domingo, janeiro 27, 2013

CYONÉA ED RAMOS

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 12 de janeiro de 2013
Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/

ENTREVISTADA: CYONÉA ED RAMOS
Qual é a origem do nome Cyonéa?
Não sei. Quando eu estava para nascer uma tia foi morar em casa, ela estava lendo um romance em que a heroína chamava-se Cyonéa. Ela se encantou pela heroína e influenciou a minha mãe para que me colocasse esse nome. Nunca descobri qual era esse romance. Sou filha de Cecílio Ramos e Maria Santa Ramos, nasci a 9 de maio de 1935 em Nipoã, próxima a São José do Rio Preto. Meus pais tiveram mais duas filhas Celinia e Celida Maria. Após meu nascimento meus pais permaneceram em Nipoã por muito pouco tempo, mudaram-se para São José do Rio Preto onde tinham uma casa comercial que trabalhava com artigos de couro: arreios, botinas. Dali fomos para São Paulo, no bairro da Aclimação, lá permanecemos até eu completar uns seis anos. Fomos para Fernandópolis, a cidade estava sendo criada. Fiz o primário todo em Fernandópolis, era uma sala, há uns 10 anos voltei para rever a cidade e no mesmo local existe um grupo escolar. Minha primeira professora chamava-se Antonieta. O professor que se tornou inesquecível foi Paulo Sampaio Mattos, gostaria muito de revê-lo, não consegui ter notícias sobre ele. Na época eu tinha uns 10 anos, admirava-o muito. Ele era piracicabano. Voltamos para São José do Rio Preto onde fiz o curso ginasial e parte do curso normal no Colégio Santo André, mudamos para Araçatuba onde conclui o curso normal no Colégio Nossa Senhora Aparecida. Aos 18 anos, em 10 de dezembro de 1953, fui estudar em São Paulo no Colégio Sagrado Coração de Jesus, onde lecionei um pouco e assumi tarefas de direção da escola. Fiz o curso de pedagogia no Instituto Superior de Filosofia, Ciências e Letras Sedes Sapientiæ. Na época abrangendo a Rua Caio Prado, a Rua Augusta, mas com entrada pela Rua Marquês de Paranaguá. Passei a trabalhar sempre na direção da instituição de ensino. Em 10 de dezembro de 1966, logo no ano seguinte fui convidada para ser vice-diretora em uma escola particular situada na Rua Padre João Manoel, próxima á Rua Augusta, era uma escola de elite. Permaneci lá por seis anos, a escola mudou de proprietário e acabou encerrando suas atividades.

Qual foi seu próximo local de trabalho?

Fui trabalhar no Banco Nacional, entrei como gerente, na Agência República, em seguida foi transferida para a Agência São Luiz. Após algum tempo fui convidada para ir trabalhar na COMGÁS, com a função de supervisionar a parte de atendimento ao público. Situava-se na Rua Augusta, onde permaneci por 13 anos até aposentar-me. A central de atendimento por telefone foi para a Rua da Figueira e o atendimento pessoal permaneceu na Rua Augusta. Minha função era de supervisão. A minha vida sempre foi sem muitas dificuldades.

Isso é uma característica da sua personalidade?

Não sei como explicar a forma como sempre encarei as dificuldades.

Em que ano a senhora mudou-se para Piracicaba?

Foi em 1997. Morávamos em São Paulo, em pouco tempo fomos perdendo pessoas da família. Ficamos minha irmã e eu. Ela estava muito doente. Nós duas gostávamos muito de São Paulo. Passei a comentar com minhas amigas: “-Eu quero ir para o interior, morar em uma cidade que não tenha muro, cerca”. Todos riam de mim, diziam: “- Essa cidade não existe”. Visitei algumas cidades do interior, nada me agradou. Um dia uma amiga me telefonou dizendo: “ -Aquela cidade que você procura, existe!”. Ela tinha visto uma matéria veiculada pela Rede Globo sobre o “Lar dos Velhinhos” em Piracicaba. Um jornalista da Rede Globo conheceu o Lar e fez uma reportagem. Telefonei para o Lar, fui atendida por uma senhora que residia no Lar, de forma muito agradável ela fez o convite para que viéssemos conhecer. Vim. Gostei. Lembro-me muito bem que fui até a capela e orei pedindo uma orientação divina. Senti que o local era este mesmo. Negociamos a nossa casa em São Paulo e viemos.

A casa foi construída pela senhora?

A minha casa e a casa vizinha foi construída em um terreno onde seria edificado um hospital. Era um terreno considerado quase “sagrado”. Dr. Roberto Canciglieri era o diretor de patrimônio. Minha amiga Zilda que também queria vir, iria construir a sua casa ao lado da minha. A diretoria aprovou o uso do terreno, comecei a construção, a minha amiga não começava. O terreno destinado a ela foi cedido à outra pessoa que hoje está no pavilhão.

Em que ano a senhora mudou-se para o Lar dos Velhinhos?

Foi no dia 12 de fevereiro de 1997.

Qual foi a sua primeira impressão ao mudar-se para o Lar dos Velhinhos?

Perfeita. Tenho uma vizinha aqui no Lar que foi minha vizinha em São Paulo por 17 anos. Ela morava em Limeira, com seu marido. Ela veio para ajudar um pouco quando mudei, um fato pitoresco é que ela trouxe de Limeira uma panela com sopa já pronta. Ela sabia que precisávamos de algo para nos alimentar. Todos os moradores do Lar nos atenderam muito bem. Foi uma recepção maravilhosa.

A senhora passou a ter uma participação mais ativa no Lar dos Velhinhos a partir de quando?

Pelas suas condições de saúde minha irmã precisava muito de mim, eu ficava a sua disposição. Em outubro de 1998 ela faleceu. Passei a ter muito tempo disponível. Um dia estava andando pelas dependências do Lar, entrei em um pavilhão onde encontrei a Irmã Virginia. Conversando com ela perguntei-lhe como funcionava o uso de fraldas geriátricas. Ela disse que usavam pano. Comecei a trabalhar no sentido de fabricar internamente as fraldas. Fralda sempre foi muito cara. Fui até o SEBRAE, infelizmente não tiveram como me ajudar. Passei um ano inteiro trabalhando nisso, fui muitas vezes à São Paulo, a máquina de fralda infantil não dá certo. Numa dessas viagens à São Paulo, quando fui levar uma pecinha para ver se adaptava para fralda geriátrica, vi um equipamento grande, perguntei o que era e me disseram que era uma máquina para fazer fraldas geriátricas. Nessa altura adquiri uma dessas máquinas, com meus recursos, e doei ao lar. Algumas pessoas como a Mariazinha, Marina fomos para São Paulo para aprender a usar a máquina. Eles trouxeram o equipamento, Mariazinha passou a ser a operadora da máquina, Marina ajudava, e muitas pessoas passaram a contribuir com dinheiro para adquirir o material necessário à fabricação. Temos uma lista de pessoas que contribuem mensalmente para comprar a matéria prima. A 29 de setembro de 1999 fizemos o primeiro bloco de fraldas, eram 10 pacotes com 18 fraldas em cada um, totalizando 180 fraldas. Para nós foi um grande sucesso. Conduzimos com pompa e circunstância para a administração do Lar. Continuamos a trabalhar, a Mariazinha passava fralda por fralda na máquina. Surgiu uma voluntária, muito jovem ainda, começou a trabalhar como Mariazinha ensinou. Essa moça, dotada de uma habilidade própria, começou a passar as fraldas em seguida. Produzimos mais. Hoje fabricamos mais de 6.000 fraldas por mês, com a mesma máquina acrescida de mais um módulo, o que faz o corte, antes fazíamos o corte, colávamos as etiquetas e embalávamos.

Essas 6.000 fraldas produzidas mensalmente atende a demanda do Lar?

Não atende. Nossa máquina só produz fraldas médias. Faltam as fraldas G e GG.

Qual é a maior necessidade existente hoje no fraldário?

Falta mão-de-obra.

Se uma pessoa quiser ser voluntária e tiver disponibilidade de duas horas por semana ele pode ajudar?

Pode sim, tanto durante o dia como a noite. O fraldário fica permanentemente aberto. Basta a pessoa aprender e poderá passar a vir trabalhar como voluntária quanto tempo desejar. A pessoa voluntária pode sair do seu trabalho, chegar aqui as sete horas da noite e trabalhar o tempo que desejar. Basta ter vontade.

