domingo, maio 03, 2015

PAULO JUSTO BUENO MORETTI

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 02 de maio de 2015.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
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ENTREVISTADO: PAULO JUSTO BUENO MORETTI





Em 22 de março de 1995, um grupo de cerca de 30 amigos aficionados pelo ferreomodelismo (trens em miniatura), reuniu-se na Rua Alferes José Caetano,701, dependências da Verna Variedades, onde foram deslocados balcões, expositores, e mesinhas com cadeiras. Foi especialmente convidado um aeromodelista (praticante de hobby de aviões em miniatura) para relatar sua experiência de ter fundado uma associação. O lendário Oda, já falecido, contou como se iniciou no hobby do aeromodelismo, e que aquele momento era muito significativo para nós ferreomodelistas. A palavra foi usada por diversas pessoas presentes, de todas as faixas etárias. Desde então acalentamos o sonho de realizar efetivamente uma associação. Nos fundos da loja Verna existia um enorme salão, que tinha sido no passado a área de preparação de pães e doces, da Padaria Brasileira, com dois enormes fornos. Era um prédio com uma área bem definida como loja, e nos fundos, onde um dia foram feitos muitos pães e assados, foi ocupada pela Associação Piracicabana de Ferreomodelismo. Por ali passaram muitos ferreomodelistas, hoje nomes consagrados: Tarcisio Lessa, Paulo Lessa, Avary Perches, Paulo Moretti, Antonio Lima, Geraldo Zaratin, Guido Sarin, Gilson ABC, José Mattos, que chegou a dar aulas de maquetes naquele local e muitos outros cujos nomes constam em ata. Foi criado o logotipo e carteirinhas da associação. Paulo Moretti sempre foi um entusiasta tanto dos trens como da associação. Na ocasião seus filhos ainda muito pequenos já o acompanhavam. Construímos uma maquete modular, com 14 partes independentes, porém que poderiam ser conectadas. Cada parte media 1,50 metros por 0,75 cm de largura, totalizando 21 metros de percurso. O circuito tinha 3 linhas independentes, que se conectavam no início e no fim de cada módulo. A paisagem ficava a cargo do "dono" do módulo. Existia uma fiação embaixo da maquete que funcionava como rede de alimentação para os trilhos. Essa maquete ficou por duas vezes exposta no Shopping Piracicaba, 30 dias cada vez que para lá foi levada. Eram necessárias duas viagens de uma caminhonete F-4000 para leva-la. A primeira exposição de maquete de ferreomodelismo ocorrida em Piracicaba foi na Casa do Povoador, onde a Verna expôs uma maquete cedida por Gilson A.B.Camargo. A segunda exposição pública ocorreu na agência do Banespa da Rua Moraes Barros, quando uma maquete foi trazida da fábrica Frateschi de Ribeirão Preto até Piracicaba, em um caminhão 3/4 tipo baú. Todos os eventos que envolviam a APF, as várias exposições realizadas em diferentes dependências da Unimep, inclusive na Faculdade de Arquitetura tiveram a participação ativa da Verna como incentivadora e mediadora. Acreditem, mas foi realizada uma exposição de trem elétrico dentro de um cemitério! O Cemitério dos Americanos, em Santa Barbara D' Oeste, em uma festividade da comunidade norte-americana e seus descendentes no Brasil. Paulo Moretti estava presente nessa exposição com seu material. Participamos de inúmeras exposições, inclusive os incontáveis sábados à tarde em que montávamos nosso material rodante em duas maquetes móveis, nas dependências já precárias da Estação da Paulista. Guido Sarin e sua família foram incansáveis nessa tarefa. Foram dezenas de apresentações onde a maioria do público eram crianças de periferia, que jamais tinham colocado os olhos em uma maquete! Foi contratada uma empresa especializada (Telas Gomes), para cercar o local onde a enorme maquete modular foi pela última vez montada. Foram tomados todos os cuidados para não furar as paredes, mas sim usar braçadeiras, com o objetivo de preservar um ambiente histórico (Estação da Paulista). Tomamos todos os cuidados necessários para preservar a maquete, mas a população de pombos que infestava o local achou por bem "retocar" a maquete com suas fezes. Os cupins devoraram a madeira. Vândalos cortaram os fios de força da malha central que ficava embaixo da maquete. Nosso sonho permanece na nossa saudade, e nas imagens fotografadas e filmadas. Mas o mais importante nós conseguimos: motivar os talentos adormecidos, revelar artistas que o tempo perpetuará. E isso o cupim não corroeu e nem os pombos destruíram. Hoje estamos felizes em ver a Estação da Paulista restaurada. Nesses muitos anos, percorremos um longo caminho, mas em momento algum desistimos do nosso sonho: a Associação Piracicabana de Ferreomodelismo - APF, ter um espaço aonde possa lembrar a história do trem na formação da nossa cidade e região. 


A primeira oficial exposição de ferreomodelismo de Piracicaba e Região foi realizada em parceria com a Frateschi Trens Elétricos, de Ribeirão Preto e a Verna de Piracicaba, com o apoio do vereador José Pedro Leite da Silva e da Secretaria da Cultura, cuja titular Rosângela Camolesi incentivou muito. Foi em um sábado, dia 8 de abril de 2006 no barracão existente logo no final da ponte pênsil, no Engenho Central. Uma segunda exposição foi mais tarde realizada na Estação da Paulista, já restaurada, sendo que na ocasião o Prefeito Barjas Negri inaugurou essa exposição.
Cabe ressaltar que cada ferreomodelista tem sua característica pessoal, como se fosse uma impressão digital. Ao conhecedor, basta olhar uma maquete e logo dirá quem é o autor.
Em 30 de abril de 1854 foi inaugurada a primeira linha ferroviária do Brasil, o que fez com que data se transformasse em o Dia do Ferroviário. O vereador Pedro Kawai decidiu homenagear os ferroviários, heróis esquecidos que muito fizeram para o progresso do nosso país, para Piracicaba, realizando um evento com inicio no dia 24 de abril de 2015 nas dependências do SEST SENAT. Foi feito o lançamento de um rico documentário denominado “Alma de Ferro”, História e Lembranças de um Passado Ferroviário assim como exposição de cerca de uma dezena de maquetes ferroviárias. Paulo Moretti e Guido Sarin participaram ativamente com as suas obras e material rodante. 

Paulo Justo Bueno Moretti nasceu a 1 de fevereiro de 1955, na Rua Governador Pedro de Toledo, centro de Piracicaba, é filho de Justo Moretti Filho e Dina Moretti.que tiveram também as filhas Adriana e Lia.
Em que escolas você estudou?
Escola Estadual Professor Elias de Mello Ayres, depois COTIP- Colégio Técnico de Piracicaba, onde fiz engenharia e administração. Tenho dois filhos, Ralf e Caio.
Como surgiu essa exposição de ferreomodelismo?
Fui procurado pelo vereador Pedro Kawai. Junto com alguns amigos fizemos a montagem das maquetes e dos dioramas.


Qual é a escala utilizada para realizar essas maquetes?
O diorama conta o pedaço de uma situação. Como se fosse a fotografia de um local. Ele retrata uma situação dentro do contexto da ferrovia. São relativamente pequenos, estáticos. As maquetes foram feitas em duas escalas: uma em escala HO que é 1:87, ou seja, 87 vezes menor que a original. Outra é a escala N, que é a metade da escala HO. Ou seja, 1:164.
O material é de procedência nacional?
O material rodante em parte é de procedência nacional. Temos material de procedência japonesa, européia de uma forma geral e algumas dos Estados Unidos. A maioria das maquetes que estão expostas foi realizada por mim, são maquetes semi-profissionais. São maquetes de fácil locomoção, não tem uma grande parafernália eletrônica, que hoje é utilizada em maquetes profissionais. Tenho algumas maquetes analógicas, outras digitais, mas ainda não estão ligadas a um computador. No Brasil estamos engatinhando nessa área de informatização de maquetes. Em São Paulo temos pelo menos duas maquetes ligadas ao computador, que dá todos os comandos para as máquinas irem buscar vagões, descarregar vagões. Ainda é algo de valor elevado, fora da nossa realidade.
Paulo, você além das exposições locais, participou de diversas exposições?
Devo ter participado de 12 a 15 exposições. Participei também de concursos de ferreomodelismo de várias cidades, sendo que em vários desses concursos tive a felicidade de ser classificado em primeiro lugar. Fui convidado por um amigo, Armando Canhão, de Coimbra, mandei três trabalhos, quando os trabalhos são escolhidos ninguém sabe quem é o autor, para minha surpresa, os três trabalhos que mandei na categoria “Construções”, ganhei em primeiro, segundo e terceiro lugar.

