sábado, maio 07, 2016

FILOMENA NASCIMENTO MATTOS



PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 07 de maio de 2016.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
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ENTREVISTADA: FILOMENA NASCIMENTO MATTOS



Filomena Nascimento Mattos está com 89 anos, com muita disposição física e mental, lembra-se de fatos que vivenciou. Com seu marido formaram um casal arrojado que em férias percorreram longas distâncias, aventurando-se até o Uruguai e Argentina, dirigindo um Fusca ou uma Kombi. Assim conheceram novas culturas, pessoas e lugares. Esportista, Filomena praticava natação, ciclismo. Acumulou junto com seu marido uma coleção de troféus e medalhas. Seus pais eram de Capão Bonito.

FILOMENA NASCIMENTO MATTOS


Qual era o nome do seu marido?
Pedro Máximo de Mattos, nós tivemos três filhos: Valdir, José Carlos e Jayme.
A senhora pintou belos quadros, como se desenvolveu essa sua veia artística?
No principio eu pintava panos de enxugar pratos. Surgiu uma vontade muito grande pintar um quadro. Passei a freqüentar aulas em um ateliê que funcionava junto a uma loja de artigos para pintura.
Quantos quadros a senhora chegou a pintar?
Foram uns treze quadros. Gosto muito de pintar flores, pássaros, borboletas.
O que a senhora sente quando está pintando um quadro?
Sinto-me feliz! E quando vejo o quadro pronto sinto-me muito feliz!
Em média quanto tempo a senhora gasta para pintar um quadro?
Demoro mais de um mês, é um processo muito lento, minucioso. Geralmente faço pintura a óleo.
                                            FILOMENA E UM DOS SEUS QUADROS


A senhora gosta de música?                                 
Meu marido era musicista. Ele tocava flauta, bandolim, violino. Ele tocava na orquestra regida pelo Maestro Mahle.
O seu marido fazia serenata para a senhora?
Fazia! Aqui no Lar dos Velhinhos o pessoal pedia para que ele fizesse serenatas.
A senhora tem alguma música pela qual tem preferência?
Sendo música de boa qualidade eu gosto de todas as músicas. Prefiro as músicas suaves. Das músicas do passado eu gostava muito as interpretadas pelo cantor Vicente Celestino (Antônio Vicente Filipe Celestino), sendo que a música “O Ébrio” é uma das minhas preferidas, foi um enorme sucesso na época, segunda metade da década de 40.




                                           VICENTE CELESTINO "O ÉBRIO"


                                       Carlos Galhardo - Fascinação ( Fascination - 1957 ) 







                   Francisco Alves - O dia que me queiras (El día que me quieras - 1945) 


 Gostava muito de Carlos Galhardo ( Catello Carlos Guagliardi ), Francisco Alves (Francisco de Morais Alves). Eu era fã deles. Eu cantava no Coral do Maestro Ernst Mahle e da Igreja Metodista.
Como se deu o encontro da senhora com o seu futuro marido?
O pai dele conhecia a nossa família e deu o endereço do meu pai para procurá-lo. Ele ficou alguns tempos no hotel. Após uns três meses na cidade de Itapetininga ele me viu e simpatizou-se comigo. Ele via que eu estava lendo romances, sempre levava um romance para que eu lesse. Cada vez que ele vinha trazia um romance.
Vocês começaram a namorar?
Eu não percebi que ele estava me namorando. Passaram alguns anos ele estava no Exército. Quando ele foi dar baixa procurou o meu pai e disse: “-Agora vou dar baixa e vou ter que procurar serviço! Ou então vou fazer carreira no Exército!”. Infelizmente como soldado naquela época não era tido como um bom partido, meu pai disse que se ele quisesse me namorar não poderia continuar no Exército. Meu pai arrumou um emprego para ele na Estrada de Ferro Sorocabana. 



Meu então namorado era muito criativo, ele fez um simulacro de um telegrafo e passou a treinar o código Morse. Ele fez os testes, entrou em primeiro lugar como telegrafista na Estrada de Ferro Sorocabana. Foi trabalhar em Santos, que era o único lugar onde tinha vaga. Ele sempre mandava telegrama para mim. Eu não mandava nada para ele. Meu pai não admitia que tivéssemos muito entrosamento. No fim ele fez carreira na Sorocabana onde permaneceu por 40 anos.
Vocês casaram-se em qual cidade?
No civil casamos em Itapetininga e no religioso casamos em Botucatu. Moramos em Botucatu uns quatro meses, meu marido foi removido para Itapetininga. Lá ele fez o curso ginasial, colegial. Prestou concurso para trabalhar no escritório da Estrada de Ferro Sorocabana. Entrou como telegrafista, trabalhou uns anos em Itapetininga e daí foi removido para São Paulo, lá cursou a faculdade e prestou concurso para administração. Ele aposentou-se como Oficial Administrativo. A Sorocabana era uma família. O termo portador era utilizado para denominar quem fazia a faxina.

A senhora morava em que local de São Paulo?
Morei em Barueri. Meu marido trabalhava na Estação Julio Prestes, hoje Sala São Paulo.


