domingo, julho 02, 2017

ARLETE MARIA RODRIGUES NEGRI


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 10 de junho de 2017.

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

http://blognassif.blogspot.com/


http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: ARLETE MARIA RODRIGUES NEGRI


 

Arlet Maria Rodrigues Negri nasceu a 27 de outubro no bairro rural Guamium, em uma fazenda, ali havia um casarão onde moravam, de portas e janelas azuis, junto a Estrada dos Godinhos. Atualmente a região já está urbanizada. Seus pais, Antenor Rodrigues e Angelina Castelucci Rodrigues tiverem três filhos: Arlete Maria, José Adalberto e Antonio Wilson.

Seu pai trabalhava em qual atividade?

Meu pai trabalhava na empresa Tema Terra em Sumaré, ele foi trabalhar nessa empresa que naquele tempo ainda chamava-se Tratores do Brasil quando eu tinha sete anos, Lá ele trabalhou até aposentar-se. Morei em Sumaré por dois anos. Meus avós paternos eram Jorge Rodrigues e Ida Carletti Rodrigues. De Sumaré por dois anos morei na cidade de Três Pontas em Minas Gerais. Depois voltei para Piracicaba, fui morar com meus avós maternos Ephigênia Basso Zambon e Antonio Castelucci , com o meu tio Antonio José Castelucci que morava com seus pais, ou seja, morávamos todos nós meu tio, meus avós e eu, na mesma casa.

Em que bairro de Piracicaba você passou a residir?

Na Avenida Dom João Nery, na Vila Rezende. Eu tinha estudado em Sumaré, em Três Pontas, e aqui fui estudar na Escola Imaculada Conceição (Na época conhecido como “Carequinha”). Era comum dizer que estudava no Carequinha! Fiz o curso de auxiliar de escritório, em seguida o Curso Técnico em Contabilidade., depois fui fazer a faculdade em Tatuí.

Você começou a trabalhar a partir de quantos anos?

Meu avô Antonio Castelucci tinha um açougue, inicialmente situado na Avenida Dona Francisca depois passou a ser na Avenida Dom João Nery. Eu tinha de catorze para quinze anos, ajudava no açougue. Gostava de trabalhar, desossar, picar, fazia lingüiça, codeguim (o cudiguim (ou codeguim ou cotechino) é uma lingüiça fresca elaborada com carne suína, couro cozido e gordura, com boa quantidade de temperos como alho, cheiro verde, noz moscada, pimenta).

A que horas abria o açougue?

As cinco horas manhã abria, lá pelas onze horas fechava, depois do almoço, das duas horas até as cinco abria de novo. O meu tio Antonio José Castelucci fazia faculdade de matemática em Rio Claro. Ele ajudava no açougue na parte da manhã, levantava bem cedinho, deixava todas as encomendas prontas e depois ele ia para a faculdade. Aos sábados um outro tio, Miguel Biscalchim  ajudava também. O meu tio Antonio José Castellucci formou-se em matemática, fez carreira como professor acadêmico e é um dos pioneiros da implantação de cursos da UNIMEP no Campus de Santa Bárbara D`Oeste.

Você concluiu o curso de contabilidade e foi fazer a faculdade?

Fui fazer educação artística em Tatuí, na Faculdade de Ciências e Letras de Tatuí, que era o que eu gostava, aos doze anos, eu morava em Três Pontas, pintava telas com pinturas a óleo, eu tinha muita habilidade com trabalhos manuais. A Faculdade de Tatuí já era famosa, quem estudava lá: João Pedro Godinho, Cecília Neves, Isabel Guardia, Mércia Angeleli, a Cica. O João Chiarini dava aula para mim. Era bem incentivador.
                                                              JOÃO CHIARINI

Como vocês iam para Tatuí?

Íamos de ônibus, saíamos de Piracicaba às seis horas da tarde, o ônibus saía de frente da catedral, e voltava à meia-noite. Na época eu era solteira. Era um pessoal muito animado, valia a viagem. Foram três anos.

Nessa época você já estava namorando seu futuro marido?

O Wilson estudava o curso científico com o meu tio Antonio José Castellucci, em função dessa amizade com o meu tio ele freqüentava a nossa casa. A minha avó era comadre da mãe dele Ângela Alleoni Negri casada com Carlos Negri, meu sogro. Estávamos sempre juntos. Depois de muito tempo começamos a namorar. Ele foi fazer Engenharia Civil na Escola de Engenharia de Piracicaba. Ele gostava muito de eletrônica. Foi um dos pioneiros da informática em Piracicaba. Ele informatizou o SEMAE – Serviço Municipal de Águas e Esgotos; informatizou a Prefeitura Municipal de Piracicaba, o SEMUTRAN -  Secretaria Municipal de Trânsito e Transporte; foi um dos fundadores do CIAGRI - Centro de Informática da ESALQ, ele trabalhava na Escola de Agronomia Luiz de Queiroz. Ele fez Mestrado em drenagem e irrigação. Quando nos casamos ele dava aulas na UNIMEP, em Piracicaba e em Santa Bárbara D Oeste. Ultimamente lecionava na Escola de Engenharia de Piracicaba.


Em que ano vocês se casaram?

Foi a 19 de julho de 1978, na Matriz da Vila Rezende, o Padre Jorge foi o celebrante. Tivemos duas filhas: Patrícia e Mariana.
                              CENTENÁRIO PARÓQUIA IMACULADA CONCEIÇÃO


Quando vocês vieram morar na casa onde permanece por 37 anos o bairro era bem diferente?

Havia poucas casas, estavam começando, a nossa rua era a que mais tinha casas, mas o bairro em si era composto por poucas casas.
                      ARLETE AO LADO DO PÉ DE MAMÃO NA CALÇADA DA SUA CASA.
                      ELA AFIRMOU TER APENAS JOGADO AS SEMENTES.

