domingo, agosto 13, 2017

NELSON CARRANO TORRES


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Terça Feira 01 de agosto de 2017.

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

http://blognassif.blogspot.com/


http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: NELSON CARRANO TORRES

 


Nelson Carrano Torres nasceu em Piracicaba a 6 de janeiro de 1943, filho do conceituado Dr. Alcides Di Paravicini Torres, engenheiro agrônomo, professor, pesquisador e Severina Carrano Torres (Nena) professora de formação, assim que casou-se deixou de lecionar. Nelson Carrano Torres é o diretor da Agência Torres Passagens e Turismo, mais conhecida como Agência Torres. Foi entre muitas atividades Secretário Municipal do Turismo de Piracicaba na gestão do prefeito Humberto de Campos. É vice-presidente da Associação dos Municípios de Interesse Cultural e Turístico de São Paulo (AMITUR). É o presidente fundador da Associação das Agências de Viagens Independentes do Interior do Estado de São Paulo (Aviesp).

O senhor morava dentro do campus da Esalq?

O meu pai foi catedrático de zootecnia, cientista, foi diretor da Esalq por três vezes, é do meu conhecimento que foi o única vez que a Esalq teve o mesmo diretor por três vezes. Naquela época a então Escola Agrícola, como era denominada, era afastada do mundo, fazia-se uma verdadeira viagem para chegar até lá. Tiveram seis filhos: Flávio, Flávia, Paulo, Nelson, Alcides e Guilherme. Meu pai foi assistente de Nikolay Atanasoff, deu aula na seção dele de zootecnia e foi continuador da sua obra. Com a saída do Dr. Atanasoff meu pai assumiu a cátedra. O Dr. Atanasoff praticamente foi o implantador da zootecnia na Esalq, ele chegou com conhecimentos que estava trazendo da Bulgária e da França. Meu pi foi fundador do Rotary Club de Piracicaba e o Atanasoff frequentou o Rotary daqui. Eu tenho parentes que foram cafeicultores no sul da Bahia, meu tio tataravo foi o Barão Di Paravicini, a origem Di Paravicini é suiça. Nessa última vez que fui àBahia estive na casa da Maria Machadão. Ali era o encontro dos latifundiários. Fui olhar ao lado da cabeceira dela, fizeram uma vitrine, lá dentro tinha um livro, era o livro do Nikolay Atanasoff !

Foi um privilégio muito grande morar na casa do diretor da Escola de Agronomia?

O meu pai concluiu a construção da casa do diretor da Esalq. Nós moramos em uma casa que foi construída na décima quarta cadeira de zootecnia, que o pessoal chama de aviário. Não existia essa parte da Esalq, ela foi adquirida pelo Governo do Estado, posteriormente a doação feita por Luiz de Queiroz, em 1939 acharam por bem desapropriar uma área, onde era a Vila Boyes, que ia até o Rio Piracicaba. Antes disso foi acertado com o meu pai para ele desbravar aquele mato, ali era mato fechado. Meu pai construiu uma casa para nós morarmos, casas para os funcionários do aviário, salas onde ele dava aulas, ele foi praticamente um desbravador daquela área. Isso foi no ano em que nasci. Mudamos para a residência recém construída em 1943 onde morei por 30 anos, até a aposentadoria de meu pai.

O meio de transporte para a “cidade” era o bonde?

Até as onze horas da noite era o bonde. Se perdesse o último bonde tinha que vir a pé. Quando era o horário de pico eles colocavam um segundo vagão ou reboque tracionado pelo bonde. Como era praticamente a única forma de transporte, o bonde professores, alunos.

O seu pai teve automóvel?

O meu pai tinha.  Na Escola de Agronomia tinha no máximo uns dez automóveis. Os dois primeiros anos eu estudei em uma escola rural que havia na Escola da Agronomia para os filhos dos moradores. Não havia separação entre as crianças, era uma família. Nessa época, meu pai tinha sob sua supervisão uns quarenta funcionários, a minha vida foi junto com os filhos deles. Para nós aquilo tudo foi um paraíso. Depois que saí da escolinha, comecei a estudar no Grupo Escolar Morais Barros e posteriormente no Colégio Piracicabano.

Da Escola Agrícola até o Grupo Escolar Moraes Barros qual era a condução que o senhor utilizava?

Eu ia de charrete. Com essa idade não era possível ir sozinho, ia com o charreteiro, ele me trazia eu voltava de bonde. Eu pegava o bonde no ponto, atrás da catedral, atravessava o jardim, passava pelo então Teatro Santo Estevão. A seguir passei a estudar no Colégio Piracicabano. Ia de charrete, voltava de bonde, ou ia a cavalo.

O senhor ia estudar no Colégio Piracicabano, situado a Rua Boa Morte, em pleno centro de Piracicaba, montado em um cavalo?

Chegava ao colégio, amarrava o cavalo, ele ficava pastando, tinha bastante gramado atrás do colégio. Era uma égua mansinha, chamava-se “Cigana”. Não aborrecia ninguém. Para os meus passeios aos sábados e domingos eu usava o “Chavequiar”, era um garanhão árabe. Para vir com ele para a cidade tinha que dar umas quatro ou cinco voltas para ele acalmar um pouco.

Tinha outros alunos que iam a Colégio Piracicabano montados a cavalo?

Só eu que, ia cavalo!

Além de andar a cavalo o senhor praticava algum esporte?

Eu era remador. A primeira atividade empresarial que tive foi fabricar sandolin. Fiz uns 20 e poucos sandolin.

Era um pouco exótico um aluno ir assistir as aulas em pleno centro montado em um cavalo?

Era um pouco exótico, mas não muito. O Colégio Piracicabano nessa época tinha o internato masculino e feminino. Noventa por cento dos internos eram filhos de fazendeiros, oriundos do Mato Grosso, Paraná. Era a elite. Hoje estamos falando do agro-negócio, a elite naquela época era denominada de “fazendeiros”. Para eles um cavalo era uma figura comum. O resto da cidade também estava acostumado com a circulação de animais pela cidade, havia carrinhos de tração animal que entregavam pão, leite. Estamos nos referindo aos anos 50, havia bebedouros para cavalos em frente a Estação Sorocabana, Estação Paulista. Não era usual o aluno ir a cavalo para escola porque não tinham o animal e todos moravam na cidade, moravam perto do Colégio.

Lembro-me do Sebastião, do Seu Urias. O Sebastião além de bedel tomava conta do internato masculino, pessoa fantástica. Tive aulas com grandes mestres: Arquimedes Dutra, Demóstenes Correa.  Benedito de Andrade foi meu professor e amigo, ele dava aula para mim no colégio e depois na Brasserie. Um fato curioso é que Benedito de Andrade falava alguns idiomas e eu também então falavamos em algum idioma diferente só para convencer os freqüentadores da nossa mesa. A nossa mesa sempre foi a mesa 10. Na nossa mesa sentavam pessoas que falavam diversos idiomas, ou seja, mais de quatro idiomas, faziam parte dela o médico Galaor Araujo Filho, Dr. Jardim,  e outros, todos eles muito modestos. Tínhamos uma nobre e sábia figura que apreciava muito as empadas da Brasserie. Entrava apenas para comprar uma empada. O detalhe é que tinha que ser a empada que ele escolhia. Pela importância da pessoa e a situação inusitada, cada vez que ele entrava, como por milagre, fazia-se silêncio e todos convergiam os olhos para aquela importante figura e sua detalhada escolha. Era um espetáculo imperdível.  Os proprietários da Brasserie eram o Zica, João, Giba e Ineizinha.

Ao lado da Brasserie existia o Restaurante alvorada, de Oscar Nishimura, você chegou a conhecê-lo?

Ele morava no apartamento no andar de cima do meu apartamento. Freqüentei muito o Alvorada. Tinha uma pizza excelente. A Joana, sua filha foi minha colega de classe.

Na Rua do Rosário havia a entrada para um centro de esportes do Colégio Piracicabano, com quadra coberta, piscina.

A piscina era o Sebastião quem tomava conta. Era a única piscina da cidade. Nós que fomos alunos naquela época mantemos contato até hoje, às vezes nos reunimos 20 a 30 colegas em uma chácara.

O professor Gustavo Jacques Dias Alvim é dessa época?

O Gustavo foi meu professor, o pai dele era amigo do meu avô, Dr. Alcides Torres, ambos eram médicos. Dr. Alcides Torres foi clínico, professor da Faculdade de Farmácia que havia em Piracicaba. Foi professor na Faculdade de Medicina no Rio de Janeiro. A defesa de tese do meu avô era sobre ferimentos de projéteis (balas) na Guerra dos Canudos da qual ele participou. Ele era do corpo médico. Em 1932 meu avô foi para frente de batalha, Walter Accorsi foi ferido na coxa com um tiro de fuzil. O Dr. Walter Accorsi toda vez que me encontrava contava a história de que em outra ocasião o meu avô havia salvado a vida dele. 

Os seus estudos continuaram no Colégio Piracicabano?

Fiz o ginásio e o científico no Colégio Piracicabano, estudei alguns anos no Sud Mennucci. Meu pai não gostava muito que eu viesse de cavalo para a cidade, ele me ajudou a comprar uma motocicleta. Foi uma Excelior 98cc, comprada do Agenor Canobello em 27/12/1957 quando eu tinha 14 anos, custou Cr$ 11.500,00. Para essa cilindrada da motocicleta não era exigida a carteira de motociclista. Tinha em Piracicaba um pessoal aficionado por motocicleta, gostávamos da motocicleta pela sua mecânica, como máquina. Toda motocicleta que eu comprava eu a desmontava, depois montava novamente, eu gostava muito de mecânica. Participei de corridas de motos em Interlagos, Piracicaba, Londres. Fui proprietário de mais de 60 motos, adquiria, usava, vendia. Tive todos os modelos da BMW, sendo que a mais antiga foi uma de ano 1938. Depois 1948, 1951.Tive algumas Harley Davidson, quando falo que tive algumas, é que ia trocando, vendia uma e adquiria outra. Em função dos meus recursos, as primeiras eu adquiri em leilões da Polícia Rodoviária. Eram sucatas, reformava, fazia com que ela ficasse em bom estado. São máquinas boas, em média 400 quilos cada uma, a minha  segunda moto foi uma Zundapp – 1.939, 250cc comprada de Miguel Sanchez.. É uma máquina alemã, muito utilizada na Segunda Guerra Mundial. Tive várias Zundapp, uma delas era de 1.000 cilindradas, quatro cilindros. Por sinal era uma máquina que puxava um Sidecar para metralhadoras. O Sidecar eu deixei. Comprei só a moto, imaginei o que iria fazer com um trambolho daqueles. Se eu tivesse recursos teria segurado, Mas como estava querendo andar mesmo, o sidecar atrapalhava. Tive Maserati que na época era rara também.