                 Estação Julio Prestes antiga Estrada de Ferro Sorocabana Ponto Turistico


INTERIOR DA ESTAÇÃO JULIO PRESTES


 Pegava o trem em Barueri e descia em São Paulo, era só subir a escada e ele já estava no seu local de trabalho. Nesse tempo eu já estava começando a costurar para alfaiate. De Barueri eu ia até o Brás, São Paulo era muito diferente, saíamos tranqüilos, eu ia ao Brás sozinha, era longe, eu ia de trem até a Estação Julio Prestes, lá pegava o ônibus e ia até o Brás. Pegava as calças, todas cortadinhas, trazia para minha casa, só costurava. Eram alfaiates finos, trabalhavam para artistas de rádio e televisão. Trabalhei uns dez anos com costura. Naquela época usava-se muito linho, tergal. Costurar linho é complicado, mas acaba aprendendo-se. Os alfinetes ajudam muito. Com isso fomos ajuntando dinheiro para adquirir uma casa, lá nós pagávamos aluguel. Com nossas economias adquirimos uma casa em Sorocaba. Meu marido estava para aposentar-se. Meus pais moravam em Sorocaba, eu tinha um circulo de amizades com pessoas da cidade.
De Sorocaba a senhora mudou-se para que cidade?
Eu vim para Piracicaba, residir no Lar dos Velhinhos. Vim para fazer uma visita a uma amiga, a Hermínia, que morava aqui, ela tinha uma filha que sofreu um acidente e ficou paraplégica, na época eu tinha muitas pessoas que eram conhecidas e moravam no Lar. A Hermínia pediu se eu não podia vir morar aqui e assim eu dava uma ajuda a ela. Meu marido e eu viemos. Naquela época o Lar dos Velhinhos era bem menor, passado um mês nós viemos. Eu tinha 50 anos, meu marido era mais velho, faz 49 anos que eu moro aqui no Lar dos Velhinhos de Piracicaba. Eu acredito que tem uma moradora mais antiga do que eu aqui no Lar, a Therezinha Monteiro. Com o dinheiro que ganhamos em Barueri adquirimos uma casa bem no centro da cidade de Sorocaba, só que fizeram um prédio em frente da casa, além de tirar a visão perdemos a liberdade de irmos para o quintal, vendemos a casa lá e construímos uma casa no Lar dos Velhinhos.
Após parar com a costura a senhora fez alguma outra coisa?
Trabalhei com artesanato, fiz chinelos de quarto, em Sorocaba trabalhei com arte culinária, fiz curso de comida natural, fiz na LBA- Legião Brasileira de Assistência que havia naquele tempo. A soja estava em voga, aprendi a fazer centenas de pratos tendo a soja como matéria prima. É um alimento que gosto muito. Aprendi a fazer leite de soja, carne, feijoada vegetariana, tofu, quibe, pastel. Eu ensinava em hospital, creche e igreja. Nós fazíamos os produtos, dávamos uma espécie de festinha e convidávamos as pessoas interessadas em aprender. Elas experimentavam os produtos, se gostassem faziam o curso para aprender a fazer. Foi um sucesso, eu era funcionária da LBA. Fiquei dez anos nessa atividade. Eu dava cursos desde Iperó até Itararé. Trabalhei muito com hospitais.















Hoje o leite de soja que é comercializado tem conservantes, isso altera o produto?
Isso adultera o produto. Após tirar o leite de soja, o bagaço nós aproveitamos para fazer outros alimentos como quibe, cocada, que por sinal fica muito gostosa. Primeiro colocamos de molho a soja, na véspera, no dia seguinte batemos no liquidificador, com um pano bem fininho vamos espremendo, hoje já até existe um espremedor especial. Sai o leite. O bagaço põe na panela com um pouco de leite de soja e vai engrossando, Poe um pouco de leite condensado. Fica uma delicia. Infelizmente temos muitas pessoas que são acomodadas, não querem ter o trabalho de fazer alguma coisa com as próprias mãos. Preferem ir a um supermercado onde todos os produtos têm conservantes adicionados. Eu evito consumir esses tipos de produtos.
Essa sua preferência por produtos naturais é responsável pelo fato da senhora com 89 anos estar com a saúde perfeita?
Graças a Deus! Sou muito metódica em todos os meus hábitos. Isso facilita a minha vida. Sempre gostei muito de bordar, depois que comecei a pintar dei preferência a pintura. Bordava tela. Aqui no Lar fiz muita coisa para exposição.
A senhora conhece a artista Denise Storer?
Conheço muito! Fiz uma excursão para Campos do Jordão com ela. Pintei flores, paisagens. Fiz umas oito exposições, ganhei certificados de Honra ao Mérito. É uma terapia. A amizade que fazemos é muito boa.
Quando a senhora e seu marido mudaram-se para Piracicaba o seu marido estava aposentado pela Estrada de Ferro Sorocabana.
Aqui no Lar dos Velhinhos ele fazia serenatas.
A senhora assiste noticias na televisão?
Com relação a televisão só assisto uma novela bíblica. Tem o canal da Igreja Adventista. Assisto mais noticiários, tenho acompanhado a situação política atual, o Brasil já passou por muitas situações. Quando eu era criança meus pais contavam que ocorreu uma revolução no Estado de São Paulo, a Revolta Paulista de 1924, também chamada de, "Revolução do Isidoro", Comandada pelo general reformado Isidoro Dias Lopes, a revolta ocupou a cidade por 23 dias.