Há necessidade de mais fraldas?

Existe a necessidade. Tudo que produzimos é consumido. Sabemos que são adquiridas fraldas para atender a demanda. A máquina às vezes quebra, passamos até uma semana sem produzir nenhuma fralda. Não conseguimos manter fraldas em estoque, por falta de mão-de-obra. A nossa operadora Ana Zurk é fantástica, ela conhece essa máquina muito bem. Ela tem um circulo de amizades com muitos engenheiros, quando a máquina dá problema ela traz essas pessoas para ajudar a solucionar. Às vezes até vir um engenheiro da fábrica situada em São Paulo há uma demora. Temos custos com sua vinda: transporte, estadia.

Seria ideal ter uma segunda máquina ou não há espaço?

Espaço se arruma. Poderia ser uma máquina para tamanho G. Existe uma máquina mais completa, que exige menos mão de obra. Hoje temos uma máquina que monta e corta, antes eu e outra pessoa que cortávamos a mão. Eu só conheço um fabricante de máquinas de fazer fraldas, nessa escala de produção. Existem outros fabricantes de máquinas maiores, voltadas para indústrias, são equipamentos que custam a partir de R$ 300.000,00. Não é o que necessitamos. A nossa máquina é um pouco mais do que doméstica, mas que nos atende quase plenamente.

A senhora participa da administração do Lar dos Velhinhos?

Já fui secretária, atualmente sou diretora de patrimônio. Sou apaixonada pela gruta existente no Lar dos Velhinhos. A Marina e eu trabalhamos lá um ano inteiro na revitalização da mesma. Quando foi construído o Memorial do Lar, tivemos que revitalizar novamente. Não mudamos nada do projeto original. Fizemos a Praça São José atrás dos pavilhões Lula e Lili. Fizemos um roseiral, com a colaboração de muitas pessoas. Uns regam o roseiral, alguns ajudam na gruta.

A leitura ocupa parte do seu tempo?

Gosto muito de ler, só não tenho lido mais por falta de tempo. Estou terminando de ler “A Arte de Morrer”, uma obra com vários autores, cada um foca um segmento.

Em seu ponto de vista o que é a morte?

Acho que a morte é uma passagem. Houve um tempo em que era chique entre os intelectuais, não acreditar em nada. Era intelectual, era ateu. Comparo muito a morte com o nascimento. Ao nascer você vem de um lugar tranqüilo, gostoso e cai em um lugar totalmente novo. Ali você começa uma vida. Acho que a morte é uma continuação disso, em que você tem um renascer.

Existe felicidade plena?

Temos momentos de felicidade. É aquele momento em que você acha: “- Se eu morresse agora seria bom!”.

O Lar dos Velhinhos de Piracicaba tem atualmente quantos moradores?

Aproximadamente 520 pessoas. São 130 chalés com uma ou duas pessoas. Às vezes três pessoas. É uma cidade.

A senhora é responsável por um informativo interno?

Sou eu quem cuida. É dirigido á todos os residentes do Lar. Fica alguns exemplares na portaria, na recepção, a disposição daqueles que querem ler. O objetivo é informar. Seja um edifício, um condomínio fechado, o ato de morar em uma comunidade tem certa complexidade. Morar em uma verdadeira cidade como é o Lar dos Velhinhos envolve inúmeros fatores. O informativo é um dos instrumentos para levar as principais notícias ao morador. Elaboro no computador e depois tiro cópias. Por exemplo, a recreacionista me passa a sua programação para o mês. As atividades realizadas pelas terapeutas também são passadas para publicação.

Esses informativos podem ser enviados via e-mail para pessoas externas ao Lar?

Posso mandar basta entrar em contato pelo e-mail: cyonea@gmail.com Nesse informativo colocamos um editorial, é impressa a agenda das atividades programadas para o mês. Eventos com datas fixas e que já se tornaram tradição, com data e local determinados nem colocamos. O Clube do Vinil é um exemplo, ele é realizado todos os sabados, o forró é realizada todas as quintas-feiras. O jornal tem um obtuário, assim como temos a relação dos aniversariantes do mês. Alguns moradores, mais reservados preferem não divulgar a data de aniversário. Há a relação de novos moradores do Lar.

Quem financia o custo da publicação?

Eu.

Há interesse em ter patrocínio, mediante anuncio do patrocinador?

Com certeza, é uma boa oportunidade para quem quizer anunciar, o custo é bem acessível, além de colaborar com o Lar.

Há abertura para que estudantes ou profissionais da área de comunicação colaborem voluntáriamente?

Com certeza. Nós damos os subsídios suficientes sobre as atividades do Lar e eles podem acrescentar matérias de utilidade aos moradores do Lar.

Qual é a motivação que a leva a prestar tanta colaboração ao Lar?

Se eu não fizer isso acho que fico doente. É da minha natureza. Uma vez ouvi de uma moradora uma frase marcante: “A Cyonéa tem a remuneração dela pelo prazer de fazer”. Achei que ela tem razão.

A senhora tem algum hobby!

Trabalhar!

Gosta de música?

Prefiro a música clássica, estudei piano por seis anos, tive um piano que acabei doando, o piano estava reclamando de ficar mudo. coitado. Não tenho apego a nada.























sábado, janeiro 05, 2013

MÁRCIA GONDIM CARNEIRO DA CUNHA E DIAS PACHECO (MÁRCIA PACHECO)

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
Sábado 05 de janeiro de 2013
Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/


ENTREVISTADA: MÁRCIA GONDIM CARNEIRO DA CUNHA E DIAS PACHECO (MÁRCIA PACHECO)




Dra. Márcia Pacheco nasceu em Fortaleza, Ceará, a 26 de dezembro de 1955, filha de Armando Teófilo Carneiro da Cunha e Maria Zélia Gondim Carneiro da Cunha, pais de mais dois filhos, Nelson Gondim Carneiro da Cunha já falecido e do Contra-Almirante Roberto Gondim Carneiro da Cunha. Seu pai era agente federal de rendas e sua mãe professora. Os primeiros estudos de Márcia, aos seis anos, foram em Aracaju, depois prosseguiu em Bauru, São Paulo, Sorocaba.


Onde a senhora cursou medicina?


Não fiz cursinho preparatório para o vestibular de medicina, entrei na Faculdade de Santos e em Sorocaba, cidade pela qual optei. Iniciei o curso em 1974, a duração foi de seis anos, sendo dois anos de estágio em pediatria.


Como a senhora conheceu seu marido Dr. Sérgio José Dias Pacheco, vice-prefeito de Piracicaba por oito anos?


Foi na faculdade. Ele tinha quatro anos de estudos a mais do que eu quando o conheci. Ele era professor assistente.


Tem algum motivo especial para a senhora ter optado em ser médica pediatra?


Sempre gostei muito de criança.


Trabalhando em áreas periféricas, vivenciando a realidade dos fatos qual é a visão da senhora sobre o ECA Estatuto da Criança e do Adolescente?


Trabalho com crianças e adolescentes carentes há 32 anos. Tenho muita critica ao estatuto, em 1991 se reuniram pessoas que se diziam entendidos sem nunca antes terem trabalhado com crianças. Quando fomos criados, a educação impunha limites, esses limites tinham que ser conversado, existia uma penalidade. Se não conseguir estabelecer limites quando a criança é pequena, quando ela for maior ela desafia, se não for rígido, impor um castigo, tirar uma coisa que a criança queira muito, você não consegue educar. Fui educada assim. Eu apanhei muito do meu pai, eu sabia por que estava apanhando, eu era levada, enfrentava meu pai. E estou aqui, amei e amo muito meu pai. Hoje se uma mãe disser que vai colocar uma criança de 10 anos de castigo, ou dar umas boas palmadas no lugar apropriado, essa criança imediatamente diz que irá telefonar para o conselho tutelar. Ameaçam os pais. É um fato interessante, quando chegam às idades entre 10 a 12 anos já ameaçam os pais dizem que vão ligar para o conselho, penso que muitos nem sabem qual é o número do telefone do conselho tutelar. Nunca ouvi dizer que alguém morreu por trabalhar. Porque a criança, o adolescente não pode trabalhar? Não podem empacotar compras em supermercados, não podem fazer uma pequena entrega. Eles permanecem nas ruas e a mãe não tem poder sobre essas crianças. Meio período do dia vão à escola, outro meio período ficam em casa, a televisão fica ligada por muito tempo, atualmente metade das crianças tem acesso a computador, onde o objeto de maior interesse são jogos envolvendo violência. Quando a mãe chega ao final da tarde a criança ficou em frente à televisão, participou de jogos violentos no computador ou ficou por meio período na rua. O ECA impedindo a criança de ter um ofício deixa-a na rua. A criança hoje recebe um volume de informações muito maior do que a criança de algumas décadas. Hoje a televisão, as novelas influenciam muito no comportamento infantil.