O reconhecimento é cultural ou financeiro?
Reconhecimento financeiro não existe nenhum. E eu também não busco isso. Há o reconhecimento cultural e a satisfação de ter o meu trabalho reconhecido.
Quando surgiu essa sua atração pelo ferreomodelismo?
Ainda criança eu ganhei do meu pai alguns trens, não eram brinquedos, já era equipamento voltado ao hobby. Era da marca italiana Lima. Com o tempo fui aprimorando, muitas tentativas, hoje estou realizando trabalhos em um nível bom, em um patamar de realismo dentro do ferromodelismo.
O custo do hobby é alto?
Há duas formas de se praticar o modelismo: uma é comprar todo o material e montar. É a maneira de custo mais elevado. Outra forma é você mesmo criar suas peças, modificando materiais. É o que eu faço. Comprar pronto, ou comprar “kit” é muito fácil. Só que você não tem uma peça exclusiva. Gosto justamente disso, exercitar minha criatividade. Com isso consigo um efeito muito superior do que o material pronto.
Quantas maquetes você trouxe para essa exposição?
São quatro maquetes rodantes e em torno de meia dúzia de dioramas.
Tem alguma peça que você considera diferencia da das demais?
Uma é a Estação da Paulista, que eu tive que medi-la em todos os seus detalhes, desenhar, depois executar na escala 1:87. Outra é um diorama estático, uma estação do Mandaqui em São Paulo, era um ramal da Sorocabana, já extinto, fiz através de fotos. Até onde sei é o único diorama existente dessa estação.
Quanto tempo você usa para fazer uma peça dessas?
Como não é meu meio de subsistência, faço isso aos finais de semana. Por exemplo, a maquete da Estação da Paulista levou seis meses para ser concluída. É um trabalho de paciência, não pode ter pressa. É um trabalho que dá prazer, você faz cada peçinha com carinho, com tranqüilidade. Isso me dá uma paz, um sossego, me desligo do cotidiano. O grau de concentração é muito grande. Fico imaginando como vou fazer encaixar, o final de semana é pleno em cima da maquete.
A busca pelo realismo é incessante?
Cada vez mais! Cada peça que faço  melhoro o meu nível. Aprendo coisas novas, aprendo como fazer de outra forma, melhor, mais fácil, mais bonita. A cada maquete que faço vou melhorando o meu grau de aprimoramento. O olhar para cada objeto é diferenciado: uma tampinha de desodorante pode tornar-se uma caixa de água!
Qual é a faixa etária que se interessa pelo ferreomodelismo?
Pela minha experiência de outras exposições, posso afirmar que ela atinge tanto a criança, como o adolescente, o jovem, o adulto. Todos gostam!
Você dá cursos, aulas?
Já cheguei a dar algumas oficinas de maquetes. Como fazer árvores. Como transformar peças para modelismo. No ano passado até fui convidado pelo Colégio CLQ a fazer uma maquete  com os alunos. A partir do momento em que a maquete passou a tomar forma o interesse deles foi muito grande. Neste ano fui convidado novamente a dar algumas aulas para alunos da oitava série.
Há um choque entre a tecnologia que domina as novas gerações (celulares, games) e o trabalho artesanal com maquetes?
Existe  esse choque, não é pequeno. Isso de certa forma me entristece, a juventude não cria com suas próprias mãos, não elabora trabalhos manuais. De certa forma é uma geração passiva, que senta em frente a um computador, onde consegue coisas maravilhosas, só que cada vez mais está se perdendo a habilidade manual e a transformação que pode ser feita manualmente. O jovem passa a ser o consumidor de um produto, ao passo que quando realiza, por exemplo, uma maquete, ela está produzindo alguma coisa. O jovem, em sua maioria, ao ficar junto a um computador, está produzindo alguma coisa, mas principalmente está sendo orientado a ser consumista. Em geral deixa de lado a sua criatividade. Com isso perde grandes artesãos. Hoje já não existem mais alfaiates, relojoeiros que saibam consertar um relógio mecânico. São profissões em extinção.
Isso pode ocorrer com a construção de maquetes?
São poucas pessoas no Brasil que desenvolvem essa arte, comparada a população do país. Não sei precisar quantas, mas sempre haverá pessoas que irão desenvolver suas habilidades manuais. A tendência hoje no ferreomodelismo é a pessoa adquirir tudo pronto. Monta com algumas falhas, e põe aquilo para funcionar. O modelista que fabrica todas as suas peças, cria do nada alguma coisa que fique bonito, dê um impacto, isso está cada vez mais difícil. O próprio meio induz as pessoas a comprar e montar kits, a fazer um diorama ou uma maquete. E não é esse o propósito. O bom modelista tem por obrigação criar suas peças.

E as maquetes eletrônicas?
São muito bonitas, gosto, admiro. Você pode programá-las. Você pode fazer inúmeras manobras como se estivesse dentro da cabine de um trem. Só que você está sentado em uma cadeira em frente a uma tela! É gostoso, mas não é mais prazeroso do que fazer uma maquete física.
Nos lançamentos imobiliários usam-se maquetes eletrônicas ou maquete físicas?
São usadas as duas modalidades. Em qualquer lançamento você vê uma maquete física, é um chamariz. No caso de uma residência, principalmente os arquitetos fazem toda a parte de arquitetura através da maquete eletrônica, inclusive a decoração interior, isso dá um impacto muito forte. O consumidor irá se encantar pela maquete eletrônica. Sob o ponto de vista comercial é muito importante uma maquete física e uma maquete eletrônica. Os softwares são cada vez mais poderosos, é um processo muito rápido.
Você utiliza-se desses meios?
Na construção civil tive curso de AutoCAD, na parte de modelismo existia um software chamado CadTrem, ele fazia alguns circuitos, ele auxiliava. Mas nada melhor do que você pensar e você criar. Às vezes fico dias pensando como fazer uma peça. Algumas vezes, em um “clique” vem com toda a clareza do mundo como devo fazer aquela peça. Você tem ferramental próprio para o modelismo?
Tenho uma oficina completa. É uma oficina para hobby. Ali tenho máquinas específicas: micro-serra, micro-torno, todo ferramental que utilizo para fazer essas peças. Existem algumas ferramentas que eu criei.
Você vê a possibilidade do modelismo ser utilizado como terapia em instituições tais como locais de detenções?
Como terapia com toda certeza sim, não só no modelismo, mas qualquer atividade que seja feita e ocupe o tempo com certeza irá beneficiar muito o recluso. Quando estou me dedicando ao modelismo me esqueço do mundo. Para mim é um remédio! Quando você cria alguma coisa em que não tenha nenhum interesse a não ser a satisfação pessoal, isso se torna automaticamente uma terapia.
Material rodante, que são locomotivas, carros de passageiro e vagões, você tem idéia de quantos  possui hoje?
Devo ter por volta de 300 a 400 peças. Tanto na escala HO 1:87 como na escala N 1:160. Existe uma outra escala com a qual não trabalho, que é a escala 0 (zero), ela é grande 1:43,5 e tem a escala Z que é 1:220. Ou seja, são peças 87; 160; 43,5 e 220 vezes menor que o modelo original.
Existe em São Paulo, no Parque Ibirapuera uma maquete coletiva, muito grande, e possivelmente a mais antiga do Brasil ?

É da SBF – Sociedade Brasileira de Ferreomodelismo Esses dias o Alberto, que é um dos diretores, me convidou para fazer uma estação para essa maquete. É a maior do Brasil, talvez a mais importante. Entreguei-a semana retrasada. É uma estação de ramal, pequenininha, não tem nome, colocaram lá “Estação Moretti”.  

sexta-feira, abril 24, 2015

JOSEFINA HORTÊNCIA DE CAMARGO E MARIA INÊS CAMARGO

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS 

JOÃO UMBERTO NASSIF 

Jornalista e Radialista 
joaonassif@gmail.com 
Sábado 25 de abril de 2015.