 A cidade de São Paulo foi bombardeada por aviões do Governo Federal. Meus pais moravam em Itapetininga. Foi feio, não podíam sair ás ruas. Os aviões passavam a todo instante. Passei a ter um enorme medo de avião. Hoje não tenho mais. Tenho algumas poucas lembranças da Revolução Constitucionalista de 1932. Eu nasci em 1927. Na Segunda Guerra Mundial meu marido foi convocado para servir, ele deveria ir para a Itália. Pelo fato dele trabalhar como foguista na locomotiva, ele serviu transportando soldados para Santos, muitas vezes ficava dia e noite trabalhando. Nós éramos recém-casados. Graças a Deus ele não foi pelo fato de ser foguista, não podia deixar a locomotiva sem lenha.
Vocês tinham o espírito de aventura?
Qualquer feriado nós já saiamos, no caminho decidíamos para onde iríamos. Tivemos um Fusca, com esse carro fomos à Argentina, Paraguai, Uruguai, lembro-me de que a Argentina estava no período da Guerra das Malvinas, havia restrições para locomover-se pelo território argentino. Teve um período em que tivemos uma Kombi, se não achássemos hotel parávamos em algum posto policial ou pedágio, naquela época já existiam alguns não tantos como hoje. Armávamos uma barraca ou dormíamos dentro da Kombi. Com isso chegamos a conhecer até São Luiz, no Maranhão. Fomos de Fusca, levamos sete dias para chegarmos. Tinha estrada, mas não era asfaltada. O Fusca era verdinho bem clarinho e a Kombi era branca. Íamos só nós dois. Os filhos ficavam em casa. Nessa época eles já estavam estudando. Ficavam sozinhos, os dois, havia uma diferença de cinco anos entre a idade de um e de outro, eu ensinei-os a cozinhar eles se viravam. Quando telefonávamos avisando que íamos chegar eles preparavam até o almoço para nós. Naquela época o telefone era muito precário, não havia a facilidade de comunicação que temos hoje. Íamos muito para Caldas Novas para passar uns dias. Isso faz uns vinte anos. Às vezes levávamos alguém daqui junto, para conhecer. Chegamos a acampar por até três meses. Às vezes parávamos em uma estrada, meu marido tinha feito uma cozinha que levávamos dentro da Kombi, armávamos umas redes em árvores para descansar. A natureza era mais rica. Não tínhamos tantos recursos de tecnologia que hoje são considerados essenciais, muito do que se compra são bens supérfluos. Infelizmente as pessoas chegam a ficar enfurecidas se dissermos algo a respeito. Os jovens levam uma vida desregrada, freqüentam as “baladas”, muitas moças saem e voltam no dia seguinte algumas chegam para o almoço. Ninguém sabe onde elas estiveram. Para se viver bem temos que ter uma vida regrada. Sermos pacientes. Querer tudo na hora acaba com as pessoas.
A senhora pratica alguma atividade física?
Atualmente não. Mas já pratiquei muito, na ACM – Associação Cristã de Moços fiquei por dez anos, em Sorocaba. Também freqüentava o SESI. Com isso fiz diversas atividades físicas. Caminhadas a distância, natação, ciclismo. Aqui em Piracicaba meu marido e eu íamos cada um em uma bicicleta, da Rua do Porto até a ESALQ. Sempre ganhamos prêmios, ultimamente pela participação com a nossa idade. Nunca fiquei doente.
A senhora é religiosa?
Sou adventista. Tenho muita fé em Deus. Acredito nas promessas que Ele fez.
Essa volúpia que o ser humano tem por poder e por dinheiro é um desvio?
É desvio! O ser humano se apega mais ao dinheiro do que a Deus. Dinheiro é tudo para a pessoa. O poder também. O mundo está envolvido só por isso, não se lembra que teremos um fim e que não sabemos quando será.
Os adventistas têm um principio de alimentação e conduta bastante metódica?
Tornei-me adventista depois de me casar. Meu marido era adventista. Evitamos determinados tipos de alimentos, aos sábados procuramos visitar as pessoas enfermas. A regra da nossa vida é a Bíblia. Visitamos doentes, hospitais, não praticamos a violência, a inveja prejudica mais a pessoa que tem inveja do que aquela que é invejada. Ela cria um inferno para ela mesma. Ciúmes e inveja a Igreja procura consertar.  

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Isidoro Dias Lopes

O velho "cabo de guerra" é uma das personalidades nacionais mais importantes do século XX. Gaúcho de Dom Pedrito (RS) - 30/6/1865 - ingressou no Exército em 1883, na arma de Artilharia. Republicano, conspirou contra o Império. Em 1893, abandonou o Exército Brasileiro e se integrou às tropas guerrilheiras federalistas que lutavam contra a tirania de Floriano Peixoto. Preso, foi para o exílio, em Paris. Anistiado, voltou ao Brasil em 1896, sendo reintegrado ao Exército.
Em 1924, já general-de-brigada reformado, foi escolhido para chefiar a Segunda Revolta Tenentista, que teve a cidade de São Paulo como palco principal. Ao lado do major Miguel Costa, da Força Pública, e dos capitães do Exército Brasileiro, os irmãos Joaquim e Juarez Távora, comandou a revolta contra o governo de Artur Bernardes. Com o impiedoso bombardeio da cidade de São Paulo efetuado pelo governo federal, que pretendia desalojar os insurretos, e que provocou a morte de mais de 700 civis, o general retira sua tropa da Capital. Queria evitar um massacre ainda maior. Instalado em Foz do Iguaçu (PR), os revolucionários recebem, em abril de 1925, a adesão da coluna rebelde gaúcha, comandada pelo capitão Luis Carlos Prestes. Izidoro é promovido pelos seus pares a "Marechal da Revolução" e vai para a Argentina e Paraguai como a missão de comprar armas e divulgar a Revolução no exterior. A chefia da Divisão Revolucionária é entregue Miguel Costa, promovido a "general", tendo o "coronel" Prestes como chefe do Estado Maior. Em fevereiro de 1927, a 1ª Divisão Revolucionária (conhecida como Coluna Prestes), se interna na Bolívia após 2 anos de marchas e combates pelos sertões de treze estados brasileiros, encerrando suas atividades como tropa combatente. Contudo, seus oficiais continuam conspirando do exílio.
Em 3 de outubro de 1930, estoura Revolução Liberal, e os "tenentes" marcham ao lado de Getúlio Vargas, governador do Rio Grande do Sul e chefe do Movimento, depondo Washington Luiz da presidência República. Izidoro, promovido a general-de-divisão, está entre os revolucionários e assume do comando da Segunda Região Militar, com sede em São Paulo. Mas logo se desencanta com os rumos da Revolução de 30. Em 28/5/31 pede demissão do Comando da Região e do Exército, abrindo mão de todas as vantagem e gratificações que Getúlio lhe oferecera para permanecer o cargo, inclusive a patente de marechal. Ao deixar o Comando, disse que preferia viver da caridade pública do que trair sua consciência de revolucionário e democrata.  Ainda em 1931, ao lado de oficiais do Exército Brasileiro e da Força Pública, passa conspirar contra Vargas.