                               VISTA PARCIAL DA PRAÇA EM FRENTE A SUA CASA, ONDE PLANTOU MUITAS ÀRVORES FRUTIFERAS. ENTRE AS DUAS ÀRVORES AO FUNDO, SEU MARIDO WILSON ESTIVACAVA UMA REDE PRESA ÀS DUAS ARVORES E FICAVA OLHANDO AS CRIANÇAS BRINCAREM NA PRAÇA.

Além de arte, que você gosta muito, há outras coisas que a atrai?

Gosto muito de móveis antigos. Tenho uma coleção de xícaras, as pessoas sabem e quando vão se desfazer de alguma coisa antiga me consultam se quero. Sabem que eu irei cuidar com carinho. Algumas vezes até restauro. As coisas antigas que possuo são presentes de diversas pessoas, vizinhas, amigas, parentes. Tenho uma peça que ganhei de uma amiga chamada Dona Vilma, ele ganhou da sogra dela. A Dona Vilma faleceu com 85 anos. Imagino que essa peça deve ter mais de cem anos! Tudo que tenho de antigo foi alguém que me deu. Muitas coisas eu restaurei. Uma pessoa de muita cultura, da nossa família, sugeriu que eu fizesse um curso de restauração na Europa, eu tenho uma mão considerada apropriada para a pintura e restauração. É o que chamam na arte de ter a mão “suave ou leve”. Tenho muitas pinturas em porcelana que eu mesma fiz, assim como vitral. Pintura em tecido, bordar, aprendi a fazer tudo isso.

                                  CAIXA COM MACHETARIA FEITA POR ARLETE
CRIADO MUDO ANTIGO, SENDO QUE A CAIXINHA DE MADEIRA EM CIMA DELE DEVE TER MAIS DE 100 ANOS !





                          PEÇAS EM PORCELANA (UMA DAS QUALIDADES DE ARLETE É PINTURA EM PORCELANA)

Você nunca pensou em fazer disso uma profissão?

Gosto muito de fazer, já trabalhei por cinco anos na Casa Campos, hoje loja Além da Lua, minhas filhas estavam estudando fora, meu marido trabalhando, eu para não ficar muito só em casa fui ajudar a minha amiga e no fim acabei ficando o período integral. É uma loja de artesanato. Na faculdade aprendemos a entalhar, fiz machetaria com a Isabel Guardia. (Machetaria é a arte ou técnica de ornamentar as superfícies planas de móveis, painéis, pisos, tetos, através da aplicação de materiais diversos, tais como: madeira, metais, madrepérola, pedras, plásticos, marfim e chifres de animais, tendo como principal suporte a madeira).

Ainda adolescente você trabalhou no açougue mas já estava tentando encontrar outra atividade profissional?

Fui fazer o curso de cabeleireira na Escola de Cabeleireiros Calazans, do Gilson Calazans. Trabalhei uns 20 anos nessa atividade, ainda trabalhando no açougue já fazia um pouco de cabelo. Depois que meu avô fechou o açougue passei a trabalhar como cabeleireira em tempo integral Naquela época não havia muitos cabeleireiros em Piracicaba. Eu era bem famosa aqui na Vila Rezende. Comecei trabalhando sozinha, depois passei a ter alguém que ajudava a fazer unhas. Trabalhava no fundo do quintal da minha avó. Fiz um quartinho, um banheiro, e fazia lá. Comprei o secador, lavatório era muito caro, não tinha. Coloquei duas colunas de concreto que adquiri na Artefatos de Cimento Coimbra, em cima coloquei uma pedra de granito, um espelho, que conservo até hoje, assim passei a trabalhar.
                                         SECADOR DE CABELO ANTIGO COM PEDESTAL


                                                              BOBES NO CABELO

O secador era aquele em que a mulher enfiava a cabeça dentro?

Era esse mesmo! Tinha um babyliss, que era um modelador para ficar enrolado, ao contrário da conhecida “chapinha” que alisa o cabelo. Essa moda de enrolar o cabelo está na moda de novo.

Naquela época era muito comum, as moças enrolarem o cabelo com bob de plástico, passar boa parte do dia com os bobs e um lenço sobre a cabeça para depois irem terminar o penteado?

Às sextas e sábados eu começava a atender às cinco horas da manhã, enrolar os cabelos das meninas. Elas colocavam um lenço cobrindo a cabeça e iam trabalhar. Quando saiam do serviço voltavam para arrumar o cabelo. A moça com bob na cabeça com certeza já sabia que a noite iria passear. Era chique até! Eu tinha clientes que moravam nas proximidades da Santa Casa de Piracicaba, a Neide Krahenbhul fazia unha comigo. As meninas que trabalhavam nas lojas do centro vinham bem cedinho para enrolar o cabelo, tinham que tomar o ônibus e chegar ao local de trabalho às sete horas.

   
O famoso cabeleireiro Nandi era seu vizinho?

Era meu vizinho! Na Vila Rezende era eu, o Nandi e a Alzira (Zaíra) Papini e a Marli Zurck.

Os produtos utilizados para “fazer a cabeça” das moças eram improvisados?

O laquê era fundamental! O cabelo era enrolado com cerveja! Passava cerveja no cabelo para ficar duro!

Não ficava o odor da cerveja?

Ele secava, ficava duro apenas. Tempo de produtos da marca Anaconda.

O salão de cabeleireiro é um local com alguma semelhança a uma sala de psicólogo, onde as pessoas desabafam seus males?

De certa forma sim. É essencial que o profissional mantenha o sigilo de tudo que ouve ou sabe, ou poderá naufragar o seu empreendimento. Há momentos em que a pessoa sente-se a vontade para revelar confidências, suas ou de uma terceira pessoa, e isso não deve virar a chamada fofoca.

Para ir para o centro você utilizava o bonde?

Quanto pegar o bonde! Um pouco antes da cabeceira da ponte sobre o Rio Piracicaba, havia uma porteira que era fechada para dar passagem ao trem particular do Engenho Central.