Piracicaba tinha muitas motos?

Nós tínhamos um clube, inclusive fui eu que fundei.  Sou um dos fundadores do Piracicaba Moto Clube. Pircicaba foi a cidade do interior que teve o maior número de motos Indian.

Tem uma fotografia muito interessante do Anísio (do estacionamento de carros) em pé sobre uma motocicleta em movimento.

O Anísio é parceiro meu! A “nossa pista” era na Avenida Carlos Botelho, em chão batido de terra. Eu morava ali perto, na Escola Agrícola, e o Anísio morava no maio da Avenida Carlos Botelho, por coincidência em frente a casa do Mineiro (Nilson), que era o melhor mecânico de motos que havia no Estado.

Quantos associados faziam parte do Moto Clube de Piracicaba?

Tínhamos uns quarenta motociclistas.  Alguns dos que faziam parte eram o Pedro Santos que tinha uma Indian, O Loirão (Anísio) tinha uma Indian, tive Indian, Harley.

E a Jawa era uma moto que fazia sucesso?

A Jawa era uma das melhores motos, mas era uma moto muito civilizada, por sinal antes de eu ter a minha moto a minha irmã tinha uma moto Jawa 250 isso é uma raridade também, na cidade mulher não andava de moto, e a minha irmã Flávia foi uma das pioneiras. Eu tive diversas motos Jawa também: 250; 175; 350 eram feitas na Tchecoslováquia, era uma moto muito boa e não era cara.

Todas com tração com corrente?

Das que eu tive, a BMW e a Zundapp tinham tração com cardan. A Zundapp e a BMW eram de fabricação de 1938, já com cardan. Eram motocicletas que tinham alguns avanços que o restante do mundo foi conseguir quarenta anos depois.

Quais eram os locais para os quais vocês iam passear com as motos?

O nosso ponto de encontro era em frente da bomboniere do Seu Passarella. Fazíamos “ponto” também em frente ao INCO - Banco Indústria e Comércio de Santa Catarina, ao lado da Cafeteria Nova Aurora, parávamos um pouco adiante do Passarella, em frente a Escola Cristóvão Colombo, a Escola do Zanin. Atualmente ali é parte do estacionamento do Bradesco. Parávamos ali, 20, 30 motos.

Qual era a reação das demais pessoas com relação a tudo isso?

Como proporcionalmente a população o número de motocicletas era pequeno, de certa forma o motociclista era visto como um sujeito excentrico. Não era considerado como um veículo de transporte e sim como uma excentricidade.

Andavam com capacete ou sem capacete?

Não existia capacete, luvas, nem óculos.

E nas estradas de terra?

Ia no peito mesmo! Às vezes algum inseto atingia o olho, o mais comum era usar um óculos normal como proteção para os olhos. No nosso grupo havia dois ou três participantes que usavam capacete de couro que eram utilizados pelos pilotos de avião durante a Segunda Guerra Mundial, mas era mais para compor um visual do que para proteção. O Mineiro tinha um capacete de couro, assim como o Roni Leite do Canto, que era outro expert em mecânica, ele também dava assistencia técnica para o revendedor Lambretta de Piracicaba, que  era o Cadiolli, ficava na Rua XV de Novembro.  Naquele tempo quase ninguém usava capacete, as estradas em sua grande maioria era de terra, só a estrada que ia para São Paulo que tinha um pedacinho asfaltado,  a velocidade nossa em viagem não era excessiva, o pessoal gostava muito de Indian, Harley, BMW que eram motos estradeiras, pneu largo.

Qual era o horário mais comum para essas viagens?

Costumavamos viajar a noite, reuniamos ali em frente ao Zanin e inventava ali pelas tantas: “Vamos para Poços de Caldas?”. Íamos para Poços de Caldas, lá havia uma vida noturna muito animada. Ficávamos lá até de madrugada, chegava umas cinco, seis horas da manhã voltávamos. Daqui até Poços de Caldas eram cerca de 150 a 160 quilômetros. Iamos parando, se divertindo.

Duas coisas perigosas são a poeira e a chuva. A poeira pela derrapagem e a chuva pelo risco que oferece a lama.

Procurávamos viajar com tempo bom. Quando chovia, paciência! Os primeiros pingos só que são um pouco confusos. Depois se acostuma. Íamos muito para São Paulo, nosso destino era a Rua Augusta.

Um artista, apresentador, comediante, apaixonado por motocicleta, o Jô Soares, ele também era freqüentador da Rua Augusta com sua motocicleta.

Era meu companheiro de BMW! Andamos muito cada um com sua moto. Ele fazia ponto em frente ao Bolinha. Havia dois locais que freqüentávamos, o Bolinha, onde comíamos a famosa feijoada e outro era o Pandoro, onde tinha o tradicional Caju Amigo, uma bebida suave a base de caju.Nós começamos a freqüentar a Rua Augusta uns dez anos antes do Jô Soares aparecer por lá. Quando ele começou a freqüentar a Augusta ele tinha uma moto igual a minha, BMW R69S, essa moto foi lançada em 1974, freqüentávamos a Rua Augusta próximo a atual Avenida Faria Lima. Freqüentávamos a Rua Augusta inteira, tinha muitos restaurantes bons, o Gigetto, Babo Giovanni, casas de shows, em frente ao então Hotel Ca'd'Oro, que infelizmente encerrou suas atividades. Quando encerrou o ciclo da Rua Augusta começamos a frequentar a Nestor Pestana, onde tem o Teatro Cultura, o Kilt, este último encerrou também suas atividades recentemente.  

Você chegou a conhecer a famosa casa noturna “La Licorne”,frequentada por personalidades nacionais e internacionais como  o diplomata americano Henry Kissinger, figura proeminente na política externa dos Estados Unidos entre 1968 e 1976, Nat King Cole, Júlio Iglesias?

Eu morei quase em cima do La Licorne. Na época eu estudava no Mackenzie, morava na Rua Dr. Vila Nova, na frente do prédio onde eu morava era o La Licorne, e embaixo do prédio havia outra casa de shows. Era a época de ouro da Rua Major Sertório. Logo acima tinha o João Sebastião Bar que marcou uma época em São Paulo, era uma época romântica, elegante, ali tinha jazz, música clássica, a freqüência em ambos os locais era composta por um pessoal mais refinado, não era um local que a visão distorcida de alguns rotulou de forma grosseira. Poderíamos comparar sem sombra de duvidas o La Licorne com o Moulin Rouge de Paris do tempo de Toulouse-Lautrec, a frequência era de intelectuais, de pessoas com recursos proporcionais ao meio. A frequência feminina era elitizada. Nessa época quem gostasse da madrugada tinha que ir em um ambiente desses porque não tinha outro lugar para ir. Muita gente ia lá para tomar um drink, conversar, ver amigos. Música ao vivo, tudo da melhor qualidade. Era o lugar aonde tinha o champagne francês, assim como o vinho. Geralmente em outros locais a bebida era alterada. Lá tinha qualidade em tudo, segurança total. A Rua Major Sertório inteirinha era extremamente segura.

Nessa época um dos célebres boemios era Adoniran Barbosa, algum dia o encontrou?

O pessoal dessa faixa nós encontrávamos no Bar Brahma, na decantada esquina Avenida Ipiranga com Avenida São João. Ali sempre tinha e continua tendo, artistas famosos dando uma “canja”. Angela Maria, o saudoso Cauby Peixoto e tantos outros. É interessante que ali havia muitos artistas e muitos piracicabanos! Isso porque era próximo ao ponto de ônibus do Expresso Piracicabano. Na época não havia rodoviária em São Paulo. No lado oposto ao Bar Brahma havia a garagem de ônibus que o Expresso Piracicabano usava, o Zefir usava. No andar superior  da garagem de automóveis que iam para Santos, ficava o “Palácio de Cristal”. Isso é uma curiosidade, hoje ninguém pode imaginar ser possível ter existido um lugar aonde o cavalheiro ia, muito bem alinhado, e pagava para dançar por determinado tempo. Era o Taxi Dancing. Era um ambiente de máximo respeito.

Em que ano o senhor foi para São Paulo?

Eu me formei em Economia em 1968 no Mackenzie. O primeiro ano fiz em Piracicaba, na ECA- Faculdade de Economia, Contabilidade e Administração, nesse ano tive aula com o Professor Gustavo Jacques Dias Alvim. Quando estudei no Mackenzie eu ia para São Paulo de moto, saia de Piracicaba as seis horas chegava lá as sete e meia. A aula começava às oito horas. A estrada não tinha tanto movimento embora um pequeno trecho fosse sem asfalto. Às vezes ia de carro.

Qual foi o seu primeiro carro?

Foi um Simca – Fiat 8, - 1.100cc - 1.949 comprado em 20/11/1962 por R$300.000,00 de Waldemar Bordone. Comprei, desmontei, montei de novo. Na época do Mackenzie eu já tinha um carro que eu preparava para corrida eu usava para chegar mais depressa a aula. Ou a moto, BMW 750 uma R75.