Em 9 de julho de 32, foi nomeado por lideranças civis e militares, chefe militar supremo do Movimento Constitucionalista, que acabara de irromper. Com a derrota dos paulistas, em 2 de outubro, foi para seu terceiro exílio, desta vez em Portugal, retornando, anistiado, em 1934. Em 1935, foi sondado pelos comunistas para participar do Movimento que acabou desaguando na chamada Intentona de 27 de novembro. Mas rejeitou o convite, alegando que tinha horror às ditaduras. Em 1937, foi um crítico feroz do Estado Novo, implantado em 10 de novembro daquele ano por Getúlio Vargas, que acabou se tornando o ditador absoluto do Brasil até o final de 1945. Izidoro Dias Lopes faleceu na cidade do Rio de Janeiro em 27 de maio de 1949, aos 84 anos. Em 1957, quando São Paulo comemorou os 25 anos da Revolução de 1932, seus restos mortais foram transladados para a capital paulista onde repousam hoje do Mausoléu do Ibirapuera


domingo, maio 01, 2016

QUIMIE KAMIYAMA

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 30 de abril de 2016.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/ 

ENTREVISTADA: QUIMIE KAMIYAMA



Quimie Kamiyama é metódica, determinada, esbanja simpatia. Quem a vê pela primeira vez imagina que se trata de uma pessoa com temperamento oriental, reservado. De fato é muito discreta. Mal se pode imaginar que ela integra um conjunto de musica popular brasileira, tocando seu inseparável pandeiro. Horas, isso mesmo, horas a fio ela acompanha as mais diversas musicas, sempre com o mesmo entusiasmo e alegria. Atleta, ela cuida de seu físico realizando longas corridas. Nascida no Noroeste do Estado de São Paulo, na cidade de Onda Verde,


                                               ONDA VERDE CIDADE DOS APELIDOS
Com dois anos de idade veio para São Paulo. Nascida a 1 de abril de 1951. Quimie é filha de Tojiro Kamaiyama e sua mãe Kiyo Kamaiyama que tiveram nove filhos: Koiti, Midori, Usio,Tokugi, Tetsuso, Naoki, Miriam, Quimie e Hissashi.
Quando a família mudou-se para São Paulo foi morar em que bairro?
Fomos morar na Rua Pitangueiras,323, apartamento 74.  próxima a Praça da Árvore. Nessa ocasião meu pai já estava aposentado, ele faleceu cedo, aos 67 anos. Isso foi por volta de 1975.
Como foi o meio de sobrevivência da família em São Paulo?
Dois dos meus irmãos abriram casas de móveis. O Naoki começou a estudar e formou-se em engenharia na Escola Politécnica. Eu também me formei em enfermagem.  O curso primário fiz no Grupo Escolar Professor Arthur Marret, ginásio e colegial fiz no Carlos de Campos. No Brás.
A senhora chegou a utilizar bonde como meio de locomoção?
Cheguei a utilizar o bonde como meio de transporte, subia a Rua São Caetano. Era na época do bonde aberto, depois é que veio o bonde fechado nas laterais, o “camarão”, assim denominado pela cor vermelha.
Após concluir o curso colegial a senhora foi estudar enfermagem em qual escola?
Fui estudar enfermagem na UNIFESP – Universidade Federal de São Paulo, entrei em 1972 e sai como enfermeira padrão em 1975.
A senhora foi trabalhar em qual hospital?
Eu gostava de trabalhar em hospitais públicos. Primeiro fiquei no Hospital São Paulo, por um ano. Depois fui para o Hospital das Clínicas onde permaneci por 13 anos, no setor de ortopedia. Na época em que eu estava pedindo demissão o governador era Paulo Maluf. Ele tinha congelado o salário de todos os “hagaceanos”, de todos que trabalhavam em hospitais estaduais.
O Hospital das Clínicas de São Paulo é um universo da medicina.
Na época o INCOR- Instituto do Coração estava ainda em construção. Depois que foi construído o Hospital do Câncer ficou maior ainda. Toda emergência de maior gravidade era direcionada ao Hospital das Clínicas. A atriz Elis Regina foi internada lá, não a vi, mas os colegas comentavam.
Como era a rotina da senhora no setor de ortopedia?
Eu circulava entre os setores: setor feminino, adulto, masculino, setor de paraplégicos. Circulava no PI que é a Paralisia Infantil. Quando eu estava no setor de Paralisia Infantil recebi a visita do Ayrton Senna, era uma pessoa bem simples, não falava nada, ficamos sabendo depois que ele trocou todos os aparelhos respiratórios das crianças do setor de Paralisia Infantil.

Esses pormenores nunca foram divulgados na mídia. Na Paralisia Infantil tinha alguns leitos reservados para casos especiais, como foi o caso do João Carlos de Oliveira, conhecido como João do Pulo, um atleta, especializado em saltos, sendo ex-recordista mundial do salto triplo,   Teve a carreira de atleta interrompida em 22 de dezembro de 1981, quando sofreu um grave acidente automobilístico na Via Anhanguera, no sentido Campinas-São Paulo. Após quase um ano de internação na UTI, sua perna direita teve de ser amputada.






  


A senhora chegou a ter contato com João do Pulo?
Às vezes tinha, ele era uma pessoa que não estava deprimido, o acidente tinha sido recente. Era uma pessoa maravilhosa.
Era muito comuns acidentes de trânsito?
Era. Mas não tanto como ocorre atualmente.
Qual é o requisito principal para um profissional trabalhar nessa área?
Além dos conhecimentos técnicos, tem que ter muita paciência, tolerância, carinho. Cada caso é um caso especial. Na época os pacientes eram mais tolerantes. Eu achava que eram menos revoltados. As pessoas eram diferentes naquela época, a educação era outra.
Nessa época a senhora morava em que bairro?
Em 1978 adquiri meu apartamento na Rua Artur Prado, paralela a Avenida Brigadeiro Luiz Antonio. É um ponto estratégico, vou para o Shopping Paulista a pé, vou até a Liberdade a pé, às vezes eu vou a pé para o centro. Vou até a Avenida Paulista em quinze minutos.
Em que ano a senhora saiu do Hospital das Clínicas?
Sai em 1988, eu disse à minha vizinha, que também era minha colega: “-Vou pedir demissão porque com esse ordenado prefiro ficar de braços cruzados”. Fui viajar para o Japão. Fiquei em Tokio, em Yamanashi, trabalhando na área hospitalar. Falo fluentemente o japonês, escrevo um pouco  e leio qualquer artigo.