Qual é o índice de gravidez entre adolescentes?


É enorme. Trabalhei com crianças de rua, são portadoras de desvios psicológicos adquiridos no próprio meio em que vivem. Passam por um sofrimento intenso, desde crianças. Não tem escala de valores, seus referenciais são os que aprenderam a conhecer. A desorientação é total. Os depoimentos dessas crianças são extremamente tristes, amargos. O profissional que trabalha com elas tem que ter uma estrutura emocional a toda prova. Trabalhei muitos anos no Clubin, criado pelo prefeito Thame e mantido durante a administração de Humberto de Campos. Depois foi extinto. Era um local onde as crianças ficavam no período em que não iam à escola, tinham recreação, esportes, reforço escolar, eu era médica desses Clubin. Dava aulas de educação sexual, higiene, o Clubin trabalhava com crianças até 12 anos. Instruía as meninas que já estavam ficando mocinhas, explicava a importância de manter o corpo saudável. Com a nova administração municipal, do prefeito Machado, fui removida para outro setor, tive que acatar as ordens do novo gestor. As crianças que deixei com 8 ou 9 anos, passaram a ter contato comigo, porém já grávidas.


A senhora é contra a concepção de filhos pela classe menos favorecida?


Acho que a pessoa pode ter os filhos que pode criar. Defendo a vida de uma forma responsável. Essas crianças não poderiam ter filhos agora. Se uma criança tem filho aos 13 anos é uma criança criando outra criança. Tem que ser feitos obrigatoriamente métodos preventivos de gravidez, até que ela tenha o discernimento necessário para escolher um parceiro. Elas acabam tendo filho de um, depois de outro, são filhos das baladas, das noitadas.


O município pode interferir nessa situação?


O município pode fazer um programa de escola em período integral. Há casos muito difíceis de serem recuperados, cabe apenas tratá-los na medida do possível, o próprio organismo sofreu mutilações irreversíveis.


A senhora exerce o mandato de vereadora há quantos anos?


Sou vereadora ha 18 anos, vou para mais um mandato.


O município tem como dar suporte aqueles adolescentes que desejam de fato mudar de comportamento, deixar a dependência química?


Tem que ficar muito claro que os filhos são dos pais, não do Estado. Tem que haver uma parceria, chamar esses pais para a responsabilidade e o município oferecendo condições. Se eu tivesse esse poder, o meu maior esforço seria colocar essas crianças estudando em período integral. Se não investirmos na educação não há mais conserto.


Não há o risco de levarem os maus hábitos para dentro da escola?


Temos que ter o apoio dos deputados federais, alguns artigos do Estatuto da Criança e do Adolescente tem que serem mudados, se houver parcerias com as empresas de iniciativa privada, sindicatos patronais, a igreja, sindicatos de funcionários, secretarias de educação do estado e do município, delegacia do ensino. Apesar de estar há 32 anos só trabalhando com criança pobre nunca perguntaram qual era a minha opinião a respeito. Tenho um vínculo muito forte com essas crianças, com seus pais.


A senhora tem idéia de quantas crianças já foi madrinha de batizado?


Já perdi a conta. Assim como de casamentos. Em minha opinião temos que trabalhar com crianças em várias frentes: os pequeninos colocar na escola em período integral. Outra frente é chamar as mães e definir quantos filhos elas têm condições de ter, qual é a renda familiar. Tem que haver uma conscientização. Tem que haver a participação das igrejas, bispos, pastores, todos os segmentos religiosos. Se tiver condições para criar cinco filhos ou apenas um filho. O estado não tem mais condições de suportar a falta de planejamento familiar. Isso tem que ficar muito claro ás famílias. Posso citar o exemplo de uma menina que veio do Maranhão para ajudar uma amiga da sua mãe que estava realizando um curso. Aos 12 anos ela engravidou de um menino de 17 anos. Com treze anos essa menina teve duas filhas gêmeas. Ela foi morar na casa do menino, só que a mãe dele não tinha como abrigar a menina e mais duas netas em sua casa. Ela acabou indo morar em um barraco na baixada do Parque dos Sabiás. Com a ajuda de algumas entidades, entre elas o Rotary eu auxiliei essa mãe de 13 anos, com a condição de que mensalmente tomasse as prevenções para não engravidar novamente. Tudo que eu conseguia leite, fraldas, o pai vendia para alimentar a sua dependência química. Eu tinha que entregar o leite com o lacre aberto. Era uma realidade tenebrosa, no fim conseguimos recursos para que essa moça voltasse com suas filhas para a sua terra de origem onde tinha seus familiares.


Essa atividade assistencial pode ser mais ativa por parte da Câmara Municipal?


Pode ser mais ativa, embora não seja função do vereador. Posso propor meios de soluções, não posso ser instrumento, isso transformaria a câmara em entidade de serviço social. Acredito que temos como reunir as pessoas de um bairro, mesmo que tenha que criar algum tipo de atrativo para essas reuniões. Conscientizar esses casais, mesmo enfrentando oposição de alguns setores que são contra o planejamento familiar. As crianças são vitimas de um mercado agressivo, a televisão mostra todo tipo de atrativo, desde alimentos até brinquedos, isso desperta na criança inocente o desejo por algo que nem sempre os pais estão em condições financeiras de proporcionar. A terceira medida é mudar alguns itens desse estatuto da criança e adolescente. Hoje uma criança com 12 anos está tão desenvolvida que pode realizar trabalhos leves e estudar. Os problemas mais graves, envolvendo exploração de trabalho infantil, ocorriam no Nordeste, que passou por uma grande transformação. A quarta iniciativa é dar uma chance á essas crianças com dependência química. É fundamental que o dependente químico queira mudar seus hábitos. Tem que ser criado um local apropriado, que ocupe o dia dessas pessoas com atividades diversas. Se determinada empresa precisa de uniforme dar preferência aos uniformes produzidos nesse local. E assim por diante. Passam a ser produtivos, ganham seu salário e se recuperam. É um esforço de toda a comunidade, da câmara, da prefeitura.


A primeira vez que a senhora foi eleita foi em que ano?


Foi em 1992, tive a segunda melhor votação, os eleitores do Jardim Esplanada em quase sua totalidade votaram em mim, foram 700 votos. Não tive sequer um cabo eleitoral. Foi um voto de amor que a população me concedeu. Eu era amada por aquelas pessoas. Para mim foi uma grande recompensa. Eu conhecia todo mundo pelo nome, descia pela favela, batia nas portas chamava: Joana D'Arc. Edméia. Entrei para a política após sentir um patrulhamento ideológico quando me recusei a ingressar em determinado partido político. Por muitas vezes cheguei à minha casa chorando. Decidi me filiar ao PSDB e concorrer às eleições. A opção por vereadora decorreu da facilidade com que eu os via conseguirem resolver problemas corriqueiros, que sem a interferência deles era muito morosa a solução. No período de campanha eleitoral eu tinha que subir em caminhão para fazer discurso, eu nem sabia fazer um discurso. Ouvia as crianças gritando: “Tia Márcia”. Elas subiam no caminhão, eu ficava preocupada com eles. De forma natural expunha meu programa, meus objetivos políticos.


Após ser eleita a senhora recebeu pedidos exóticos?


Surgiam pessoas de todos os lugares pedindo de tudo. Coleira para cachorro, madeira para fazer barraco, óculos, dentadura, levavam conta de água, de luz, de IPTU. Se fosse um pedido coletivo, para crianças, eu conseguia fornecer. Pedidos individuais não atendo. Temos que educar os eleitores para que não elejam eternamente pessoas pouco qualificadas para o cargo.


Como é ser esposa do vice-prefeito?


É perder um pouco o marido. Somos muito companheiros, ele participa de onze entidades assistenciais. Eu também participo de diversas entidades, além da câmara municipal, dou plantão aos finais de semana. Meu marido é uma pessoa de paz, ponderado, muito humilde. O Sérgio tem o dom de agregar as pessoas. É uma pessoa alegre.


Uma sessão na câmara de vereadores é complexa?