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana 

As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/ 

ENTREVISTADAS: JOSEFINA HORTÊNCIA DE CAMARGO E                                     MARIA INÊS CAMARGO



                                Da esquerda para a direita as irmãs Maria Inês e Josefina


Duas irmãs, uma advogada e uma jornalista, buscam resgatar a passado da família. Pesquisadoras incansáveis nasceram e residem em São Paulo, decididas, tomaram como rumo a cidade de Piracicaba. Sabem que muito da história de seus ascendentes está em nossa cidade. Revelam ainda que a família foi proprietária de dois ícones do comércio piracicabano, as lojas “A Porta Larga” e “Loja Duas Âncoras”.
Qual é o seu nome?
Josefina Hortência de Camargo, meu nome tem origem no nome da minha avó, a piracicabana Josephina Hortência Soares de Camargo, casada com o piracicabano João Baptista de Camargo. Eles residiram em Piracicaba até 1920. Sou a neta mais nova dela, em sua homenagem recebi o seu nome. Eu nasci na cidade de São Paulo, no bairro da Lapa a 4 de outubro. Meu pai, Ismael Camargo, filho do casal João Baptista e Josephina. Ele nasceu em Piracicaba, foi ainda muito jovem para São Paulo, estudou no colégio São Bento. Fez o curso de medicina, e acabou não voltando mais para Piracicaba. Minha mãe, Maria Paula Camargo, nasceu no Rio de Janeiro e mudou-se ainda menina para São Paulo.
Maria Inês Camargo, você nasceu em São Paulo onde exerceu qual profissão?
Nasci em São Paulo a 18 de setembro, sou jornalista.
Maria Inês como surgiu o interesse em fazer essa pesquisa com tanta dedicação de ambas?
Acredito que com o passar do tempo passamos a sentir saudade de todos nossos entes queridos que já nos deixaram. Coloco a cabeça no travesseiro e lembro-me de uma frase qualquer, penso: “Isso aqui o meu pai dizia e é a realidade!” Os anos passam a tecnologia muda, tanta coisa mudou, mas continuo pensando “- É aquilo mesmo que meu pai falou! Ele estava certo!” Ou foi algo que alguma tia falou. Esse sentimento despertou o interesse em pesquisar a história mais próxima, que é a da sua família, e descobre várias pérolas.
O que vocês descobriram, por exemplo?
Descobrimos que o nosso avô João Baptista de Camargo teve treze filhos: Nasceram em Piracicaba: João Baptista Jr, Maria Angélica Camargo Almeida, Antonio Bento de Camargo Neto, Josephina Camargo Silveira, José de Camargo, Ismael Camargo, Joanna D!Arc Camargo Jany. Nasceram em São Paulo: Isabel Camargo Simões, Paulo de Camargo, Beatriz de Camargo Pujó, Eliza de Camargo, Helena Soares de Camargo e Jorge de Camargo.  Os oito primeiros filhos nasceram em Piracicaba, os outros cinco nasceram em São Paulo, quando meu avô vendeu seus negócios em Piracicaba e transferiu-se para São Paulo.



Maria Inês, o seu avô atuava no comércio em Piracicaba?
Meu avô fundou a Loja “A Porta Larga” em sociedade com o irmão dele José Basílio de Camargo. (Cabe observar que o livro ACIPI 80 anos, editado em 2013, na página 58, cita que o nome “Porta Larga” surgiu em fevereiro de 1884 quando Eduardo de Paula Carvalho abriu uma sapataria a rua do Commercio (Governador Pedro de Toledo) canto (esquina) com a rua Direita ( Moraes Barros).O proprietário trazia as últimas novidades das melhores lojas da Corte, calçados e também armarinho, chapéus de sol e “lindíssimos artigos da moda”. O texto prossegue afirmando que no final de 1887 João Baptista de Camargo e seu irmão José Basílio de Camargo, compraram a loja e participaram seus fregueses que estavam mudando seu depósito de secos para o prédio onde ficava a Porta Larga. Em 1895 a loja passa por uma reforma). A loja ficava inicialmente na esquina da Rua Governador com Moraes Barros, ao lado direito da Rua Moraes Barros no sentido centro para o bairro, mais tarde ali funcionou a Farmácia do Povo. João Baptista de Camargo e seu irmão José Basílio de Camargo fundaram “A Porta Larga” em um prédio na mesma esquina do lado esquerdo da Rua Moraes Barros, onde funcionou até se dar o seu encerramento em 2006.  Em 1921 foi vendida para Pelippe Zaidan Maluf com a ajuda de Elias Zaidan, Jorge e Hide Maluf).