O local que por muitos anos foi denominado de “Bimboca” situa-se aonde de fato?

Se você for pela Avenida Dona Santina, irá passar por um posto de saúde, descendo a atual Rua Francisco de Souza, tem uma bica de água, ali é que era a Bimboca. Mais adiante tínhamos o famoso bairro do Pitá, assim denominado por ter a plantação de pita ou agave, material que o industrial Virgilio Lopes Fagundes utilizava em sua indústria de cordas. Atualmente essa área está toda urbanizada. Essa descida que temos na Avenida Manoel Conceição é denominada como pertencente ao Bairro São Luiz.

Você freqüentava os cinemas de Piracicaba?

Freqüentava o Politeama, comprava balas, chocolates, na “bombonière” situada entre os bancos Itaú e Bradesco, na Praça José Bonifácio nº 13 de propriedade de José Passarela. Ia a outros cinemas também, na época existiam o Broadway, o São José o Palácio e o Colonial na Rua Benjamim Constant. Eu gostava de ir ao Politeama, é onde a juventude reunia-se. Dizíamos de vez em quando que “íamos fazer a praça”. Tinha uma grande amiga Leila Pizelli, advogada, trabalhava na prefeitura. Íamos até o centro, o seu pai tinha uma caminhonete, dávamos uma volta de caminhonete no centro. Às vezes quadrávamos o jardim da Vila Rezende, era freqüentado mais pelos jovens da Vila Rezende, eles não se misturavam com o pessoal da “cidade”. Na época a Caninha Tatuzinho e a Caninha Cavalinho estavam em atividades intensas. Eu tinha bastante amigas que trabalhavam na Tatuzinho.

Quais eram os cortes e penteados de cabelo femininos mais na moda da época?           

Eram “Joãozinho”, Chanel, Coque, Banana, que era um penteado que ficava na parte posterior um formato parecido com uma banana.
        PENTEADO FEMININO CONHECIDO COMO "BANANA" MUITO USADO NA ÉPOCA

Você teve a oportunidade de conhecer diversos artistas de repercussão nacional, no auge da carreira?

Na década de 60, anos da Jovem Guarda, quando muitos artistas estavam no auge, houve um almoço em Sumaré, do qual eu participei, era composto basicamente por artistas de expressão: Jorge Bem, George Freedman, Martinha, Pedro Paulo Rangel.

E Milton Nascimento?

Ele era de Três Pontas, no período em que morei lá o conheci, na época eu era criança, tinha uns doze anos, ele estava começando a fazer sua carreira. Era praticamente um anônimo. Depois que ele fez sucesso e estourou. Gosto muito de teatro, quando vinham peças com artistas muito famosos, íamos meu marido e eu até o camarim, para conhecê-los, cumprimentá-los. Assisti um show de Roberto Carlos e André Rieu.no Chile.

De maneira geral nós não valorizamos muito a nossa história?

Nada! Vejo o que sobrou, edificações que a especulação imobiliaria ainda não derrubou. Sou conservadora. Em frente a minha casa nasceu um pé de mamão, está carregado. Do outro lado da rua tem uma praça, ali já plantei diversas mudas de àrvores frutiferas, Inclusive duas mangueiras, quando o bairro não era tão habitado, meu marido colocava uma rede entre as duas mangueiras e ali ficava, olhando as crianças que brincavam. Até hoje cuido dessas plantas, faço compostagem, coloco adubo natural, corto grama.

Você gosta de ler?

Devoro livros, prefiro os livros de leitura leve, também chamados de àgua-com-açúcar. Embora as vezes também leio livros utilizados pela minha filha que atua profissionalmente na área de psicologia. Leio jornais, do começo ao fim. Tenho o habito de recortar aquilo que me interessa e às minhas filhas.

Você participa de alguma instituição como voluntária?

Já estou ha 20 anos como voluntária da instituição Associação Viva a Vida - Mulheres Mastectomizadas, mais conhecida como “Viva a Vida” situada a Rua José Pinto de Almeida, 824. A Dona Vilma Almeida de Godoi, foi a primeira pessoa a se preocupar em dar suporte à mulheres com cancer de mama, iniciei fazendo pinturas em tecido e fazendo perucas para as pacientes. Sou a primeira pessoa não acometida pelo mal a ajudar. Um dia Dona Vilma aceitou que eu ajudasse a instituição. Passei a fazer de tudo um pouco. Ajudar a fazer a primeira prótese, para as pessoas que não tem condições de comprar. Fazemos uma de paninho, com os pesos certos, é colocado dentro do sutiam. Fazemos esse trabalho, faço artesanato com as pessoas. Temos psicólogos, fisioterapeutas, contribuímos com cestas básicas, tentamos elevar a auto-estima da pessoa. Ali é freqüentado por mulheres de todos os níveis. Temos o brechó que abre de segunda a quinta do meio dia e meia até as três e meia, às quintas feiras é das duas horas da tarde até as quatro horas. O primeiro bingo feito pela Associação foi organizado por mim, pelo meu marido Wilson e pelo saudoso Didi Cardinalli. Foi lá no Lar dos Velhinhos. Depois o Capitão Gomes passou a nos ajudar, fizemos reuniões beneficentes com jantares. Assim levantamos a Associação. O volume maior de pessoas assistidas por nós é de pessoas carentes.

segunda-feira, junho 26, 2017

DOM IRINEU DANELON


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 10 de junho de 2017.