Uma sessão não é complicada, é necessário preparar-se antes de ir à sessão. No mínimo conhecer com antecedência os projetos, o que será votado.


Atualmente a senhora é a única mulher eleita vereadora em Piracicaba?


Já por três mandatos tenho sido a única mulher que participa como vereadora.


Há alguma diferença de tratamento por seus pares?


Nenhuma.


A senhora foi eleita nas últimas eleições com quantos votos?


Tive 2181 votos em uma eleição com 445 candidatos. O colégio eleitoral feminino na cidade é de 51 por cento.


Quais são os projetos da senhora para o próximo mandato?


São muitos. Quero trazer para Piracicaba o CEJUSC - Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania, pode-se dizer que é o Poupa-Tempo judiciário. As pessoas podem resolver seus problemas sem contratar advogados, sem entrar com processos no fórum, sem a demora existente. Não há limites de valores envolvidos. Os processos podem ser retirados de um tramite normal dentro do fórum e tratados no CEJUSC. Pode ser tratados direitos de família, parte civil. Engloba todas as áreas. Outra campanha que vou desenvolver é incluir na cesta básica um livro. A criança de seis a sete anos tem necessidade de literatura infantil. Caso a pessoa não tenha filhos nessa faixa etária, podem dar o livro a uma criança vizinha. O que importa é criar uma cultura para as crianças que estão se iniciando agora. Outro projeto é desenvolver no centro da cidade a conscientização de que o pedestre tem prioridade na faixa de pedestre. Há uma grande dificuldade da pessoa, em especial da terceira idade, em atravessar as faixas existentes em torno da Praça José Bonifácio. Simplesmente os veículos não param. Quero ajudar muito uma instituição chamada AUMA - Associação de Pais e Amigos dos Autistas de Piracicaba.








domingo, dezembro 30, 2012

MÁRIO (MARITO) ANTONIO CAVICCHIOLI

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
Sábado 29 de dezembro de 2012
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/

ENTREVISTADO: MÁRIO (MARITO) ANTONIO CAVICCHIOLI
Mário Antonio Cavicchioli nasceu a 18 de agosto de 1949 em Mombuca, é filho de Mário Maria Cavicchioli e Isabel Gomes de Andrade Cavicchioli, que tiveram ainda uma filha: Ana Maria Cavicchioli. Iniciou o curso primário em Mombuca. Quando tinha nove anos seus pais mudaram-se para Rio das Pedras, Mário completou seu estudo no Grupo Escolar Barão de Serra Negra e mais tarde fez o ginásio na E E Prof. Manoel da Costa Neves, conhecida por Macone. O científico estudou em Piracicaba no Instituto de Educação "Sud Mennucci". Estudou Letras na Unimep, especializando-se em Literatura Portuguesa e Inglesa.


Nesse período em que você estudava, também trabalhava?


Essa história de que menor de idade não pode trabalhar é pura conversa. Trabalho desde nove anos de idade. Meu primo era tintureiro em Rio das Pedras, eu passava pelas ruas recolhendo as roupas para ele lavar, principalmente ternos. O horário escolar era sagrado, estudava à tarde e pela manhã trabalhava, saia com um saco branco, esses de farinha de trigo, voltava cheio de ternos para meu primo Dengo Salmazi lavar. Meu pai era funcionário da prefeitura municipal de Rio das Pedras. Ele veio de Mombuca com o intuito de tomar conta da banda de Rio das Pedras, a convite do prefeito Álvaro Biancchin. A família Cavicchioli é constituída por muitos músicos. Por 26 anos meu pai foi maestro da Corporação Musical Santa Cecília, em Rio das Pedras, o maestro anterior era o Zico Gaiola.


Quando eram feitos os ensaios da banda?


Durante o dia meu pai trabalhava na prefeitura e a noite era feitos os ensaios, os primeiros ensaios foram fetos na nossa casa.


Após trabalhar na tinturaria qual foi seu próximo emprego?


As doze anos passei a trabalhar na farmácia do Mário Gobatto e da Dona Lúcia localizada na Rua Prudente de Moraes, onde permaneci por uns cinco ou seis anos. Fazia de tudo: limpeza aplicava injeção. Naquele tempo não havia pronto socorro na cidade, vinham pessoas que trabalhavam na roça com cortes produzidos por “folhão” de cortar cana. O Mário Gobatto é quem fazia as suturas, muitas vezes o Gorga, único médico existente na cidade estava ausente. Eu ajudava. Eu fazia aplicações de injeções em domicílio para pessoas idosas ou que não podiam ir até a farmácia. Com 18 anos ingressei como contínuo no Unibanco, situado no imóvel onde hoje funciona a “Farmácia do Pio”. Nessa época comecei a fazer faculdade na parte da manhã, voltava ao meio dia, trabalhava no Unibanco, quando estava fazendo o segundo ano de faculdade por um período lecionei inglês na Escola de Contabilidade Domingos Justolin, em Rio das Pedras. Ao concluir a faculdade fui para Londres, fazer um curso de especialização em inglês, eu tinha 24 anos, já tinha saído do banco.


De quanto tempo foi a sua permanência em Londres?


Fiz um curo por três meses, voltei a Rio das Pedras quando Antonio Airton Zepelini foi eleito prefeito. Por um ano trabalhei com ele. Essas palmeiras que existem na entrada da cidade foram plantadas quando Rio das Pedras comemorou 80 anos como município. Fui o mentor da idéia, foram plantadas 80 palmeiras, cada uma representando um ano da cidade. Fui ao Dierberger em Limeira, com o caminhão da prefeitura, comprei as mudas e inclusive ajudei a plantá-las. Meu próximo emprego foi na Indústria Romi, em Santa Bárbara D`Oeste, como conhecia a lingua inglesa trabalhei no departamento de importação e exportação da Romi. Fui indicado pelo Antonio Carlos Angolini, que já era funcionário da empresa. O gerente era Aderbal Martins, com laços famíliares em Rio das Pedras, Mombuca. Após um ano, mudei-me para São paulo, ingressei na aviação.


Em qual empresa aérea foi o seu primeiro emprego?


Fui trabalhar do departamento de reservas da Varig onde permaneci trbalhando por seis anos. Em 1976 eu já trabalhava com computador, eram equipamentos enormes, a CPU era do tamanho de uma geladeira, produzidos pela IBM. Eu queria cursar a faculdade de arquitetura, cheguei a fazer cursinho preparatório, mas não consegui ingressar em uma faculdade pública. Fiz só o curso de projeto de arquitetura. Tenho o diploma de arquiteto projetista. O primeiro lugar que morei em São Paulo foi próximo ao Viaduto Maria Paula, ali morava um pessoal de Rio das Pedras, após seis meses fui morar em um apartamento no Paraíso, na Praça Oswaldo Cruz, one morei por nove anos, nessa época minha irmã lecionava e morávamos juntos. Depois mudei-me para a Rua Bela Cintra onde até hoje mantenho meu apartamento. Permaneci em São Paulo por mais de trinta anos.


Você trabalhou em outras companhias de aviação?


Fui trabalhar na Royal Air Maroc, transferi meu período de trabalho na Varig para a noite. Das nove da manhã até as seis da tarde trabalhava na Royal Air Maroc, das sete da noite até a uma hora da manhã trabalhava na Varig. Após uns quatro ou cinco anos a Air Maroc encerrou suas atividades no Brasil, seu escritório ficava no Edifício Itália, fui um súdito do Rei Hassan, meu patrão era o rei, dono da Royal Air Maroc.Naquele tempo as comunicações eram por telex, as mensagens vinham com a assinatura do rei do Marrocos.


Com o encerramento das atividades da Air Maroc, qual foi seu próximo emprego?


Ingressei na Ladeco – Linea Aerea del Cobre, chilena, onde trabalhei por nove anos. A Royal Maroc voltou, me chamaram, trabalhei mais um tempo, a companhia fechou novamente. Fui trabalhar na Canadian Airlines, após algum tempo ela foi vendida para a Air Canada onde me aposentei em 2005.


Por ser funcionário da empresa você tinha alguns privilégios para viajar?


