domingo, março 13, 2016

MARLENE DE LIMA

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 30 de janeiro de 2016.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADA: MARLENE DE LIMA 

Marlene de Lima nasceu na cidade de Rio Claro, a 24 de maio de 1954, filha de Francisco de Lima, caboclo, e Maria de Lourdes Ondas de Lima, nascida no Brasil. Marlene esclareceu que quanto a palavra Ondas do sobrenome da sua mãe tem um motivo muito interessante, seus avós maternos vieram da região de Trás-os-Montes, Portugal, e narra a história que o avô gostou muito do mar,  o nome dele era Joaquim Carvalho, quando chegou ao Brasil ele colocou seu nome como Joaquim Ondas.
Marlene qual era a atividade profissional do seu pai?
Meu pai era ferroviário, aos 17 anos ele ingressou na Companhia Paulista de Estradas de Ferro, sua função inicial era colocar dormentes nos trilhos. Fez carreira dentro da Companhia, passando por todas as funções: ajudante, foguista, maquinista de locomotiva a vapor. Quando eu tinha 12 anos levava comida para o meu pai na Estação de Rio Claro. Ele fazia as devidas manobras no pátio da estação e discretamente eu permanecia na locomotiva nesse passeio encantador. Moramos sempre na Rua 8-A, Bairro Vila Nova, na cidade de Rio Claro. Meus pais tiveram onze filhos: Maria José, Eunice, Maria Tereza, Marlene, Neusa, Francisco, João Carlos, Sonia Regina, Roseli, Marcelo e José Carlos. Foi uma infância difícil, mas feliz, morávamos em uma casa de quintal muito grande, com muitas plantas frutíferas, vivíamos subindo em árvores, havia frutas durante o ano todo. De casa até a estação de trem, a pé, demorávamos vinte minutos. Passava pela Vila Indaiá, Cidade Nova, chegava à porteira da Avenida 8. O movimento de trens era intenso, por sermos filhos de ferroviários tínhamos uma carteira de identificação que nos permitia viajar de trem. Nossos avôs paternos moravam em São Paulo, íamos sempre para lá, os avós maternos moravam em Itirapina. Em sua carreira como maquinista ocorreram dois desastres graves com o meu pai, um deles foi no dia de Natal, ele estava indo para Rincão, o trem de passageiros lotado, quando ele entra em uma curva, tinha chovido na noite anterior, o barranco caiu. O trem entrou no meio do barranco, meu pai passou o Natal lá, mas graças a Deus ninguém se machucou. A máquina já era elétrica.
A sua característica de preservar a memória da sua família surgiu naturalmente?
Desde pequena eu percebi que tinha o interesse em saber tudo sobre a história da minha família, poucos tinham esse interesse, meus irmãos não entendiam porque eu queria saber tanto. Meu primo, Alfredo Ondas, também tem o mesmo interesse pela história da nossa família. Talvez esse gosto fez com que, quando eu cheguei em Piracicaba e me tornei atleta, depois funcionária pública, eu continuasse os registros naturalmente. Comecei a perceber que isso não era rotina das pessoas, aumentou meu interesse em guardar esse material e disponibilizar às pessoas interessadas. O que eu disponibilizo é muita coisa. Fui professora da rede estadual no bairro Boa Esperança, nos anos de 1987 a 1992, ali registrei umas 200 fotos dos alunos em atividade. Fiz um álbum para esses alunos com todas as fotografias dentro, constantemente esse álbum vai para o bairro, permanece um mês rodando pelo bairro e retorna. Fiz exposições fotográficas, já realizei bastante coisa com o meu material.
Marlene você estudou em escola pública?
Éramos muitos filhos, com uma vida muito dura, eu tive a felicidade, ou o destino, de desde cedo estar envolvida em política, mesmo sem saber. Ao lado da nossa casa havia uma chácara, era de propriedade de parentes próximos ao Dr. Ulisses Guimarães. Eles praticamente nos adotaram com relação ao material escolar necessário. Viam a luta dos nossos pais. Eu não tinha noção da importância disso tudo. Fiz o curso primário no Grupo Escolar Indaiá. A quinta e sexta série eu fiz na Escola Professor Armando Bayeux da Silva, a sétima e oitava séries eu estudei na Escola Professor Odilon Correa. Por volta de 1970 não havia a facilidade de fazer o ensino médio como é hoje. Tinha que prestar um vestibular para entrar, quis o destino que eu não passasse nesse vestibular, fiquei apavorada, meus pais incentivaram muito os filhos a estudarem, tive a sorte de encontrar um amigo que disse que também não havia passado no vestibular, mas ele havia encontrado uma escola técnica, CTA- Colégio Técnico Agrícola de Rio das Pedras. Nesse colégio havia Economia Doméstica para as mulheres, que era equivalente ao ensino médio, foi uma luta fazer o meu pai entender que tinha que sair de Rio Claro para morar dentro da escola! Duas colegas, vizinhas da minha casa também se interessaram e o pai de uma delas nos trouxe até o Colégio de Rio das Pedras. Com isso formei-me em Técnica em Economia Doméstica. Foram três anos de curso, no segundo ano, a professora de Educação Física descobriu que eu tinha talento para o atletismo. Eu corria muito bem. Ela trazia os alunos para participar dos campeonatos em Piracicaba. Foi ela que me disse que Piracicaba tinha uma equipe de competição e que era importante que após concluir o curso de Economia Doméstica, que eu procurasse o pessoal de Piracicaba, era possível que eu conseguisse entrar na equipe. Assim eu fiz. Terminando a escola não voltei para a minha casa. Empreguei-me como balconista na Eletroradiobraz de Piracicaba, arrumei uma pensão para morar, fui procurar o Idico Luiz Pellegrinotti, o “Deco”.  Ele estava treinando uma turma de jovens para formar uma grande equipe. Isso foi em 1975. Ele pediu que eu corresse na pista de atletismo em volta do campo do XV de Novembro, acho que dei umas 8 ou 10 voltas. Quando eu parei ele disse-me: “-Daqui a três meses irá ocorrer os jogos regionais de São Carlos, você quer participar?”. Disse-lhe que queria. Ele me colocou na equipe, com isso ganhei uma bolsa de estudo para fazer a Faculdade de Educação Física, em troca eu iria ser atleta da cidade de Piracicaba. Foi uma grande alegria, em três meses já consegui obter resultados, passei a participar de todas as grandes competições no país, fui bi campeã brasileira universitária, bati o recorde no dia 12 de junho de 1977 no Ibirapuera, onde nós fomos campeãs estaduais em uma das provas, revezamento 4 por 400 metros, foi corrida no tempo de 3 47.9 um tempo fantástico para a época. As quatro corredoras eram: Conceição Jeremias uma grande atleta que participou de cinco olimpíadas, Aparecida de Fátima Adão que era campeã Sul Americana, campeã Brasileira, Maria Teresa Ferreira que tinha batido o recorde mundial juvenil na França e eu, Marlene de Lima, campeã Brasileira. Participei de jogos regionais, dos jogos abertos, participei de muitas competições.
Você tem uma idéia de quantas competições já participou?
 Foram três anos intensos em que participei de todas as grandes competições do país todo. Fui sexto lugar do Troféu Brasil em Porto Alegre, fui finalista dos 800 metros, na final Piracicaba conseguiu colocar Aparecida de Fátima Adão e eu.
A prática dessa modalidade dá condições ao atleta de participar de uma corrida nos moldes da São Silvestre?
Na realidade até daria na época, mas como eram muito intensas as competições no Brasil todo, tínhamos o Campeonato Paulista, Troféu Bandeirantes, Jogos Regionais, Jogos Abertos, Campeonatos Universitários, Campeonatos Regionais, o tipo de treinamento era especifico para as provas de 400 e 800 metros, são corridas de velocidade e a São Silvestre é uma corrida de fundo. Todos os meus tempos, na época, eram para menos de um minuto, eu fazia para 59 segundos. Em Porto Alegre consegui correr 800 metros em 2 minutos e 17 segundos.
Sem querer ser saudosista, você acha que o atletismo sofreu um processo de decadência?
Atrás dos atletas tem que ter a mão de um grande técnico. Nós tivemos a felicidade de nessa época ter o Idico Luiz Pellegrinotti, que era um visionário, um idealista. Ele sonhava em transformar todos os seus atletas, não só em campeões de pistas, mas em campeões da vida. Ele lutava muito para que todos nós estudássemos. A grande maioria desses atletas que passaram pela mão do Idico Pellegrinotti tornou-se vencedores dentro e fora das áreas esportivas. Posso citar alguns nomes como Dr. Mário Telles, hoje um ortopedista de renome, o Fifi que era da Guarda Mirim de Piracicaba tornou-se um conhecido engenheiro. Muitos profissionais da Educação Física, como eu, Marlene de Lima, Olaria, Margarida, Aparecida de Fátima Adão, Denise Schiavinatto. A psicóloga Rita Furlan, Maria Eugenia, filha do Zequita aqui de Piracicaba, atleta do meu tempo, hoje fisioterapeuta da Seleção Brasileira de Ginástica Artística, onde ela é responsável pelo Mario Zanetti, o Campeão das Argolas. O técnico era muito importante, ele participou de três estágios na Alemanha, buscava conhecimento. Eu acredito que estávamos no momento certo. Naquele tempo havia um interesse muito grande dos jovens pelo esporte, eram mais idealistas, participativos. Dentro das escolas estaduais éramos orientados para a prática esportiva. O esporte era tido como algo fantástico. De repente o ensino mudou. No momento em que a Educação Física mudou de turno já se quebrou a prática do esporte. O grande problema de não termos mais um basquete em Piracicaba, um atletismo tão forte, é porque houve uma interrupção dentro das escolas de base. Se for perguntar, todos os grandes atletas começaram na escola de base. Hotência, Paula, foram incentivadas dentro da escola estadual.
Isso significa que o esporte deve ser incentivado nas escolas?
A força do esporte está nas escolas. Na base. Desde pequenininho, quando entra no primário, até ele chegar à idade de definição, quando ele entra para o ginásio. Isso não existe mais. O mundo mudou, as mídias chegaram, as realidades são outras.
Voce acredita que os pais são responsáveis por essa mudança?
É um conjunto, responsabilizar apenas os pais não é correto, eles não têm força junto as escolas, quem tirou isso tudo das escolas foi a diretriz de ensino. Ela transformou a Educação Física dentro de uma grade curricular no horário de aula. Como um aluno pode ter matemática, português, educação física e história? Não se admite isso! Voce vai com uma roupa comum para a escola, fui professora da rede estadual até 2011. Sai decepcionada em 2011, quando me aposentei da rede estadual. Dei aula de educação física por 25 anos. Boa parte desses anos todos foi de pura alegria. Consegui passar para muitos jovens a importância da pratica do esporte. A importância dele se tornar atleta para poder ter uma ascensão social através de bolsa de estudo.
Em sua visão a indumentária utilizada em uma aula de história não irá ser apropriada para a prática de uma aula de educação física?
Em hipótese nenhuma! Entendo que a educação física tem que ser o contra turno, em um turno as aulas normais e em outro turno a educação física. É dessa forma que ira se conseguir estimular o jovem a não ter a preocupação de uma sala de aula. Ele vai lá para praticar o esporte. Esse jovem terá muito mais possibilidade de se interessar por aquilo que será passado se estiver fora de um horário de aula normal.
Nos três anos em que você estudou no Colégio Agrícola de Rio das Pedras qual era a sua forma de lazer?
Morávamos em frente a Igreja Matriz em Rio das Pedras, hoje no local existe uma agência bancária, ali residiam todas as meninas que estudavam no colégio interno, nós passávamos o dia no colégio íamos até esse alojamento só para dormir. Nós ajudávamos a limpar a escola, a fazer as refeições, tinha uma cozinheira, nós éramos ajudantes. Muitos produtos que consumíamos vinham da horta dos meninos que estudavam no Curso Técnico Agrícola. Tínhamos grandes professores, como por exemplo, Frederico Alberto Blaauw, uma sumidade, deu aula de português no CTA de Rio das Pedras. Regina Dória Sanflorian foi minha professora de educação física, na cidade de Rio das Pedras, ela que descobriu que eu tinha talento para o esporte. Fui muito feliz em Rio das Pedras porque foi um marco de mudança na minha vida. Aos domingos nós alunas íamos à missa, depois ficávamos no alojamento, não tinha televisão, eu lia muito. Lembro-me que eu tinha muitos livros. Tinha uma grande amiga Dirce Salati de Almeida, infelizmente ela já faleceu. Eu pratiquei atletismo só por três anos, tive uma lesão muito grave e não pude participar mais de esporte. Nesses três anos fui muito feliz, conheci muita gente por conta dos Jogos Regionais e Jogos Abertos, convivia muito com Maria Helena, Heleninha, pessoal do basquete, assim como convivi muito com o pessoal do vôlei, todos os esportes se interagiam. Logo que me formei, Maria Helena, Heleninha, viajavam com a Seleção Brasileira e me convidavam para substituí-las nas escolas onde lecionavam educação física. Foi dessa forma que ingressei como professora na rede de ensino estadual. Eu já era funcionária publica municipal, logo que terminei a minha carreira dentro do atletismo tornei-me uma estagiária de educação física, e logo me tornei professora de educação física da rede municipal. Naquela época não havia concurso, havia a indicação. O Fernando Guerra e o Luiz Antonio Chorilli disseram-me que estava começando um movimento muito grande na cidade e que era um trabalho social. Instituir educação física nos centros comunitários da cidade. Com essas pessoas eu tinha muito respeito, o que eles falavam para mim, eu fazia. Fui para o Centro Comunitário dar aulas. Eu mal sabia que no ano de 1977 estava começando um grande projeto social, que se tornou a minha carreira na Prefeitura do Município de Piracicaba. Um trabalho social atuando em centros comunitários, junto a Associações de Bairros, em vários projetos voltados à população em um trabalho integrado com várias secretarias de governo.
Você continuou lecionando na rede estadual de ensino?
Naquela época o fato de ser professora na rede estadual não estabelecia um vinculo com o Estado como tem hoje, em que você é obrigado a ter 20 horas semanais de aulas. Com 9 horas semanais já podia ser professor da rede estadual. Por um bom tempo eu entrava dando aulas de educação física as seis e meia da manhã e às nove horas da manhã já estava livre para trabalhar na prefeitura. Sempre sob a orientação da Maria Helena que me dizia: “-Nunca deixe a rede estadual, nunca deixe a prefeitura, porque lá no futuro você irá ter um ganho muito grande”. No ano de 2008 aposentei-me na prefeitura do município e no ano de 2011 aposentei-me na rede estadual. Sou muito grata à essas pessoas que me deram a mão lá no passado. Lecionei na Escola Mirandolina de Almeida Canto de 1983 a 1986. No ano de 1987 fui lecionar na Escola Samuel de Castro Neves, no bairro de Santa Olímpia, para mim foi uma alegria enorme. Imagine trabalhar em uma escola que quando chegava a safra não tinha aluno. Eu perguntava à diretora: “- Onde estão os alunos?” e ela respondia: “- Eles estão todos cortando cana-de-açúcar!” Eu ia no meio do canavial. É uma pena que eu não tenha fotografado. 