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

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ENTREVISTADO: DOM IRINEU DANELON


 

O Bispo Diocesano de Lins, Dom Irineu Danelon, nasceu no dia 4 de abril de 1940 na cidade de Piracicaba, em uma região da cidade em que na época era considerada zona rural, Bairro São Jorge, ao lado do Terminal de Ônibus Urbano do Bairro São Jorge existe a Capela São Jorge, seus pais foram uns dos construtores. Fundou e acompanha a Pastoral da Sobriedade, que lida com dependências do álcool e outras drogas. É salesiano, tendo sido colega do padre Jonas Abib, fundador da Comunidade Canção Nova, grande expoente da Renovação Carismática Católica  no Brasil. Dom Irineu apresenta o programa Sobriedade Sim, na TV Século XXI, as segundas-feiras, as 20 horas. Também apresenta programas na Rádio Regional Esperança, da Diocese de Lins, Foi diretor da Gráfica Salesiana na Mooca. Irineu em grego significa portador de paz, pacífico.




Qual é o nome dos pais do senhor?

Meu pai Antonio Danelon, minha mãe Antonia Lovadini Danelon, tiveram os filhos: José, Antonio, Tarcísio e Irineu. Meus pais tinham um sítio, eles cultivavam de forma especial a horta, uma plantação que não precisa de muita terra.

O senhor chegou a trabalhar no cultivo de hortaliças?

Principalmente na horta! Eu tinha também os meus canteiros, meu pai ia ao mercado, vendia, o dinheirinho resultante da venda dos produtos dos meus canteiros ele me entregava. Assim ele me estimulava.

Além da Capela São Jorge, o senhor freqüentava qual igreja?

Freqüentava a Igreja dos Frades, isso significava ir até a cidade, eram cinco quilômetros de distância. O meu pai tinha como meio de locomoção carroça com roda de ferro, tracionada por animal.

O senhor ia a pé até a igreja ou escola?

Ia a pé, pisando no barro, tirava o sapato, quando chegava perto da cidade lavava os pés e punha o sapato. Subia o Morro do Enxofre (Avenida Madre Maria Teodora), pegava “rabeira” do caminhão carregado com cana-de-açúcar que subia o Morro do Enxofre. Os motoristas já nos conheciam, fazíamos um sinal, eles paravam. Era meio perigoso, as canas não tinham o mesmo comprimento, uma era mais comprida outra mais curta. Isso foi dos nove anos em diante, o primeiro ano escolar estudei em casa, os meus pais emprestaram parte da casa, que era grande, para fazer uma escolinha rural. O curso primário conclui no Grupo Escolar Dr. João Conceição. A minha primeira professora era Dona Elisa. Depois os Salesianos vieram para Piracicaba, os frades emprestaram para eles a Escola Dr. João Conceição. Ali passaram a lecionar o curso preparatório para ingressar no ginásio. Eles deram-me bolsa de estudos. Meus pais não tinham como pagar um colégio.

O senhor foi coroinha?

Fui, na Igreja dos Frades, lembro-me do Frei Liberato de Gries, Frei Felicíssimo, Frei Fulgêncio, Frei Evaristo. Tornei-me coroinha quando fui aluno dos salesianos, sou da primeira turma do Colégio Salesiano em Piracicaba. Os frades ficaram sabendo que eu era coroinha, quando iam para as celebrações em área rural me levavam. (A religiosidade do fiel da zona rural é muito respeitosa, o coroinha, que é um auxiliar do padre ou frade, é tratado quase como o próprio padre).

Os estudos continuaram em qual escola?

Fiz o ginásio e o curso colegial com os salesianos do Colégio Dom Bosco. Os salesianos construíram o próprio colégio, sob a orientação do Padre Pedro Baron. Inicialmente alugaram dependencias do Colégio Nossa Senhora da Assunção, e aos poucos foram construindo o atual Colégio Salesiano Dom Bosco onde atualmente tem até faculdades. Após concluir o ginásio fui para Lavrinhas, onde conclui o colegial. Fomos de trem, até São Paulo pela Companhia Paulista de Estradas de Ferro, de São Paulo até Lavrinhas pela Estrada de Ferro Central do Brasil . Fomos em oito rapazes, eu caipira de Piracicaba, nunca tinha saído da cidade. Tem muitos padres salesianos de Piracicaba, acho que são 29. É bonito o trabalho deles com a juventude. Depois eu fui promotor vocacional, buscava vocações, encaminhava, ajudava. Daqueles hoje tem 157 que são padres.




                                                    Seminário Diocesano de Lavrinhas




Em que ano o senhor ordenou-se como padre?

Foi em 1967, na igreja dos salesianos, Nossa Senhora Auxiliadora, no bairro Bom Retiro, em São Paulo. Fiz a Faculdade de Filosofia em Lorena, Teologia estudei no Instituto Pio XI em São Paulo, a minha primeira obediencia, é assim que denominamos quando recebemos a cartinha de obediência, fui trabalhar em Campinas, em um grande internato que havia lá, Liceu Nossa Senhora Auxiliadora, eu era professor e orientador dos meninos. Tinha 450 alunos internos! E 2.000 externos! O colégio é grandioso, ocupa duas quadras. Onde eu era padre novo o que chamam de Coordenador da Pastoral, ou então catequista. Após tres anos de permanência em Campinas, recebi a obediência de trabalhar na formação dos futuros padres. Em Lorena, onde permaneci por três anos. Deram-me obediência de novo, para volatar ao primeiro colégio, Liceu Nossa Senhora Auxiliadora de Campinas. Após algum tempo voltei para Lorena onde lecionei Filosofia.


Qual foi a próxima etapa?

Acharam que eu tinha jeito, mandaram-me estudar em Roma. Fui fazer uma complementação de estudos, permaneci em Roma por quatro anos, na Universidade Salesiana de Roma, eu morava nela mesmo, participava de todos os eventos, com a comunicação fácil   que demonstrei ter era convidado para ir a diversos eventos, não podia deixar de dar a contribuição. Minha tese de doutoramento foi sobre a situação do menor no Brasil. Fundei a Pastoral da Sobriedade, cujo objetivo é espalhar o que eu estudei, sobre a importância da educação de todos os menores, não existe menor de segunda classe. Partilho muito do ideal de vida de São João Bosco, a importancia da educação integral. Para todos.