Como a senhora conseguiu esse emprego no Japão?
Na época estavam começando a recrutarem pessoas para levar para o Japão, havia umas empresas que atuavam nessa área, ficavam lá no bairro da Liberdade. Eu me candidatei e fui. Tinha uma hospedaria certa e já tinha onde trabalhar. Já sai do Brasil com destino certo.
No Japão a senhora morou quanto tempo?
Foram uns cinco anos. Nesse tempo eu vim várias vezes para o Brasil.
Lá a senhora trabalhou na área de ortopedia?
Não. Lá eu trabalhei bastante com idosos, Trabalhei um pouquinho com ortopedia também.
Como é o idoso japonês?
É um pouquinho diferente dos nossos idosos. Dependendo do problema podem ser mais bravos. Às vezes a pessoa que sofre um AVC- Acidente Vascular Cerebral, a pessoa perde a paciência.
A senhora pode fazer um comparativo entre a medicina no Brasil e no Japão?
A medicina de uma forma geral não é diferente.
O tratamento com relação aos pacientes, lá são mais bem cuidados?
São! Recebem mais cuidados lá. São mais respeitados.
O idoso no Japão recebe um respeito maior do que o idoso no Brasil?
Qualquer idoso merece respeito. No Japão ele recebe muito mais respeito, não dá nem para comparar.
As doenças mais comuns com idosos no Japão são semelhantes às doenças com idosos no Brasil?
Tem Alzheimer, Parkinson, a seqüela de AVC é bastante comum.
O habito alimentar japonês difere muito do brasileiro?
Acho que o habito alimentar japonês é um pouquinho menos gorduroso, mais saudável. Os idosos têm atividades físicas conforme a capacidade e necessidade de cada um. Tanto dentro do hospital como fora, em passeios. Para mim foi uma experiência muito importante.




A senhora decidiu voltar ao Brasil por algum motivo em especial?
Eu não fui para ficar definitivamente lá. Voltei. Quando estava com quase 40 anos fui acometida de uma doença. Fui fazer tratamento lá, porque aqui não havia o tratamento que eu queria. Tratei-me, me curei totalmente. Depois voltei para o Brasil. É uma doença que não faço questão em evitar em falar, tive câncer de ovário. Permaneci em tratamento por quatro meses, no primeiro mês tive um tratamento convencional, tanto no Brasil como no Japão o médico tinha estimado que eu teria só mais três meses de vida. O hospital em eu estava no Japão trabalha em conjunto com a medicina americana. Resolvi parar com essa terapia convencional. Fui fazer um tratamento chamado imunoterapia. ( A finalidade da imunoterapia é incentivar o sistema imune do paciente a reconhecer o tumor e eliminá-lo). Eram duas vacinas diferentes que eu aplicava a cada cinco dias, subcutânea, quando recebi por seis meses essa vacina, eles me chamaram para fazer um check-up total e fazer uma auto vacina. Foi colhido material, com esse material foi feita vacina com dose para um ano. Isso foi em Tokio. Eles tem hospital, consultório e laboratório em três lugares diferentes de Tokio. Junto com as duas ampolas que eu tomava adicionei a auto vacina. Assim que comecei a tomar a auto vacina a recuperação foi surpreendente.
Isso foi há quantos anos?
Já faz quase 25 anos. Se eu não tivesse feito o tratamento lá eu não estaria conversando com você. Essa vacina quem está trabalhando é o filho do pioneiro, é a segunda geração do professor. O nome dela é Vacina Hassumi. Ele começou a pesquisa durante a Segunda Guerra Mundial, acredito que tenha sido até um pouco antes da Segunda Guerra. Se não me engano foi na década de 30, esta relatado em um livro escrito em japonês.
E quem pagava todas essas despesas?
Eu tinha algumas economias. Mas tenho dupla nacionalidade, sou cidadã brasileira e japonesa, tenho os dois passaportes. Nessa condição de cidadã japonesa obtive bons benefícios médicos. Primeiro você paga com seu dinheiro, quando o tratamento é de alto custo ai eles devolvem 70% do que você gastou. Eu recebi na hora.

                                                        MONTE FUJI - JAPÃO

Ou seja, o Estado cuida do cidadão?
Cuida! Há um grande respeito pela vida humana. Cada um respeita seu semelhante. É interessante, muitas vezes respeita mais o próximo que a si mesmo.
Os seus laços com o Brasil a trouxeram de volta?
Minha família toda está em São Paulo. Meus amigos. Minha profissão. Eu nasci, estudei e trabalhei aqui.
Após curar-se a senhora voltou a trabalhar?
Voltei a trabalhar no Hospital Santa Cruz, fui convidada a trabalhar lá. O Hospital Santa Cruz foi inaugurado em 1939, e sua história está intimamente ligada à da imigração japonesa. Trabalhei um ano. 