A professora de Educação Física Marlene de Lima já foi atleta de destaque nacional. Conviveu com as grandes estrelas do esporte nacional radicadas em nossa cidade. Apaixonada pelo esporte, Marlene de Lima conseguiu a proeza de unir a máquina pública para incentivar a prática esportiva. Passou por diversos governos, das mais variadas correntes políticas, mantendo o foco no esporte. Tem como característica pessoal documentar através de fotografias a evolução ocorrida no esporte piracicabano nos últimos quarenta anos. Aposentada, continua com sua paixão dedicando-se ao esporte da Terceira Idade. Tem revelado valores significativos nessa área, mas acima de tudo, ajudado a proporcionar uma qualidade de vida melhor aos integrantes da Terceira Idade.  
Antigamente, nas escolas publicas, as aulas de educação física eram fora do horário normal utilizado para outras matérias?
As aulas de educação física tinham horário diferenciado. Havia muito empenho em adaptar tudo para incentivar o aluno. Em Santa Olímpia um aluno manifestou seu desejo de jogar tênis de campo. Construímos na terra uma quadra de tênis de campo. Comprei as raquetes e meus alunos passaram a ter aulas de tênis de campo. Tenho no facebook um grupo chamado Arquivo fotográfico de Piracicaba, já tenho uns trinta álbuns e essa história que estou contando pode ser vista em um dos álbuns que estão lá. Inclusive há fotos das adaptações feitas nas aulas de educação física, como eram feitas na década de 80. Era tudo feito com muito carinho e os alunos fazendo aulas com qualidade. Sai da Escola Samuel de Castro Neves e fui para a Escola Carlos Sodero no bairro Boa Esperança, onde fiquei de 1988 até 1992. Também uma escola fantástica. Depois fui para a Escola Helio Penteado de Castro, no Parque Piracicaba – Balbo onde permaneci até o ano de 1996. Em seguida fui para a escola de Tupi, voltei para a Escola Mirandolina de Almeida Canto onde trabalhava com a criançada de primeira até quarta série. A primeira coisa que fiz na escola, junto com a diretora, foi resgatar a fanfarra. Fui buscar o famoso Zé Hélio, ele desenvolveu um projeto na escola. Quem comandava a fanfarra eram os alunos mais velhos, o Zé Hélio treinou a criançada, ele era o professor, mas quem conduzia a fanfarra eram os próprios alunos.
Como vocês conseguiram adquirir os instrumentos?
Através de doações, a Associação de Pais e Mestres da escola conseguiu doações, compraram, tinha uns quarenta alunos que participavam. Foi um marco na escola a participação da fanfarra em desfiles de 7 de Setembro, encontros de fanfarras no Engenho Central, tenho tudo documentado, eram eventos que aconteciam no Engenho e eu trazia as fanfarras. . Em seguida fui para a Escola de Anhumas. Depois fui para a Escola de Tanquinho. Aposentei-me quando lecionava na Escola Estadual Professora Avelina Palma Losso localizada no bairro Santa Rosa. 
O que você acha sobre a divulgação das realizações feitas em Piracicaba?
Por conta de coordenar o trabalho com o pessoal da Terceira Idade viajo muito. Faz 40 anos que estou em Piracicaba, só trabalhando, eu não tenho família em Piracicaba, isso permite que eu esteja disponível diuturnamente para o trabalho. Faço o que gosto, convivo até hoje com o pessoal da prefeitura, tenho trânsito em todas as secretarias de governo, conheço muita gente. Eu tiro o chapéu, esta cidade faz muito. Todas as secretarias de governo que atuam com crianças, jovens, adolescentes, com adultos, cada um fazendo o seu trabalho. Desde o tempo em que eu atuava de uma forma direta na prefeitura, sempre dizia que os grandes terminais de ônibus da cidade de Piracicaba: Terminal Central, da Paulicéia, Cecap, Piracicamirim, Vila Sônia e São Jorge, só esses terminais abrangem uma grande massa da população que usa o serviço. Eu que vivi muito tempo, usaria algumas formas para divulgar mais ainda os eventos que ocorrem na cidade.
Você trabalhou quantos anos?
No Estado foram 25 anos, na Prefeitura Municipal de Piracicaba estava na Secretaria de Esportes, aposentei-me após 33 anos de trabalho. A maioria dos projetos que desenvolvi era de finais de semana. Acredito que foi quase um sacerdócio dentro da prefeitura do município.  Todos os projetos em que eu era envolvida eram sociais: Jogos Comunitários, Manhãs de Lazer, Trabalhos com Terceira Idade, eventos de lazer na cidade, eram voltados à população, desenvolvidos junto com diretorias de centros comunitários. Preparava-se tudo durante a semana para realizar aos finais de semana.
A cada mudança de administração possivelmente são estabelecidas novas metas e novos objetivos. Isso às vezes não chocava com o projeto que você estava desenvolvendo, principalmente se o projeto era para ser realizado em longo prazo?
No ano de 1992 fui convidada a escrever sobre exatamente isso. Escrevi a respeito umas 10 páginas para uma editora ligada a UNIMEP. O título era “A Eterna Transição do Esporte e Lazer na Cidade de Piracicaba” Mencionei todos os governos para os quais trabalhei e quais eram os projetos públicos e no final consegui concluir que os projetos de uma forma ou de outra que o Esporte fazia, não foram interrompidos. A população não era tão grande como é hoje, há 35,30, 25 anos, os grandes bairros da cidade como Piracicamirim, Jardim São Paulo, Paulicéia, Santa Terezinha, Balbo, já estavam acostumados com as atividades de lazer aos finais de semana, aos campeonatos de futebol. Não havia o interesse por parte da administração que assumisse em terminar esses projetos. Eram seqüenciais. Tanto que os jogos comunitários têm 33 anos de existência. Eram projetos suprapartidários. Posso afirmar que a parte que eu coordenava não teve interrupção. Obvio que tinha novas ópticas de trabalho. Eu ia adequando.
O basquete que já nos deu muito orgulho, e em particular, o basquete feminino, como está hoje?
Eu costumo afirmar que o basquete de Piracicaba quem viu, viu! Tenho gravações de grandes partidas da Paula, de vez em quando eu vejo. Quem viu as grandes estrelas como nós tivemos, peguei o finalzinho da Maria Helena e Heleninha, mas tive a oportunidade de acompanhar toda a geração da Paula, sendo que me tornei uma amiga da família, particularmente da Dona Hilda Gonçalves, era uma mulher apaixonada pelo trabalho dela, brigava pelas filhas, pelas escolinhas, para dar condições para que continuassem. O esporte é uma atividade muito bonita, essas meninas são maravilhosas, comove ver a humildade da Paula, da Branca. Essas coisas me emocionam. O esporte mostrou tudo isso para mim. Convivi com muitos “monstros sagrados”. Mantemos relacionamentos com amigos que conhecemos há quarenta anos, estrelas que brilharam no cenário nacional. Há uma grande amizade entre nós.
Quantas medalhas você conquistou?
Acredito que são umas 80 medalhas, muitos troféus e muitos prêmios na carreira. Um prêmio fantástico me foi dado pelo “Educando Pelo Esporte”, que é o Premio Rocha Netto. Tive o meu trabalho reconhecido o tempo todo.
A seu ver o esporte tem que ser repensado em nosso país?
Tem que ser totalmente repensado, a educação em nosso país tem que ser repensada. A mudança que se faz necessária passa pela educação. Não se resolve a educação com idéias mirabolantes, a criança tem que passar o dia inteiro na escola, o ensino e a educação tem que serem completos. Transformar o aluno em um futuro cidadão tire-o um pouco dessas mídias que atuam no subconsciente, é o subconsciente que rege a nossa vida. É só analisar um jovem que fica o tempo todo nas mídias sociais, você acha que ele terá algum bom caminho?
O que você diz sobre a Terceira Idade?
No governo Collor eu trabalhava na Secretaria do Desenvolvimento Social, na prefeitura do município, aconteceu uma reunião da LBA – Legião Brasileira de Assistência, com todos os profissionais que atuavam em áreas sociais, ela convocou todas as forças vivas da cidade, o SESC, o SESI, a Prefeitura do Município, e veio com a diretriz de que o segmento da Terceira Idade deveria ser estimulado. O SESC fez algumas reuniões preparatórias com os técnicos, alguns palestrantes, esse segmento para nós era novidade, até então nossos pais ficavam dentro de casa, de chinelos, esperando talvez a morte chegar. E vem de repente essa possibilidade de trabalhar. Juntamente com outros profissionais fomos pioneiros, nós começamos a atuar junto a Terceira Idade. Foi uma alegria muito grande. Isso foi no ano de 1985, o primeiro Clube da Terceira Idade foi no Jardim Primavera, chamava-se Clube da Vovó, eram mulheres que se reuniam no Centro Comunitário e nós da Educação Física que estudávamos as possibilidades: gincanas, caminhadas, encontros no Engenho Central, o projeto foi crescendo, fui trazendo profissionais para ajudar, não demorou muito estavam jogando até vôlei adaptado. Eu tenho fotografias dessa época. Imagine um grupo da Terceira Idade, em circulo, fazendo exercícios, isso na Escola de Agronomia Luiz de Queiroz.  Até a forma de vestirem-se mudou. Deu certo de tal forma que se iniciou uma febre de atividade em 1992 a UNIMEP, o SESC, a Prefeitura e outras entidades reúnem-se e lançamos os Primeiros Jogos Municipais da Terceira Idade. Esses jogos existem até hoje. É direcionado aos grupos da Terceira Idade da cidade, onde tem jogo de malha, bocha, jogo de baralho (buraco), dominó. No ano de 1995, na cidade de Osasco começa um movimento de jogos de competição. O professor José Orlando de Almeida foi até a cidade de Osasco, ajudou-a a se organizar, durante 10 anos seguidos Piracicaba foi convidada especial dessa grande competição da cidade de Osasco, onde se reuniam representantes de toda a Baixada Santista, Grande São Paulo e Piracicaba.
Mais ou menos quantos idosos de Piracicaba participavam?