Com as motos, os carros, velozes, o senhor era uma personalidade de destaque no Mackenzie?

Acho que era um dos mais pobres que estudavam lá. Talvez o mais sem juízo, em ir de moto de Piracicaba até lá. Destaque econômico eu nunca tive nenhum, nunca tive dinheiro. Talvez em função da moto o pessoal gostava. Ninguém tinha uma BMW 750! Naquela época as motos não tinham chegado para os boys.

Nelson, e as garotas admiravam a moto?

A maior vantagem da moto era essa!

Quando o senhor começou a trabalhar com turismo?

Por volta de 1964 a 1965. Comecei fazendo turismo sem ter agência própria. Tudo surgiu com a motocicleta. Quando tive possibilidade de ter uma moto mais potente passei a viajar pela America Latina, conheci Argentina, Uruguai, Paraguai, Chile, Bolívia, fiz umas duas viagens sozinho, outras com outro motociclista, me hospedava onde dava certo. O motociclista viaja com pouca roupa, mochila. Fiz umas viagens de carro também para alguns países onde não dava certo ir de moto. Conheci a América Latina inteira. Fui para alguns países da América Central que me interessavam. O Caribe eu conheci em uma segunda fase. Participei de uma excursão com destino ao Peru, México e Estados Unidos.  Quando chegamos lá, os organizadores da viagem, era uma viagem para estudantes, pediram-me, em função da minha facilidade com línguas, para que os ajudasse.

Como o senhor adquiriu essa facilidade com línguas?

O meu pai desde o grupo escolar já exigia que eu falasse em inglês com ele. Tive também a oportunidade de passar muito tempo com meus avôs e todos eles estudaram francês. A literatura deles era toda em francês, e me deram a literatura. Li bastante em francês. Minha família é italiana, tenho um primo na Itália, isso vai facilitando. Depois essas minhas viagens pela América Latina a gente vai aprendendo o espanhol. O importante é a base, eu tive quatro anos de latim. Como eu gostava do latim, tive facilidade com as demais línguas derivadas do latim. Tive aulas de espanhol com José Salles. Tive aulas de francês com dois excelentes professores: Dr. Josaphat de Araújo Lopes e Louis André Mená Neptine, eu gosto muito de francês, tinha a base de egramática, não foi difícil. Também gostava de inglês, meu pai me dava orientação. Me dei bem com outras linguas como o suaíli (suaíli ou suaíle também chamado de suahíli e conhecido pelas formas vernáculas Swahili ou Kiswahili) que é uma lingua falada em uma parte da África e como já fui bastante para lá, em Nairóbi, perto do Kilimanjaro deu para prticar.

A Itália tem muitos dialetos?

Têm! Só que estão sendo esquecidos, nas cidades grandes, não são usados, a Itália é uma autêntica colcha de retalhos, chegamos a ter 70 países na Itália (Principados, ducados) , cada um para não ser igual ao outro reforçava o seu dialeto. Na Itália tem a família Carrano que são parentes da minha mãe, são da região de Santa Maria de Castelabate fica no Parque Nacional de Cilento. Apesar de estar perto de Salermo, tem dialeto também. Cinco quilômetros adiante tem outro dialeto, e assim por diante. Isso porque os feudatários queriam ser diferenciados.

Por  muito tempo o senhor publicou na imprensa piracicabana muitas informações sobre turismo.

Por mais de 30 anos publicamos uma página semanal no Jornal de Piracicaba, em “O Diário” foram mais uns 10 anos. Sempre sobre turismo. Já faz tempo que escrevo em “A Tribuna Piracicabana”

A agência de viagens como surgiu?

Bom, voltamos da excursão que tinhamos mencionado anteriormente, e que me escolheram como lider do grupo, tradutor, interprete, enfim o responsável, Até que formalmente pediram-me para tomar conta desse grupo enqunto eles recepcionam novos grupos que estavam chegando. Eu fiz como base Nova Iorque e Flórida, tinha uma companhia aéraea que usávamos muito, a Braniff International Airways, saia daqui fazia escala em Lima, Panamá, México, San Antonio, Nova Iorque, Miami, São Paulo. Fiz umas quinze excursões dessas, ou indo junto ou esperando eles chegarem em San Antonio, pegava o grupo, naquela época acompanhavamos o grupo. Gostei da coisa, essas excursões pararam eu acabei ficando em uma agência de viagens em Nova Iorque, na 46 quase esquina com a 5º. Fiquei lá uma boa temporada, aprendi essa parte básica da agência, vendiamos passagens para os americanos que vinham para o Brasil e recebíamos os brasileiros que iam para lá. Após alguns meses acabei vindo para o Brasil, depois voltei e fiquei em Miami, aprendendo um pouco mais, conhecendo um pouco mais da região, naquela época ainda não tinha Disney World. O que nós tinhamos de atração era só Miami, Sea Florida, Everglades National Park, Key West.Chegando de lá, comecei a trabalhar, sozinho, em Piracicaba. Comecei a levar grupos daqui. Deu certo. Aluguei uma sala na Galeria Lucia Cristina, onde era a Loja Mantel, do Paulo Carbon. Em seguida o João Chiarini, que era dono de “O Pilão” saiu de lá, me ofereceu, fui para a loja dele. Na Mantel eu tinha uma funcionária só. No Pilão já tinha diversos funcionários. Depois do Pilão fomos para aquele prédio que era do Banco da Cooperativa dos Plantadores de Cana, atrás da catedral.

Foi a primeira agência de turismo de Piracicaba?

Foi a primeira e única por uns dez anos. Iniciamos em 1965. Era a única agência do Estado de São Paulo a Oeste de Campinas. Campinas tinha duas ou três agências. Graças a isso esta agência atendeu o Estado de São Paulo inteiro, inclusive Ribeirão Preto, até hoje tenho inúmeros clientes de Ribeirão Preto. São clientes desde aquela época. Atendemos o Sul do Mato Grosso, Sul de Minas Gerais, Norte do Paraná. Ontem recebi uma mensagem de um cliente de Minas Gerais que compra comigo ha mais de 50 anos, chama-se Luiz Custódio Cotta Martins. Eu vendia muito no passado para o pessoal do nordeste do Brasil, eram empresários ligados a cana-de-açúcar, lá não havia agência de viagens. Como sou um expert na área de eventos sucro-alcooleiro, eu levava e acompanhava o pessoal. Tem alguns líderes que já me contrataram para fazer eventos, para Maceió já levamos quase 5.000 pessoas em um evento. A Agência Tores foi a primeira agência de viagens a entrar oficialmente em Cuba, oficialmente quer dizer com autorização oficial, naquela época era proibido ir à Cuba. Levei uns 30 grupos para Cuba. Organizamos a parte receptiva em Cuba, do Brasil levamos 320 pessoas. Tivemos que fretar dois aviões para levar o pessoal.

Qual foi o impacto que os passageiros tiveram ao chegar a Cuba?

Foi muito interessante, muito forte e revelador. Passamos a admirar bastante o cubano. Como é que pode um país, uma pequena ilha daquela, fazer frente ao poderio militar da maior potência mundial,com um bloqueio total. Não se pode transportar um remédio. Isso foi tão bom para eles que passaram a produzir seus próprios remédios. Só da cana-de-açúcar eles conseguirarm criar mais de 200 sub-produtos ligados a saúde, hoje esses sub-produtos são de certa maneira infiltrados para as grandes empresas, o pessoal acaba usando a tecnologia cubana para uma série de enfermidades que nunca ninguém descobriu com toda a parafernália que eles tem, para se ter uma idéia os cubanos nem computador não tinham naquela época. Esse congresso que organizei lá, tive que usar os nossos computadores. Além dos computadores precários que eles tem, os hackers destruiram os computadores. Usei os meus computadores, dois computadores que levei. Quer dizer que se não fossem os nossos computadares teria sido um desstre total na organização. Forças ocultas destruiram os computadortes deles. Eu e uma funcionária que levei tocamos não só a parte do Brasil, como a parte do mundo inteiro que estava lá. Esse congresso é feito a cada três anos em um local sucro-alcooleiro de expressão no mundo.

O turismo que o senhor promove tem um foco comercial também?

É bastante grande na parte empresarial. Relativo a parte de cana-de-açucar temos clientes até hoje no nordeste.

Foi um nicho que foi descoberto ou criado?

É um nicho. Quando comecei com isso Piracicaba era muito mais forte do que é hoje em termos da indústria de base. Tudo que fazia no Brasil para o stor sucro-alcooleiro era feito pelas Industrias Dedini e nas empresas que orbitavam em torno da Dedini. A Torres era parte da estrutura ligada ao setor sucro-alcooleiro sendo que Piracicaba tem a Sociedade dos Técnicos Açucareiros do Brasil, que é sediada aqui, é uma entidade importante. Temos aqui o maior centro de pesquisa sobre cana-de-açúcar do mundo, que é a Esalq. Acabamos tendo uma forte ligação com esse pessoal. Por intermédio do meu pai, pelo fato de termos morado lá, a nossa ligação com a Esalq é muito forte. Assim como com o pessoal que estudou lá. Temos uma forte entrada também no setor de cafeicultura. Somos agentes oficiais também para os cafeicultores. Pessoal do Sul de Minas Gerais, Mococa, Espirito Santo. Que são os produtores de café fino. Normalmente eu organizo as excursões dos compradores que vem do restante do mundo do sudeste asiático, da Asia, da África, esse intercâmbio eu pratico bastante. Participo muito também do setor voltado ao controle da poluição tanto ambiental como das águas, temos trabalhado bastante em conjunto com essa área, que está sendo motivo de preocupação do mundo, é outro nicho do mercado nosso.

O turismo tradicional é também um foco da Torres?

Posso dizer que hoje o turismo empresarial e comercial representa cinquenta por cento da receita da minha empresa.

O Brasil está aprendendo a explorar o turismo?