Eu tinha muitas facilidades. Para mim era mais barato passar um fim de semana em Nova Iorque do que vir para Rio das Pedras. Não pagava taxa de embarque, transito para o aeroporto tinha de graça, eu tinha um amigo que morava em Nova Iorque, ele ia me buscar no aeroporto e eu me hospedava na casa dele. Em um ano chegei a ir 14 vezes só para Nova Iorque. Conheci muitos países. Para o Chile fui muitas vezes pelo fato de trabalhar em uma companhia chilena. O fato de ter viajado muito, para os mais diveros países, proporcionpu-me conhecimentos para hoje ser Guia Acompanhante de Viagens Internacionais, dou assessoria aos grupos de passageiros que viajam para o exterior.


Há pessoas que resistem em viajar em grupo por imaginarem que estarão presas a uma programação, sem liberdade individual?


A agência com a qual trabalho, a Século XXI, só para Europa tem mais de 600 programações. O passageiro tem a liberdade de fazer o que quizer. A parte terrestre é feita por onibus, basta o passageiro comparecer no local e hora combinados. Ha passageiros que viajam só para fazer compras, adquire o que deseja para seu próprio uso. Muitos deixam de ver locais históricos, artísticos, como Louvre, Palácio de Versailles, Vaticano, para se dedicarem a compras.


A denominada “Nova Classe Média” está viajando mais?


Pura verdade! As viagens estão muito facilitadas, o preço da passagem de avião, os pacotes turísticos estão muito mais em conta do que ha 10 anos. É mais barato ficar 12 dias na Europa do que uma semana no nordeste brasileiro.


O brasileiro comete gafes em viagens internacionais?


Já vi muita coisa. Aqui mesmo no Brasil, povos de outras origens comentem gafes. Certa vez, eu trabalhava na Royal Maroc, tinha ao lado um colega de trabalho, o Tuzzi, o passageiro chegou com a mala, deu-me o passaporte, precisava pesar a mala na balança ao lado, eu disse-lhe: “- Por favor, primeiro na balança.” Ao invés de só pesar a mala ele subiu na balança com a mala. Era comum o passageiro despachar a mala com o passaporte dentro, na hora do check-in necessita-se do passaporte.


Qual é o seu conselho para quem tem medo de voar?


Basta pensar quantos aviões decolam por segundo no mundo e quantos acidentes aéreos acontecem. É o meio de transporte mais seguro. Em 1998 somei a quantidade de horas que já tinha voado, eram mais de 500 horas.


Há uma ocidentaliação do mundo?


Creio que sim. A interação das civilizações é intensa pela internet, pelas pessoas que viajam, que migram. Há países que ainda são radicais em manter sua cultura. Acredito que a a maioria dos países tem muitas coisas em comum. Em muitos países há mulheres jovens uzando calças compridas, roupas de grife, mesmo em países de cultura mais fechada. Jeans, tenis e camiseta são utilizados em muitos países. O povo europeu tem um certo requinte para se vestir, particularmente o italiano. Motorista de onibus na Itália trabalha com paletó e gravata, parece um executivo. No Canada, a temperatura sendo de 15 graus centigrados é considerada quente, andam de bermudas, inclusive os policiais.


Com relação a alimentação, há complicações?


Os hoteis para os quais levo os turistas, já tem uma estrutura para receber turistas do mundo inteiro, inclusive brasileiros. Só não irão encontrar arroz e feijão. Alguns reclamam que em Paris não tem papaya no café da manhã, é a mesma coisa que ir à Bahia e querer comer damasco no café da manhã. Outros reclamam que o pão europeu é seco. É o pão da Europa. Inclusive existe churrascarias brasileiras na Europa. Em Portugal existe a churrascaria Fogo de Chão.


O Can-Can é mesmo fascinante?


A única casa que mostra o Can-Can é o Moulin Rouge. É uma casa de show enorme com apresentações inesquecíveis. É um espetáculo maravilhoso.


Mário, além dessa atividade em turismo, você é artista plástico.


A arte é um costume em nossa família, quando ainda morávamos em Mombuca, tinhamos olaria, o meu tio Antonio Otávio Cavicchioli, conhecido como Neca, sempre foi um artista, trabalhava com argila, barro, fazia potes, figuras humanas, aninais. Fui aprendendo com ele a técnica, o dom pela arte. Outrs familiares dedicavam-se a musica. Fomos acumulando. Meu pai achava as vezes uma pedra na estrada dizia: “´Olha que bonita essa pedra! Põe lá para enfeitar!”Ou trazia uma planta, uma coisa diferente isso foi criando nosso ambiente. Os alemães dão muito valor para os detalhes em uma decoração natural, ele pega um galho torto, enfeita, coloca na casa, fica bonito, Fui adaptando isso na minha casa. Os lampiões que tenho aqui, comecei trazendo um , outro, depois alguns amigos sabendo que eu gostava me davam de presente, uma amiga, Eliana, que também é artista plástica assim como o seu marido, outro dia me trouxe uns 10 ou 12 lampiões. Todo Natal ponho velas em todos eles e acendo para Jesus.


Como surgiu o presépio que você montou em Santa Bárbara D`Oeste?


Foi fruto de uma oficina de arte que realizo, As primeiras vezes que eu fiz foi em São Paulo, na Fundação Bradesco, na Cidade de Deus. Foi meio por acaso, eu estava acompanhando a palestra de um amigo, quando a pessoa responsável pelo departamento de cultura estava desesperada, procurando alguém para fazer uma oficina de arte para o natal. Apontado pelo meu amigo, mostrei meu curriculo, o que poderia fazer. Por dois anos seguidos fiz essa oficina de arte na Fundação Bradesco. No primeiro ano fizemos uma árvore de natal com cinco metros de altura só com material reciclado, com lixo. A TV Futura foi lá para mostrar o processo de transformação. Isso foi em 2006. Através do Antonio Angolini a Fundação Romi ficou sabendo do meu trabalho. Fiz em Santa Babara o mesmo proceso de trabalhar com material descartado. Neste ano me chamaram e eu propus o presépio. A gruta do presépio é feita de papelão. O Menino Jesus é uma boneca, adquirida em um brechó, transformei, fiz a caracterização, algumas pessoas ajudaram na pré-montagem, a parte artística eu elaborei. O presépio é em tamanho natural, está instalado no espaço onde era o saguão da bilheteria da estação de trem em Santa Bárbara D`Oeste, deve ter entre 40 a 50 metros quadrados. estará em exposição até dia 6 de janeiro de 2013. Fica em frente a Romi, onde foi a antiga Estação da Companhia Paulista de Estrada de Ferro. O presépio pode ser visitado a qualquer hora do dia ou da noite, sete dias por semana, é um espaço público, aberto.











O sentimento de Natal está muito distorcido, celebrando mais Papai Noel do que o nascimento do Menino Jesus?


Infelizmente! Virou comércio. Antigamente colocava-se anjinho dependurado na árvore de natal, hoje colocam até bruxinhas. É uma forma de disvirtuar a essência. Comemorar o natal sem lembrar-se do Menino Jesus é comemorar um aniversário sem lembrar-se do aniversariante. Fazer um bolo, colocar a velinha, cantar o parabéns e não lembrar-se do aniversariante. É uma data instituida pelo cristianismo para celebrar o nascimento de Jesus. Fizeram do Papai Noel o maior vendedor do mundo, a origem, Santa Claus tinha outra finalidade. O correspondente ao Papai Noel italiano é uma bruxa, chamada Befana. A festa maior na Itália é dia 6 de janeiro. O Natal é comemorado dia 25, mas a grande festa com entrega de presentes é no Dia de Reis. Eles dizem às crianças: “ -Se você for bonzinho, no Dia de Reis a Befana vem entregar presente para você! Se for uma criança má, a Befana vem fazer caretas e puxar a sua perna.”














sexta-feira, dezembro 14, 2012

CECÍLIO ELIAS NETTO

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
Sábado 15 de dezembro de 2012
Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/