                                                      HOSPITAL SANTA CRUZ
Eu voltava ao Japão uma vez por ano. Após cinco anos parei de tomar a vacina.  Eu tinha feito um concurso para ingressar no Hospital do Servidor Publico Municipal, fui aprovada, quando voltei do Japão passei a trabalhar. Ali permaneci até me aposentar. Cinco anos antes de me aposentar me chamaram para trabalhar em uma pesquisa clinica, um serviço que eu nunca tinha feito. Em 2011, aos 60 anos, aposentei-me. Eu não via a hora de chegar aos 60 anos, minhas colegas achavam isso um absurdo! É que eu tenho algumas atividades a mais do que as minhas colegas. Leio em japonês, gosto de astronomia, história. Em 2008 eu resolvi voar de balão, eu gosto de umas aventurazinhas, não muito radicais. Marquei com uma colega de profissão, vim aqui em Piracicaba voar, decolando da ESALQ. Fiquei um dia hospedada no IBIS Hotel, perto do Shopping Piracicaba, voamos por uma hora e depois descemos em um campo onde tomamos um delicioso café da manha com champanhe. Nesse dia que fiquei sabendo do Lar dos Velhinhos. Resolvi marcar com o Serviço Social para conhecer o lugar, a Irmã Hilda nos acompanhou pessoas maravilhosas, fiquei encantada com o lugar e tudo. Em 2009 eu comprei o flat em que resido.
A senhora tem uma particularidade que são suas famosas caminhadas.
Na verdade eu pratico corridas já faz 19 anos. Em São Paulo eu corria no Parque Ibirapuera. Após tirar essa doença, achei que a corrida era a melhor opção para manter a minha saúde. Eu vou praticando e vou analisando. Não pratico corrida de curta distância onde tenho que desenvolver a velocidade. Corro lentamente, mas longa distância. No Parque Ibirapuera tem uma trilha de seis quilômetros, eu dava duas voltas, são doze quilômetros, demorava mais ou menos uma hora e meia. Hoje continuo correndo na ESALQ onde corro aproximadamente dez quilômetros. Por semana eu sinto que tenho que ir umas quatro vezes.



Existe outra particularidade da senhora que nos chama muito a atenção, a senhora é uma exímia pandeirista!A sua execução de pandeiro permanece por horas!
São duas horas. Quando cheguei aqui no Lar convidaram-me para ir a uma Feijoada do Gordo, fui, na ocasião o Laerte do Vinil colocava seu material de som e me orientou nas primeiras batidas de pandeiro. Eu gostei! Um dia o Seu Antonio me convidou para tocar na festa. Foi assim que comecei.









                                   
Qual é o sentimento que a senhora sente ao tocar esse instrumento?
É uma delicia ! Eu tento acompanhar!
Há um pouco de contradição em uma pessoa com forte formação oriental tocar um instrumento popular brasileiro?
Acho que a minha relação com o pandeiro foi de amor a primeira vista!
É uma atração inusitada, algo muito bonito, e não deixa de ser um exemplo de otimismo!Percebe-se que seus sentimentos estão nas pontas dos dedos ao tocar pandeiro de forma tão concentrada!
Nosso objetivo, do conjunto musical, é beneficiar as pessoas, levar alegria.
A senhora já saiu em algum desfile de carnaval?
Não! Acho que não tenho samba no pé! Mas se me mandarem tocar pandeiro eu toco sim!
A alimentação da senhora é normal?
Eu evito frituras. Tenho colesterol alto, é genético, mesmo sendo magra o índice de colesterol é acima do normal.
A senhora gosta de literatura, sua preferência é pela literatura brasileira ou japonesa?
Ultimamente estou lendo mais em japonês. Mas gosto de literatura ocidental também.
A senhora gosta de História, a seu ver é importante conhecer História.
Você conhecendo História pode prever muitas coisas do futuro. Com a História você pode aprender.
Quem quiser conhecer a sua arte em tocar pandeiro qual é o horário em que o conjunto se apresenta?
O Conjunto se apresenta todas as quintas feiras das duas horas até as quatro horas da tarde, no Lar dos Velhinhos.


ROBERTO RODRIGUES VIDAL

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado , 23  de abril de 2016.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/ 


ENTREVISTADO: ROBERTO RODRIGUES VIDAL




Roberto Rodrigues Vidal nasceu a 30 de dezembro de 1937, filho de Ramon Rodrigues Vidal Júnior e Teresa Correia Vidal, que tiveram ainda os filhos Ramon, Raquel e Renato.
Quando o senhor nasceu seus pais moravam onde?
Quando nasci meus pais moravam em Piracicaba na Rua Treze de Maio, junto ao Clube Treze de Maio, nessa época ele já era funcionário das empresas da família Morganti.
Qual era a profissão dele?
Ele era contador, trabalhava também como revisor e redator do Jornal de Piracicaba. Ele trabalhou junto com Leandro Guerrini.  Quando meu pai faleceu Leandro Guerrini escreveu um “Adeus” muito bonito, onde ele conta sobre a convivência dos dois na sala do jornal, onde faziam as revisões e ajudavam na confecção do Jornal de Piracicaba. Gerrini fala de um Adeus, da amizade que tinham e pede um “Até breve, até a próxima redação”.

LEANDRO GUERRINI

O seu pai estudou contabilidade em Piracicaba?
Ele estudou contabilidade após retornar da frente de batalha da Revolução de 1932.






Na realidade ele não era paulista, nem brasileiro, era argentino, de Rosário, Santa Fé. Por um acidente também, quando meus avôs paternos vieram de Sevilha, Espanha, permaneceram na Argentina por uns três ou quatro anos. Meu avô paterno era construtor, eu não cheguei a conhecê-lo.  De lá vieram para Piracicaba. O meu avô materno, Alvim Correia de Godoy é originário de Avaré, onde era administrador de fazenda, minha avó materna é Ida Rigolo Godoy, ela veio da Itália. Minha mãe nasceu em Avaré. De lá meu avô veio para Piracicaba para trabalhar na Estrada de Ferro Sorocabana, na linha que ia até São Pedro.
O seu pai trabalhava na Usina Monte Alegre e no Jornal de Piracicaba?
Durante o dia trabalhava na Usina Monte Alegre e a noite no Jornal de Piracicaba. Na Usina ele foi contador, administrador e depois passou a Superintendente Geral. Passamos a morar no bairro Monte Alegre, na segunda casa para quem vai sentido centro-bairro. Ali moramos uns 10 anos. 
Os seus primeiros estudos foram em que escola?
Foi no Grupo Escolar Marquês de Monte Alegre. 