Quando João Baptista de Camargo vendeu a loja "A Porta Larga" entre outros itens comercializava louças importadas, estas duas peças ainda existem e a fotografia é uma cortesia da proprietária.   
Maria Inês essa loja trabalhava com o que?
Eles tinham várias coisas, vi referências, anúncios de jornal da época, dizendo que eles tinham desde gêneros alimentícios até produtos para uso doméstico, agrícola.
Josefina complementa:
O que as tias contavam é que o pai (João Baptista de Camargo ou então o irmão e sócio João Basílio de Camargo) ia de navio para a Europa, para adquirir louças finas, porcelanas, sedas, essas coisas mais sofisticadas. Ele fazia as compras e trazia para serem comercializadas pela sua loja.
Em que ano faleceu João Baptista de Camargo?
Ele nasceu a 16 de junho de 1870, faleceu em 1940.
Qual é a origem da família?
Josefina responde: “- É o que estamos pesquisando!” O pai da minha avó Josephina Hortência Soares de Camargo era português. Veio de Portugal para Piracicaba, ele trabalhava como lavrador. O pai do meu avô João Baptista de Camargo, não tenho certeza se era piracicabano ou não, mas eles tinham vinculo com Piracicaba através do Antonio Bento e do irmão Joaquim Cipriano de Camargo. Joaquim Cipriano de Camargo foi o padre que celebrou a missa na inauguração do Cemitério da Saudade. Na família todos tratavam como “tio padre”, descobrimos isso recentemente. Ele tinha uma tia, Maria Justina de Camargo, diziam que era uma excelente quituteira. Procurei saber quais eram os quitutes da época, eles comiam o que plantavam e o que criavam. Tinha muitas receitas a base de porcos e frangos, muitos alimentos feitos a base de mandioca: sopas, ensopados, farinha de mandioca era utilizada em lugar do trigo, que praticamente não existia. Conhecer os costumes da época despertou-me muita curiosidade.  Maria Justina de Camargo, tia do meu bisavô, isso por volta de 1870. A maior dificuldade é encontrar documentos dessa época.
Josefina, qual era a principal fonte de lazer dessa época?
Percebi que o grande divertimento deles era em função da igreja. Divertiam-se através das festas religiosas. Era o núcleo deles. Até a proclamação da república os registros eram todos feitos nas igrejas. Consegui ver os registros de nascimento de João Baptista de Camargo, de Josephina Hortência Soares de Camargo, do falecimento do Antonio Bento de Camargo, pai de João Baptista de Camargo. Antonio Bento de Camargo está sepultado aqui no Cemitério da Saudade de Piracicaba. Há uma rua com o nome dele aqui em Piracicaba.
Maria Inês, como era o seu avô João Baptista de Camargo?
Seus pais foram Antonio Bento de Camargo e Sebastiana do Amaral Gurgel, que tiveram cinco filhos: Antonia, José Basílio, João Baptista, Pedro e Maria Angélica. Um fato curioso é Pedro de Camargo foi o fundador e proprietário de uma loja muito conhecida na época: a loja “Duas Âncoras” que de certa forma concorria com “A Porta Larga”.  Pedro de Camargo permaneceu em Piracicaba até por volta dos anos 50. Meu avô João Baptista, ao voltar para São Paulo, acabou envolvendo-se com o comércio novamente. Teve uma loja chamada “Ao Bandeirante”, que ficava no chamado “centro velho” nas proximidades da Praça Julio de Mesquita. Era similar ao que foi a Porta Larga. Nessa loja ele acabou contratando um rapaz para ajudar no atendimento ao público. Esse rapaz chamava-se Gabriel Gonçalves, que com aquele aprendizado, acabou montando seu próprio negocio e tornou-se um grande nome do comércio de São Paulo, montou uma rede de lojas chamada Gabriel Gonçalves conhecido como “GG Presentes”. Na Revolução Constitucionalista de 1932 meu avô aderiu plenamente na luta de São Paulo contra o Governo Federal. São Paulo queria uma constituição, Getulio Vargas negava. Meu avô já era uma pessoa mais idosa, na faixa de mais de 60 anos, os filhos foram lutar na frente de batalha paulista, meu avô ficou em São Paulo e fazia a Ronda Noturna, percorria o quarteirão onde morava, na Rua General Jardim, na Vila Buarque. Havia o temor de que como a maior parte dos homens estava servindo em combate, alguém se aproveitasse disso para invadir alguma residência. Os homens mais velhos das famílias, quase em sua totalidade circulavam durante a noite em cada quarteirão. No inicio da Segunda Guerra Mundial meu avô já estava idoso, vendeu seus negócios e encerrou as atividades comerciais.
Josefina com relação a “A Porta Larga” também havia uma vigilância à noite?
Isso eu descobri na pesquisa, ele e outros comerciantes da região faziam a ronda também com o intuito de segurança, era um grupo de comerciantes que se revezavam, cada noite ia um deles. Eles trabalhavam na loja durante o dia e a noite faziam essa ronda. Foram os primeiros guardas-noturnos. Essa ronda deu origem a Guarda Municipal, isso deve ter sido entre 1890 a 1900.
Em sua busca pela origem dos seus antepassados até que época sua pesquisa abrange?
Chegamos até por volta de 1500, com um ascendente nosso chamado Fernão Ortiz de Camargo, ele era espanhol. Percorrendo a linha do tempo chegamos a Marta de Camargo, que teve treze filhos. Uma das suas filhas é Maria Joaquina de Camargo, que supostamente seria a mãe do Padre Diogo de Feijó. O Padre Diogo de Feijó seria o provável pai de Antonio Bento, na época era muito comum terem filhos, eles não eram a favor do celibato.
Existe alguma documentação a respeito?
Descobri recentemente em Piracicaba, um primo que é filho de José Basílio, esse meu primo disse que toda documentação que tinham sobre Feijó foi entregue à Cúria. Estive nas Cúrias de Piracicaba e de São Paulo, mas não consegui levantar nada a respeito. Em alguns livros, Feijó se declara filho de Maria Gertrudes, que era filha da Marta e irmã de Maria Joaquina. Feijó era uma pessoa muito culta, com grande participação política, foi o fundador de uma loja maçônica, mas com o seu envolvimento com a Corte, com o Império, ele não levou adiante suas atividades maçônicas.
O que motiva vocês duas a se deslocarem de São Paulo a Piracicaba apenas para pesquisar o assunto?
Tudo começou comigo, Josefina. Embora a Inês goste muito também.  Comecei a perguntar-me: Como era o meu passado? Quais informações eu tenho? Vi que tinha muito pouca história. Baseei-me um pouco na história do meu marido, a família dele é espanhola, por parte de pai e de mãe, ele conseguiu fazer a árvore genealógica dele, no ano passado tivemos a felicidade de poder ir para a Espanha e nós fomos à cidade, à igreja, vimos os livros dos registros dos avós, bisavós, dele, aquilo me acendeu uma chama.
Maria Inês, você é jornalista, trabalhou na grande imprensa paulista por alguns anos.
Trabalhei, estudei jornalismo na Universidade de São Paulo – ECA, meu primeiro emprego foi no Jornal da Tarde, do Grupo Estado de São Paulo, permaneci por 10 anos na empresa, trabalhava na reportagem de “Cidades” principalmente. Trabalhei em outros veículos de comunicação, em revistas, em jornalismo especializado na área de construção. Trabalhei no então Diário Popular, que foi vendido e passou a se chamar Diário de São Paulo.
Como era o seu pai?
Meu pai Ismael Camargo, médico, nasceu em Piracicaba, era o sexto filho do casal João Baptista de Camargo e Josephina Hortência Soares de Camargo. Ele estudou na Faculdade de Medicina de Pinheiros, incorporada mais tarde a Universidade de São Paulo. Foi um grande médico, cirurgião, fazia a área de ginecologia e obstetrícia, ele foi assistente do médico que introduziu a cesárea no Brasil, Raul Briquet. Quando meu pai formou-se em 1928 a sua tese já era sobre cesárea. Ele era um médico que se dedicava integralmente a profissão. Ele teve consultório no centro de São Paulo, na Rua Barão de Itapetininga,  trabalhou muito tempo no Hospital Matarazzo, na Maternidade São Paulo, que era uma referência na área, depois trabalhou na rede publica de saúde, inclusive no Hospital Sorocabana.
Maria Inês lembra-se de uma particularidade a respeito do seu pai.
Ele saiu de Piracicaba ainda criança. Conheceu minha mãe em São Paulo, onde se casou. Uma particularidade dele era quando estava chateado ou aborrecido punha-se a cantar o Hino de Piracicaba, lembro-me de um trecho: “Ninguém compreende a grande dor que sente o filho ausente a suspirar por ti...”



Josefina complementa
Lembro-me que meu pai não gostava de dirigir, como tínhamos acabado de nos habilitarmos, adorávamos sair. Ele então pedia para levá-lo para fazer as visitas aos seus pacientes no hospital. Chegou uma época que ninguém mais queria levá-lo nessas visitas, nós ficávamos aguardando no carro dentro do estacionamento, alguém chamava ele entrava em cirurgia. De tanto que ele gostava ficava fazendo cirurgia e ficávamos lá em baixo esperando! Não era uma cirurgia que estava programada, alguém o chamava e ele entrava na sala cirúrgica. Nós às vezes ficávamos horas esperando por ele.
Quando seus pais se casaram foram morar onde?
Na Avenida Dr. Arnaldo, no bairro Sumaré, eles tinham uma diferença de 30 anos de idade. Uma diferença muito grande, mas era um casal muito harmonioso. Ele tinha 50 anos, minha mãe 24. Davam-se muito bem, ficaram casados quase 30 anos. Ele faleceu em 1980. A minha mãe está com 84 anos, uma cabeça excelente!
Maria Inês, com sua experiência e vivencia em grandes veículos de comunicação, a seu ver, porque Piracicaba encanta tanto?
Acho que Piracicaba é uma grande metrópole. A primeira vez que estive aqui foi há uns 30 anos, ao retornar notei que a cidade cresceu muito. As grandes empresas deram um eixo econômico para a cidade. A cana-de-açúcar deu um grande impulso. A Escola de Agronomia Luiz de Queiroz é uma referência para o país todo. Foram dois grandes marcos. È uma cidade que parece oferecer uma qualidade de vida muito boa.
Josefina, o que significa para você esse mergulho ao passado?
Acho que é a busca pela minha origem. De onde vim. Comecei a descobrir na família personagens que me chamaram muito a minha atenção, uma delas é a Maria Justina de Camargo, tia de Antonio Bento de Camargo e Joaquim Cipriano de Camargo. Não me considero uma boa cozinheira, mas descobri um livro chamado “As Receitas do Imperador”, ele é rico em fotos e curiosidades, mostra como faziam as comidas naquela época. Usavam banha que chamavam de “manteiga de leite”. Os doces eram feitos a base de frutas. Faziam compotas. Tentei cozinhar alguns pratos baseando-me naquelas receitas. Tive que fazer algumas adaptações de ingredientes. Tem uma receita de peru recheado que desperta a salivação.  Eles faziam a farofa com pão colocavam diversos ingredientes, aquilo parece que deve ficar muito bom! Era comum ele comerem muito peru. Outra coisa que me chamou muito a a atenção é que nessa época eles descobriram o banho-maria. Os banquetes eram feitos para muitas pessoas, as mesas das famílias eram muito grandes, com isso preparam tudo com antecedência, havia a dificuldade em aquecer o alimento na hora de servir. Descobriram aquela tampa usada para o prato não esfriar. (Cloché ou abafador).
Qual religião era seguida pela família?