Partiam mais ou menos 45 idosos atletas que permaneciam por uma semana lá. Fomos 10 anos campeões dessa competição, até que um dia terminou, ninguém conseguia ganhar da representação de Piracicaba. Em 1997 o Governo do Estado de São Paulo lançou os Jogos Regionais e os Jogos Estaduais do Idoso. Sou coordenadora dos Jogos Regionais do Idoso em Piracicaba desde o primeiro è realizado pelo Governo do Estado de São Paulo, através do Fundo Social de Solidariedade coordenado pela Primeira Dama do Estado, Dona Lu Alckmin e pela Secretaria de Esportes, Lazer e Juventude do Estado de São Paulo. Eu não coordeno sozinha, sou aposentada, não tenho vinculo interno com a prefeitura. Eu coordeno a Seleção Piracicabana da Terceira Idade em conjunto com a professora Renata Ganciar da Secretaria de Esportes.
Essa competição envolve quantos idosos?
Essa competição tem a participação de 300 cidades, são 25.000 atletas a partir de 60 anos, com diversas categorias, a última é dos atletas de 85 a 90 anos. Passamos por 10 fases de classificação, Piracicaba é da Região de Campinas que abrange 55 municípios. O primeiro e segundo colocado das quatorze modalidades coletivas e individuais vai para a grande final. Piracicaba ostenta por 10 anos seguidos o fato de ser campeã regional e 6 vezes campeã estadual nos últimos anos. É uma das maiores equipes do Estado de São Paulo. É uma das maiores competições do gênero na América Latina, realizada pelo Governo do Estado de São Paulo, em 2016 estaremos completando 20 anos de competições.
O Governo Federal não participa dessa iniciativa?
Há uma tendência de esse projeto tornar-se em Jogo Brasileiro dos Idosos. O projeto já está em Brasília, estamos encontrando uma dificuldade muito grande porque a rubrica, a verba, está dentro de um Ministério onde é dividido com os Jogos Brasileiros dos Indígenas. Há uma luta para que também tenhamos o nosso quinhão.
Os Jogos Regionais do Idoso exige muitos recursos? 
A logística dele não é tão complicada, a prefeitura participa com seus profissionais na modalidade de vôlei e atletismo. Os atletas treinam nos próprios municipais. Há parcerias, como a prefeitura e o Clube de Campo, onde ocorre a natação e o tênis de campo. Com o Clube Cristóvão Colombo com o tênis de campo.
Até por uma razão financeira incentivar a saúde dos idosos é muito mais barato do que o governo arcar com tratamentos de saúde de pessoas sedentárias?
O médico Dr. Pedro Mello, Secretário da Saúde, foi Secretário de Esportes em 2005 até 2012, em sua gestão era enfático o tempo todo para que os idosos tivessem motivação em atividades, sempre dizia que a relação custo-benefício é muito maior mantendo o idoso em atividade do que deixá-lo em casa sujeito a doenças próprias da idade e do sedentarismo. O Dr. Pedro é um grande incentivador juntamente com o Secretário de Esportes Lazer e Atividades Motoras João Francisco Rodrigues de Godoy, o Johnny, que é um entusiasta.
Hoje vemos que a pessoa integrante da Terceira Idade tem um comportamento menos formal do que há algumas décadas.
Brinco muito dentro do ginásio de esportes quando viajo, olho para os pés dos atletas, os tênis chamam muito minha atenção. São pessoas com 60,70,80 anos com roupas esportivas, descontraídos. O município os incentiva nesse aspecto. São roupas lindas fornecidas pelo próprio município. Neste ano tivemos o patrocínio da Amhpla. Conseguimos patrocínios para que essas roupas sejam feitas: roupa de vôlei, de atletismo, para jogar truco. É obrigatório o uso do uniforme. O truqueiro nosso é o José Beneditto Massarutt, já foi por diversas vezes campeão estadual nessa modalidade. O companheiro dele é o Odair Athanazio.
Marlene, Piracicaba tinha um grande acervo de troféus da Comissão Municipal de Esportes, onde eles se encontram?
Tenho um sentimento muito grande com relação a esses troféus, eu gosto de preservar a história. Muitos desses troféus estão com as modalidades. Eu acredito que há muitos troféus guardados em alguma sala do Estádio Municipal. Acredito também que já passou do tempo para que esses troféus sejam resgatados, reparados, organizados, para que fique em algum lugar onde todos possam ter acesso.
Você acredita que Piracicaba está na hora de criar seu Museu do Esporte?
Já passou da hora! Acho que poucas cidades têm o material que nós temos. Hoje os museus usam a mídia, com a possibilidade de que cada modalidade esportiva possa passar tudo que ela tem. Quantas modalidades têm em nossa cidade que foram grandes campeãs? Quantos atletas olímpicos têm em Piracicaba? Quantas histórias serão perdidas? Embora eu estivesse lotada em uma secretaria, trabalhei no gabinete dos prefeitos junto a todas as primeiras damas. Eu coordenava projetos de eventos com isso participava de todos os eventos. O primeiro prefeito com o que trabalhei foi João Hermann Netto a primeira dama era a Macau, depois Adilson Maluf, foi quando entrei mesmo no gabinete com a primeira dama Rosa Maria Bologna Maluf. Foi quando fiz parte de uma comissão formada pela Rosa Maria, Silvia Petrocelli, Claudia Paleo, era um grupo que gerenciava todos os projetos, eventos de esporte e lazer da cidade. Rosa Maira que é a responsável dos Jogos Comunitários, pela Festa das Nações, hoje Rosa Maria é atleta da Seleção Piracicabana da Terceira Idade. É uma grande atleta de natação, representou Piracicaba nos Jogos Regionais do Idoso. Classificou-se para os Jogos Abertos do Idoso, ela esteve em dois grandes eventos nas cidades de Mogi-Guaçu e na cidade de Campinas. Foi podium, medalhista, ela consegue no Clube de Campo me ajudar a agregar mais pessoas.
Hoje você tem sob sua supervisão quantos atletas da Terceira Idade?
Eu trabalho só com atletas de Piracicaba, são 150.
E esse pessoal da Terceira Idade que freqüenta as academias de bairro?
São milhares, passa dos 5.000. Quem pode afirmar com precisão é o Clevis  Spada e a  Mônica Graner da Secretaria de Esportes.
Esses aparelhos são importantes para incentivar o atleta?
São fundamentais, hoje em dia sabemos que o nosso corpo quando chega a certa idade se você não colocá-lo para funcionar, se não for ativo, a sua tendência é não ter energia para pensar, seguir sua vida.  Nosso corpo nada mais é do que atividade o tempo todo. È ele que vai oxigenar o cérebro.
Marlene de Lima como atleta como é?
Hoje faço pequenas caminhadas, sou apaixonada pelos meus atletas de 60,70, 80 anos. Supervisiono o trabalho acompanho o treinamento de natação, atletismo, vôlei, tênis de campo, tênis de mesa, são atividades intensas onde eles têm que submeterem-se ao ano todo a treinamentos, para competirem e representar bem a cidade.
Você cobra rendimento dos atletas?
Na realidade não preciso cobrar dos atletas da Terceira Idade. Eles têm dentro deles essa vontade. É uma alegria ver Amires Cobra, aos 87 anos nadar 25 metros! Rubens Machado, aos 88 anos ir viajar para nadar representando nossa cidade. Felício Lantanze com 86 anos praticando natação e dança de salão. Esses atletas com 80, 90 anos, são uma grande alegria. João Caetano Fonseca, irmão de Pecente, descobre que é capaz de representar a cidade de Piracicaba aos 83 anos. Contaram para mim que tinha um senhor do Lar dos Velhinhos que fazia caminhada, eu precisava de um senhor para fazer 600 metros de caminhada em Mogi-Guaçu. Fui até o Lar do Velhinhos, conversei com a assistente social, e fui conversar com o Barbieri. Seu filho levou-o a Mogi-Guaçu, ele fez a caminhada de 600 metros. Só que ele não ficou famoso só pela caminhada, é que quando terminou a competição ele perguntou se podia cantar o Hino de Piracicaba. Ele cantou, parou completamente a pista de atletismo. Antonio Carlos Bicheiro, um português que tem dois filhós médicos, é aos 80 e tantos anos corredor da São Silvestre, ele tem um pacote de medalhas.
Voce nasceu em Rio Claro, esta há 40 anos em Piracicaba, já é Cidadã Piracicabana?
Um dia escutei Cecílio Elias Netto dizer que para ser cidadão piracicabano basta chegar à beira do Rio Piracicaba, se molhar, se batizar, eu já fui lá e me batizei! Eu amo esta cidade, tudo que conquistei foi aqui. Convivi com monstros sagrados, com profissionais incríveis como Aracy Lovadini, todas primeiras damas do município com as quais atuei, particularmente a Rosa Maria Bologna Maluf, Janete Machado, Vanda Campos, Sandra Negri, atualmente a Dona Selma Ferratto. Foram primeiras damas fantásticas que me ajudaram muito. Asssim como todos os secretários de esporte que passei por eles: Rubens Braga, José Carlos Hebling, Dr. Pedro Mello, o Secretário de Esportes, Lazer e Atividades Motoras João Francisco Rodrigues de Godoy, o Johnny, é tanta gente que é impossível lembrar o nome de todos. As mídias de Piracicaba, sempre colaboraram e muito no desenvolvimento do nosso trabalho. Quando vou a Câmara Municipal recebo um carinho muito especial dos vereadores, em especial do João Manoel e do Longatto. Sendo que esses dois vereadores eram líderes comunitários e trabalhavam com crianças carentes. Eu organizava os campeonatos para as crianças carentes, era muito comum recebê-los em minha sala o João, o Longatto com as careteirinhas das crianças. Fica uma amizade muito bonita. Tenho que agradecer muito aos líderes de Associações e Centros Comunitários de todos os bairros de Piracicaba. Foram eles que junto com os profissionais da prefeitura, particularmente as assistentes sociais, deram inicio a tudo isso. Eu era da área de Educação Física estava junto com elas. Os grandes projetos públicos surgiram em momentos muito felizes da prefeitura. Tudo estava para fazer e foi feito. José Roberto Pianelli (Beto Pianelli) foi meu Secretário de Esportes, outra pessoa fantástica. Conto com o apoio muito especial do Dr.Pedro Mello,que em janeiro de 2009,fez eu entender que tinha ainda muito para contribuir na comunidade, com o meu trabalho,e desde então estamos próximos com objetivo único:possibilitar melhor qualidade de vida aos praticantes do esporte-competição da terceira idade.