Em 1825. Monte Alegre passou a ser propriedade do Dr.José da Costa Carvalho, futuro Barão, Visconde e Marquês de Monte Alegre. 

Em 1927, as Escolas reunidas foram transformadas em Grupo Escolar. Criando-se assim o Grupo Escolar Marquês de Monte Alegre, em 21 de Janeiro de 1927


No bairro Monte Alegre convivi dos quatro anos de idade até quando fui trabalhar um tempo em São Paulo já com uns 20 e poucos anos.
O senhor chegou a trabalhar na Usina Monte Alegre?
Trabalhei no escritório. Eu gostava mesmo era de nadar, pescar. Eu agradeço por ter vivido e sentido em minha pele essa vivência no bairro Monte Alegre. Foram tempos felicíssimos.
O senhor conheceu a família Morganti?
Principalmente! Conheci Pedro Fúlvio Morganti, ele era o sobrinho mais novo de Lino Morganti. Ele casou-se com uma moça do Paraná e veio morar na usina como diretor. Conheci a Marisa Morganti, era uma moça muito bonita. Ela vinha de São Paulo, principalmente nas férias de julho, ficavam hospedados na casa da fazenda. Essa casa existe até hoje, Nessa época eu já ia trabalhar no escritório. Conversei algumas vezes com a Marisa, com sua mãe Dona Bici. Eu não cheguei a conhecer, mas o meu pai falava muito do pai dela, Dr. Alcides Ayrosa, médico. Ele ficou algum tempo na direção da usina. Dona Bici, Marisa e Maria Cristina vinham para o centro de Piracicaba, lembro-me do automóvel que usavam, era um Oldsmobile 1950, era um carro com duas cores, uma parte era escura outra era clara. Quando era umas oito e meia, nove horas da noite elas vinha para a cidade. Foi assim que a Marisa conheceu seu futuro marido, o Quico, que andava sempre acompanhado do Orlando Coury, o China. A Maria Cristina namorava o China.
Quantos anos o senhor morou no Bairro Monte Alegre?
Na usina morei 33 anos. Antes de ir para essa casa do lado direito eu morei uns 15 anos na casa em frente ao bar.
Com que idade o senhor  voltou para São Paulo?
Acredito que com quase 30 anos. Continuava mantendo a residência aqui, vinha todo fim de semana para a casa onde meus pais moravam. Em São Paulo fui trabalhar na refinadora mesmo, no Açúcar Tupy. Pertencia a família Morganti, ficava na Rua 25 de Janeiro, próximo a Estação da Luz. Ali funcionava a refinaria de açúcar. O açúcar cristal ia daqui para lá, era refinado, ensacado e distribuído em São Paulo, nos bairros. Havia um 50 caminhões Chevrolet Brasil que faziam essa distribuição, recebiam o dinheiro e eu que conferia o dinheiro que o motorista trazia da rua. Isso foi entre 1950 a 1955. Eu morava em uma espécie de república, na Rua Aurora, 544. Trabalhei no Escritório Central da Usina Monte Alegre, em São Paulo, onde trabalhava a família Morganti, ficava na Rua Formosa, 367. Depois eu fiquei louco para voltar, meu pai, que era chefe do escritório, tinha adquirido um carro, o Morganti financiou para ele em São Paulo, um Studbacker 1950. Financiou dois veículos, um para o meu pai e outro para o Dr. Eno Mena Cardoso, que era engenheiro-agrônomo e passou a ser diretor geral naquela época.

Studbacker 1950.