Pode-se afirmar que há dois ramos: O irmão do João Baptista, o Pedro, era espírita, teve uma participação muito grande na Federação Espírita em São Paulo. Meu avô João Baptista também era espírita, embora não tivesse a mesma dedicação que seu irmão Pedro teve. Outro lado da família é católico. Meu pai era muito engraçado no que ele falava: “Eu sou ateu, graças a Deus!”. Duas gerações anteriores, dentro da família Camargo, têm muitos familiares que foram padres. Sebastiana do Amaral Gurgel era casada com Antonio Bento de Camargo, pais de João Baptista de Camargo, ela tinha um sobrinho Manoel Joaquim do Amaral Gurgel, isso por volta de 1870, ele era padre, deu o nome a Rua Amaral Gurgel, é tido como um excelente deputado. 

sexta-feira, abril 10, 2015

GUSTAVO GUEDES BORTOLETTO (GUSTAVO BOLEIRO)

Entrevista realizada no dia 31 de março de 2015 A Rua Prudente de Moraes, 470
PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS 

JOÃO UMBERTO NASSIF 

Jornalista e Radialista 
joaonassif@gmail.com 
Sábado 11 de abril de 2015.

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana 

As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

http://blognassif.blogspot.com/
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ENTREVISTADO: GUSTAVO GUEDES BORTOLETTO 

                                               (GUSTAVO BOLEIRO)


O artista Gustavo Guedes Bortoletto é conhecido no meio artístico como Gustavo Boleiro, um cognome que adquiriu quando se dedicou ao futebol, esporte ao qual dedicou desde cedo muitos anos de treinamento e aperfeiçoamento, chegando mesmo quase a ser tornar um profissional do futebol. Desde os doze até os dezoito anos sempre jogou, tendo integrado os quadros dos times XV de Novembro de Piracicaba, Rio Branco de Americana, União de Araras, União Barbarense. Entre 17 e 18 anos foi para a Turquia onde fez um teste em um time local, foi aprovado, só que decidiu não permanecer naquele país. Gustavo nasceu a 10 de março de 1986, em Piracicaba, é filho de João Luiz Bortoletto e Rosangela Nogueira Guedes Bortoletto que tiveram os filhos Thaísa e Gustavo.  


Com que idade você já praticava esportes?
Acho que com três anos eu já chutava bola. A seguir entrei na escolinha de futebol do Clube de Campo, tive aula com o Américo, com Armando Bala (Filho do Cícero fotógrafo) permaneci lá até os 13 anos, quando comecei a jogar mais profissionalmente, fui jogar no mirim do XV. Hoje jogo como lateral direito, já joguei de meia, volante.
Você estudou em qual escola?
Estudei no Dom Bosco Assunção ate a oitava série, depois estudei em várias escolas: COC, Anglo Portal, Dr. Jorge Coury, em função da minha dedicação ao futebol. Fiz o curso de jornalismo na Unesp em Bauru. No segundo ano da faculdade comecei a me interessar por humor. Participei de grupos de teatro, extracurricular. Volteia à Piracicaba, fiz um curso de Arte Dramática no SENAC local. Eu queria dedicar-me a alguma coisa ligada ao teatro, em especial ao humor.

                                                        GUSTAVO E SEU PAI
Você tem a percepção de quando surgiu essa sua atração pelo humor?
Sempre gostei de piada, embora nunca tenha pensado em ser o apresentador das mesmas. Quando surgiu o stand-up (do inglês stand-up um termo que designa um espetáculo de humor executado por apenas um comediante, que se apresenta geralmente em pé), é um humor de cara limpa, você está sozinho no palco, o comediante, o microfone, contando fatos do cotidiano. Diz-se que stand-up é um termo utilizado não pelo fato de se estar em pé, mas sim por posicionar-se sobre um assunto. Tem que ser usado o texto autoral, são textos que o próprio apresentador cria, é permitido imitações. Tenho textos sobre o meu pai, sobre a minha mãe. Tenho piadas sobre Marcelo Rezende, Datena, eu abordo as coisas do cotidiano. (Nesse momento Gustavo imita Marcelo Rezende com grande semelhança.). A piada é relativa a forma como ele fala, O Marcelo Rezende vai falando de uma forma que você percebe que ele está sempre com o nariz entupido. Parece que está com rinite! E ele vai falando e vai perdendo o fôlego! Acho isso muito engraçado! Acabo levando para o palco observações do que vejo no cotidiano. Tudo pode virar piada, desde um celular que a pessoa não atende até um mosquito, uma notícia da política. Mantém a lente do humorista sempre atenta.

O humor é a forma mais eficaz de se fazer uma crítica?
Pelo menos acho que é uma forma eficaz de manter a atenção da pessoa, de elas entenderem e prestarem a atenção. Faço shows em empresas com caráter educativo sobre determinado assunto. A aprendizagem dos funcionários, dos colaboradores, é muito maior quando se transmite uma mensagem através do humor do que fazendo uma abordagem apenas técnica, sem um atrativo que prenda a atenção do ouvinte. Não tenho os dados precisos no momento, mas está confirmado que se utilizando do humor pode-se aprofundar por mais tempo uma exposição técnica sem que haja perda de interesse de quem assiste. A abordagem deve ser bastante técnica, bem elaborada, com consistência, dar consciência da importância do assunto, porém de forma extremamente agradável. Tenho uma apresentação destinada a corretores de imóveis, é muito interessante como os clientes valorizam termos em inglês utilizados pelos corretores. Aguça o interesse do cliente. Nesse meu show dou instruções adversas, com o objetivo de conscientizar o profissional. Crio situações inusitadas, totalmente absurdas, em um limite ridículo, para que o profissional examine como tem sido seu procedimento, possivelmente nunca tenha chegado a essas situações extremas, mas pode correr o risco de inadvertidamente perder uma negociação por um pequeno detalhe.


Você era o típico aluno que era o mais engraçado da turma?
Não muito, eu era muito tímido. Acho que descobri isso A minha faculdade tinha um projeto chamado Web Rádio Unesp Virtual, era uma rádio gerenciada somente pelos alunos. No primeiro ano entrei participando d um programa de esportes. No segundo ano criei um programa de tênis chamado “Top Spin”. Desde os onze ou doze anos que eu jogo tênis. Criei um programa de humor, chamado “Errando o Furo”, baseado no “furo” jornalístico, um radio jornal com notícias inventadas, onde era criador, redator, locutor, editor e editor geral. Nessa mesma época comecei a ter contato com vídeos de “stand up”, foi quando ele estava começando no Brasil. Quem fazia praticamente era o Rafinha Bastos, o Danilo Gentili.
Quais temas você aborda em seus shows?
Gosto muito de falar sobre família, profissões, coisas básicas do cotidiano. Tenho um texto sobre siglas. Que usamos no cotidiano. Temos siglas para tudo na vida. “Por exemplo: “Meu nome é Gustavo, nasci em BH, fui criado no ABC, moro no CDHU da ZL que fica na PQP e faço ADM na GV mas estou de DP. Estava na minha BMW ouvindo um CD do RPM no MP3 tomando energético TNT mexendo no GPS quando um PM pediu minha CNH. Como eu só tinha RG e CPF estava vencido o IPVA o PM me levou para a DP me botou no SPC fez um BO. Lá eles me torturaram passei 10 horas vendo numa TV de LCD em FULL HD todos os CDs do KLB”. Claro que é uma história fictícia.
Quem quiser entrar em contato com você pode fazer como?
Tenho meu e-mail:  contato@gustavoboleiro.com.br Faço shows, palestras, focadas em determinado assunto, mas com o humor sempre presente.

Você participa de peças publicitárias
Faço comerciais para a televisão. Acabei de fazer um teste para a Renault. Fiz comercial com o Rubinho Barrichello. Já fiz diversos comerciais que são veiculados pela Rede Globo.