                                     


















                                                 Monsenhor Jonas Abib e Dom Irineu Danelon


                                                          Como nasceu a RCC



                                                    Dom Danelon e TV SÉCULO XXI

                                          Entrevista com Bispo D Irineu na Radio Regional Esperança Lins-SP.

 Dom Irineu Danelon fala de seus 25 anos de episcopado



                                                         Gráfica Salesiana da Mooca

                     









Em Roma o senhor teve contato com o Papa?

Quase todas as semanas íamos fazer as visitas em que ele recebia o público todo. Era o Papa João Paulo II.

O senhor chegou a ter alguma conversa pessoal com o Papa João Paulo II ?

Por três vezes! No período das férias eu fui para Castel Gandolfo, onde o Papa passa as férias. O Papa João Paulo morava ali, eu também morava em Castel Gandolfo o encontro era quase semanal. Lá tem a comunidade salesiana também.

Como era o Papa João Paulo II ?

Era muito receptivo, Tivemos conversas particulares por três vezes ou até mais. Geralmente falávamos sobre o que a Igreja precisa, sobre os padres novos. Ele deu início ao Concilio, e o resultado é o que vemos hoje.

Chegaram a tomar alguma refeição juntos?

A primeira refeição ele foi até a minha casa, foi almoçar em casa, era em frente uma da outra, Depois ele me convidou para almoçar com ele. Aquele menino caipira do sítio, de Piracicaba, olha onde foi parar!

Quando o Papa João Paulo foi almoçar em sua casa o que foi servido?

O Papa já tinha vindo ao Brasil, sabia que aqui todo mundo come feijão, então tinha feijão e arroz lá também.

O Papa comeu arroz e feijão?

Ué! Estava na mesa não é? Ele sabendo que eu era de origem italiana mandou fazer uma polenta, foi o que ele trouxe. Essa adquação é muito edificante. O Papa João Paulo II manifestava um amor especial aos brasileiros. Quando fui almoçar na casa do Papa também tinha arroz, feijão, macarronada. Na terceira vez ele almoçou na Comunidade Salesiana onde eu morava. Ai já foi um almoço comunitário.

Houve alguma oportunidade de encontrar o Patriarca da Igreja Ortodoxa?

Fui fazer uma visita de quase um mês na Terra Sntaa, tive a oportunidade de almoçar com o Patriarca  da Igreja Ortodoxa, isso em Jerusalem. Foi um almoço informal.

Qual era o idioma utilizado para conversarem?

Era o italiano.

O senhor fala quantos idiomas?

Nem português como deveria falar! Caipiracicabano acredito!

O senhor tem como característica marcante a humildade.

Não tenho que me prevalecer em nada porque tudo foi Graça de Deus.

Após ter permanecido em Roma, de volta ao Brasil, para que local o senhor foi solicitado?

Voltando de Roma fui nomeado diretor do Liceu Nossa Senhora Auxiliadora em Campinas onde permaneci por cinco anos. O Padre Inspetor me nomeou diretor do Seminário de Filosofia, em Lorena, tinha uns setenta alunos, seminaristas. Após isso fui nomeado promotor vocacional dando apoio aos jovens que queriam ser padres. Fui nomeado Inspetor Vocacional de toda nossa Inspetoria Salesiana em São Paulo e o Estado do Paraná. Me fizeram diretor do Seminário de Filosofia, onde estudei.

O senhor teve a ordenação episcopal em que ano?

Foi em 1988.

Como Bispo de Lins quantas cidades pertencem à diocese?

A diocese abrange 97 cidades, de Lins até Mato Grosso, depois que fizeram a Rodovia Marechal Rondon ficou até fácil, as cidades todas estão ao lado. Quando eu cheguei lá ainda era estrada de terra.

Todo bispo tem um lema, qual é o do senhor?

O meu lema é: “O amor jamais passará” (Caritas Nunquam Excidit) é da Primeira Carta de São Paulo aos Corintios, capítulo 13, versículo 12.

                      QUADRO NA RESIDÊNCIA DE DOM IRINEU DANELON

Há uma diminuição de vocaçoes sacerdotais?

Depende muito da formação que os padres realizam. È necessário buscar, preparar, apoiar, as vezes até economicamente, tudo tem um custo. Não faltam vocações, necessita haver apoio. O padre ao exercer bem o seu ministério atrai o jovem para o sacerdócio.

Nomes de grande projeção nacional, empresários, publicitários, segundo a mídia, dizem que rezam o terço regularmente.

Eu rezo o rosário, que são três terços, todos os dias. Principalmente durante as viagens, quando se tem mais tempo. Não é necessário rezar em voz alta.

O senhor tem algum livro escrito?

Tenho vários. Um deles é Promoção Vocacional, não faltam candidatos ao seminário, o que falta é quem os promova. Quem chame, dê animação. Como bispo eu ordenei 27 padres. Trabalhei no aspirantado, no noviciado, tenho um especial amor a esses jovens que enfrentam muitas dificuldades para poder tomarem essa decisão. A gente compreende, visita a família, apazigua a família, há casos em que os pais estão esperando do filho um apoio econômico.

Como o senhor vê essa profusão de religiões?

Vejo como a falta de uma catequese em profundidade. A simples decoração de algumas perguntas e respostas não tem o conhecimento profundo de Jesus Cristo. As vantagens que tem um discípulo de Jesus. Alguns têm a religião mais por tradição familiar, sem uma formação especial. Como conseqüência a religião tornou-se um costume mais do que uma doutrina.

Há diferença entre religião e fé?

A fé faz parte da verdadeira religião.

O senhor tem devoção especial a algum santo?

Por tradição, Santo Antonio, meu pai é Antonio, minha mãe Antonia, o padroeiro de Piracicaba é Santo Antonio, meu irmão Antonio casou-se com uma moça chamada Antonia, tenho muita fé em São João Bosco. É admirável a sua forma de vida, a maneira educada de tratar as pessoas, pelo empreendimento que ele teve na sua vida. Tanto na cadeia, nas escolas, no colégio que ele fundou, fui o primeiro aluno do Colégio Salesiano Dom Bosco de Piracicaba, então ele é um dos meus santos desde criança.