ANTONIO (TONY RODRIGO) RODRIGUES

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 23 de janeiro de 2016.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: ANTONIO (TONY RODRIGO)  RODRIGUES


Antonio Rodrigues nasceu a 1º de setembro de 1940 na cidade de Andradas, no Estado de Minas Gerais, é filho de Manoel Rodrigues e Ana Teixeira Rodrigues, que tiveram treze filhos sendo que Antonio é o mais novo. Seus pais eram de Amarante, Portugal. No Brasil chegaram em 1912, desceram no porto de Santos, e dedicaram-se ao cultivo agrícola. È interessante ressaltar que Manoel e Ana já se conheciam em Portugal, mas namoraram e casaram-se no Brasil, em Jacutinga. Permaneceram em Andradas até 1942. Antonio Rodrigues reside em Piracicaba, é além de tudo um artista no violão e dono de uma voz que deixa toda e qualquer platéia maravilhada. Sempre solicito, canta pelo prazer, participou de grandes programas em televisão e rádio. Gravou musicas em Compact Disc (CD). É um artista completo que por opção pessoal seguiu a carreira profissional em outra área, que também envolve muita técnica e arte, a de modelista. É um dos grandes nomes da história da indústria automobilística nacional. Casado em segundas núpcias com Lina Valentim Rodrigues.
Você nasceu em Andradas e foi criado em que cidade?
Nasci em Andradas e fui criado em São Paulo. Fomos morar na Vila Alpina. Mudamos para São Caetano do Sul onde meu pai adquiriu um terreno e construiu uma casa. , estudei na Escola Dom Benedito Alves de Souza. Minha primeira professora foi Maria Soledade. O ginásio eu estudei no Instituto Rocha Pombo.
Você já estava trabalhando?

Comecei a trabalhar aos nove anos, tinha que ajudar a família. Meu pai fez uma caixinha de engraxate, eu ia para o campo de futebol e exercia minha atividade. Ia almoçar em casa, depois ia para o Clube da General Motors, havia jogo de boliche, eu ficava levantado pinos até umas quatro ou cinco horas da tarde. Eram pinos de madeira. Fiz isso até os doze anos, fui trabalhar em uma loja cujo proprietário era do São Caetano Esporte Clube. Eu gostava de jogar bola ele acabou me levando para treinar no time. Jogava como ponta esquerda. Só parei porque aos 17 anos tive um acidente durante um jogo, um adversário com chuteiras com cravos atingiu minha perna. Permaneci 45 dias em casa me recuperando, foi um corte extenso. Passei a jogar ping-pong, hoje denominado de tênis de mesa, no SESI em São Caetano. Fomos campeões intermunicipais, ganhamos o campeonato do ABC e região: São Bernardo, São Caetano, Diadema , Piraporinha e Ribeirão Pires. Como exercício individual, pratiquei natação. A GM – General Motors tinha um grupo de escoteiro, participei desse grupo. Comecei a freqüentar o SENAI, passei a trabalhar na Aços Villares, naquele tempo ficava-se seis meses na Escola SENAI e seis meses na fábrica. E a noite eu estudava o colegial. Na Escola de Desenho 28 de Julho fiz o curso de desenho técnico. Isso em uma época em que havia fila para entrar nas salas de aula colocava-se um a mão no ombro do colega da frente, cantava-se o Hino Nacional. No Dia da Bandeira cantava-se o Hino à Bandeira. Fiz o curso SENAI durante o dia e também o SENAI a noite, onde fiz o curso de modelação, na Escola Castro Alves C-22, no Cambuci. Quando me formei na minha carteira de trabalho colocaram como “Aprendiz Qualificado”.

Da Villares você foi trabalhar em que empresa?

Fui trabalhar na Ford. No inicio tive que desempenhar funções diferentes da que pretendia: eu queria ser modelador.  Nessa época surgiu o Renault, Dauphine, Gordine, ajudei a montar todas as máquinas da linha de montagem, eu sempre ia ao Departamento de Engenharia, queria saber quando passaria para a modelação. Até que em um dia no Departamento de Estilos da Jeep Willys estavam precisando de um modelador. Permaneci lá quase 10 anos, já pertencia a Ford. No Departamento de Estilos trabalhei desde 1963 até 1967.

O que fazia o Departamento de Estilos?

Na época para sair um carro novo na rua demorava-se três anos, um especialista em desenho recebia sugestões do carro desejado, ele então desenhava aquele carro. Ai vinha para o modelador, geralmente diziam: “-Queremos que voce faça isso aqui em escala 1 por 5”. Ou seja, exatamente igual, só que em tamanho cinco vezes menor. As rodas eram torneadas em madeira, com dois pauzinhos fazíamos a longarina, colocava-se um pedaço de compensado em cima, fazíamos uma gaiola, colocávamos longarinas onde é o capô, o teto, em cima daquilo colocávamos um barro especial que colocado em estufa ele amolecia, era preenchida a superfície além do limite, o que estava no papel era feito em escala 1 por 5, saia direitinho.

Tem que ter uma mão de escultor para fazer, ou seja, tem que ser artista?

Entra arte, técnica, o artista não trabalha bem com medida, trabalha mais com proporção. Vinha um desenho para nós com comprimento, largura, bitola, altura, por exemplo, a altura com relação ao chão era padrão. Assim como a altura do para choque, dos faróis, altura do teto.

E as curvaturas?

As curvaturas íamos sempre nos baseando nas medidas do comprimento, largura e altura, dentro da altura máxima fazíamos uma longarina que chegava ao teto, na linha de centro. Depois fazíamos mais duas linhas coordenadas, uma de cada lado em relação a linha de centro. Acompanhando o desenho. Para fazer as curvas tínhamos ferramentas próprias, espátulas, uma infinidade de curvas francesas, era uma escultura técnica.

Tinha que ser artista para fazer isso tudo?

Eu não me considerava um artista. Na modelação voce faz o desenvolvimento de superfície. Tem que ter noções de raios. Uma vez fizemos o modelo de um carro cujo emblema era o Diabo montado no garfo. Fizemos o protótipo, naquele tempo havia uma exposição de carros no Ibirapuera. Não foi aprovado porque o chassi era tubular. Quando a pessoa subia em uma calçada com o carro não conseguia abrir a porta. O Departamento de Estilos no Brasil começou naquela época. Os carros que chegaram aqui foram o Dauphine, Gordini. O Simca veio depois. Da Ford fui para a General Motors onde trabalhei por quatro anos, depois fui para a Chrysler onde trabalhei por cinco anos. Quando trabalhei na Simca fizemos o Dodge Polara, era um carrinho bonito, forte. Na GM fui o primeiro funcionário a ser admitido como Modelador de Estilo. Entrei como Modelador Senior. Lá eu trabalhei de 1967 até 1972.

Modelador de Estilo era uma figura rara na época?

Não existia! Tanto que quando fui para a Chrysler fui como supervisor, a Simca estava sob o comando da Chrysler, fui buscar modeladores conhecidos meus, que já eram do ramo. Se anunciasse a vaga não aparecia ninguém. Na GM trabalhei na criação do Opala, o nome faz referência a uma pedra, o mentor desse nome foi um designer chamado Carlos Alberto de Oliveira. O diretor de engenharia disse que íamos inventar um carro aqui. Eu dava estimativas: vai demorar tanto tempo, quero tantas horas, preciso disto, o pessoal que estava junto comigo se empenhava para entregar tudo no prazo pré estabelecido. Lembro-me que na Chrysler ia vir o painel de instrumentos do Dodge Charger, estávamos aguardando a vinda do painel, julgaram que não tínhamos condições de fazer um painel de luxo, compatível com o carro. Sugeri que fizéssemos um painel, para mostrarmos que também, sabíamos fazer. A nossa equipe fez o painel, utilizando o material que era da época, os americanos vieram, fizeram uma palestra de umas duas horas, quando acabaram a apresentação, mostramos nosso painelzinho, ficaram encantados, o nosso painel é que acabou sendo adotado. O painel que eles fizeram tinha muito aço bisotado, muita coisa que brilhava, e dentro do carro não se pode colocar elementos que dê reflexo com a luz, tanto durante o dia como a noite. Nós tínhamos um painel todo de madeira, naquele tempo usava-se o jacarandá e por dentro colocamos cerejeira, com todos os relógios marcadores muito bem posicionados. Na época não existia computador, era tudo feito na prancheta. Atualmente até as pranchetas são motorizadas. Naquela época era tábua formando a prancheta pantográfica e a famosa régua “T”. Era maravilhoso na época, eu gostava. Na Ford tínhamos um desenhista, Hans, ele trabalhou depois na revista Medicina e Saúde, no Hospital das Clinicas eles pegavam um coração, um pulmão, o Hans desenhava com absoluta perfeição e riqueza de detalhes. O Hans era o responsável por todos os desenhos da revista. Era uma sumidade. Para automóvel também ele era muito bom, quando ele chegou o Brito já estava lá.