Você faz shows em Piracicaba?
Aqui faço na “Cachaçaria Água Doce” uma vez por mês, todos os meses, isso já há uns 18 meses. Stand Up já faço há quase seis anos. O CQC surgiu quando encontraram o pessoal apresentando-se em um bar. Os produtores argentinos do “Quatro Cabezas” que são os produtores do “Gora é Tarde” do “CQC”, o Diego, se não me engano, foi ao bar, assistiu ao show de Stand Up do “Clube da Comédia” apresentado por Oscar Filho, Rafinha Bastos, Danilo Gentili, e Marcela Leal acho que Marcelo Mendes estava no elenco nessa época. Ele gostou e levou esse pessoal para fazer um teste. Ai surgiu o CQC que é um marco no humor brasileiro.
O que você acha do humor feito pelo programa Pânico?
Em minha opinião só quem trabalha com humor sabe como é difícil obter conteúdo para gerar um programa de duas a duas horas e meia por semana. Tem quadros mais elaborados, que eu gosto, assim como tem quadros que passam a impressão de que foram colocados para completar o programa.
O publico brasileiro aceita passivamente programas de qualidade duvidosa?
Isso é uma questão de cultura popular. Muitas vezes não têm nem outra programação para usar como referência. A revista Piauí é uma revista de humor só que grande parte da população nem sabe da existência dessa revista.
Durante uma apresentação há pessoas que são inconvenientes?
Todo artista tem muita história sobre o comportamento do seu público, inclusive de alguns raros inconvenientes. Normalmente apresento espetáculo com outros artistas que também se apresentam. Um comediante apresenta-se, em seguida chama o próximo, e assim todos se apresentam, individualmente. Aqui em Piracicaba desempenho o papel de mestre de cerimônias. Entro, coloco o publico a vontade, busco descontrair o ambiente, e assim vou chamando os comediantes a cada intervalo. O nome do show chama-se “Gustavo Boleiro Convida”. Todo show trago três convidados diferentes, normalmente faço o show na terceira ou quarta semana. O espetáculo dura de uma e quinze minutos a uma hora e meia. Meus vídeos estão todos no You Tube. Co relação a interação com a platéia, certa vez estava realizando um show em uma casa noturna de uma cidade próxima, um dos clientes, excedeu-se na ingestão de bebida, e tornou-se inconveniente, interferindo sempre que podia. Foi quando perguntei ao público: “- Após conhecer uma garota, após quanto tempo é recomendável que se telefone para ela?” Imediatamente o sujeito embriagado, com voz pastosa disse: “-Imediatamente!” Respondi-lhe: “-Está vendo porque você está desacompanhado?”. O publico veio abaixo. Foi um delírio só! O show em si é baseado em um texto. Esse é o roteiro básico, se alguém falar alguma coisa eu não posso ignorar. Há o contato direto com o público. Fiz um curso de improviso durante três anos.

Você costuma assistira gravações de artistas que fizeram sucesso?
Às vezes ocorre sim. Tem um vídeo do Chico Anísio fazendo a entrega do Prêmio Roquette Pinto fazendo Stand Up mesmo. Sensacional! Ronald Golias era muito bom também. É um pessoal de outra escola. O Golias era engraçado naturalmente, o Oscar Filho disse que encontrou o Golias uma vez, e um consultório aguardando para ser atendido. O Golias com seu jeito característico de falar disse-lhe: “- Sabe meu amigo o que eu queria agora? Queria dormir!”. Ri muito só de ele ter falado isso! A própria Dercy Gonçalves, não era moldada para os padrões da televisão, era muito ela mesma.

Quantos comediantes de Stand Up existem hoje no Brasil?
Estávamos discutindo isso esses dias! Acho que vivem mesmo de comédia não existem nem mil.
É bastante?
Não é bastante! Quantos dentistas, médicos existem? Basta imaginar quantos bares, teatros, casas de shows existem em todo o Brasil. Tem espaço para todo mundo que quiser, que é bom. Cada um cria seu espaço também.
A comédia é melhor para quem apresenta ou para quem assiste?
Comecei a fazer de tanto gostar de assistir. Para mim a comédia é uma necessidade. Não me imagino parara de fazer teatro, comédia. Acredito que não consigo. Mesmo que pare de fazer profissionalmente vou ficar todo dia postando uma piada no face book.
Você acredita que exista talentos ainda não descobertos?
Penso que não adianta ter apenas talento. Tem que haver dedicação.  Em Piracicaba meu show está bem, lotado, mas estamos sempre cuidando para que continue assim. Só ter talento e não dedicar-se para escrever uma piada nova, não produz um show, ai fica difícil. Tem comediante que está com o mesmo show há 10 anos.
Existe apresentador de stand up que usa serviços de algum redator?
Eu já escrevi algumas coisas para alguns amigos. Escrevi uma série de humor chamada “Consultor de Carreira”. O consultor Max Gehringer responde dúvidas corporativas. Fazíamos um consultor aconselhando o  contrário da maneira correta de ser feita. Algo sem lógica.   
Gustavo você aceita convites para shows em eventos domésticos?
O humor é semre bem vindo em qualquer evento. Tenho essa disposição para estar presente em confraternizações, celebrações, onde houver um público. Basta entrar em contato pelo e-mail contato@gustavoboleiro.com.br. Atualmente tenho três shows corporativos, u é especializado na área imobiliária. Outro que é voltado pró-atividade, segurança do trabalho. Outro show é o Happy Hour que faço junto com Jansen Serra, focado principalmente em segurança do trabalho. Temos outros shows abordando espírito de equipe, produtividade, liderança. São shows com orientações corporativas.
Você tem um grande admirador, é uma pessoa especial em sua vida e em sua carreira?
É meu pai João Luiz Bortoletto! Admirador e fonte de inspiração! É onde busco boa parte das minhas piadas! As coisas louças que ele faz! Eu tinha piadas sobre ele e não tinha sobre a minha mãe, ai descobri que ela fala sozinha quando lava louça. Na hora pensei: “-Preciso contar isso!”.
Gustavo, você tem uma sensibilidade aguçada?

Tem que treinar! Criatividade é muito treino! Já é muito difícil fazer rir. Eu faço o humor que eu acho engraçado, não me preocupo em passar determinada mensagem. O show corporativo é diferente, através do humor são passadas as mensagens. 

sexta-feira, abril 03, 2015

JOÃO DE OLIVEIRA

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 28 de março de 2015.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: JOÃO ANTONIO TEODORO DE OLIVEIRA

                                 JOÃO DE OLIVEIRA)

