver protecionismo.


Como radialista você cobriu noticias policiais?


Em Piracicaba eu fiz. É uma área em que se tem que ter jogo de cintura. Às vezes tinha que entrevistar o contraventor, mas tem que pesar muito, senti-lo, saber como ele está. Fiz a cobertura policial por muito tempo, nunca tive nenhum problema, mas sempre procurei trabalhar de forma a não ofender quem quer que fosse.


Como você vê o rádio atualmente?


É difícil falar. Hoje funciona da seguinte maneira, não importa quantos anos você tenha de rádio ou a sua audiência, você tem que vender. Se você não tiver sua carteira de clientes, amanhã vem um moleque que está começando no rádio, vem com R$ 10.000,00 de vendas, pede o seu horário, dão o seu horário para ele porque o dele é rentável e o seu não.


Baixou o nível do rádio?


Baixou! Hoje o rádio é comercial. Totalmente comercial.


Você fez televisão?


Trabalhei na TV do Silvio Santos, tinha um estúdio em Jaú. Era São Paulo, Jaú. Depois abriu outro estúdio em Ribeirão Preto. Eu gravava os créditos da televisão. E apresentei um jornal falado, entrava na rede. Tive uma rápida passagem pela MIX mineira, eu, Rogério Achiles. Gosto mais de rádio.


O ouvinte usa muito a imaginação ao ouvir o rádio?


Pela voz ele começa a imaginar o locutor, às vezes ele pensa que você é um cara de um metro e oitenta de altura, atlético, olho verde, quando ele vai ver não tem nada disso. Houve uma época em que o público feminino criava ilusões sobre um locutor de voz marcante. Atualmente isso mudou.


Você transmitiu de tudo, por acaso algum sepultamento?


Transmiti o sepultamento do jogador “Chicão”, Francisco Jesuino Avanzi, transmiti pela Rádio Onda Livre. Eu e Edirley Rodrigues fomos acompanhando o féretro até o Parque da Ressurreição. Narrava “Agora pela Avenida Independência nos aproximamos do Campo Santo, onde será sepultado...”. A transmissão foi feita por etapas. No ato do sepultamento narrei: “Acaba de ser sepultado...” Ai tinha diversos jogadores como o Careca, o Almeida., completamos com as entrevistas.








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