É uma parte da história automobilística do Brasil que poucos conhecem.

Há fatos interessantes, curiosos. Uma vez o Charles de Gaulle presidente da França veio nos visitar, o Interlagos é uma versão do carro francês Alpine, o Presidente Castelo Branco deu um carro Interlagos de presente para Charles de Gaulle, era um monstro de homem, tinha quase dois metros de altura, como iria entrar naquele carro esportivo? Ele só ameaçou entrar, abriu a porta, a cabeça dele batia. Ele agradeceu, disse que ia dar a seu filho. Dali a uns dois meses saiu uma brincadeira: Castelo Branco foi visitar Charles de Gaulle, ganhou uma gravata! Era sabido que Castelo Branco tinha pescoço muito curto.

Na General Motors você participou de grandes projetos?

Fizemos o projeto do caminhão Chevrolet Brasil, da Veraneio. A famosa caminhonete Marta Rocha era importada e montada no Brasil. Feito aqui foi a F-100 da Ford. A Chevrolet fez a C-10, C-14, D-20 que é fabricada até hoje. Deixei a indústria automobilística, em 1975 houve a crise do petróleo, fecharam cinco fábricas da Chrysler: da Argentina, Colombia, Venezuela, Brasil. Quando me chamaram para ir trabalhar na Chrysler eu já não queria trabalhar na indústria automobilística. Queria trabalhar em um local menos fechado, fui trabalhar com vendas na Melhoramentos, na Abril Cultural. Um funcionário da Chrysler foi duas vezes me procurar em casa, decidi ir até lá. O Celso me levou até a sala do chefe do departamento, era Pedro Falcone, um argentino que tinha trabalhado comigo na General Motors e havia aprendido muito conosco. Fui convencido a trabalhar, entrei como supervisor, com um salário substancial, veículo da empresa, começamos a caçar pessoas de talento no mercado, montamos um departamento de estilo na Chrysler, em frente a Volkswagen, na Via Anchieta. Trabalhei para a Volkswagen, fiz a maquete da Variant e acho que da Kombi também. Para a Mercedes-Benz fiz um para choque de plástico para caminhão, fiz uma versão de plástico, naquele tempo eram para choques de ferro. Fiz um modelo e um protótipo.  

A Kombi não veio com o projeto pronto da Alemanha?

Veio, só que ela sofreu umas modificações, era muito fraca, sofreu modificações nas colunas, tubulação, suspensão, recebeu inclusive uma entrada de ar, era muito abafada.

Há profissionais das mais diversas áreas envolvidos na produção de um veículo?

Na Ford tínhamos três decoradoras: uma cuidava da parte de estofamento, outra da parte externa e outra das cores. Havia um painel enorme, com, por exemplo: tons de verde, tons de todas as cores. Com isso ela tinha uma enorme variedade de opções.
Voce trabalhou em outras empresas com modelação?
Após ter trabalhado na indústria automobilística trabalhei na Modelação Atlântica, na Fast Ship, uma indústria de barcos de corrida e iates, pertencente ao Grupo Souza Ramos. No caso de barcos a aerodinâmica é primordial, tanto as quilhas, como diversos componentes que influenciam muito. A minha participação era só na parte externa, na aparência.
Da Fast Ship você foi para onde?
Fui para Nova Iorque, Estados Unidos, trabalhar em carpintaria naval. Lembro-me bem de que fui preparado para o frio, com roupas e bota forrada com lã, quando desci estava com a temperatura de 40 graus centigrados. Eu tinha um sobrinho que morava lá, ele tinha insistido muito para que eu fosse para lá. Ele era engenheiro na Laminação de Metais no ABC e a esposa era secretária executiva. Lá eles trabalhavam como diaristas, ganhavam um salário bem maior do que aqui onde eram profissionais qualificados.
Quanto tempo você permaneceu nos Estados Unidos?
Fiquei um ano e oito meses. Eu já conhecia o inglês técnico, lá trabalhando com americanos, voce passa a pensar em inglês e não tem alternativa a não ser falar em inglês. Fui fazer um curso de inglês lá e a diretora da escola tinha morado em Goiânia por nove anos.
De lá você foi para que local?
Voltei ao Brasil, comprei um apartamento na Vila Prudente. Em 1991 decidi vir para o interior, adquiri uma chácara em São Pedro, era terra nua, fiz o projeto da casa, construí, enquanto não ficava pronta fiquei hospedado na casa da minha irmã a uns 300 metros. Fiz a cerca, buraco, poço. Fiz toda parte de hidráulica, alvenaria.
Como iniciou o seu gosto pela música?
Comecei quando tinha doze a treze anos. Fui coroinha na Matriz Nova de São Caetano do Sul. Depois passei para a Cruzada Eucarística, fui da Liga Católica. Eu ia para a Congregação e às vezes cantava no coro da igreja. Durante dez anos fui coralista do Coral Clássico e Folclórico Baccarelli do maestro Silvio Baccarelli a sede era na Rua Nazareth, no Ipiranga.
Que voz você faz?
Sou segundo tenor. Estudei com meu ex-sogro. Um dia estava mexendo nas minhas coisinhas, ele disse-me: “–Toninho! Você toca bem! Voce conhece musica?” Ele passou a me ensinar aquela Bona (método completo para divisão musical). Eu gosto de compor, naquele tempo já tinha escrito alguma coisa, ele me levou a Chantecler, mostrei umas musicas, gostaram, me mandaram para o Morumbi, para a Bandeirantes, fui falar com o maestro Cocho, ele me deu um cartão para falar com o Caetano Zama. Arrumaram-me para cantar nas emissoras associadas cantei na Rádio Clube de Santo André, na Rádio Cacique de São Caetano. Fui crooner da Orquestra Carinhoso do maestro Osvaldo. Tive uma dupla sertaneja famosa em São Paulo chamava-se Rodrigo e Rodrigues.  O meu parceiro chamava-se Madiel Rodrigues Figueiredo. Tivemos um programa na Radio São Paulo durante uns quatro anos, chamava-se “Recital Sertanejo”. Voltei a cantar sozinho. No meu primeiro casamento não tive a felicidade de ter filhos, no meu segundo casamento tive dois filhos. Eu cantava em uma casa chamada Cana Verde, no bairro Santa Cecília.  Comecei a cantar musicas de Milionário e José Rico, Miguel Aceves Mejía, Pedro Vargas. A casa encheu outra vez. A Lilian Gonçalves um dia passando lá viu aquele tumulto todo, ficou escutando eu cantar, convidou-me: “Vai lá ao meu restaurante!”. Fui, cantei no Bastidores, na Biroska I , Biroska II, na Toca, trabalhei com ela por uns seis meses.
Ganhava bem?
Dava para levar. O que mais me desanimou é que meus filhos estavam crescendo com o pai ausente. Um dia eu disse a meu parceiro que tocava guitarra, era um boliviano, disse-lhe que assim que terminasse o contrato iria parar. Ele era proprietário da empresa CIMA, era uma indústria que vendia perfis de alumínio para serralheiro. Ele  ofereceu emprego como vendedor. A oferta foi boa, aceitei. Eu cantava no Clube Piratininga, onde havia a Festa Baile. O Agnaldo Rayol e Francisco Petrônio cantavam lá. Conversei com o Agnaldo, ele me convidou cantamos juntos “Galopeira”. Passei a trabalhar com a Promel que fazia fechaduras, assim tive duas representações. Tornei-me evangélico, aos poucos fui deixando o meio musical. Cheguei a vender musicas, compostas por mim.
Quantas composições você tem?
Umas 300 ou mais.
Tem algum motivo que desperta uma determinada inspiração?        
O problema do compositor é o tema. O que mais rola no mundo é a música romântica. A música reflete o grau de escolaridade, de cultura. Infelizmente estamos perdendo valores importantes. O ritmo não é tão importante, o fundamental é a mensagem que a musica transmite.
Você cantou e várias emissoras de rádio e televisão.
Cantei na Record, foi onde conheci Thais de Almeida Dias, como jurada, na Cultura, Tupi, Rádio Clube de Santo André, Rádio Cacique de São Caetano. Vendi uma música que eu tinha composto, o cantor que adquiriu a musica é famoso e fez muito sucesso, não posso revelar nada da negociação. porque tenho um contrato assinado que inclui o sigilo total. Quando vendi tinha uns vinte anos.
Você participou de shows abertos?

Participei com shows onde cantaram Wilson Simonal, Luiz Fontana, Dino Franco, Tião Carreiro, Abel e Caim, Os Vips. Cheguei a fazer shows em Rorâima, Barretos, Porto Velho, Jaboticabal, Rio Preto, Inhandiaára. Uma vez eu estava cantando uma música de Agnaldo Thimóteo, ele estava presente com o irmão dele Major e o Mitta. Ele disse: me: “Olha, irmãozinho, você não sabe como é emocionante alguém cantar a música da gente! Voce conhece a malandragem da musica, você tem jeito”. A música não é só cantar. 

LUZIA PINTO DE LIMA GORGA

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 16 de janeiro de 2016.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADA: LUZIA PINTO DE LIMA GORGA