João Antonio Teodoro de Oliveira nasceu a 19 de setembro de 1950 em Tomazina, estado do Paraná. João de Oliveira, como é muito conhecido, é filho de Antonio Teodoro de Oliveira e Maria Aparecida de Oliveira que tiveram o s filhos João Antonio, Maria Francisca, Maria das Graças, José Teodoro e Isabel e mais dois outros filhos falecidos ainda muito novos.
Até que idade você permaneceu em Tomazina?
Até meus treze anos. Meu pai era agricultor, cultivava arroz, feijão, frutas, minha mãe trabalhava em nossa casa. Estudei até o segundo ano de ginásio em Tomazina, no Grupo Escolar Carlos Gomes. Embora fosse uma cidade pequena, tinha também uma escola de comércio.
Você lembra-se do nome do seu primeiro professor?
Lembro-me! Foi um tio meu, Alcides, irmão do meu pai, pai do Teodoro da dupla Teodoro e Sampaio! Era uma classe mista, onde estudavam alunos do primeiro, segundo, terceiro e quarto anos, todos na mesma sala. Não foi em Tomazina! Foi em Sertão de Cima, era um povoado, ficava a seis léguas de Itararé. Nós moramos em várias cidades do Paraná, o meu pai era telegrafista substituto antes de dedicar-se a agricultura. Ele trabalhou na Estrada de Ferro Sorocabana. Pelo fato de ser telegrafista substituto ele ficava três meses em uma localidade, seis meses em outra. Eu tinha de sete para oito anos.
Você ia ver seu pai trabalhar como telegrafista?
Ia! Meu pai tentou me ensinar o código Morse, Ele trabalhava muito bem com o telegrafo, eu não me adaptei.
Você então é primo do Teodoro da dupla Teodoro e Sampaio?
Sou primo do Teodoro (Aldair Teodoro da Silva) tanto que meu nome é composto pelo sobrenome Teodoro. Às vezes tenho contato com ele. Ele fazia o terceiro ou quarto ano do grupo escolar eu fazia o primeiro, isso em Sertão de Cima. Estudamos na mesma sala de aula. Lá estudei só o primeiro ano, em seguida fomos morar em outro patrimônio: Euzébio de Oliveira, no fim do ramal da Sorocabana. Nessa época meu pai era feitor de uma turma que dava manutenção na estrada de ferro. Meu pai trabalhou por dois anos lá, onde fiz meu segundo ano escolar, a professora chamava-se Dona Inês Marques Leal. De lá fomo morar em Arapoti onde fiz o terceiro ano primário. De Arapoti fomos para Tomazina onde estudei o quarto ano primário, o professor era Seu Manoel de Almeida, um excelente professor. Ele também dava aula de matemática para o primeiro e segundo ano de ginásio. Tenho muita saudade dele. Ele cobrava muito dos alunos, mas a classe sabia muito também.
Isso era no tempo em que o aluno ficava em pé assim que o professor entrava na sala de aula?
Exatamente! E só sentávamos depois que ele mandava.
Quanto tempo seu pai permaneceu na atividade rural?
Acredito que tenha sido por uns dois anos.
Por que seu pai escolheu Piracicaba para vir morar?
Meu pai já conhecia Piracicaba. Ele tinha pessoas da família que moravam em Piracicaba, seus pais viveram e faleceram aqui.
Em que local vocês vieram morar quando vieram do Paraná para Piracicaba?
Fomos morar no Rancho Alegre. Na casa da Dona Joaninha, casada com o Seu Luiz Acs, o húngaro. Essa história foi muito interessante, viemos para cá com o nome e a roupa do corpo! Conseguimos alugar uma casa de dois cômodos nas dependências do Rancho Alegre, que era uma chácara enorme. Conheci a filha deles a Magali, esposa do Zezo, que até hoje moram ali, em frente onde foi o Rancho Alegre, em uma casa de esquina que eles construíram. Morei 10 anos ali. A minha mãe ajudava Dona Joaninha e Seu Luiz, eles trabalhavam com festas.
Que tipos de festas eram realizadas no Rancho Alegre?
Eram eventos finos, os casamentos mais chiques da época eram comemorados ali. O Seu Luiz Acs trabalhou como confeiteiro no tradicional restaurante Fasano em São Paulo antes de vir para Piracicaba. Ele gostava de fazer palavras cruzadas que vinham impressas na Gazeta Esportiva. O Rancho Alegre ficava a uns trinta ou quarenta metros de distância dessa casa que a Dona Joaninha alugou para nós. Ela foi até a nossa casa e disse: ”- Estou vendo a família aí, mas não vi chegar caminhão de mudança!”. Ela não sabia que não tínhamos nada. Ela olhou, viu a situação em que estávamos e disse à minha mãe: “-Aparecida, não se preocupe, vamos dar um jeito!”. Não sei se ela era espírita ou tinha muita amizade com pessoas ligadas ao espiritismo, em dois dias tínhamos de tudo dentro de casa! Tinha coisas novas, outras usadas, mas em excelente estado de conservação, Dona Joaninha foi uma santa para nós! É por isso que gosto tanto de Piracicaba! Eu só cresci aqui em Piracicaba! Desde a época em que cheguei.
Qual era o acesso para o Rancho Alegre?
Você descia a rua da Mausa, passava em frente a Mescli, passava a linha da Estrada de Ferro Paulista, entrava na Rua Higienópolis, ali tinha um caminho que cortava, passava a linha da Estrada de Ferro Sorocabana, e entrava no Rancho Alegre. Dava também para seguir pela linha de trem da Sorocabana e sair logo abaixo do Seminário Seráfico São Fidelis, onde tem a praça, próxima ao Teatro Municipal Losso Neto.
Você conheceu o Olho da Nhá Rita?
Conheci. Era a nascente de água. Não existia a Avenida 31 de Março. Lembro-me quando abriram a Avenida 31 de Março, onde o trator passou íamos jogar bola. Cheguei a pegar o trem da Sorocabana para ir jogar bola em Rio das Pedras, cheguei a fazer esse trecho com a Maria Fumaça. Era uma viagem demorada. Parava em todo quanto é lugar.
Nessa época seu pai trabalhava em que atividade?
Ele trabalhava com o engenheiro Alberto Coury. Eles estavam fazendo a fundação do Edifício Bandeirantes, aquele prédio ao lado do então Cine Broadway, na Rua São José entre a Praça José Bonifácio e a Rua Alferes José Caetano quando caiu o Edifício Luiz de Queiroz (Comurba) isso foi em 1964. Meu pai estava na obra quando o Comurba caiu, a distância entre os dois edifícios era de uns 100 metros mais ou menos. Naquela época telefone era uma raridade, mas o Rancho Alegre tinha, e meu pai conseguiu avisar a família que estava tudo bem com ele. A telefonia era tão precária que para pedir um interurbano e falar com alguém em São Paulo levava umas seis horas!
Que idade você tinha?
Eu estava com uns treze anos quando vim do Paraná para Piracicaba. Surgiu uma oportunidade para trabalhar com o meu primo Garcia Netto, que veio da Rádio Piratininga de São Paulo para trabalhar em Piracicaba, ele era gerente da Rádio “A Voz Agrícola”, ele me chamou, entrei como Office boy, ia buscar jornais, revistas, a Dona Joaninha que me levou até o juiz para que me autorizasse a trabalhar, eu não tinha 14 anos ainda. Fomos até o juiz de ônibus. O fórum ficava na Praça José Bonifácio, onde hoje funciona o Banco do Brasil, na esquina da Rua Santo Antonio com a Rua Prudente de Moraes. Naquela época desde que tivesse o diploma do primário o juiz autorizava a trabalhar mesmo que fosse menor de 14 anos. Devo ter essa autorização guardada até hoje. Na rádio pela manhã eu ajudava a Dona Maria Navarro, que era a mulher que cuidava da limpeza, lá pelas nove horas ia até as agências buscar os jornais e revistas.

Era a famosa época do “Gillete Press” recortavam-se as notícias publicadas em jornais, colava numa folha de papel jornal e entregava no estúdio, para o locutor do horário ler com aquele entusiasmo que dava a impressão de que o fato estava acontecendo naquele exato momento e na presença do repórter. As revistas da época eram a Fatos e Fotos, Cruzeiro, Manchete, Intervalo. Horóscopo de Omar Cardoso (Homar Henrique Nunes mais conhecido por Omar Cardoso). Trazia tudo para a rádio.  O Celso Ribeiro fazia o horário da uma hora da tarde às sete horas da noite. Ele disse-me: “-João, vem cá, você vai trabalhar na mesa!”. Fiquei lá uns quinze ou vinte dias. Fui pegando o jeito. Trabalhava com picape, era muito mais difícil de trabalhar. Gravador Akai. Para que o som não ficasse muito ruim, cortava-se a fita original e emendava-se com durex.

Tinha que ser meio mágico?

Tinha que gostar muito. Se passasse de um gravador para outro, o original já era ruim! O outro você nem entendia então. Na época futebol utilizava a linha física, se tivesse uma chuva forte no meio do caminho acabava a transmissão.

Pode-se dizer que Celso Ribeiro é o seu padrinho?

Foi o Celso quem me ensinou. Isso foi no final de 1964, começo de 1965.

Você conheceu figuras históricas nesse período todo que vem trabalhando com rádio?

No começo de 1965, eu já sabia trabalhar na mesa. O Garcia Neto ia para São Paulo, para a Rede Piratininga. Ia ser comentarista esportivo da Rede Piratininga junto com Wilson Brasil. Quem assumiu a Rádio “A Voz Agrícola” em Piracicaba foi Pantaleão Pirillo Júnior. O Celso de Moura ia sair de férias, o Pirillo Junior pediu para que eu cobrisse as férias dele. Até então eu não tinha carteira de trabalho assinada. Ele disse-me que iria providenciar minha carteira e eu iria trabalhar na rádio. Na época eu trabalhava com Garcia Neto que era comentarista, Ary Pedroso, que era o primeiro narrador, Jamil Netto que narrava basquete, vi absurdos acontecer no basquete, vi cesta contra, a parte técnica sempre acompanhava o locutor.