Não! Não está! Estamos explorando o turista e não o turismo!  Não estamos absorvendo o que vemos lá fora. O grande entrave que nós temos são os governos, político “xix” que nomeia o sobrinho, com isso ficamos sem os grandes tomadores de decisões, sem os grandes líderes. Com isso nós ficamos praticamente sozinhos, é dificil empresas do porte da nossa tomarmos decisões de nivel mundial. Turismo receptivo, que é o que produz mais riquesa para o país, ele tem que ser apoiado pelo governo. Como é que vou sair daqui e fazer propaganda de Piracicaba na Noruega, na Nova Zelândia, ou nos Estados Unidos. Isso é parte do serviço que o governo deveria fazer. A mesma coisa eu digo do turismo municipal, é um absurdo que o turismo municipal não gasta um centavo para trazer turista para gastar em Piracicaba. E por que? Qual é o interesse nosso em trazer o turismo para cá? O gasto que ele tem aqui dentro só em níveis sociais é fantástico. O emprego no campo do turismo é a atividade mais democratica, mais niveladora que existe, se dermos mais empregos a esse pessoal que está aguardando o turista chegar quais serão os mais beneficiados? Um guardador de carro, um garçom, auxiliar de cozinha, que é o pessoal menos qualificado, que não tem colocação em indústria ou outros locais. Só que esse pessoal em Piracicaba fica marginalizado porque nós vamos ao Deus dará.

Piracicaba tem infra estrutura hoteleira para receber turistas?

Não! Acho que está faltando ainda.

Se o senhor quiser fazer um evento para 3.000 pessoas existe condições?

Tem! Sabe onde ponho esse pessoal? Àguas de São Pedro, Rio Claro. Quando tem grandes eventos aqui eu hospedo uma parte do pessoal. O demais vão para Rio Claro. Àguas de São Pedro, São Pedro. Os que querem um hotel um pouco melhor estou colocando em Campinas. As diretorias e o pessoal que quer ficar em um hotel bom coloco em Campinas.

O que falta à Piracicaba para mudar esse quadro?

Falta incentivo! O Poder Público tem que incentivar para que venham hotéis para cá. Quem faz um hotel aqui é uma briga de foice para conseguir uma liberação. Um apoio. A grande maioria desiste e vai escolher outro lugar. Existe centenas de municipios oferecendo, correndo atrás dos investidores. E nós fazemos o contrário! O Conselho tem que ser da área empresarial: hoteleiros, gente ligada ao setor.

O senhor que é um homem que conhece inúmeros lugares do planeta, pode afirmar que Piracicaba tem potencial para o turismo?

Posso afirmar que Piracicaba não só tem potencial turístico, como é a cidade que tem o maior potencial turístico do interior do Brasil. Tirando as praias, não existe nenhuma cidade que tenha o potencial que Piracicaba tem. As belezas que nós temos. Qual é a cidade que é atravessada por um rio, com um salto no meio da cidade, dentro de uma área de mata atlântica, preservada, isso no aspecto geográfico, Qual é a cidade que tem a Casa do Fundador? Uma cidade de 250 anos que tem uma casa do fundador, não existe. Há pessoas que dizem que ali não é a Casa do Fundador, Aqui se faz ao contrário.

Tivemos a casa do Barão de Serra Negra que foi demolida.

Quer um absurdo maior do que isso! Derrubam um palacete imperial para fazer estacionamento! Piracicicaba tem coisa fantásticas. Temos uma Esalq! Dá para ficar dois dias dentro da Esalq. Temos um aeroporto fantástico aqui, que é o Viracopos, está a 45 minutos de Piracicaba. É o melhor aeroporto da América Latina.

Atualmente a Agência Torres ocupa as antigas instalações do Clube de Regatas de Piracicaba.

Além do sentimento romantico e poético do local, uma das razões por que mudamos é  a facilidade do cliente estacionar em nosso estacionamento próprio. Antes eu estava ocupando as mansões do Dedini. Inclusive em uma das salas havia uma pintura muito detalhada das Industrias Dedini. Era um afresco, quem restaurou fui eu, paguei para o Galdi que é o melhor pintor muralista que nós temos. Depois que sai do prédio, foi alugado e no processo da reforma para a nova empresa pintaram uma obra de arte com tinta latex, escondendo-a.

 

MARIA GRAZIELA VICTORINO DE FRANÇA HELENE


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Jornalista e Radialista
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Sábado de 29 de julho de 2017

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
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ENTREVISTADA:


MARIA GRAZIELA VICTORINO DE FRANÇA HELENE

Maria Graziela Victorino de França Helene nasceu em Piracicaba a 16 de outubro de 1951, filha do Dr. Geraldo Victorino de França, professor da Esalq e da sua mãe a professora  Zilda Giordano Victorino de França que tiveram  ainda os filhos Ivana Maria França de Negri, Maria Fernanda França Cabrini e Geraldo Victorino de França Júnior, que é o Bebe Bicentenário pois nasceu em abril de 1967, ele tem até um “diplominha” referente ao fato, “Minha mãe guardava, não sei se ele ainda o conserva”, afirma Maria Graziela.

Em qual escola a senhora iniciou seus primeiros estudos?

Eu morava em Campinas, meu pai trabalhava naquela cidade, estudei até a quarta série no Colégio Imaculada Conceição. Da quinta série em diante estudei no Colégio Nossa Senhora da Assunção, já em Piracicaba, para onde mudamos em 1963. Ali fiz os meus estudos, até completar o curso como normalista. Em 1969 formei-me como professora.

Sua infância foi vivida em Campinas?

A minha infância foi vivida em Campinas, embora estivesse sempre em Piracicaba, a família da minha mãe são todos de Piracicaba. Eu freqüentava muito a casa dos meus avôs. Mantive o laço com Piracicaba, nasci aqui e vinha sempre para cá, tenho uma ligação muito forte com essa terra!

Após a conclusão do curso, tornando-se professora, qual foi a sua próxima etapa?

Fui estudar artes plásticas, estudei em Campinas, aqui em Piracicaba estudei no ateliê do Professor Hugo José Benedetti por um período de três a quatro anos. Fui aluna também do professor Angelino Stella, com quem tive aulas de desenho. O Professor Benedetti gostava muito de retratos. Eu fazia obras em telas, gostava muito de fazer retratos. O primeiro retrato que fiz foi um auto-retrato. Fiz o curso de Belas Artes na Escola de Desenho e Pintura em Campinas.






Em 1967, Piracicaba completava 200 anos de fundação, foi um ano marcante para Piracicaba, e a senhora protagonizou eventos importantes na época?

O Baile das Debutantes era um acontecimento especial, para as participantes assim como para a cidade. Era um evento comum nos maiores centros urbanos do Brasil, sempre tinha um convidado especial, geralmente um galã que estivesse em evidência, no nosso baile a personalidade convidada foi o ator Hélio Souto, Estava fazendo grande sucesso nas novelas da TV TUPI e era casado com uma das filhas da família Morganti de Piracicaba. O Baile das Debutantes em que participei foi em junho de 1967. O presidente do Clube Coronel Barbosa era o Dr. João Tacla, A jornalista Alik Kostakis foi quem apresentou as debutantes. Èramos de 20 a 30 debutantes.

Naquela época era um cerimonial quase obrigatório para as moças da alta sociedade participarem do Baile das Debutantes?

 Nós não iríamos freqüentar o clube a noite sem ser apresentadas à sociedade. Era o nosso primeiro baile! Nós, debutantes, ficamos muito ansiosas com relação a esse acontecimento. Era um momento mágico da vida da moça. A partir dessa apresentação poderíamos passar a freqüentar os bailes, sempre acompanhadas dos pais, todas éramos sempre acompanhadas pelos pais. Era uma época em que a família toda ia aos bailes. Os clubes eram freqüentados pelas famílias.

Infelizmente Piracicaba passou por um grande trauma quando desabou parte de um edifício em construção, o COMURBA ocorrido a 6 de novembro de 1964,quando se deu o fato em que local a senhora se encontrava?

Eu estava no Colégio Assunção, estudando. Essas coisas chegam rapidamente até o nosso conhecimento, as próprias freiras comentaram sobre o assunto. Havia entre nós uma grande preocupação com os parentes, nessa época nossa família morava na Rua Riachuelo. Foi um acontecimento muito forte, a cidade ficou de luto por muito tempo.

A seu ver, os festejos do Bi-Centenário de Piracicaba, foi uma grande virada de página na nossa história?

Com a queda do COMURBA a cidade praticamente parou. Não se construíam mais edifícios, as pessoas estavam temerosas. Aliado a isso havia um turismo negativo, muitas pessoas vinha visitar Piracicaba para ver o que tinha sobrado do edifício, as lajes ainda dependuradas, um espetáculo bizarro, vinham para fotografar o prédio destruído e o que havia restado. ( Por razões técnicas ou de outra natureza, a metade do prédio que restou,com enormes lajes pendentes, perdurou por anos incorporando-se ao cotidiano da cidade). Eu não me conformava com isso, pensava que com tanto lugar bonito na cidade iam tirar fotografias do palco de uma tragédia. Os festejos do Bi-Centenário foram intermináveis, não encerrou em 1967.




     Símbolo do Bi-Centenário de Piracicaba, o cata-vento na faixa foi idealizada pelo grande    mestre Arquimedes Dutra


Em sua juventude, qual era o lazer comum entre os jovens?

Havia, no nosso caso, muitas reuniões na Esalq, os professores e suas famílias reuniam-se em festas: juninas, de Natal, havia muitas festas. A Sra. Anneliese Brieger esposa do Professor Brieger era muito participativa, animava essas festas. Aprendi a tocar piano, na época toda menina tinha que aprender a tocar piano! Aprendi também a tocar acordeom e violão. Na época violão era considerado um instrumento mais utilizado pela boemia. Era tido como instrumento musical masculino, por isso era difícil as mulheres tocarem. Mas nós conseguimos! Gosto muito de música clássica internacional e brasileira, como Ernesto Nazareth, Zequinha de Abreu, Villa Lobos, Chiquinha Gonzaga. Gosto de boa música. Tive professores particulares e freqüentei também a Escola de Música de Piracicaba "Maestro Ernst Mahle. Mais tarde meus filhos também frequentaram essa escola.