ENTREVISTADO: CECÍLIO ELIAS NETTO


Adorado por muitos e questionado por alguns, ninguém fica indiferente aos brilhantes textos de Cecílio Elias Neto, advogado, bacharel em filosofia, escritor, jornalista e historiador na acepção da palavra. Cecílio vivenciou a história de Piracicaba por décadas. Em muitas ocasiões conviveu com os personagens centrais da história recente da nossa cidade, sendo ele algumas vezes o próprio protagonista. Seus pais Tuffi Elias e Amélia Abrahão Elias, piracicabanos, filhos de sírios-libaneses, com ascendentes gregos e turcos, tiveram nove filhos sendo que dois faleceram antes do nascimento de Cecílio Elias Netto em Piracicaba a 24 de junho de 1940.
Em que local da cidade o senhor nasceu?
Costumo dizer que nasci bem no umbigo de Piracicaba, na esquina da catedral, ali onde mais tarde por alguns anos funcionou a lanchonete Daytona. A edificação foi demolida e hoje no local se abriga o Banco Santander Nessa esquina meu pai tinha o Café Imperial. Meu tio Elias Cecílio era dentista formado pela antiga Faculdade de Odontologia e Farmácia de Piracicaba. Meu pai já estava cursando essa faculdade, enquanto estudava trabalhava como marceneiro e carpinteiro, nessa atividade ele perdeu um dedo em uma serra, com isso o futuro dentista encerrou seus estudos e passou a ser comerciante, foi proprietário do Café Imperial durante a guerra, até 1945. Depois eles se mudaram para a Rua São José, quase em frente ao Cine Broadway, onde ele criou a Tufiniquim. Ali também se iniciou uma tragédia que abateu sobre a nossa família, foi quando a minha irmãzinha, Carolina, de apenas dois anos, faleceu atropelada por um caminhão. Meu pai tinha ido até a prefeitura que ficava na esquina da Rua Alferes José Caetano com a Rua São José, ninguém percebeu que a pequena Carolina, muito apegada a ele o seguiu, ao atravessar a rua o caminhão a atropelou. Com a gritaria toda, meu pai correu para ver o que estava acontecendo e viu sua filha embaixo do caminhão. Foi um fato que mudou o curso da vida da nossa família. Nessa época eu tinha seis anos. Meus pais ficaram acamados de quatro a seis meses, em profunda depressão. Minha irmã Marlene tinha 16 anos, começou a lecionar piano, devemos a ela a nossa manutenção. Jorge Maluf, pai da Ivone Maluf, tinha um armazém em frente ao Broadway, ele necessitava de caixas de papelão, garrafas vazias. Para ajudar a minha irmã, eu com apenas seis anos, batia de porta em porta, junto aos vizinhos, recolhendo esse material e levava ao Jorge Maluf. Com 10 anos fui trabalhar como recepcionista do consultório médico do meu primo Alarico Coury.
Porque alguns o chamavam de Toninho?
Quando nasci a alegria da família foi muito grande. Fui batizado no mesmo dia, um domingo, deram-me o nome de Antonio João Pedro. Até hoje consta no batistério da igreja católica, assim como consta Cecílio Elias Netto, que já adulto mandei acrescentar, esse sempre foi o meu nome no registro civil. Descobri que me chamava Cecílio quando tinha 10 anos. Iniciei meus estudos no Externato São José, foi lá que conheci um grande amigo, Jayme Antonio Cardoso, hoje morando em Curitiba. Quando entrei no curso primário já estava praticamente alfabetizado, meus pais e irmãos gostavam muito de ler. Minha turma foi a última masculina do Externato São José. Foi quando veio o Colégio Dom Bosco, as meninas foram para o Colégio Assunção, os meninos para o Dom Bosco. O último semestre conclui no Moraes Barros.
Lembra-se da sua primeira professora?
Lembro-me, foi Romilda Casali, por quem eu tinha grande admiração. Ela morava perto de casa, eu apanhava flor para levar até a sua mesa. Quando lancei um livro, apareceu uma moça dando-me uma maçã e dizendo: “Minha mãe mandou-me entregar essa maçã, ela disse que o senhor irá lembra-se dela”. Na hora me lembrei: ”- Dona Romilda!”. Todos os dias ela me dava uma maçã, tinha conhecimento de que a minha família passava por dificuldades até para se alimentar. Voltávamos juntos do externato, fazíamos o mesmo caminho, Ela deveria ter uns dezoito anos. No Colégio Dom Bosco conclui o ginásio e o científico. Sempre tive prazer em estudar. Talvez para ajudar a minha família, alguns professores me indicavam ás mães dos meus coleguinhas, para que eu os acompanhasse nas tarefas de casa. Aos doze anos comecei a fazer reforço de aulas para os meus colegas. Aos dezesseis anos já dava aulas particulares. Meu grande sonho era de ser diplomata para ser escritor.
Quando se deu o ingresso no jornal?

Desde criança tive paixão por escrever. Recordo-me que com sete ou oito anos ia ao Cine São José, levava um caderninho, sentava na primeira fila de cadeiras, anotava as rimas dos filmes musicais. Anotava: “Coração rimando com paixão, querida-vida.” O professor Leandro Guerrini me ajudava muito na biblioteca indicando livros. Minha paixão era escrever. Aos quinze anos escrevi meu primeiro livro, “Estela Estrela”, tenho o original até hoje. Naquela época o jornalismo era a grande escola literária. Ao ser aceito em um jornal era como ganhar um prêmio. Meus professores começaram a mandar meus artigos e composições de escola para os jornais. Com 13 a 14 anos já tinha publicações minhas em jornal. Uma vez João Chiarini me levou até o Dr. Losso, dizendo: “Esse menino quer trabalhar em jornal, o pai dele não quer.”
Porque seu pai não queria que seguisse a carreira de jornalismo?
Ele achava que era coisa de boêmio, era uma profissão estigmatizada. Meus pais tinham o sonho de que eu fizesse o curso de medicina. Entrei no Jornal de Piracicaba como “ouvinte”, na verdade era falante, lia os textos para o revisor que era Samuel Pfromm Netto; Comecei no jornalismo como auxiliar de revisão no Jornal de Piracicaba. “O Diário” realizou um concurso tendo como tema seu aniversário. Resolvi participar. Gostava de escrever de madrugada, no último dia timidamente entreguei meu trabalho. Sempre fui tímido. Recebi um telefonema, tinha sido vencedor do concurso. Eufórico, fiquei sabendo que Leandro Guerrini, Guilherme Vitti e eu tínhamos sido os vencedores. Dr. Losso era um dos juízes, quando fui receber a premiação ele disse aos meus pais: “Por justiça o prêmio era dele, mas não podíamos deixar de premiar os ilustres Leandro e Guilherme”.fiquei entre lisonjeado e indignado. Aquilo me animou muito, fui falar com o Sebastião Ferraz, de “O Diário”: “-Quero começar, posso vir aqui? O Ferraz chamou Izidoro Polacow que além de trabalhar no Banco do Brasil era redator-chefe de “O Diário”. Ele usava gravatinha borboleta, tinha uma figura imponente. Era muito competente. O Ferraz disse-lhe: “Esse menino quer aprender jornalismo, está em suas mãos”. Fui conduzido até uma mesa onde estavam diversos jornais como a Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo, Diário de São Paulo, Folha da Manhã, Diário da Noite. Aquela altura me sentia um David Nasser. O Polacow traz uma tesoura dizendo: “- Agora você lê os jornais e recorte a notícia que achar interessante. ”Disse-me ainda: “ Quem não sabe ler jornal não sabe fazer jornal”. Fiquei louco da vida, tinha me tornado “recorter”!
Existiam alguns temas preferenciais?
Eu tinha curiosidade por tudo: futebol, esporte, política. Getúlio Vargas tinha falecido. Comecei a me interessar por política naquela época, em 1954. O Polacow selecionava as notícias que eu recortava. Fiz isso por uma semana. A seguir me colocaram como ouvinte do Osvaldo de Andrade, o maior revisor que conheci. Após algum tempo me passaram para a seção de polícia, eu ia até o plantão policial, o delegado era Dr. Zenon. Na verdade ia buscar o B.O. e entregava ao redator. Um dia o Ferraz me pediu para escrever um artigo em comemoração ao aniversário de Edson Rontani. Embora já tivesse artigos publicados, esse foi o primeiro a pedido do diretor do jornal. Passei a redigir artigos. Houve um escândalo em Piracicaba, envolvendo menores com pessoas influentes. Escrevi um artigo, contei o fato sem citar nomes, o título eu me inspirei em Shakespeare: “Tempestade em Uma Noite de Verão”. Foi um grande escândalo na cidade, todo o mundo sabia, mas ninguém falava. Animei-me e escrevi outro, esse passou pela mão do Ferraz antes de ser publicado. Ele então me disse: “- Quando você quiser escrever o que bem entender tenha o seu próprio jornal, aqui quem manda sou eu”. Isso tinha acontecido com David Nasser, ele foi reclamar com Chateaubriand que tinha sido censurado e recebeu a mesma resposta. Ali comecei a aprender que a censura começa dentro do jornal. Coloquei como objetivo ter meu próprio jornal. Nessa época eu namorava a Mariana, mãe dos meus filhos. A irmã dela. A Odila, era casada com Wilson Guidotti, filho do Luciano Guidotti. Com os comendadores da cidade, Luciano inventou a criação de um jornal. “A Folha de Piracicaba”. Eles me convidaram para ir para “A Folha” ajudar a montar a equipe, viria um diretor novo. Diziam como se fosse um jornal com o que havia de extraordinário, moderno. Eu estava muito comprometido com “O Diário” e muito comprometido com o Ferraz, que se tornou um grande amigo. Eu era o filho que o Ferraz não teve. Eu disse ao Ferraz: “Vou me casar, estou noivo, fui convidado para ir para “A Folha”, vou dizer à família da moça que não vou trabalhar no jornal ligado a eles?”.
O salário em “O Diário” era compensador?
Ganhava mixaria. Trabalhei por dois anos em “O Diário” sem ganhar nada. Era um favor que os jornais faziam em deixar alguém entrar na redação. Como se fosse o Liceu de Artes e Ofícios. Você ia aprender uma profissão. Não havia a profissão de jornalista. Todo o mundo tinha outra atividade. Eu dava aulas particulares, criei um cursinho.
Como foi seu ingresso na faculdade?
Permaneci por um ano em São Paulo fazendo cursinho, no “Cursinho Nove de Julho” para prestar vestibular em medicina. Não freqüentava muito as aulas, minha paixão era a literatura, eu não saia da biblioteca, ficava no “Estadão” onde via Thales de Andrade, conversava com pessoas que eram amigos do meu pai. Nessa época comecei a escrever meu primeiro romance: “Um Eunuco para Ester” Pensava que não tinha sentido estudar medicina. Nesse período comecei a estudar línguas. Vim à Piracicaba de onde saí para prestar vestibular de medicina. Sai de casa, meus pais rezando o terço, pedindo em meu favor. Na viagem de Piracicaba à São Paulo, comecei a sentir uma angústia, onde é a Bosch, em Campinas, havia um posto de gasolina o ônibus fazia uma parada. Decidi fazer o curso de direito. Tirei a mala do ônibus, esperei uma carona, fui direto para a Faculdade de Direito da PUC. Os exames já estavam marcados, o prazo para inscrição já tinha sido encerrados. Naquele tempo cada faculdade fazia o seu vestibular. O vestibular seria no dia seguinte. Acomodei-me como pude em uma pensão. Fiz o vestibular, com provas escritas e orais. A Ivone Matiazzo era uma amiga da família que estava fazendo também o vestibular. Eu pedi que não contasse â minha família que estava prestando vestibular para o curso de direito. Em determinado dia, estava prestando exame oral de latim, vi a Ivone pela janela, desesperada, fazendo sinais com a mão. Sai exausto do exame oral, a Ivone me deu a notícia: “Seu pai e sua mãe estão ai na porta!”. Meu pai tinha ido fazer um exame médico em Campinas, encontrou-se com meu tio, pai de João Hermann Netto. O meu tio tinha me visto entrar na faculdade, eu não o vi. O meu nome na família era Toninho. Ao ver meu pai ele disse-lhe: “ Então o Toninho está fazendo direito aqui, que bom !” . Meu pai disse-lhe: “Não! Ele está em São Paulo fazendo vestibular para medicina!”.Na hora em que sai da sala e vi os dois, vi que meu pai estava branco, lívido. Ele disse-me: “Prefiro um filho sapateiro a um filho advogado!” Disse-lhe que a partir daquele dia iria dispensar a ajuda financeira que recebia dele. E fiz o curso. Ele já tinha tentado me boicotar em jornalismo, tinha pedido ao Ferraz para me dizer que eu não tinha vocação. Em 1959 entrei na PUC em Campinas, viajava todos os dias.
A formatura foi em Campinas?