João, alguma vez você viu algum locutor narrando uma partida sem ver o jogo?

Já! Ouvindo outra rádio e transmitindo como se estivesse no local! Já vi locutor deixar de narrar um gol porque não viu.

Em que rádios você já trabalhou?

Na “Voz Agrícola”, que mudou de nome diversas vezes, lá eu trabalhei 25 anos. E depois trabalhei na Rádio Educadora. E desde 1999 eu trabalho também na Rádio Educativa.

João de Oliveira, você é um operador, um sonoplasta, que qualquer locutor sente muita segurança para trabalhar com você, qual é o segredo?

Os bons técnicos que eu conheci foram aqueles que nunca tiveram a ambição de ser locutor. É muito comum o técnico usar a mesa como um trampolim para a locução.

Uma grande parte do sucesso de um programa de rádio está na qualidade e profissionalismo do técnico?

Acredito que depende de ambos: operador e locutor, ambos tem que falarem a mesma linguagem. Um tem que olhar para o outro e conhecer. Trabalhando juntos se entendem pelo olhar.

O técnico sabe quando o locutor terá sucesso ou não?

Sabe! Alguns têm muita vontade, mas não tem futuro.

Com sua experiência, quais qualidades você acredita ser importante para um locutor ter sucesso?

A humildade é indispensável. Ler muito. Estar muito bem informado sempre. Isso dará um campo enorme para ele trabalhar. Fazer o rádio para os ouvintes e não para ele. A meu ver esse é o pecado maior do radialista, querer fazer o programa para ele. Quem tem que achar que o programa está bom é o ouvinte. O operador é a mesma coisa, não vou deixar de colocar uma música porque não gosto, não estou fazendo o programa para mim.

Houve uma grande evolução na parte técnica, no momento você está administrando quatro monitores, além de todo complexo de chaves e botões, isso requer uma qualificação muito especializada?

No inicio o técnico aprende o principal. A medida que vai evoluindo ganhará mais segurança para ir desenvolvendo seu aprendizado. Não dá para queimar etapas!

Você é o braço direito e esquerdo de uma figura muito importante do rádio piracicabano: Titio Luiz.  Como é trabalhar com um mito?

Damo-nos muito bem Com Titio Luiz trabalho já há 15 anos, temos uma excelente relação, ao entrarmos no estúdio já o fazemos de forma muito alegre, brincamos muito um com o outro, para descontrair um pouco. São três horas de programa ao vivo., diariamente. Titio Luiz não tem nada redigido, é tudo de improviso. É uma característica que poucos têm. Sempre dizemos que o locutor de AM é capaz de fazer o FM. O locutor de FM não faz o AM. Não é culpa dele, é o sistema em que ele trabalha.

Essa mudança que está havendo de tudo passar para FM, você acha que é bom para o rádio?

O radio em AM irá ganhar em qualidade. Poderá perder em alcance, se for ver que a internet permite com que seja sintonizada no mundo todo, então não perderá seu alcance. No receptor comum irá diminuir seu alcance. Creio que será mantida a rádio em AM. São dois segmentos diferentes com a mesma qualidade.

Você chegou a trabalhar com Nadir Roberto?

Trabalhei! Era fantástico! Era um grande companheiro, um grande vendedor, excelente profissional, eu trabalhei bastante tempo com Nadir. Tenho muita saudade dele. Com Marcio Terra trabalhei bastante tempo fazendo esporte, no olhar um para o outro eu já sabia o que ele queria. Ele também já sabia o que eu estava fazendo. Fiz esporte com Mario Luiz também. É mais agitado. É um ótimo narrador, ele fica preocupado às vezes com a transmissão. Quem está em casa não tem a menor idéia dos problemas que enfrentamos com linha de som. Temos que ir bem cedo para o estádio para deixar tudo em ordem. Com o Mário Luiz eu sempre consegui fazer uma excelente transmissão. Deixava tudo pronto, testadinho, dizia: “_Mário, pode vir !”.

João em sua trajetória, já aconteceu de estar o microfone aberto e a pessoa falar aquilo que não deseja que o ouvinte escute?

Isso acontece sempre! Para nossa sorte e também pelo próprio ambiente, o que vai para o ar geralmente é conversa sem nenhuma importância ou que cause impacto ao ouvinte.

Por muito tempo trabalhei com o Rubens Lemaire de Morais que cobria a polícia. Ele transmitia do carro, naquele tempo tinha muito ruído, dependendo do lugar não funcionava. Trabalhei com Roberto Cabrini, na rádio “A Voz Agrícola de Piracicaba” no tempo em que o Caldeira comandava a rádio. O Cabrini dizia: “- João eu vou para casa agora, qualquer noticia que chegue, seja a hora que for eu venho para a rádio.” Cabrini sempre teve o jornalismo no sangue. Era magrinho e alto. O Francisco Silva Caldeira trabalhou muito tempo como gerente da Rádio Difusora, foi trabalhar como diretor comercial da rádio “A Voz Agrícola”, era uma rádio bem mais simples e tinha certa dificuldade para vender publicidade. Situava-se na Rua Moraes Barros, 1191. O telefone da rádio era 27491. Era 590 Khertz, uma freqüência fantástica. Não sofria pressão de nenhuma outra rádio de São Paulo, ela pegava com 250 watts onde outra rádio precisava de 500 ou 1.000 para ir ao ar. Quem trouxe a radio para o meio do dial foi o Caldeira.

Isso foi em um tempo em que a audiência do rádio era muito grande?

Sem dúvida! Mesmo porque a transmissão da televisão era um desastre! Imagem ruim, em preto e branco. Saía fora do ar.

A internet ajudou ou atrapalhou o rádio?

Acho que ajudou. Se souber usar é uma das melhores ferramentas disponíveis. Para você fazer um programa de duas horas de jornalismo, é só selecionar o material que está a sua disposição. Coloca em uma pasta só para você, na hora em que abrir o programa é só abrir a pasta. Você não tem a menor dificuldade do mundo.

João você é casado?

Sou casado desde 1973 com Maria de Fátima Teles de Oliveira, nos casamos na igreja velha de São Judas Tadeu. Quando me casei o piso da igreja era terra. Eles estavam construindo a igreja nova por fora. A igreja velha estava dentro. O vestido de noiva da minha mulher ficou uma beleza! O véu arrastando na terra vermelha! Temos um sobrinho que é praticamente nosso filho, Rodrigo Teles, trabalha em rádio também.

Você tem algum hobby?

Gosto de futebol, sou corintiano, joguei futebol por alguns tempos, a turma do Rancho Alegre me conhecia pelo apelido, acho que poucas pessoas que moraram lá me conhece pelo nome.

Qual era o seu apelido, João?

Ratinho! Naquela época eu era pequeno. Desenvolvi-me bastante depois de fazer o Tiro de Guerra, que na época já estava na Avenida Dr. Paulo de Moraes. Eu era da turma do Sargento Guatura. Era muito enérgico, mas estava sempre de bom humor. Eu fazia o Tiro de Guerra das cinco às sete horas da manhã.

Você conheceu inúmeras personalidades trabalhando em rádio?

Principalmente cantores. O cantor Daniel, o próprio Nelson Gonçalves, Perla, Altemar Dutra, Nelson Ned, Cezar e Paulinho, João Mineiro e Marciano, Moacyr Franco, Milionário, Teodoro e Sampaio. Os principais nomes passaram pelo rádio. Além do talento esse pessoal lutou muito para vencer. Conheci a maioria dos políticos de renome que vieram a Piracicaba.

Pode-se dizer que hoje o sonoplasta recebe a programação praticamente pronta, com isso seu poder de decisão fica bem limitado?

Antes ficávamos bem mais a vontade.

João se você não trabalhasse em rádio em qual outra área você gostaria de trabalhar?

Bom, eu só fiz isso! Rádio para mim está no sangue! Mas antes de fazer rádio eu pensava em ser engenheiro. Sempre tive muita facilidade com ciências exatas. 

Atualmente você é o técnico de som, ou sonoplasta, com mais tempo de trabalho e que continua trabalhando?


Acho que sou! No dia 4 de abril vou completar 51 anos de trabalho em técnica de som. 

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