O senhor praticava esportes?

Nunca fui bom de bola! Mas sempre participei, no sítio em que eu morava tinha um cercado, lá foi transformado em um campo, um gramado bonito, nos fins de semana tinha o joguinho de futebol lá. Eu era mais juiz do que jogador!

Como foi a reação familiar na ordenação episcopal do senhor?

Meu pai já havia falecido, minha mãe participou da missa da minha ordenação episcopal. Ela ficou muito emocionada, chorou durante a missa toda. Quando dei a palavra à ela, em sua simplicidade ela afirmou que valeu a pena todo sacrifício. Foi sacrificada, uma formação de longo período. Ela ia de vez em quando de Piracicaba para Lavrinhas, tinha que tomar dois trens. Parar em São Paulo. Tudo desconhecido para ela. E também porque eu era um dos filhos já estudados, que talvez levasse um apoio financeiro à família, mas no fim eu recebia o apoio da família. Eles nunca esperaram que o filho fosse padre, não tinha ninguém com essa formação na família. Muito menos bispo. Ela chorou. Eu chorei. Muitos dos que estavam na missa choraram.




                                                   Filme Dom Bosco – completo



O Sonho de Dom Bosco - Il sogno di Giovanni - Brasil - Italia - Recine 2011


Brasília - sonho de Dom Bosco

Relíquias de Dom Bosco

A urna com as relíquias de Dom Bosco em Piracicaba,SP
 




domingo, junho 25, 2017

GEORGINA NASSIF


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado de 03 de junho de 2017

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

http://blognassif.blogspot.com/


http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADA: GEORGINA NASSIF


Georgina Nassif nasceu em Santa Bárbara D Oeste  a 22 de janeiro de 1926,  filha de Nagib Nassif e Rosa CanaãNassif que tiveram 13 filhos, sendo que 3 deles faleceram ainda muito novos. Rosa e Nagib tiveram os filhos Mary e Linda nascidas no Líbano. Os demais nasceram no Brasil, são: Josefa (em alguns documentos consta Josefina), José, Afife, Isabel, João, Georgina, Jorge e Geraldo.










Os seus pais vieram do Líbano?

Ambos vieram do Líbano, Rosa era a única filha do sexo feminino, tinha outros irmãos, sendo que dois deles também vieram para o Brasil, ambos eram advogados: Mário Canaã e Jorge Canaã. Nagib Nassif e Rosa Canaã Nassif casaram-se no Líbano. A autorização para o casamento foi concedida por outro irmão, o mais velho de todos, que na falta dos pais, pelas leis locais tinha esse poder. Rosa casou-se com 14 anos de idade, Nagib tinha mais de 40 anos. Foram morar com os pais de Rosa em Beirute. Tiveram as duas filhas, Mary e Linda, Rosa estava grávida pela terceira vez, quando Nagib decidiu aventurar-se em terras brasileiras.

Em que local Nagib fixou residência no Brasil?

Em Santa Bárbara D Oeste ao que consta adquiriu uma propriedade urbana. Ele passou a ser o que quase todos os imigrantes libaneses foram: mascate. Pelas informações que tenho, ele percorria grandes distâncias. Chegou a Minas Gerais, Goiás, mascateando. Com isso ele economizando, trouxe a esposa e as filhas para o Brasil. Montaram um armazém em Santa Bárbara  D Oeste. Nesse período teve o dissabor de ter sido furtado em uma soma relevante por pessoa que considerava amiga, a família mudou-se para o bairro rural de Caiuby, onde estabeleceu um pequeno armazém. A família cada dia mais numerosa, os rendimentos não atendiam plenamente as necessidades. É uma tradição de alguns povos, que o filho primogênito assuma funções relevantes. José, o primogênito, era funcionário do Cartório de Santa Bárbara D Oeste. Diante das circunstancias emergenciais, seu parco salário não era suficiente para ajudar a prover a prole, na época constituída em sua maioria por crianças.







                 GEORGINA COM UMA AMIGA NO TERRAÇO SUPRIOR DO SOBRADO AO FUNDO   A VISTA DE PIRACICABA  

MESMO TERRAÇO COM A FOTO DE ALGUNS DE SEUS SOBRINHOS

Qual foi a atitude de José?

Embora muito jovem, percebeu que seu pai já não estava em suas melhores condições de saúde, decidiu pedir a demissão no cartório e passou a negociar, fazer corretagem, de algodão. Para economizar, ia a cavalo até as propriedades interessadas em vender o algodão, depois com um caminhão muito precário, adquirido com muito esforço, ia buscar a mercadoria. Apesar de estarmos nos referindo a década de 30, a região merecia o cognome de Oeste Paulista, não só pela localização geográfica, mas também pela semelhança com a vida difícil e violenta do Oeste Norte Americano, principalmente no meio rural, onde povos dos mais diversos pontos do mundo se aglomeraram: russos, norte-americanos (Os Confederados do Sul dos Estados Unidos), italianos, libaneses, espanhóis, portugueses. Eram todos imigrantes que traziam cicatrizes do país de origem.  Um povo sofrido e de muita garra. Havia homens famosos por sua valentia e destemor, era muito comum andarem armados com armas brancas ou de fogo. Isso trazia temor e respeito.

Você começou os seus estudos em qual localidade?