A minha turma foi expulsa da PUC por causa do “Partidão”. Fui filiado ao Partido Comunista, o Monsenhor Salim, nos chamou e disse: “- Os senhores estão convidados a se retirarem da universidade”. Estava cursando o quarto ano. Não havia transferências de faculdades na época, conseguimos em São José dos Campos e Bauru. Optei por Bauru. ”O Diário” queria que eu voltasse, remunerando-me mais. Foi quando em 1961 surgiu “A Folha”. Falei com o Ferraz, que na sua previsão achava que “A Folha” não daria certo, mas como envolvia família ele disse-me que poderia voltar ao “O Diário” quando quisesse. Fui para “A Folha”. Vi que não havia organização, as máquinas adquiridas eram impróprias para um jornal. O diretor era de Leme, nunca tinha dirigido um jornal. Para se ter uma idéia as páginas eram impressas uma a uma. “O Diário” já era rotoplana. O Luciano queria o título em vermelho. Tinham que primeiro imprimir em vermelho o título, deixava secar, limpava a máquina. Começava a imprimir as quatro horas da tarde e terminava as sete horas da manhã. O diretor, Valdemar Arruda, foi mandado embora. O Luiz Tomazzi, grande jornalista de Piracicaba, que trabalhou na Folha de São Paulo, no jornal Ultima Hora, era um consultor dos comendadores proprietários de “A Folha”: Humberto D`Abronzzo, Romano, Luciano Guidotti, João Guidotti, Ometto, eram 33 acionistas. Era para ter sido o melhor jornal, só que os equipamentos adquiridos eram ineficientes.
Qual era o objetivo desse grupo em ter um jornal?
O Dr. Losso e o Ferraz romperam com o Luciano, no último ano do mandato dele, isso em 1955, o Luciano tinha indicado o Aldrovandi para ser seu sucessor. O Aldrovandi era metodista, Dom Ernesto não admitia que Piracicaba tivesse um prefeito protestante. Começou uma guerra na cidade, foi quando Salgot candidatou-se com apoio da igreja, do Dr. Losso e de “O Diário”. O Aldrovandi renunciou. O Luciano achou que o empresariado deveria montar um jornal. Contrataram o Valdemar Arruda que foi infeliz na aquisição dos equipamentos. Eles pagariam o necessário para ter o melhor equipamento possível. Eu tinha 20 anos, fiquei cuidando da redação a espera do novo diretor. Telefonaram-me chamando para ir até a agencia do Guidotti, ao chegar deparei com todos os proprietários de “A Folha”. O Thomazzi disse-me que iria apresentar o novo diretor. Era eu. Ele disse-me que me havia indicado por me achar preparado para dirigir o jornal. Aceitei. “A Folha” situava-se na Rua Regente Feijó esquina com a Rua Benjamin Constant. Eu, em um partido comunista e dirigindo o jornal dos comendadores. Fiquei com “A Folha” até 1967, acabei me tornando proprietário dela. Ela estava deficitária, fizeram-me a proposta para que eu assumisse o prejuízo ou os lucros. Montei uma equipe escolhida por mim, fizemos um tremendo trabalho, em seis meses conseguimos levantar a empresa. “A Folha” chegou a tirar 3.500 exemplares, naquela época era uma tiragem muito significativa. O Gustavo Alvim escreveu um livro sobre “A Folha”, ela foi o jornal mais revolucionário de Piracicaba, de 1961 a 1967. Fui processado pela Lei de Segurança Nacional. Era o único jornal de oposição. Ganhei do Dr. Cera como presente de casamento, 100 ações da Folha. Quando a coisa começou a ferver o D`Abronzo deu-me as suas ações de presente. O Luciano, antes de tomar posse quis me dar suas ações, eu não aceitei. Disse ao Wilson, que não podia aceitar. Se o seu pai quisesse me dar um litro de whisky ou uma gravata eu aceitaria. Se eu aceitasse as ações do prefeito eleito, Luciano Guidotti, eu estaria comprometido. Eu não tenho nenhuma vocação para administração. Quem entrou em crise foi “O Diário”, eu nunca perdi o vinculo com o Ferraz. Fechei a Folha, as máquinas estavam sucateadas. Com Sebastião Ferraz, Lazaro Pinto Sampaio e Domingos Aldrovandi adquirimos as ações dos antigos proprietários de “O Diário”. Eu cuidaria da redação, o Ferraz da administração, o Lázaro da parte financeira e o Aldrovandi era nosso relações públicas, ele era deputado. Fizemos uma revolução em “O Diário”. Após dois ou três meses só se falava em “O Diário”. Fizemos uma reforma gráfica completa. Regionalizamos, não era mais “O Diário de Piracicaba”, mas sim “O Diário”. Levei minha equipe de redatores, uma equipe muito boa, o Geraldo Nunes estava lá. Um sábado fui chamado pelo Ferraz para ir ao “O Diário”, ao chegar, encontrei-o de chapéu de palha, sapato de camurça, todo esportivo. Entrei, ele estava com uma chave na mão. Disse-me: “Toma, é a minha chave”. Perguntei-lhe o que tinha acontecido. Ele estava saindo da cidade, arrebatado por uma paixão alucinada. Jogou tudo para o ar. Todo o esquema montado para a empresa foi desmontado. A administração passou para mim que não entendo nada a respeito. Diante da confusão formada o Lázaro decidiu desligar-se do jornal. Ficamos eu e o Aldrovandi. Passei a cuidar da redação, da parte financeira, comercial e administrativa. Isso foi em 1970. Fomos vencendo, Decidi comprar o off-set, o primeiro do Estado de São Paulo. Fomos os primeiros a comprar e o segundo a instalar, Bauru comprou a vista, instalaram umas duas semanas antes do que nós. Nenhum dos grandes jornais tinha off-set. Lembro-me que estava com financiamento de 150 mil dólares, o Delfin Neto entrou e fez a maxidesvalorização, dormi devendo 150 mil dólares acordei devendo 300 mil dólares. Passava o pente no cabelo, caia cabelo. Lutamos muito e fomos conseguindo vencer. Meu pai adoeceu, se afastou da sua empresa, assumi as pendências da Comercial Tuffi Elias. Fui agüentando até que veio a minha prisão. Os processos não paravam. Tinha tido diversas detenções. A minha primeira condenação foi de um ano e nove meses, a segunda foi de seis ou sete meses.
Essas prisões eram fundamentas em que?