Um fato marcante para a cidade e em especial para a senhora ocorreu em 1967?

Deu-se através da minha mãe. Após o Baile das Debutantes, o Dr. João Tacla abriu o concurso para Miss, isso foi no final de junho. Ele telefonou para a minha casa e falou com os meus pais se eu poderia ser a candidta do Clube Coronel Barbosa, cada clube da cidade tinha sua candidata, foram oito candidatas.  Eu tinha só 15 anos! Para mim foi uma honra muito grande. Meus pais concordaram. No inicio fiquei um pouco apreensiva, depois acabei gostando, o Professor Arquimedes Dutra, Dr. Nelson Meirelles, pessoas importantes da cidade, eram os jurados. Foi um período muito intenso, minha mãe tinha dado a luz recentemente ao meu irmão mais novo, minha tia Ermelinda Germano, cuidava do meu irmão, era madrinha dele. Tia  Rosina Antonia Jordão de Mattos (Toninha) ajudava,ela é mãe do Dr. Jairo Ribeiro de Mattos, do Paulo, João e Dalva, eles também frequentavam esses bailes, minha tia Vivica, se revezavam para me levar aos lugares, nunca ia sozinha, era menor, issso aos ensaios, ao encontro com o corpo de jurados. A minha roupa foi feita pela minha tia Antoninha. Ela fez o desenho, criou, e fez a roupa para o desfile de Miss. Fez uma capa bonita. Esse vestido que usei foi copiado depois, vi muitos semelhantes em diversos bailes em que eu ia.

A senhora aos 15 anos, em 1967 foi eleita Miss Bi-Centenário de Piracicaba?

Ao ser eleita assumi uma grande responsabilidade, tinha que representar a cidade em muitos eventos, o fotógrafo Cícero sempre estava documentadando esses eventos. Além dos meus pais, em todos os lugares ia uma comitiva comigo. Ia representar Piracicaba em cidades vizinhas, o prefeito na época era o Comendador Luciano Guidotti. Jornais de São Paulo e outras cidades noticiaram a minha eleição, bem cmo publicaram fotografias, realizaram matérias. A repercussão foi grande. Na época a mídia escrita e falada noticiava a vinda de autoridades até Piracicaba. “O Estádio Municipal foi utilizado para o pouso do helicóptero do Governador do Estado acompanhado de um ministro do Senegal e sua esposa, General Syzeno Sarmento comandante da Segunda Região Militar, um representante do Presidente da República Arthur da Costa e Silva e outras autoridades. A comitiva foi recebida pelo prefeito Luciano Guidotti, pelos deputados Athiê Jorge Coury, Pereira Lopes, Domingos Aldrovandi, Francisco Salgot Castillon seguindo diretamente para o palanque oficial armado na Praça da Catedral, onde se realizou o desfile militar, assistido por grande multidão. Bandeirolas do Brasil e do Estado de São Paulo eram agitadas pelos populares, que se acotelavam em todo o trajeto da parada. O grande cortejo contou com a participação de Tiros de Guerra da região, como o de Limeira, São Carlos, Americana, Rio Claro, elementos do 5º  GCAM, do 2º RO de Itú, as Bandas Marciais da Força Pública de Piracicaba e de Campins. Logo após o desfile o governador e sua comitiva rumaram para o Centro Cultural e Recreativo Cristovão Colombo onde cortou perante grande massa popular a fita inaugural da Exposição Filatélica e Numismática. O governador carimbou oficialmente o selo de Piracicaba sendo a exposição aberta a seguir à visitação pública. A mostra que ficará aberta até o próximo dia 8.” Essa notícia foi divulgada por um jornal local.
COMEMORAÇOES DO BI-CENTENÁRIO DE PIRACICABA EM 1967


CINQUENTA ANOS DEPOIS A MESMA FAIXA, CETRO E COROA DESCANSAM NO TRONO DA ETERNA RAINHA DO BI-CENTENÁRIO



Quem eram os jurados que julgaram as candidatas a Miss Bi-Centenário de Piracicaba?

Eram o Dr. Nelson Meirelles e esposa, Dr. Hugo de Almeida Leme e esposa, Dr. Francisco Antonio Coelho e Sra.,Professor Nélio Ferraz de Arruda e Sra. Capitão Antonio Bruno e Sra.

Em seu intimo havia a certeza de que sairia a vencedora?

Acredito que todas tinham como esperança ganhar em primeiro, segundo lugar. Fui confiante, queria representar bem o clube, como de fato consegui.

A emoção foi muito grande?

A emoção foi muito forte! Uma alegria muito grande, vendo toda aquela festa, todo aquele aparato, a coroa, é um sonho realizado! A coroa é de prata, foi feita especialmente para a Miss Bi-Centenário, o presidente dos festejos, Dr. Rubem mandou gravar uma placa e colocou na coroa com o meu nome. O cetro foi o grande artista Eugênio Nardin que fez. A faixa foi idealizada pelo grande mestre Arquimedes Dutra, uma das particularidades é que na faixa está o símbolo do Bi-Centenário de Piracicaba, o cata-vento. Arquimedes Dutra dizia que como o cata-vento está sempre em movimento, simboliza o movimento e o progresso da cidade. E de fato, de 1967 para frente, como houve muitas festividades, a cidade teve um progresso muito grande. Até então estava estagnada, a tragédia do COMURBA tinha abalado profundamente a população. Foi uma época muito triste. Ao que parece, o ano do Bi-Centenário resgatou o espírito progressista e positivo da cidade. Esse espírito nascido em 1967 continuou nos anos seguintes. A cidade passou a ter mais festas, a ser mais alegre, foi como correr atrás da alegria deixada esses anos todos que haviam passado. Aonde eu ia tinha alguém  me fotografando.
O dinamismo do prefeito Luciano Guidotti colaborou também?

Sem duvida! Ajudou muito! Era um prefeito muito amado pela população. Eu percebia, quando ele ia pelas ruas, o povo gostava muito dele.

Após ter sido eleita houve os festejos da coroação?

Após as atividades protocolares, houve o baile, um baile muito bonito, a primeira dança já como rainha foi com o meu pai. Depois eu dancei com o meu primo Jairo Ribeiro de Mattos.

Como foi retornar a vida normal de estudante sendo a Miss Bi-Centenário?

Minhas colegas me parabenizaram as freiras também gostaram muito, eu conversava muito com elas. Eu tinha uma cabeça muito boa. Continuei a minha vida normal.

Todo esse glamour se não for muito bem administrado pode interferir negativamente pela exposição da pessoa ao público?

Certamente! Houve uma grande exposição na mídia local e regional. Participei bastante de festas. Foi um período em que o carnaval de Piracicaba era tido como o melhor do interior paulista. O afluxo de artistas de renome era muito grande. Conheci vários artistas, como a Pepita Rodrigues, a diretora de cinema Aurora Duarte, irmã do Anselmo Duarte. Fui convidada a fazer cinema, eu disse que não era meu objetivo. Eu queria ser professora, fazer artes plásticas, queria estudar.




O encantamento das telas de cinema ou televisão não a atraiu?

Nem um pouco! Eu gostei mesmo é de ficar em Piracicaba, junto dos meus pais, da minha família. Não queria deixar a minha família de forma alguma e nem sair da minha rotina. Quando fiz 18 anos fui convidada para ser candidata a Miss São Paulo, eu também não quis.

O que o seu pai achou da sua recusa?

Meu pai ficou contente! Nem meu pai e nem a minha mãe queriam que eu fosse candidata.

 O excesso de exposição tem que ser administrado?

Com certeza! Quem está em uma situação dessas tem que estar permanentemente atenta, sempre fui uma pessoa centrada, soube impor respeito e também sempre tratei as pessoas muito bem, com muita educação.

O fato de ter sido eleita Miss Bi Centenário de Piracicaba não a deixou deslumbrada?

Foi muito bom, aproveitei todos os momentos, foi importante para mim. Eu gostei muito. Sempre junto com a minha família conheci outras pessoas, outras cidades, eu tinha essa estrutura, o apoio dos meus pais. Isso para mim era importante.

Com o passar do tempo o seu curso foi concluído e qual foi a próxima etapa?

Depois de concluir meu curso, comecei a expor. Ali que conheci o meu futuro marido. Eu estava expondo no Salão de Belas Artes, o professor Hugo Benedetti expôs um quadro onde eu tinha sido retratada, o meu futuro marido também gostou do quadro e depois me procurou.

Quantos quadros são da sua autoria?

Não saberia dar um número exato, mas já pintei bastante e fiz muitos desenhos, diga-se de passagem, que desenho até hoje. Desenhos com lápis, crayon, faço desenhos com mais rapidez. Faço algumas telas também, só que demoram um pouco mais.

Essas obras estão no mercado de arte?

Tenho alguns quadros no Museu Histórico e Pedagógico Prudente de Moraes, alguns quadros eu dei como presente à algumas pessoas, nunca comercializei a minha arte. Fazia também algumas esculturas, como a que tenho aqui denominada como “A Espera” em terracota. Tem como inspiração a minha irmã quando estava esperando o meu sobrinho, essa escultura ganhou a menção honrosa.

Como era o Professor Hugo Benedetti?

Um bom professor, nós saiamos, em várias alunas, para fazer pinturas ao ar livre. Fizemos muitas pinturas da Esalq. Era uma turma grande que pintava. Fazíamos as paisagens da cidade, era muito gostoso.

O seu marido conheceu a sua arte, e através da arte quis conhecê-la?