Em Caiuby. Tive uma professora de nome Adélia Granja e no ano seguinte a sua irmã Madalena Granja. Estudei lá até o terceiro ano primário. No ano seguinte mudamos para Piracicaba, os negócios prosperaram, passamos a residir a Rua do Rosário, 2547, no primeiro sobrado após a linha da Companhia Paulista de Estradas de Ferro. Fui estudar no Externato São José, situado a Rua D. Pedro II esquina com a Rua Alferes José Caetano. Éramos três irmãos estudando lá: eu, Jorge e Geraldo. O João já estava estudando na quinta série, salvo engano, estudava no Colégio Piracicabano. Nesse ínterim papai faleceu isso foi na década de 40. Eu freqüentava a Igreja dos Frades ou Sagrado Coração de Jesus, freqüentava o Lar Escola Maria Nossa Mãe para fazer retiro espiritual.








Vocês continuaram a estudar no Externato São José?

Em decorrência do falecimento de papai, sendo que éramos três filhos estudando no mesmo local, não nos foi concedido nenhum tipo de desconto. Isso fez com que ficássemos impossibilitados de continuar os estudos naquele local, a escola foi irredutível. A nossa irmã Linda trabalhava no Colégio Piracicabano, expôs o assunto, este nos acolheu com muita boa vontade. Com isso concluí o curso primário e o ginásio no Colégio Piracicabano. A Mary, nossa irmã casou-se em Santa Barbara D Oeste com José Curiacos, que havia sido professor universitário no Líbano, no Brasil teve que abraçar a profissão de comerciante. Lembro-me que era pequena e queria assistir o casamento da Mary com o José, mas naquele tempo segundo nossos costumes, crianças não participavam de cerimônias de adultos. Isso em tudo, criança não podia ficar próxima a adultos.

Após concluir o ginásio no Colégio Piracicabano qual foi a sua opção?

Fui fazer o Curso Normal, no Sud Mennucci. Após me formar fui para Biguá, no litoral. sul paulista. Existia a estação de trem da Estrada de Ferro Sorocabana, era uma viagem longa, quem me acompanhou foi meu cunhado José Curiacos. Eu era mocinha, foi lá que ingressei no magistério. Aluguei uma casa, minha sobrinha Helena Curiacos Nalin foi comigo, e outra colega. Éramos três professoras com uma empregada que fazia o trabalho doméstico. Biguá era uma vilinha, dava aulas para classes mistas, permaneci lá por uns quatro ou cinco anos. Vinha para Piracicaba aproximadamente uma vez por mês. De lá fui removida para São Paulo, na periferia, lecionava em um grupo escolar, surgiu uma vaga no Instituto Pinheiros, ficava na estrada Regis Bittencourt, lá dei aulas para o terceiro ano escolar, permaneci uns três anos. De lá voltei ao grupo escolar que havia lecionado anteriormente, em São Paulo. Lá completei 50 anos de formada professora.

Quantos ônibus você tomava para dar aulas em São Paulo?

Tomava um ônibus apenas, era o ônibus que ia para Itapecerica da Serra, até a escola em que lecionava levava uma meia hora. A classe era composta por cerca de cinqüenta alunos. Eu morava em Pinheiros a Rua Teodoro Sampaio, 1355, onde permaneci por uns 10 anos. Quando me aposentei fui morar no Alto da Lapa, a Rua Eleutério Prado.

Em Piracicaba, ainda mocinha, você era uma das senhoritas que quadrava o jardim?

Eu detestava, mas tinha amigas que adoravam. Eu gostava de ficar parada. Olhando. Voltávamos do centro de bonde. Na época eu morava no sobrado, havia um professor universitário, falecido recentemente, que era apaixonado por mim.

Naquela época havia os famosos cururus?

Nossa! Tinha, o meu irmão José havia construído um barracão que usava como depósito de cereais, na entressafra, o barracão ficava vazio, era utilizado para memoráveis cururus. Pessoas de alta reputação na cidade não perdiam um. Estava na moda. Autoridades jurídicas, policiais, pessoas gradas, assim como a população do bairro. Era praticamente o salão social do bairro. Muitas festas de casamento aconteceram ali. Piracicaba não tinha a oferta de locais sofisticados como hoje.  Era tudo na base da camaradagem. Como mocinha não era apaixonada por cururu, mas ia para prestigiar.

A sua irmã, Linda Nassif, foi diretora do internato feminino do Colégio Piracicabano?

Foi na época eu era criança ainda. Estamos nos referindo a aproximadamente oito décadas passadas. Eu cheguei a conhecer a antiga piscina do Colégio Piracicabano, situada a Rua do Rosário, onde termina a Rua D.Pedro II, há uma entrada para uma unidade da UNIP, ao lado foi construído um estacionamento, ali começavam os degraus que levavam os alunos até a piscina.

Como eram os carnavais de Piracicaba?

Eu não sabia nada a respeito, fazia retiro espiritual e religioso no Lar Escola Maria Nossa Mãe.

E cinema você freqüentava?

Ia com a minha irmã Linda. Os cinemas eram o São José, Broadway, Politeama. Lembro-me da Bomboniere do Passarella. Lembro-me da fonte luminosa, do Comurba.

E parques de diversões?

Na esquina da Avenida Dona Jane Conceição com a Rua do Rosário, havia um terreno baldio, onde se instalavam os parques por um período de tempo. Hoje no local existe um conjunto de lojas. O bairro da Paulista recebeu muitos circos, inclusive famosos.

Naquele tempo a água era retirada de um poço?

Não havia água encanada no bairro. A água era retirada com manivela, mais tarde que colocaram um motor, a função do mesmo era encher uma caixa de água que ficava no alto da casa e distribuía para a casa toda. A privada ficava em área externa, distante da casa e principalmente do poço, era popularmente chamada de “casinha”.

O meio de transporte mais comum para São Paulo era o trem?

Usei muitas vezes, havia vagões mais confortáveis, eram os de primeira, os sem assento almofadado, com menos conforto eram os de segunda. A diferença era o preço de cada um.

Após mudar-se para São Paulo, você adaptou-se bem?

Adaptei-me sim. Embora tenha levado uma rotina que incluía serviço, igreja e supermercado.

Você é uma pessoa que sempre foi muito católica, foi Filha de Maria?