Quanto tempo o senhor permaneceu em São Paulo?
Fiquei uns sete ou oito anos. Eu ia muito ao Restaurante Paladiun Ia muito tanbém no Taxi Dancing onde cantava Francisco Egídio. Era costume usar gravata. Havia sempre uma orquestra boa, você entrava e recebia um cartão. Se tirasse uma moça para dançar o cartão era picotado. Tinha bons aristas se apresentando, como Nelson Gonçalves. Começva as 10 horas da noite e ia até a cinco horas da manhã. Todos os dias, menos na segunda-feira. Era um salão enorme. Acabei saindo da Refinaria em São Paulo, fiquei aqui um tempo. Voltei para São Paulo, fui trabalhar na Pfizer Quimica – Área de Humanas. Tive aulas por tres meses com médicos. Tinhamos que levar ao médico a informação de qual era o sal (base) do remédio. Para que o médico recetasse e dai eu vendia nas farmácias. Permaneci um ano trabalhando nesse setor. Trabalhei em vários lugares.
O senhor tem filhos?
Tenho dois : Roberta e João Gabriel. Depois de me casar fiquei em Ribeirão Preto, onde permaneci por quatros anos trabalhando com a Pacaembu Auto Peças. Sempre tive carro bom: Galaxie, Maverick com oito cilindros. Trabalhei em Piracicaba para a Delta Retifica de Motores, era do Amadeu Castanho e seu sócio, um português.  Descobria clientes onde tinha motores para serem retificados e visitava-os regularmente. Várias vezes vim com quatro a cinco motores em cima da caminhonete, nem cabia direito. Por imposição da profissão acabei conhecendo peças. Quando fui trabalhar para a Pacaembu me aprofundei mais ainda no conhecimento de peças automotivas.
O senhor chegou a aposentar-se em que ano?
Aposentei-me ha oito anos.
O período que lhe traz mais saudades qual é?
Principalmente do tempo em que vivi no Bairro Monte Alegre ! Os Morganti sempre foram patrões maravilhosos. Cuidavam muito bem dos funcionários. Quando chegava no final de ano o Departamento de Pesoal fazia um levantamento dos funcionários, principalmente na época do Homero Paes Ataíde, se uma familia tinha duas meninas e um menino, recebia dois cartões cor de rosa, até “X” idade, e o menino um cartão azul, atraves desse cartão eram distribuidos para os meninos um caminhãozinho, bola e balas. Para as meninas, boneca, bola e balas. Todo ano era feito isso. A Dona Bici vinha muito de São Paulo trazendo muita coisa de lá também.
O senhor praticava algum esporte na Usina Monte Alegre?
Jogava basquete. Ajudei a fazer a quadra de basquete na Teixerada.
O que era Teixerada?
O Seu Teixeira tinha um rancho na beira do rio. Ele ia lá junto com alguns amigos. No fim os chefes da usina acabaram frequentando, o Seu Teixeira faleceu, ai fizeram uma quadra de boche, uma quadra de basquete, a qual eu ajudei a fazer, uma área de lazer com balanços. Diziam: “-Vai ter Teixerada hoje?” . Ai pegou. O lugar começou a se chamar Teixeirada.
O senhor vinha muito para a cidade?
A minha paixão era vir para a cidade. Vinha de onibus. Eu estudava em Piracicaba. Primeiro, em 1950, no Colégio Dom Bosco, depois no Instituto Educacional Piracicabano, a noite. Onibus saia da usina as seis horas, seis e meia ele parava aqui, eu descia e ia para a aula. As dez e meia da noite tomava o onibus para ir embora, o ponto era em frente a Estação da Estrada de Ferro Sorocabana.
Dizem que o carnaval no bairro Monte Alegre era muito animado.
Era bom, o povo esperava muito. As vezes não sabiam se era com conjunto ou com o Amazilio, sanfoneiro. Ele vinha de São Paulo, juntamente com o Walter que era guitarrista. Os dois casaram-se com moças do Monte Alegre, filhas do Castro. A instrução dele era limitada, o apelido dele era  “7000 Castro”  Isso porque ele assinava seu nome escrevendo o número “7” e em seguida tres “0”. Era assim que ele escrevia “João”. E Castro, pois seu nome era João Castro. Em contrapartida tinha uma dicção e uma oratória excelente.
E a Capela do Monte Alegre?
É uma igreja que tem uma história bonita. O Morganti trouxe Alfredo Volpi da Itália para pintar a igreja. Alfredo Volpi morou dois anos no Monte Alegre. Fiz a minha primeira comunhão nessa igreja. Todos os moradores do Bairro Monte Alegre iam a missa que era ali celebrada.
O Rio Piracicaba tinha muito peixe?
Lembro-me de que o Rio Piracicaba tinha muito peixe. Um dia eu e meu amigo Geraldo Ribeiro estávamos pescando na usina. Estavamos pescando mandi na Teixerada. O Geraldo estava com massa, eu com uma varinha de pescar lambari. Ele pegou um pelote de massa e colocou no anzol, íamos embora mesmo. O peixe pegou, embodocou a vara, arrebentou tudo. Ele disse: “Vamos lá em casa, vamos buscar a vara”. Morava a uns trezentos metros. Ele pegou a vara, um anzol grande, pegamos oito piracanjubas. Nunca mais vou esquecer daquilo. A sensação, a força, a pressão. Era algum cardume que estava ali. Mas tinha muito peixe, na parte de cima só não pegava jaú e pintado eles não conseguiam subir o rio naquele trecho. Dourado, piracanjuba existia muito, eles pulavam e subiam o rio.
No bairro Monte Alegre havia um armazém?
A direção do armazém era do Seu Gino Mateo Dinucci. Quem ia muito comprar lá em julho, era a Dona Bici e suas filhas. Vinha muito ali o linho 120, aquele que é 120 fios por centímetro quadrado. Ela comprava sedas importadas.
O senhor frequentava o centro de Piracicaba?
Eu ia muito ao Lider Bar, na época o proprietário era Sebastião Ortiz. Era onde o Jacob da Galeria dos Tecidos ia também. O japones era o Tanaka na Rua São José e o Gioconda de propriedade de Oscar Nishimura, ficava na Praça José Bonifácio. Lembro-me do Zé Pena, ele era piloto amador, chegou a passar com seu avião por debaixo da ponte de Artemis. Piracicaba tinha umas figuras tipicas. Uma delas era o “João Vinte Contos”, o nome real dele era João Vassão. Era o maior aprontão que já vi e segui de perto. Acompanhei algumas coisas dele. Inclusive  ali no Tuffi Elias, onde se reuniam os músicos para ensaiarem, lembro-me o dia em que ele foi até a padaria Vosso Pão e encomendou 200 coxinhas para que fossem entregues lá. E entregaram. O Elias ficou louco da vida. O João encomendou mas não pagou, como se fosse pedido do Tuffi. Mandou entregar no Tanaka 200 pães. Uma ocasião estávamos no rancho, a beira do Rio Piracicaba, ele pegou pimenta do reino branca, moída, desenrolou um pedaço do papel higiênico e colocou a pimenta sobre o mesmo, depois tornou a enrolar e a colocar no lugar correto do banheiro. Infelizmente um dos presentes, Chester McFadden tinha hemorroidas, e aleatoriamente foi o primeiro a utilizar-se do banheiro. O resultado é de se imaginar! O João Vinte Contos aprontou muito nesses encontros de amigos. Algumas brincadeiras mais pesadas. O Chester adorava-o, mas tinha pavor dele também. Uma ocasião no  Zimbaloo que era um boliche e transformou-se em boate, nessa noite eu estava presente junto com essa turma de amigos, era novidade em Piracicaba. O João Vinte Contos ia até o balcão buscar chope para o “Chestão”  só que colocava laxante no chope. Algum tempo depois o efeito começou, foi impossível o Chestão se controlar. O João levou-o para casa, em uma situação precária. No dia seguinte a esposa do Chestão telefonou para o João dizendo palavras pouco agradáveis, o estrago tinha sido enorme !
O senhor gosta de música?

Adoro música! Gosto muito das músicas Frank Sinatra. Posso citar algumas, embora goste de todas. I've Got You Under my Skin; Something Stupid ; Send in the Clowns: New York New York: Mac the Knife ; The Way You Look Tonight : Moon River : My Way : Summer Wind

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