Ele me viu na exposição. Seu nome é Octavio Helene Júnior, na época ele era juiz substituto em Piracicaba. Nos casamos, ele fez carreira, passamos por diversas cidades do interior do estado, ele voltou a Piracicaba, foi diretor do fórum, depois foi para São Paulo, ficou no Tribunal, foi desembargador do órgão especial e aposentou-se quando completou a idade determinada.

Em que ano vocês se casaram?

Foi em 4 de janeiro de 1975, na Igreja Imaculada Conceição, em Piracicaba. Tivemos cinco filhos: Otávio, Ricardo, Graziela, Eduardo e George.

Como foi deixar Piracicaba, onde existe toda uma estrutura familiar e ir para São Paulo?

Antes passamos por diversas cidades, em São Paulo acabei me acostumando com a cidade e seu burburinho. A família do Otávio mora lá também. Nas cidades menores  a vida é mais restrita, eu pintava bastante nessa fase. Tive muitos filhos, cuidava deles. Não deixei a música, com isso minha vida sempre estava com alguma ocupação. Gosto muito de ler, textos, poesias, mas não escrevo, prefiro me expressar através da arte, das cores, das formas.

Qual é a sua visão de Piracicaba da época em que foi Miss, aos 15 anos, e a Piracicaba atual?

Falo que Piracicaba envelheceu também, mas cidade não envelhece, ela só progride, mas não perdeu o encanto. Piracicaba é uma cidade que todo mundo gosta. Quando vemos o Rio Piracicaba, nos emocionamos. (Nesse momento Da. Graziela deixa transparecer forte emoção, sinal do carinho que tem pela cidade). O Engenho é bonito!

A mãe da senhora teve uma influencia fundamental na formação da sólida estrutura familiar?

Teve! Ela era uma pessoa muito culta. Tinha uma visão ampla, dizia: “Tal escola não é suficiente, tem que aprender mais coisas !”. Ela encaminhou-nos para a música, para as artes, sempre comprava livros, desde pequena líamos Monteiro Lobato, todos os classicos infantis. Depois Shakespeare e todos os autores famosos estavamos lendo. Já falei muito bem o inglês e o francês, depois perdi um pouco o traquejo. Na minha época o francês era muito valorizado. Hoje falam muito espanhol. Havia escola de francês. A propria origem do Colégio Assunção tem influência francesa. As freiras nos deram uma boa educação, não era uma coisa tão rígida, mas elas ensinavam. Orientavam, ensinavam a dizer não quando algo não era bom. Trabalhavam com a formação de carater. Eu estudava de manhã e voltava a tarde pelo fato de ser normalista, ficava dois períodos no colégio. Voltava a tarde para fazer os meus estágios, eu gostava muito de criança. Tudo que fosse necessário relativo a desenhos eu fazia. Ajudava nas festas, fazia decoração. Venho de uma família muito religiosa, minha mãe, minha tia, eu, frequentávamos as missas na Catedral de Santo Antonio assim como na Igreja dos Frades.

E os bailes de carnaval de Piracicaba como eram?

Eram maravilhosos! Até 1967 eu ia nos bailes voltados ao publico infantil, eu não podia ir a noite. De 1967 em diante eu precisava da autorização do Juiz de Menores, mesmo assim ia com os pais. Até 18 nos tinha que ser acompanha por uma pessoa adulta. Compravamos aquelas mesas, ia a família inteira. Era muito bom, a confraternização entre primos, primas. Vinha muita peça de teatro, muitos artistas,  Johnny Mathis, Roberto Carlos, Wilson Simonal, Jair Rodrigues, os cantores da Jovem Guarda vinham para cá, lotavam o Teatro São José. Roberto Carlos vinha sempre a Piracicaba.

A senhora lembra-se das lojas do comércio piracicabano da época?

Havia a loja do Seu João Guidotti, era voltada a eletros-domésticos, O Cardinalli, A Casa Portuguesa que era uma loja finíssima. Em dezembro ganhei presentes de Natal da maioria das lojas, meus pais ficaram contentes e surpresos. Eu ia até as lojas, agradecia, tirava fotografias.

Piracicaba era quase uma grande família?

Era! Todos se conheciam, era interessante que os pais iam juntos com os filhos aos bailes, e às vezes os pais se divertiam mais do que os filhos! Meus pais dançavam mais do que eu nos bailes. Atualmente vivemos outros tempos. Um fato curioso, mas próprio da época, é que ficávamos sentadas junto aos pais e era o rapaz quem tirava a moça para dançar. Tinha algumas moças que tomavam o que chamávamos de “chá-de-cadeira”, ninguém tirava para dançar! Algumas vezes estava junto a mesa o presidente ou um diretor do clube, sentada a mesa eu já sabia que não iria dançar, geralmente o rapaz ficava intimidado. Eu então dançava com o meu pai, com o Jairo.

Existia a famosa “taboa”?

Existia também, que era quando a moça recusava-se a dançar com o rapaz que a convidava. Geralmente os rapazes eram muito educados, não havia desavenças maiores.

A senhora dirige veículos?

Dirijo normalmente. Meu primeiro carro foi um “Fusquinha” branco ano 1978! Foi meu marido que deu, tenho até hoje! Tenho o maior carinho por esse carro.

Como é seu olhar sobre a internet?

Uso com moderação, Não tenho facebook. A internet para mim é mais uma ferramenta para pesquisa. Tenho uma característica pessoal que cultivo desde muito jovem, procuro manter minha privacidade. Sempre fui assim. Isso eu aprendi com a minha mãe. As  mulheres da família da minha mãe sempre foram mulheres muito religiosas, fortes, altivas. Elas também se mantinham reservadas. Viviam a vida delas. Gosto de interagir com as pessoas, mas dentro de um limite! Que não seja invasivo.

A Miss Bi-Centenário gosta de cozinhar?

Adoro! Fiz muitos cursos de culinária.

Qual é o prato que os filhos pedem com muita vontade?

Geralmente eles gostam de tudo que eu faço, muitos assados, a famosa “macarronada da mama”, risotos.

A senhora chegou a andar de bonde?

Quando era pequena! Eu ia com meu tio Vicente, Tinha um bonde que saia do centro e ia até a Agronomia era um local onde eu adorava passear quando era pequena. O meu pai nos levava muito lá, só que ele nos levava de carro. Uma particularidade que ficou gravada, era a forma como o cobrador do bonde colocava as cédulas de dinheiro entre os dedos, elas era dobradas pelo meio e ficavam no vão de cada dedo cédulas de valor pré-determinado.  Eu ficava olhando, o cobrador andando de um lado para outro no estribo do bonde. Outra coisa que eu achava muito interessante eram os encostos dos bancos que giravam conforme o destino do bonde. Quando o bonde chegava ao seu destino final, como tinham duas frentes, bastava girar o encosto e os passageiros estavam olhando de frente para o trajeto. A meu ver o bonde deveria continuar  a existir, mesmo que fosse com a finalidade turística, com um trajeto apropriado.

Qual é a sua opinião sobre a juventude atual?

Acredito que a juventude atual não pode ser igual a que existiu anteriormente, ela está vivendo outro tempo, tem a internet, essa velocidade da informação. A dinâmica é maior. Só acho que deviam se preservar um pouco, zelar pela sua intimidade. As pessoas colocam no facebook coisas que ali não é lugar para ser colocado. Isso não é restrito a crianças ou adolescentes, adultos também agem dessa forma. Penso que temos que respeitar a nós mesmos, dar-se valor, para respeitar o outro também. Ai há uma troca.

O nome disso é caráter?

Sim! E tem que ser formado desde pequeno. Ter uma boa formação.

A seu ver, no momento em que estamos passando, os exemplos que vemos estampados em todas as mídias, não são edificantes?

É verdade! Mas nesse caso credito que cada um deve fazer a sua parte. Eu faço a minha parte, construo uma coisa boa para mim, para a minha família. A família é importante demais. A minha família foi muito importante na minha formação.

A senhora ouviu comentários sobre uma coisa, que já praticamente acabou, embora tenha provocado algumas tragédias em determinadas famílias, denominada “Baleia Azul”?

Já ouvi falar a respeito. É uma coisa absurda, não é só um problema físico, chega a ser um problema psíquico grave.

Esse “deixar-se influenciar” é um vácuo?

É um vácuo que existe, na falta de fé, há falta de oração nesse caso.

A senhora é religiosa?

Venho de uma família com base religiosa muito forte. A oração é muito importante, ela constrói o seu caráter. Você faz uma conexão com o divino que existe dentro de todo mundo. É só procurar! Minhas avós, tias, pais, sempre foram muito religiosas, além de ir a igreja tiveram sempre muita fé, então tudo que pediam conseguiam. Todos nós temos nossos momentos de dificuldades, tristeza, perda. Isso faz parte da vida. Procuro através da religião acreditar em coisas melhores, é um lenitivo, um conforto. Pode observar que as pessoas que não tem nada em que acreditar elas tem uma vida diferente. Até na saúde dessa pessoa. Afeta a saúde. A pessoa que medita, que ora, tem uma vida melhor. Não que ela terá uma longevidade maior, mas terá uma qualidade de vida melhor.

A tão em moda “depressão” existe se a pessoa se deixar abater?

Não deve deixar-se abater, temos que acreditarmos que estamos nesta vida por alguns anos, essa passagem é um aprendizado. Aprendemos coisas boas. Sofremos. Não existe nenhuma pessoa que não tenha sofrido na vida. Só que temos que tirar proveito de tudo que acontece na nossa vida. Temos que tirarmos uma lição. Quando fui Miss Bi-Centenário também tirei uma lição, de tudo que me foi oferecido só tirei as coisas boas. O que me ofereceram que achei que não era bom, eu descartei. Mesmo tendo muitos achando que seria uma vantagem para mim.

Naquela época era uma adolescente, já tinha esse discernimento?