Fui sim, foi uma entidade que se destacou, como uma das mais importantes associações religiosas femininas. As Filhas de Maria poderiam transmitir as doutrinas católicas em seus lares, normas e tradições católicas. Usava a fita vermelha, ainda a mantenho. Na realidade a fita vermelha era do apostolado da oração. Naquele tempo para ingressar a igreja usava-se véu, as jovens ou solteiras usavam véu branco, e as senhoras casadas usavam véu preto. Cheguei a usar roupa branca e fita azul. Toda primeira sexta-feira do mês eu não falto a missa.


Qual é o seu santo padroeiro?

Era Santo Antonio, agora é o Espírito Santo e os Arcanjos.

Antigamente havia as famosas quermesses, você as freqüentava?

Ia muito pouco, não gostava. Tinha uma amiga que gostava muito, e também às vezes arrumava um namorado. Eu ficava por perto, esperando.

Você era a famosa “vela”?

Exatamente! Para quem não sabe, “vela” era o nome dado para a acompanhante de uma moça que está namorando. Eu era a “vela” sem chama!

Tinha o serviço de alto falante, você recebia mensagens através do correio-elegante?

Mandavam! Eu recebia, mas não respondia!

O locutor anunciava: “O rapaz de camisa branca e calça azul, com blusa preta oferece para a moça de vestido branco, cabelos escuros, com simpatia e admiração”. Era mais ou menos assim?

Era exatamente isso! Às vezes tinham alguns mais criativos!

Tem algum cantor que você gostava?

Tinha! Orlando Silva, Vicente Celestino, Nelson Gonçalves.




Na Rua do Rosário, a poucos metros da esquina da Avenida Dr, Edgar Conceição, havia uma bomba de gasolina manual, da TEXACO?

Era da nossa família! Muitas vezes eu manuseava essa bomba. Às vezes o motorista que estava abastecendo acabava ajudando bombear a gasolina, não era elétrica! Quando mamãe estava ao lado, ninguém deixava que ela fizesse esse trabalho. Além do barracão que servia para armazenar os produtos da safra, havia na esquina da Rua do Rosário com a Avenida Dr. João Conceição um armazém, com uma porta que se comunicava com a casa onde morávamos. Geralmente eram as mulheres da família que atendiam o balcão. Ali eram feitas as vendas de varejo.
     GEORGINA NO DIA DO CASAMENTO DA SU IRMÃ LINDA COM ANTONIO MARTINS AO FUNDO A BOMBA MANUAL DE GASOLINA DA TEXACO JUNTO AO MEIO FIO, NA RUA DO ROSÁRIO EM FRENTE AO NÚMERO 2555.




Naquele tempo a Paulista tinha poucas casas?

O sobrado onde morávamos estacava-se. Existiam outras construções, porém mais modestas. Já existia a casa em frente de propriedade de Isidoro (Nenê) Lopes. Em torno da hoje Praça Takaki existia muitas pessoas excelentes. A praça em si era apenas um terreno vazio. A Padaria Takaki veio bem depois, anteriormente fazia muito sucesso o Bar Serenata, de Miguel Fernandes. Era um ponto dos ônibus que iam para a zona rural. O telefone mais próximo ficava a duas quadras de casa, era do Bortoletto, que tinha um armazém onde hoje é uma agência do Bradesco, na esquina da Rua do Rosário com a Avenida Dr. João Conceição. A Rua do Rosário era chão de terra, ou muita poeira ou quando chovia, muito barro. Era mão dupla, iam e voltavam pela mesma rua. Havia muitos caminhões de cana-de-açúcar que levavam suas cargas até o Engenho Central, na Vila Rezende.

                                                                                     


     ALGUNS DOS SOBRINHOS DE GEORGINA. BONS TEMPOS....


Lembra-se de Jorge Canaã?

Lembro-me pouco, mais das cartas que ele me mandava. Conservo algumas até hoje. Ele me deu um dicionário que posteriormente dei ao meu irmão João. Jorge disse que aquele dicionário o havia acompanhado desde suas primeiras letras. Jorge era poliglota, muito querido por vultos do direito piracicabano: Noedy Krahenbuhl Costa e Jacob Diehl Neto. Jorge Canaã tinha um raciocínio muito rápido, um dos seus passatempos preferidos era fazer torcadilhos refinados. Por isso mesmo muito apreciados entre seus pares.

Você fala àrabe?

Muito pouco, entendo alguma coisa. Quem sabia mais era a Mary e a Linda.

          GEORGINA DE FÉRIAS NA PRAIA DE SANTOS

Quem era boa cozinheira da gastronomia àrabe?

A Isabel era excelente.

Em seu Curso Normal você teve aulas com os irmãos Dutra?

Tive com os dois! Archimedes e João., com o Jethro Vaz de Toledo que dava aulas de português.




Como professora aposentada, como você vê o ensino?

Deteriorado! O nível abaixou muito! As mães, responsáveis, ouviam o que as professoras diziam a respeito dos filhos delas, e também perguntavam.

A tecnologia em suas diversas versões, desde a televisão até a internet ajuda?

A meu ver, absurdos como a recente onda da “Baleia Azul” só traz profundos prejuizos. O uso indiscriminado dos recursos de tecnologia só serviu para intervir negativamente na família. Existe uma grande diferença entre educação e ensino. Os pais devem educar e o professor deve completar através do ensino. Hoje os pais querem que o professor eduque e ensine, isso é completamente errado, a educação tem que partir da casa da criança. Os pais são os exemplos que os filhos seguem, em todos os sentidos.
                     UM DOS COLÉGIOS EM QUE GEORGINA LECIONOU EM SÃO PAULO

Antigamente o profesor era uma figura respeitada?

Era! Primeiro eram os pais, depois os professores.

O que você achou em dar aulas por cinquenta anos?

Tenho saudade até hoje!
            GEORGINA SENDO HEMENAGEADA POR SEUS ALUNOS


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