Na Lei de Imprensa. Fiquei com prisão domiciliar. Na cadeia fiquei em Campinas, no exército.
Sua postura de independência jornalística teve um custo muito alto?

Foi sempre muito alto e a vida toda. Tem uma frase de Millor Fernandes que diz: “Jornal é oposição, o resto é balcão de anúncios”. Se você não for um crítico do poder para que serve o jornal?
O episódio do “Mar de Lama” foi difícil para “O Diário”?
O Luciano Guidotti era meu padrinho de casamento, tinha laços familiares com eles, tive que fazer oposição a eles. O João Hermann era meu primo. O “Mar de Lama” tem um detalhe que muitos não se lembram, não fui eu que fiz. Entrei para o jornalismo pensando em ser escritor, em 1979 tive uma crise pessoal muito séria. Tirei umas férias, fui com a Mariana para o Rio de Janeiro, assisti a uma peça que escolhi aleatoriamente, chamava-se Layout. Na metade da peça me deu um ataque, pensei: “-Desgraçados, quem deu autorização para vocês contarem a minha vida?” Era a minha vida que estava ali na peça, a pessoa se autodestruindo. Ele fazia publicidade, mas não fazia o que queria que era escrever, ele estava se matando. Junto com a minha mulher tomei a decisão: “Vou voltar, vender “O Diário” e começar vida nova. Fiz isso e fui embora para São Paulo. Doei “O Diário” à pessoas que trabalhavam comigo, sem contudo formalizar, ele continuava em meu nome. As pessoas que assumiram “O Diário” juntamente com o Dr. Losso fizeram o “O Mar de Lama”.
No seu conceito a pessoa deve seguir a vocação embora tenha que trabalhar em outra atividade para suprir suas necessidades?

Depende da força da vocação e da necessidade. Questiono muito o aspecto da necessidade. É muito mais fácil viver do que sobreviver. Para sobreviver você tem que ter o carro do ano, o último modelo de celular, tem que ter isso, mais aquilo. Fazer parte desse clube, daquele outro. Ganhar dinheiro sem parar e gastar sem parar. Hoje a minha necessidade é de sossego, paz, ficar lendo. Todo mundo tem necessidades, depende de estabelecer uma escala. O que realmente tem importância e o que não tem. Eu queria ser escritor.
Como foi o episódio da faixa em frente a Comercial Tuffi Elias?

O Diário” estava em uma campanha contra a poluição de faixas existentes no centro da cidade. Liquidação disso, daquilo. Meu pai tinha a sua loja, eu disse-lhe: “ Pai, por favor, tire essa faixa, estou fazendo essa campanha, vai ficar chato, daqui a pouco terei que publicar”. Ele dava risada. Um dia peguei o Henrique Spavieri,e disse-lhe: “- Vai lá em frente a Comercial Tuffi Elias, tire uma foto da faixa, vamos publicar na primeira página. Poluição visual”
Qual foi a reação do seu pai?
Disse: “- Meu filho é macho!”.
E a sua busca por novas tecnologias de impressão e mídia como surgiram?
“O Diário” foi pioneiro na tecnologia de impressão em off-set. Atualmente tenho o jornal eletrônico “ A Província”, que está no ar a uns seis ou sete anos. Ninguém acreditava nesse meio de comunicação. O jornal impresso tem que se reciclar completamente. Hoje notícia em jornal não tem mais sentido. Se morrer o presidente da república agora o jornal irá dar a notícia amanhã? A televisão já está atrasada.
Como o senhor vê o futuro do jornal tradicional?

É difícil prever alguma coisa, no meu entender, o jornal só sobrevive se for investigativo, jornal de opinião, ou jornal que tenha grandes nomes de orientação pública, interprete, traduza os fatos. Quem esta fazendo esse jornalismo e está indo muito bem é a Carta Capital. Piauí é uma novidade, uma mostra do futuro. As grandes revistas no mundo todo estão passando para meios eletrônicos.
Faz sentido uma revista viver de notícias de escândalos?

Não suporto uma postura dessas. Não sei quem é pior, se o público que lê ou quem a publica.
As novas gerações informam-se de uma nova forma?

Não lêem jornais, revistas, querem informações rápidas. Os livros eletrônicos é o futuro. Olho a minha biblioteca e penso: “Coitada!”. A Enciclopédia Britânica é via meio eletrônico.
Sua convivência com as mais diversas ferramentas de comunicação permite dizer que o romantismo nessa área acabou?

Entra o lado emotivo, saudoso. Acho que esse é realmente o admirável mundo novo. Estamos vivendo momento de poeira no ar, ela não abaixou ainda. Muita coisa terá que ser regulamentada. Mas é irreversível. O primeiro livro escrevi em uma máquina de escrever, com um enorme pacote, tomei o ônibus, fui á São Paulo, entreguei para a editora, após um mês estava revisado, ela mandou-me pelo correio, fiz uma nova revisão, levei novamente à São Paulo. Foram de 4 a 5 meses para ser editado. Hoje mando um livro meu em seis segundos para a editora. Nunca tivemos a oportunidade de termos tantas informações como agora. Mas que informação? Um fato real, foi quando pediram a um garoto para fazer a biografia de Beethoven. Ele acessou a internet, e respondeu: “É o cachorro famoso...”. Se você não tem conhecimento a tecnologia não serve para nada. As universidades estão preparando a ciência de acordo com quem financia. O cientista não tem liberdade para fazer o que quer, necessita do financiador, Financiam o que interessa ao mercado. As escolas estão preparando mão-de-obra. Não estão preparando cidadão. Não estão formando. Não deveriam mais falar em educação, deveriam falar “ensino formal”. Educação é outra coisa. Universidade para todos não é correto, é para quem tem talento. Para quem tem vocação. Tenho cinco filhos, três fizeram universidade, dois não quiseram fazer, têm talento para outra coisa. Universidade não é só graduação, é pesquisa, extensão.
O que é necessário para ser um bom jornalista?

Tem que ter vocação, não adianta ter talento. Você pode ter um grande talento, ser espetacular, mas se não tiver vocação, não vai. Vocação exige de você tudo, como a medicina.
Quantos livros o senhor publicou até hoje?
Vinte. Tenho mais uns cinco prontos para publicar. O Dicionário Caipiracicabano conforme disse um amigo, dei um tiro em um mosquito e acertei um elefante. Foi escrito sem qualquer pretensão. Era complementação da Província, já está indo para a sexta edição. Foram vendidos mais de 40.000 exemplares. Ainda vendo 100 a 110 exemplares por mês só na Livraria Nobel. Não costumo reler o que escrevi, tenho dois livros que considero obras primas: “Isto é Meu Corpo” e “Miserere Mei, Amor”.














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