Sim, com 15 anos já tinha essa consciência. Eu sabia que queria ter uma família, eu queria construir. A educação que recebi foi essencial. A rotina pode até ser entediante, mas é importante, se você não construir tijolo por tijolo, dia a dia, como irá construir um prédio? Temos que ser otimista, termos disciplina interior. É mais importante ser alguma coisa do que ter. Quando você tem, você perde, não terá aquilo para a vida toda. Quando você é , é para toda eternidade.

Cada povo tem sua forma própria de pensar, é a característica do povo. Japoneses, alemães, americanos, cada povo tem uma identidade, qual é a identidade do brasileiro?

Não tem! É um povo alegre, vive o dia. A pessoa tem que viver o presente, pensar no futuro, o passado é muito bom, recordar um pouco, mas a pessoa não pode viver do passado. Passado já passou. Não podemos desenterrar coisas ruins! Quando passou uma coisa ruim, você já enterrou, já cimentou, coloca um colorido ali, pronto, não desenterra mais. Aprende. Tirou alguma lição dali? Tirou algum proveito? Tirou! Então não desenterra! Quando podemos lembrar coisas boas é ótimo rememorar coisas boas. Mas não viver disso! Temos que viver o presente já com um olho no futuro! Quando encontramos uma dificuldade achamos ruim, mas na realidade ela serve para a pessoa crescer. Se conseguir superar você ganhou mais auto-estima, autoconfiança, para a próxima dificuldade. Aqui vamos subindo degraus. Cada degrau tem a sua dificuldade, a sua facilidade, tem tudo de bom, como tem as coisas que não são boas, mas você tem que resolver aquilo. Quem vai resolver o que está dentro de você? Você mesmo! Não tem uma pessoa de fora que irá resolver. Sabedoria é saber viver com as dificuldades, com as alegrias, tirar sempre uma coisa boa, uma lição. Um proveito de tudo que você viveu.

 

ADOLPHO CARLOS FRANÇOSO QUEIROZ



PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 22 de julho de 2017

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

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http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO:
 ADOLPHO CARLOS FRANÇOSO QUEIROZ


 

Adolpho Carlos Françoso Queiroz possui graduação em Comunicação Social Publicidade e Propaganda pela Universidade Metodista de Piracicaba (1980); mestrado em Comunicação pela Universidade de Brasília (1992) ; doutorado em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo (1998) e pós doutorado em Comunicação pela Universidade Federal Fluminense (2009). Atualmente é professor do curso de Publicidade e Propaganda da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Tem experiência na área de Comunicação, com ênfase em Publicidade e Propaganda, atuando principalmente nos seguintes temas: comunicação, marketing político, propaganda política, publicidade e propaganda . Ex- presidente da INTERCOM, Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, fez parte do Conselho Curador da entidade; um dos fundadores e atual Presidente de Honra da POLITICOM, Sociedade Brasileira dos Pesquisadores e Profissionais de Comunicação e Marketing Político; diretor administrativo e financeiro da ABP2, Associação Brasileira dos Pesquisadores de Publicidade e Propaganda; membro do Conselho Fiscal da SOCICOM, Federação das Associações Científicas de Comunicação do Brasil; sócio da ABCOP, Associação Brasileira dos Consultores Políticos e atual Presidente do Conselho Consultivo do Salão Internacional de Humor de Piracicaba. Adolpho Carlos Françoso Queiroz nasceu em Piracicaba a 18 de setembro de 1956 é filho de Adolpho Carlos de Souza Queiroz, funcionário público municipal e Maria Zélia Françoso Queiroz, funcionária pública municipal, atualmente aposentada que tiveram também a filha Lia Raquel Françoso Queiroz.

Seus primeiros estudos foram feitos em qual escola?

Fiz uma parte do primário no Instituto Sud Mennucci e outra parte no Grupo Escolar Barão do Rio Branco. No final dos anos 60, o Sud Mennucci teve um problema inusitado, um formigueiro de proporções gigantescas, colocou em risco uma parte da estrutura do prédio. Por precaução muitos dos alunos foram deslocados para o Grupo Escolar Barão do Rio Branco, até que o problema foi resolvido. Com isso terminei o curso primário no Barão do Rio Branco e o ginásio e colegial voltei a estudar no Sud Mennucci.

Nessa época você morava em que local da cidade?

Eu morava no Edifício Lúcia Cristina , na Rua XV de Novembro, em frente ao atual INSS. Logo na esquina havia o Supermercado Pão de Açúcar, atualmente Supermercado Jaú, no andar superior havia a Rádio A Voz Agrícola do Brasil. Essa esquina antes de ser supermercado foi a padaria do Seu Arthur Azevedo. O Lúcia Cristina é um dos edifícios pioneiros de Piracicaba. O meu pai trabalhava na prefeitura, que na época ficava no centro, mais precisamente no palacete que foi do Barão de Serra Negra, posteriormente demolido e hoje é utilizado como estacionamento da Câmara Municipal de Piracicaba, na esquina da Rua São José com Rua Alferes José Caetano. Depois construíram o prédio maior ao lado, e por um período foi alugada a casa da esquina com a Rua do Rosário com a Rua São José onde funcionou o gabinete do prefeito. A seguir o prefeito Adilson Benedito Maluf construiu o edifício onde atualmente funciona o Centro Cívico, nas proximidades da Rua do Porto.

O seu pai conheceu o prefeito Luciano Guidotti?

Ele trabalhou sob a liderança de Luciano Guidotti. Meu pai era fiscal de rendas da Prefeitura Municipal. Um fato marcante da minha infância é que no dia da sua nomeação ele me levou junto. Eu devia ter de quatro a cinco anos. Alguns anos depois eu estava junto as minhas primas que trabalhavam no Centro de Reabilitação, quando o prefeito Luciano Guidotti chegou. Se não me engano Dona Hilda Gobbo era uma das lideranças. Ela disse: Prefeito, estamos precisando de tais coisas, e foi relatando. Luciano Guidotti enfiou a mão no bolso, tirou um maço de dinheiro e disse: “-Veja o que dá para fazer!”. Dinheiro dele, pessoal, em espécie. Luciano Guidotti era muito desprendido. Criou-se certo folclore sobre a figura de Luciano Guidotti, mas era um grande empreendedor pelo que sabemos. Tenho uma lembrança muito positiva a respeito dele.

Como você ingressou no jornalismo?

Eu tinha uns quinze anos de idade quando meu pai faleceu. Minha mãe passou a trabalhar no IPASP, na prefeitura, eu tive meu primeiro emprego em “O Diário”. A minha mãe trabalhava no IPASP que nessa época localizava-se a Rua Prudente de Moraes, entre a Rua Tiradentes e a Rua Luiz de Queiroz, todos os dias ela passava em frente ao “O Diário”, nessa época situado no Edifício Terenzio Galesi, onde atualmente funciona um banco . Um dia minha mãe se encheu de coragem e entrou em “O Diário”, explicou a situação, que o meu pai havia falecido, embora eu fosse muito novo gostava muito de ler, escrever, eu era datilógrafo! O Cecílio Elias Neto disse para que fosse até lá. Com cinco minutos de conversa, ele disse-me que iria dar-me uma oportunidade como repórter. A partir de então me encantei com o campo de jornalismo. Lembro-me que fiz uma bela reportagem sobre o Museu Prudente de Moraes. Da. Helena Benetton era diretora do museu. Presidente da Associação dos Amigos do Museu. Quem fez as fotografias foi o Aldano Benetton, filho dela. O João Chiarini também me “adotou” na época, eu conversava muito com ele. Isso que está sendo feito hoje eu já fiz em 1970 em “O Diário”, dois ou três domingos, mostrando um pouco dos monumentos da cidade. Comecei a gostar do campo de humor gráfico, em 1973 fui por minha conta e risco cobrir a primeira instalação do Salão de Humor do Mackenzie. Pedi a máquina de fotografia ao Cecílio, fui de ônibus para lá. Publiquei. o Alceu Marozzi Righetto, o Roberto Antonio Cêra (Cerinha) viram, O Carlos (Carlinhos) Colonnese viu também a matéria. Acharam muito interessante,  e surgiu a idéia de fazer um salão de humor também em Piracicaba. Era a época do jornal “O Pasquim”, um período difícil da intervenção militar. “ O Pasquim” era uma leitura de muito impacto à minha geração que estava começando a gostar de política.

Nessa época “O Diário” criou uma página denominada “Recados”?   

Era comandada pelo Cerinha, como se fossem as notas do Pasquim. Pílulas de texto pequeno. Antes do Orkut, do Facebook, do WhatsApp, do Twitter de 140 caracteres,  “Recados” era uma forma de comunicação bem diversificada. Seguia um pouco a linha do Pasquim. Ali havia muitos colaboradores: Caetano Ripoli, Cerinha, Alceu, Padre José Maria Almeida, Padre Pettan, João Maffeis, de vez em quando o próprio Cecílio escrevia, Marisa Bueloni, havia uma rede de colaboradores, era uma página muito lida. Pode-se dizer que era “O Pasquim” de Piracicaba na época, uma página ousada para o tempo. O Cecílio como jornalista dava muita liberdade para todos nós, em termos culturais, políticos. Ele construiu uma equipe de colaboradores, jornalistas muito aguerridos. Seguimos muito o estilo do Cecílio de fazer críticas. Foi uma fase muito boa, o Araken desenhando, o Jago na diagramação e nos desenhos também.  “O Diário” foi inovador na implantação do sistema offset, foi o terceiro jornal no Estado de São Paulo, tínhamos “O Cruzeiro do Sul” de Sorocaba, o jornal “A Franca” de Franca, “O Diário” foi o terceiro jornal, antes de “Folha”, do “Estadão”, do próprio “Jornal de Piracicaba”. Houve um empenho muito grande das lideranças políticas da época, o Cecílio estava muito envolvido com o José Aldrovandi que era Presidente da Associação dos Fornecedores de Cana e outras lideranças da cidade que acabaram bancando as máquinas.

Era um equipamento caríssimo.

Eram muito caros, equipamentos importados do Canadá. Houve a necessidade de treinar a equipe técnica para imprimir o jornal, foi uma mudança radical para a época.