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Luzia Pinto de Lima Gorga nasceu em Piracicaba a 20 de março de 1937. Filha de Antonio Pinto de Lima e Angelina Casarini que tiveram dez filhos: Airtom, Oswaldo, Antonio, Olga, Dirce, Dirceu, Terezinha, Aparecida, José e Luzia.  Seu pai era caboclo e sua mãe filha de italianos. Casada em segundas núpcias com Antonio Gorga Filho.
Quando a senhora era ainda criança, sua família morava em que local?
Morávamos na Rua São João próximo a Rua Marechal Deodoro. Aliás as ruas eram todas de terra a Avenida Carlos Botelho era de terra com pedregulho. O bonde passava na frente da nossa casa, a linha do bonde era próxima a calçada. Estudei no Grupo Escolar Moraes Barros, na época eu tinha sete anos, tínhamos mudado para uma casa situada na ESALQ.  Para ir até o Grupo Escolar Moraes Barros, íamos de bonde, comprávamos passe escolar na prefeitura, quem vendia os passes chamava-se Mário Moreno, que nas horas vagas era sanfoneiro.
O que levou a família da senhora a residir nas dependências da ESALQ?
O meu pai era funcionário da ESALQ, motorista, ele nasceu na ESALQ e trabalhou por 54 anos na ESALQ.  Meu avô paterno, Luciano Pinto de Lima, nasceu em terras pertencentes a ESALQ, ele era do tempo de transportar angu para escravos na Fazenda Morro Azul para onde tinha ido trabalhar. Mais tarde trabalhou com aquela antiga carrocinha de lixo, varria a rua e colocava o lixo na carrocinha conduzida a mão. Já com bastante tempo como funcionário da prefeitura, minha avó faleceu, ele passou a morar com a minha tia que morava próxima ao Aviário da ESALQ.  O eu pai nasceu onde hoje é a Colônia do Bananal. Ainda menino o meu pai levava água em corote para as pessoas que trabalhavam na roça. Quando já tinha idade apropriada tirou a habilitação como motorista e passou a ser motorista da ESALQ. Transportava alunos na perua, na caminhonete, naquele tempo havia o transporte de alunos no mesmo formato como eram transportados os bóias-frias. Colocavam umas tábuas eles iam sentados. Era uma caminhonete aberta onde meu pai levava os alunos para aulas na zona rural. Naquele tempo havia uma grande preocupação com as formigas que existiam em grande quantidade. Lembro-me que meu pai dizia: “Não fique andando como barboleutas pelo parque”. Ele usava esse termo mesmo”barboleutas”.
Era o tempo em que havia muita saúva no Brasil?
Havia muita saúva, elas eram exterminadas com o uso de máquinas que enchiam os formigueiros e suas ramificações com a fumaça de carvão em brasa e arsênico. Dr.  Mariconi era professor da ESALQ nesse tempo.O fato do meu pai ter que estar sempre a disposição da ESALQ permitiu que morássemos nas casas que existiam próprias para funcionários. Ele ficava de plantão.
Quantos funcionários moravam nas dependências da ESALQ?
Havia as colônias de casas, a ESALQ tinha quatro colônias, tinha a colônia da carpintaria, em frente ao atual restaurante, havia a colônia que meu pai chamava de “pombal”, eram umas casas ao lado da outra, todas pintadas de branco, essas ficavam próximas ao prédio principal. Depois tinha a conhecida como “colônia das vacas” por estar próxima ao gado leiteiro da escola. E tinha a colônia do Bananal, beirando o Rio Piracicaba. Tinha ainda sete casas no pomar e mais sete casas no campo de aviação. Os funcionários muitas vezes durante a noite tinham que dar assistência as criações, como por exemplo, o parto de uma vaca.
Após concluir o Grupo Escolar Moraes Barros a senhora foi estudar em qual escola?
A minha primeira professora no Grupo Moraes Barros foi Dona Antonia Martins de Toledo, irmã do diretor José Martins de Toledo. De lá fui para a Escola Industrial, sou da primeira turma da Escola Industrial, o diretor era o Sr. Mario Boscolo. Naquele tempo a denominação correta era Escola Técnica Fernado Febeliano da Costa. O bonde da Vila Resende saia do lado da catedral, ao chegar próximo a atual Câmara Municipal havia um desvio na linha, era onde um bonde prosseguia em direção ao centro e outro em direção à Vila Rezende, até onde hoje existe um posto de gasolina, no final da Avenida Rui Barbosa. Próximo havia a estação de trem da Sorocabana que seguia até o Porto João Alfredo, hoje Artemis.
Quantos anos a senhora permaneceu na Escola Técnica Fernando Febeliano da Costa, a Escola Industrial?
Foram quatro anos em período integral. Nós almoçávamos na escola. Ensinavam além das matérias regulares outras como corte e costura, desenho, pintura. entravamos as sete e meia da manhã e saíamos às cinco horas da tarde. Tinha aulas de ginástica, era matéria obrigatória. O professor José Vicente Caixeta dava aulas na Escola Industrial.
Tinha uma fanfarra famosa lá?
Naquele tempo chamava-se fanfarra depois passou a ser chamada de Banda Marcial. Fiz parte da fanfarra, tocava surdo. O professor Danilo Sancinetti foi o primeiro a comandar a fanfarra depois veio o professor Henrique Wolgemuth Miller. Todos os professores eram muito competentes, nós aprendíamos muito com eles. A maioria eram professores que vinham de outras cidades e ficavam em pensões em Piracicaba. O uniforme da fanfarra era uma saia preta, uma blusa branca, gravata, sapato colegial, sendo que na gravata estavam a iniciais FFC – Fernando Febeliano da Costa. Por uns dois anos joguei basquete na quadra do XV. Teve um ano que a Escola Industrial fez ginástica rítmica no antigo campo do XV, o “Roberto Gomes Pedrosa”, na Rua Regente Feijó. Uma aluna ficava em um tablado, era tocada a música e toda a escola acompanhava os movimentos rítmicos.
Havia uma rivalidade muito grande entre o Industrial e o Colégio Dom Bosco para ver quem tinha a melhor fanfarra?
Havia, mas era mais acirrada no desfile de 7 de Setembro. Havia um grande entusiasmo popular em ouvir e ver a fanfarra desfilando.
Com que idade a senhora concluiu o curso na Escola Industrial?
Eu tinha de 15 para 16 anos. Recebemos o diploma na Sociedade Italiana di Mútuo Socorro Aos 18 anos entrei na Décima Terceira Ciretran, isso no tempo do Dr. Adir da Costa Romano, Zenon Batista Citrângulo. Janio Quadros era o governador do Estado. A Ciretran era na Rua São José, junto a delegacia. Isso foi por volta de 1958. Naquela época era tudo feito a máquina, a carteira de habilitação era feita na máquina de escrever. Fazia aqui mesmo, não ia para São Paulo. O exame para habilitação era feito por dois peritos e pelo delegado. Eram exames teóricos e práticos. No Ciretran fiquei uns dois anos e meio, fui trabalhar na fábrica de cordas do Dr. Virgilio Lopes Fagundes, a  Agave Industrial Limitada, o escritório era na Rua Treze de Maio, perto do Museu Prudente de Moraes. O contador era o Pedro Natividade. O Dr. Virgílio tinha uma mangueira no quintal, era dessa manga Tommy. Quando amadurecia, a esposa dele trazia em um pratinho a manga picadas em pedaços para nós. Era muito atenciosa. A fábrica ficava em Santa Terezinha, havia muitas mulheres que trabalhavam lá. Permaneci na Agave uns dois anos e meio. Em 1960 eu casei-me. Tivemos um filho, Alaor Pinazza Júnior, já falecido.
Após o casamento a senhora parou de trabalhar fora de casa?
Depois e cinco anos de casada é que entrei na Prefeitura Municipal. O prefeito era Luciano Guidotti. Fui trabalhar na Secretaria de Finanças, na Contabilidade. No prédio da Rua São José. Isso foi em 1966, em 1968 o prefeito Luciano Guidotti faleceu. Era um homem muito serio, não gostava de funcionário vagabundo. Permaneci na prefeitura de 1966 até 30 de dezembro de 1992. Quando comecei a trabalhar a prefeitura funcionava ainda na casa que tinha pertencido ao Barão de Serra Negra, o prédio foi demolido e hoje é um páteo.  
Após a morte de Luciano quem assumiu a prefeitura?
Foi o vice-prefeito Nélio Ferraz de Arruda. No nosso tempo era tudo feito com máquinas de somar. A informática entrou quando eu estava saindo. Um curso que fiz e foi muito útil foi o de datilografia com Dona Rosa Orlando Canto, a Dona Rosinha, na Rua XV de Novembro quase esquina com a Rua Governador Pedro de Toledo. Ela não queria alunas de unhas compridas, vinha coma tesourinha cortando as unhas das alunas. Em cima do teclado da máquina havia uma tábua, que permitia escrever sem ver as letras. O exame final era a cópia de um texto, ela ficava com um cronometro marcando o tempo. Fiz o Curso Técnico em Contabilidade na Escola de Comércio Cristovão Colombo. Trabalhei com Luiz Mattiazzo, Florivaldo Coelho Prates, Joanin Bouchardet e Antonio Barrichello. Quando estudava contabilidade na escola do Pedro Zanim e Dona Branca, eram marido e mulher, o secretário era o Bertoco. Tinha aula de português com o professor Cotrin. Quando entrei na Escola de Contabilidade, em 1970 tinha 34 anos, eu era a avó da turma. Com esse jeito, logo essa diferença de idade desapareceu. Sou considerada e condecorada como “Amigos dos Bombeiros”, uma condecoração da qual tenho muito orgulho. Recebi das mãos da então prefeita de São Paulo, Luiza Erundina.
 Meu marido e eu fomos até São Paulo, no Ibirapuera, para receber essa comenda. Teve uma demonstração dos bombeiros, minha cunhada tinha ido junto, eu estava tão absorta com aqueles malabarismos dos soldados, tinha alguém batendo no meu ombro, disse-lhe: “ – Lindinha, pare de bater! Olhe lá que espetáculo!”. Era a prefeita Luiza Erundina que queria me cumprimentar! Fui funcionária pública e tinha orgulho em poder servir as pessoas que procuravam o serviço municipal. Por esse desempenho tenho o reconhecimento da Guarda Civil, do Tiro de Guerra. Nunca fui de estabelecer dificuldades para estabelecer a importância das minhas funções ou por vaidade pessoal.
A senhora é vaidosa?
Eu era muito elegante, até hoje com meus 79 anos sou vaidosa. Mantenho minha agilidade. Acredito que tem muito a ver com hereditariedade. . Meu marido é muito calmo, eu já sou mais agitada. Sempre fui.
A seu ver, de forma geral, o funcionalismo publica mudou?
Mudou! Falta humanidade, solidariedade. Sempre tratei o contribuinte com muita atenção e em particular os idosos eu sempre fiz o que foi possível. Alguns secretários tinham um respeito muito profundo por mim, diria até certo temor. Fiscalizei muitas casas de caridade. Sempre fui muito rigorosa na análise da documentação, sem, no entanto deixar de usar o bom senso. Quando encontrava alguma coisa polemica já tomava uma atitude enérgica. Já ocorreu de em viagens, por descuido, o secretário apresentar as despesas e incluir algum item que a legislação não admite como despesa. Eu fazia o secretário restituir a despesa indevida. Quando houve períodos de contenção de despesa na prefeitura, muitas vezes eu reduzia a quantidade dos itens que eram requeridos.
A senhora lembra-se do tempo em que o pronto socorro era na antiga rodoviária?
Lembro-me! Lembro-me também do Pronto Socorro que funcionou na casa do Pretel, onde hoje é um cartório, na esquina da Rua São José com a Rua do Rosário. Ali por um período funcionou a prefeitura, o prefeito era João_Herrmann_Neto. Lá tinha a imagem de Nossa Senhora Aparecida, eu tinha um carramanchão que dava umas flores azuis, eu cortava e levava para colocar junto a imagem. O João Hermann dizia: “Já sei! A Luzia esteve por aqui!”.
A seu ver, como era o prefeito João Hermann Neto?
Eu gostava dele, era uma pessoa muito expansiva. Sempre olhou muito pelos funcionários. Em qualquer lugar ele abraçava, beijava. Eu sou do tempo em que o Tribunal de Contas vinha para conferir as contas da prefeitura.
Lembro-me da Madalena, que freqüentava sempre a prefeitura. Dia 27 de setembro ela faz aniversário, nós comprávamos uma  champagne e oferecia para ela.
A senhora conheceu a vereadora Ditinha Pinezzi?
Conheci! Era muito extrovertida. Brigava com Luciano Guidotti. Conheci o seu marido Vicente Pinezzi. Vereador não ganhava salário nenhum. O prefeito Luciano Guidotti doava seu salário. Elias Sallun trabalhava com Luciano Guidiotti. Conheci Haldumont Nobre Ferraz, o pai dele era farmacêutico, quando eu tinha 10 anos de idade o pai do “Tiquinho”, como era conhecido o Haldumont furou a minha orelha para colocar brincos. O Tiquinho foi vereador. Trabalhei com João Maffeis Netto. Conheci Jamil Netto, Xilmar Ulisses. Trabalhei com Lazaro Pinto Sampaio, Hide Maluf.
A senhora lembra-se quando foi criado o SEMAE?
Onde está a Câmara Municipal existia um local que eram umas casinhas, ali era o SEMAE, depois foi para um local em frente ao Cine Broadway. Lembro-me de uma funcionária que trabalhava lá, super competente, a Maria Aida.  Na esquina da Rua São José com a Rua Alferes José Caetano ficava a Funerária do Libório. Na esquina oposta ficava o Bar da Lola.
As instalações a prefeitura na antiga mansão do Barão de Serra Negra estavam superadas?
Não tinha mais condições de comportar uma prefeitura, estava tudo desgastado, só havia dois banheiros para todos os funcionários. Na parte inferior do prédio funcionava a Cooperativa dos Funcionários Públicos de Piracicaba. No dia 7 de julho de 1968 em que Luciano Guidotti faleceu, o páteo da Câmara Municipal ficou com muitos idosos do Lar dos Velhinhos de Piracicaba, do qual Luciano Guidotti foi benfeitor por muitos anos. Seu corpo foi velado no prédio da Câmara Municipal. Lá pelas quatro horas o corpo foi levado a pé até a Catedral de Santo Antonio, depois é que foi levado em carro aberto do Corpo dos Bombeiros. Foram necessários dois caminhões basculantes para levar todas as coroas de flores.
A senhora lembra-se da queda do Comurba?
Minha mãe estava em casa. Lazinho Capelari recolheu os entulhos com o poder de pão com mortadela e café com leite.
A senhora conheceu “Nhô-Lica”?
Conheci, eu estava no grupo escolar. Ele andava com uma capa preta, recolhia pedras da rua que dizia serem preciosas.
Como era a poesia que a senhora ouviu ainda criança?
O Meton Maranhão tinha um gato chamado Cazuza. O Zambello,chefe da guarda matou o Cazuza. Naquela época tinha muita raposa, gato do mato, cobra, meu irmão mandava cobra para o Butantã. Isso há 60 ou70 anos. O Meton era meio poeta, ele fez uma música: “Zambello chefe da guarda/Só mata raposa e coruja/Com um tiro da espingarda/ Matou o meu Cazuza”. Eu tinha uns doze anos nessa época. Sou do tempo em que subíamos a caixa de água da ESALQ para espantar as corujas. A caixa tem dois andares, lá em cima onde há uma bola com água dentro e nós chamávamos de bola da água.
Do grupo escolar a senhora lembra-se de algum trecho de música?

De José Martins de Toledo, Dona Antonia Martins de Toledo. Nós cantávamos no recreio, de dois em dois para subir, tinha um Cristo na parede, subíamos a escada cantando: “A escola querida do alegre recreio/ do mais vivo anseio por muito estudar/ e vós amiguinhos que vós mocidade/ oh quanta saudade irão nos levar/assim vamos hoje / de flores ou lentes/ de louros de dentes / a fonte cingir/ jamais esse dia tão cheio de glória/ em nossa memória irá de porvir/ aplausos e palmas aos mestres zelosos/ aos guias que a infância conduz/ a eles louvores e nossos afetos” Outra música que me lembro, sobre o “A” encarnado: “O “A” encarnado da Luiz de Queiroz/ o “A” encarnado saúda todos nós/ Os universitários de todo interior/ Vieram mostrar sua pujança e seu valor/Vamos ao esporte/ Vamos com amor/“. Isso ouvi quando era criança, na época em que foi construído o ginásio da agronomia. 

quarta-feira, dezembro 30, 2015

ALBERTO DIAS PEDROSO DO CARMO



PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 09 de janeiro de 2016.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: ALBERTO DIAS PEDROSO DO CARMO


Alberto Dias Pedroso do Carmo nasceu a 21 de novembro de 1952 em São Paulo no bairro da Bela Vista também conhecido como Bexiga. É filho de Alice das Dores Dias Carmo e Roque Pedroso do Carmo, tem um irmão chamado José Antonio Pedroso do Carmo. Alberto é pai de três filhos: Aline, Alessandra e Cássio. É avô de duas netas piracicabanas Valentina e Mikaela. Hoje Alberto reside em Piracicaba. Formado em Administração de Empresas com especialização em Comércio Exterior. Músico de talento expressivo. É tradutor muito respeitado, traduziu livros, sendo muito procurado por empresas pelo seu talento em traduzir e conseguir transmitir a mensagem original de forma objetiva.
Inicialmente seus estudos foram feitos em qual escola?
O jardim de infância, pré-primário e primário até o segundo ano, estudei no Colégio Santa Monica, na Rua Augusta, próximo havia o Colégio Santo Agostinho. Do terceiro ano até me formar no colegial estudei no Colégio Imaculada Conceição, ficava na Rua Cincinato Braga, onde hoje existe um supermercado. Ficava próximo a Igreja Imaculada Conceição, os padres da Igreja participavam do colégio. O dono do colégio era o Professor Carramenha de Goes. Trabalhei quando tinha uns 14 a 15 anos, em um escritório de engenharia situado na Rua Rocha, onde nós morávamos. Ali eu ficava escrevendo com nanquim nas plantas de construções. Em 1970, aos 18 anos prestei o vestibular chamado MAPOFEI – sigla das escolas Mauá, Politécnica e FEI. Entrei na FEI- Faculdade de Engenharia Industrial. Era paga e ficava no ABC. Não tinha como eu ir para lá, nós éramos uma família simples. Prestei também no Mackenzie e entrei em Engenharia Civil no Mackenzie. Nessa época eu já falava inglês por causa dos Beatles, desde os doze anos eu era fã deles. Essa minha facilidade em falar inglês permitiu que entrasse no departamento de reservas da VARIG, em Congonhas. Era um trabalho de meio período, nós trabalhávamos um sábado e um domingo por mês. Lá só trabalhavam jovens universitários, tinha que saber falar inglês. Eu trabalhava das sete horas da noite até a uma hora da manhã. Estudava engenharia no Mackenzie, as aulas iam das oito horas da manhã até as seis horas da tarde. Minha mãe me levava uma marmita às seis horas da tarde, lá no Mackenzie, subia as escadarias da Rua Avanhandava e ia lá para o Mackenzie. Eu tomava o ônibus Jardim Miriam e ia para o aeroporto, pegava o ônibus lotado. Ao chegar à VARIG ia a uma espécie de cozinha, comia minha marmita, descansava um pouco e ia trabalhar.
E para voltar do Aeroporto de Congonhas até a sua casa?
Eu pegava o último ônibus Jardim Miriam, às vezes um amigo ia me buscar, nós já tocávamos juntos em uma banda desde os treze ou quatorze anos.
Como você aprendeu a tocar?
Começou quando eu tinha 3 a 4 anos de idade, meu pai tocava cavaquinho, ele tinha os discos de 78 rotações, colocavam os discos para tocar, eram com agulhas de metal, tocava um disco e já tinha que trocar de agulha. Era uma agulha por disco! Lembro-me da música “IV Centenário”, com Mario Zan na sanfona e de Luiz Gonzaga "Qui nem Jiló”. Eu pegava o cavaquinho do meu pai e ficava brincando, até que chegou uma época em que pela manhã ele afinava o cavaquinho e deixava para que eu tocasse. A primeira musica que aprendi a tocar foi “Toque de Silêncio”. Ficava o dia inteiro tocando essa musica. Por volta de 1962 a 1963. Andando com a minha mãe ela disse-me: Você viu que surgiu um conjunto de cabeludos? Disse-lhe que não sabia. Ela estava falando dos Beatles. Com os amigos acabei conhecendo os Beatles, com os quais ficamos maravilhados.

Naquela época o habito entre os jovens era usar o cabelo curto?

Todos usavam cabelos curtos. Lá pelos 13 ou 14 anos já começamos a ficar com os cabelos compridos. Era um choque um rapaz usar cabelo comprido, diziam palavras chulas a quem usasse. Começamos a ouvir Beatles. Os discos em vinil, dos Beatles saiam defasados aqui. Fui a um aniversário na casa de um amigo onde estava realizando uma festa de comemoração, esse meu amigo pegou um violão e tocou Twist and Shout. Foi lá que conheci um violão, fiquei fascinado e comecei a aborrecer meu pai, eu também queria ter um violão. Com muito sacrifício meu pai e minha mãe compraram um violão, pagaram em parcelas. Era um violão da marca Rei, Comecei a aprender e aprendi muito rápido. Já formamos um conjunto musical: “Os Nobres”. Era eu tocando um violão, meu irmão que ganhou de uma prima mais abastada um violão em que colocamos só quatro cordas, para ele tocar contrabaixo, o baterista era vizinho nosso, é um grande baterista que toca até hoje em um conjunto chamado Rockover, na época ele colocava uns pedaços de plásticos, como se fosse bateria, o prato da bateria eram aquelas caixas aramadas de transportar garrafas de leite, e o Cecílio que já tocava violão. Começamos a tocar e a fazer música também, versões das musicas dos Beatles. Nessa época eu ainda não falava inglês. Com os discos dos Beatles tentávamos imitar o som do inglês, nós falávamos sem saber o que queria dizer, aos poucos íamos conseguindo uma letra, não era como agora que você entra no Google e pega a letra! As vezes em alguma revista saia uma reportagem, pegávamos a letra e saiamos cantando, com isso começamos a treinar inglês. Isso foi até eu me casar aos 27 anos. Tivemos conjunto, tocamos na TV Excelsior, tocamos no Restaurante Bierhalle, em Moema. Tocávamos em troca do almoço, que era salsicha com maionese e pela sobremesa que podíamos pedir o que quiséssemos, pedíamos Banana split. Minha mãe costurou o uniforme do conjunto. Tocávamos música dos Beatles e algumas músicas compostas por nós. Usávamos uma calça listada, camisas com gola muito alta, um chapeuzinho de veludo vermelho. Eu fiz mais de 50 versões de músicas dos Beatles. Tocamos na TV Cultura, eles nos deram para cada integrante uma caixa de biscoito e pastilhas supra sumo.

Quando você menciona versão o que significa?

Você pega a música “Got To Get You Into My Life” , é uma música do LP Revolver, de 1966, eu fiz a versão dizendo: “Quero você em minha vida” . Não era tradução, às vezes não tinha nada a ver com a letra da música. Aliás, a maioria das vezes! Pegava uma música e inventava uma letra romântica.  Fazíamos isso por diversão, estudava antes de almoçar, o resto do dia tocava. Eu morava na Rua Rocha e o baterista morava na Rua Silvia, onde muitas vezes ensaiávamos. O avô dele era o proprietário da casa onde morávamos. Aos poucos arrumamos uma forma de tocar no Canal 9, há uma foto conosco tocando, éramos pequenos, pegamos as guitarras do conjunto que estava tocando lá. Quando tinha o “Salão da Criança” tinha música ao vivo, fomos tocar e acabamos conhecendo um pessoal da TV Bandeirantes, passamos a participar do programa “Mini Guarda” do Ed Carlos. Acompanhamos o Ed Carlos em muitas musicas. Lembro-me que uma das músicas que mais fazia sucesso quando tocávamos no programa era a música “Israel” que o Moacyr Franco gravou, o baterista Robertinho, um virtuoso, dava um show na bateria. Íamos e voltávamos de taxi com os instrumentos, até a Rua Brigadeiro Luiz Antonio nas imediações da Rua Pedroso. Tocávamos de ouvido, sem partitura. Nós acompanhávamos as crianças que iam cantar. Aparecia um catatau, perguntávamos o que ele iria cantar, ele dizia, por exemplo: “- Vou cantar “Quando” de Roberto Carlos.” Ele começava a cantar nós acompanhávamos, íamos até chegar ao tom de voz dele. Isso me ajudou muito em percepção musical. Quando passamos a estudar no curso científico, passamos a compor muita música. Músicas de Bossa Nova, acordes de Bossa Nova, mais sofisticadas. Em 1976 ou 1977 eu já trabalhava na Goodyear conseguimos um estúdio de gravação Gravamos uma fita, mas não gerou disco nenhum. Lembro-me que quando ainda estudava no Objetivo tinha o FICO Festival Interno do Colégio Objetivo nós participamos do segundo ou terceiro festival. Nessa época tínhamos umas cinco pessoas que tocavam conosco. Fiz uma música “Concerto em Flá Maior”, fiz essa musica para uma namorada chamada Flávia, Esse festival para participar tinha que ser aluno, só o baterista era aluno, arrumamos várias pessoas e colocamos sete músicas, todas entraram nas semifinais, com orquestra do Maestro Zaccaro, e a música “Concerto em Flá Maior” foi para a final. Um fato interessante é que a música estava em nome de um dos alunos do Objetivo: o Roger do Ultraje a Rigor. Na época pegamos em terceiro lugar. E por ai foi, continuamos tocando, estudando música, quando tinha festas de pessoas conhecidas nos convidavam, íamos com a turma toda. Eram cinco violões de doze cordas. Fazíamos três, quatro vozes nas músicas. Tocávamos Beatles, Bossa Nova e músicas nossas. Fazíamos vocal até no Hino Nacional. Começou a época dos namoros mais firmes, com isso houve gradativamente a dissolução do conjunto. Alguns de nós continuamos a nos encontrarmos. Eu, Tarcísio, meu imrão, outro amigo, o Bruno que infelizmente já faleceu, no ano 2000 ou 2001 conversando com o baterista, o Robertinho, que tem o conjunto Rockover disse-nos: ”Vamos nos reunirmos!”. Começamos a ensaiar, na minha casa no Alto da Lapa, fizemos um show em uma festa de final de ano em uma firma de informática, eles queriam só música dos Beatles, Rock anos 60, ficamos uns seis meses ensaiando aos domingos na minha casa, combinei com o Tarcísio e a última musica que tocamos foi What a Wonderful World, era uma festa de comemoração de Natal. Foi o momento mais emocionante do show. O Robertinho conseguiu a terça-feira para tocarmos no Café Piu Piu. O ensaio era na casa do Robertinho aos domingos, começamos a fazer o repertório, com músicas nossas e musicas MPB.

Você voltou a tocar na noite?

Eu estava morando com os meus pais, tinha me separado, ficava a noite em casa, meus amigos me convidaram para ir tocar em uma boate chamada “Azul da Meia Noite” na Rua Franz_Schubert. Nessa época eu trabalhava no Banco de Boston. Fiquei tocando na boate “Azul da Meia Noite” e em uma boate chamada “House”, em uma travessa da Avenida Jardim.

Você trabalhou na VARIG até que idade?

Eu tinha entrado no Mackenzie em 1972, sai porque o meu salário era todo para pagar a mensalidade. Eu não conseguia estudar, e engenharia civil você tem que estudar muito. Um dia peguei o meu salário, fui até a Del Vecchio na Rua Aurora e comprei um violão de 12 cordas. Esperei, fiz vestibular na faculdade de música na Faculdade Paulista de Música era em um prédio que parecia um castelo, ficava na rua atrás do MASP e comecei a dar aulas no FISK e aulas particulares de inglês. Fiz isso uns dois anos, fiz a opção por composição nosso professor era Edmundo Milani, toda sala tinha um piano, quando ele dava aula executava a musica explicando a composição, nós olhávamos extasiados. Um dia ele estava na lousa e percebi que ele estava com a calça rasgada, aquilo me chamou a atenção. Ao terminar a aula, convidei-o para tomar café, fomos até a Rua Frei Caneca. Perguntei-lhe como era a vida de musico. Ele disse-me que trabalhava no Programa do Chacrinha, tocava em boate até as quatro horas da manhã, vi a vida que um gênio da música levava. Naquele mesmo dia deixei a faculdade. Por coincidência um vizinho que trabalhava na Goodyear ia sair de férias e eles estavam precisando de um funcionário no departamento de marketing por um mês. Fui lá, fiquei um mês, o meu chefe era um americano que morava com a família no hotel Caesar Park. Um dia ele disse-me que tinha nascido um terceiro filho e os outros dois estavam no Caesar Park, eles só sabiam falar inglês, ele precisava de alguém que ficasse com seus filhos enquanto ele dava atenção a sua esposa que estava no hospital, fora uma gravidez complicada. Fui, sob a maior gozação do pessoal da Goodyear, chamavam-me de babá! Fiquei vários dias cuidando dos dois meninos até sua esposa sair do hospital. Nessa época a Goodyear estava formando o departamento de exportação, eles chamaram um senhor de nome Nakagima, chefe de exportação da Goodyear do Japão, maior exportadora da empresa. Fui contratado, começamos com três ou quatro funcionários, quando sai da empresa eram quarenta. Ali veio a minha profissão de comércio exterior. Fiz a faculdade de Comércio Exterior na FAASP. Entrei na Goodyear em 1977. No Banco de Boston trabalhei na Divisão Internacional, na Área de Controle. Foi a época em que começaram os computadores, eu trabalhava com um HP-41C, entraram os Personal Computers, comecei a colocar o meu trabalho todo em computadores. Fiz um banco de dados em Lotus, passei a fazer serviços para o departamento, automatizei a maior parte do serviço de câmbio em rede com o Clipper. No Banco de Boston entrei em 1981 e saí em 1990. Alguns amigos foram trabalhar em um banco chamado Exxcel, na Rua Augusta quase esquina com a Avenida Paulista. Permaneci algum tempo e decidi sair. Meu amigo Tarcisio sugeriu que eu trabalhasse com tradução. Anunciei na revista Veja São Paulo. No inicio apareceram muitas pessoas físicas, querendo traduzir currículo.  Eu e minha parceira Leila, trabalhávamos juntos e adquirimos um computador 286. Adquirimos um programa em DOS, começamos a trabalhar com uma empresa de assessoria de marketing, até que surgiu a internet, com uma novidade o e-mail! Trabalhei com essa empresa de 1992 até 2015.

Você faz tradução técnica e coloquial?

Faço ambas. Principalmente na área de informática e muito em comunicação de empresas. Marketing. Propaganda. Aconteceu um fenômeno no mercado de tradução, começaram a aparecer agenciadores de tradutores, são grupos de tradução na internet. Eles abrem uma agencia de tradução. Há o Sintra -Sindicato Nacional dos Tradutores, são eles que recomendam o preço a ser praticado pelos tradutores. Há sites com mais de 2.000 tradutores, até mandarim eles traduzem. O preço eles espremem, é quem paga menos, se você olhar textos de press-release de muitas empresas o vocabulário está mesmificando, nivelado por baixo.

Quando você traduz algo sigiloso é assinado algum termo de responsabilidade?

Normalmente não assinava, traduzi textos de grandes corporações e extremamente confidenciais, mas o que eu traduzo nem os meus filhos olham. Existe empresa que tem por norma assinar um termo de confiabilidade. Nunca precisei assinar. Trabalhei por dezessete anos com uma empresa, muitas vezes eu dava a minha opinião a respeito da eficácia do texto com relação ao objetivo a ser atingido. Fui tradutor para muitas empresas como Gartner, HP, Texas Instruments, Embratel/Olimpíadas, Dassault Systems, Polaroid, AMD, D-Link, EMC, Verint, Hamburg Süd, Roland Berger, DHL,Schneider Electric, Canon. Traduzi três livros técnicos do inglês para o português. Uma empresa que deseja fazer um anuncio em inglês para colocar no exterior eu sou uma pessoa capacitada para fazer isso. Há muitas empresas que recebem muita correspondência comercial da matriz, tem que colocar para o português, seja algo para ser publicado, um plano que a matriz queira que seja elaborado, textos corporativos, eu traduzia para um bom português para ser publicado. Cheguei a colocar “nota do tradutor” em vermelho quando começaram a vulgarizar demais o vocabulário. Por exemplo, “a nível de”, “focado” “obstaculizar”, cansei de ver escrito repetidamente no mesmo texto. Gosto dos textos do Veríssimo, quando ele é irônico com a americanização que estão fazendo com a nossa língua. Porque “50% off”  põe “50% de desconto”, “sale” escreva “venda”.
Qual é o seu facebook?

 É Alberto Carmo (existe um homônimo), o meu email é: lennon@netpoint.com.br . Um dos motivos que credito ao meu sucesso como tradutor é que eu estava sempre disponível. Lembro-me de uma pessoa que estava o exterior e ligou-me pedindo um texto para que ela usasse dali a algumas horas em uma reunião importante. Segundo ela me disse o texto que elaborei e enviei salvou a conta com um cliente dela. Conheço bem o linguajar do pessoal de propaganda e marketing para escrever de forma bem feita com uma conversa que venda o produto ou serviço. Esse sempre foi o meu diferencial, não era traduzir literalmente, mas sim traduzir de forma que atingisse o objetivo final. Eu opinava, dizia que não achava bom aquilo, que tal escrever desta forma. Nunca usei o que chamam de “motores de tradução” que são programas que traduzem. Vou traduzir de acordo com a realidade do momento, a tradução tem que ficar cada vez melhor. Por exemplo, no Brasil há muitas cidades que buscam investimentos de empresas do exterior. Só que tem que saber falar a linguagem das possíveis empresas interessadas. Simplesmente fazer um site pode funcionar de forma inversa, passa uma impressão errada da cidade, temos que saber que nem sempre a linguagem compreensível para nós é entendida da mesma forma por povos de outra cultura. Um ótimo site para nós pode suscitar duvidas e ate inviabilizar o investimento se não for dito na linguagem que o pretenso interessado entenda.

 

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