A dinâmica do jornal passou a ser muito grande?

Muito maior, recebíamos informações internacionais das agencias como a United Press International (UPI), ANSA, tinhamos um produto jornalístico que mesclava Piracicaba e o mundo. ”O Diário” foi um jornal de vanguarda.


                43º Salão Internacional de Humor de Piracicaba - Vídeo de Abertura

A HISTÓRIA DO SALÃO INTERNACIONAL DE HUMOR DE PIRACICABA - TV CULTURA – 2001
Nesse período, há algumas passagens que são quase folclóricas, como a delegação de Piracicaba que foi ao jornal “O Pasquim” no Rio de Janeiro?

“O Diário” havia mudaddo da Rua Prudente de Morais para a Rua São José, em um prédio moderno, onde anteriormente funcionava a loja de máquinas e equipamentos de Tuffi Elias, pai do Cecílio Elias Neto. Foi em frente a esse prédio que Alceu Marozzi Righetto fez a proposta de fazer o Salão de Humor de Piracicaba, após ter lido a reportagem do Salão de Humor do Mackenzie que eu havia feito. Ele disse que ia convidar o Carlinhos Colonnese, iriamos conversar com o “Fagundinho” como era carinhosamente chamado o Cordnador de Turismo Luiz Antônio Fagundes. O prefeito era Adilson  Benedito Maluf. Pretendíamos que a prefeitura nos ajudasse a fazer o Salão. Isso foi em fevereiro, era carnaval. Logo em seguida, em um sábado de carnaval, o Alceu, o Colonnese e eu fomos entrevistar o pessoal que veio fazer parte do júri do carnaval de Piracicaba daquele ano, isso foi em 1974. Na piscina do Hotel Beira Rio começamos a conversar, e uma das pessoas que nos deu mais atenção na época foi um jornalista do jornal Ultima Hora, chamado José Maria do Prado. Conversamos bastante sobre cultura, carnaval, estávamos a vontade, quando o Alceu disse: “Zé, será que você não marca com alguém em São Paulo, vamos um dia para lá, para que alguém possa nos ajudar a organizar o “Salão do Humor” pretendemos fazer um Salão de Humor em Piracicaba, na hora o Zé Maria disse que era muito amigo do Zélio Alves Pinto, irmão do Ziraldo, que era um dos diretores do Pasquim. O Alceu queria chegar ao Pasquim mas não tínhamos uma forma clara de como entrar. Alguns dias depois, conversamos com o Fagundinho, com o Luiz Mattiazzo que era o Chefe de Gabinete do prefeito Adilson, a principio não havia verba disponível para realizar o Salão. Um dia o Alceu me chamou, assim como  o  Carlinhos Colonnese e disse que o Fagundinho queria conversar conosco. O pessoal do Clube Orquidófilo de Piracicaba que iria fazer uma tradicional  exposição no Teatro São José, estava com alguma dificuldade, e parece que tem uma “fortuna” de 10.000 cruzeiros para fazermos o salão. O Alceu acionou o José Maria do Prado, que entrou em contato com o Zélio, marcamos um almoço em um restaurante em São Paulo. O Zélio gostou muito da idéia. Convidou-nos para ir tomar o café na sua casa, assim conheceríamos o seu ateliê, fomos, tomamos o café, lembro=me do Zélio ter fincado um compasso em cima do mapa do Estado de São Paulo, a ponta seca em Piracicaba e com o grafite começou a desenhar círculos de raios cada vez mais abertos em torno da cidade de Piracicaba, dizendo: “Olha só o poder de disseminação que nós temos com relação ao salão para projetar Piracicaba nacional e internacionalmente!”. Uns dias depois o Zélio ligou para o Alceu dizendo: “Consegui que o  Ziraldo receba vocês no Pasquim situado a Rua Saint Germain. Era um casarão antigo, parecia uma vila. A secretária do Pasquim era a Dona Nelma. Normalmente as sextas-feiras era fechamento do Pasquim, estavam todos presentes: Ziraldo, Jaguar, Paulo Francis, Henfil. Ai vai dar para mostrar o projeto para toda a turma. O Mattiazzo emprestou o famoso automóvel Galaxie preto do prefeito Adilson, com o motorista do Adilson, o Kaoro, um japonês, que nunca tinha ido ao Rio de Janeiro. Fomos o Alceu, o Carlos Colonnese e eu para apresentarmos o projeto. Nisso já tínhamos convidado o Zélio para fazer o cartaz do Salão de Humor, e ele fez. Esse primeiro cartaz ficou um ícone. Passamos no Seu Julio Romano, que comercializava pinga em garrafão, compramos cinco garrafões e levamos. Todos apreciavam uma cachaça boa, mas era a predileção do Jaguar. Seu Júlio tampou os garrafões com rolha, amarrou, quando chegamos próximos a Campinas, a pressão forçou a saída das rolhas, como champanhe. O aroma da cachaça invadiu o interior do veiculo, fomos de Campinas ao Rio de Janeiro aromatizados pelo odor da legitima cachaça. Chegamos quase inebriados ao destino. Assim que chegamos, após as devidas apresentações, o Jaguar já emborcou um dos galões, tomou uma talagada de bom tamanho. Emendando: “É a melhor pinga do Brasil!” A pinga foi nas devidas proporções o nosso espelhinho de índio. O pessoal do Pasquim entrou de cabeça, pediram o cartaz do Zélio, na época tinha que fazer clichê. Prontificaram a publicar no Pasquim. O Jaguar chamou o Fortuna, para fazerem o regulamento do Salão. Eles perceberam a ousadia de uma cidade como Piracicaba, a ousadia daquele grupo de jovens.


                    Como surgiu o Salão Internacional de Humor de Piracicaba

Como foi a reação em Piracicaba?

Voltamos e logo começamos a divulgar. Surgiu um novo problema, em Piracicaba não tínhamos onde fazer o Salão. Na época o Mário Terra era colunista social de “O Diario”. Era também diretor social do Clube Coronel Barbosa. O presidente na época era o Dr. Heitor Montenegro, professor da ESALQ. Uns dias depois, o Mário voltou meio chateado, e comunicou-nos  de que o pessoal do Clube Coronel Barbosa estava com receio, a exposição tinha um caráter político. A idéia inicial era fazer no Teatro São José. O Clube se propôs a bancar o coquetel da abertura do Salão, iriam fazer uma divulgação. O Mário Terra tinha um amigo, o Renan Cantarelli que era gerente do Banco Itaú, o qual havia adquirido o Banco Português, que funcionava na Praça José Bonifácio, ao lado da Banca de Revistas do Gianetti, da Rádio Difusora, o Alceu mencionou que era uma exposição de arte, para comemorar  o aniversário de Piracicaba, Quando o Renan ficou sabendo que era o Salão de Humor já não tinha mais como adiar. Só que ele estabeleceu um prazo máximo para ser retirado do prédio. Com isso o Primeiro Salão de Humor abriu em um sábado, 26 ou 27 de agosto, e ficou só 15 dias, vieram para Piracicaba Jaguar, Fortuna, Ziraldo, Zélio e Wilde Weber que era cartunista do “Estadão”. O Pasquim mandou os trabalhos censurados, montamos com esses trabalhos uma mostra paralela.


      SALÃO DE HUMOR DE PIRACICABA - TV CULTURA 1998 - A HISTORIA



Após fazer o Primeiro Salão de Humor de Piracicaba, qual era a intenção? Prosseguir?

Nós não tínhamos a expectativa de fazer o Segundo.

Teve algum tipo de censura?

Houve um episódio que eu chamaria de surreal. O Capitão Alfredo Mansur era diretor do Tiro de Guerra e era o chefe indireto do SNI Serviço Nacional de Informações em Piracicaba. Era um militar bastante socializado a cultura de Piracicaba. Em um dos dias o Alceu me chamou e mostrou que algum visitante tinha colocado uma fita adesiva preta em cima de um determinado cartum. Como se quisesse dizer censurado. O Alceu criu a lenda de quem tinha feito aquilo foi o Capitão Mansur. O SNI tinha censurado o Salão! Passados esses anos todos e conhecendo o espírito anárquico do Alceu, eu diria que foi ele mesmo quem colocou o adesivo! Para criar um clima. Os artistas do Pasquim foram muito bem recebidos em Piracicaba. Saíram deslumbrados com Piracicaba. E voltaram muitas vezes depois.


                                      Salões de Humor de Piracicaba 1974 1975


Hoje nós estamos em qual Salão?

Vamos abrir agora no dia 26 de agosto o Salão de numero 44. É o Salão de Humor mais antigo do mundo! Na época em que abrimos o salão as referencias eram o Salão de Lucca na Itália, que não existe mais, o Salão de Toronto no Canadá e o Salão de Tóquio no Japão, que também não existem mais. Nesse livro que fiz recentemente sobre a História do Primeiro Salão do Mackenzie conseguimos identificar hoje no Brasil a existência de 126 Salões de Humor.

Quantos trabalhos vocês receberam no ano passado e quais são as expectativas para esse ano?

No ano passado recebemos quase 3.000 trabalhos, a expectativa é mais ou menos próxima a isso esse ano. São selecionados cerca de 400 trabalhos. O trabalho mais difícil é o da comissão de seleção. A comissão de seleção se reúne dias 28,29 e 30 no Hotel Center Flat,

Qual é a importância do cartum?

Ele fala por si próprio, independente da nacionalidade ou regime político em que o artista vive. É uma linguagem universal. É ácido, contundente, provocador.

O Delfim Neto é um colecionador de caricaturas?

É ! E é um sábio. Sempre foi um sujeito criticado, por trabalhar com uma área difícil que é a economia, ele imitou outro craque da área chamado Getulio Vargas. Faziam criticas do Getulio ele mandava chamar o autor, dizia que queria comprar a arte, com isso virou um colecionador dos seus desafetos. O Delfim é hoje um dos maiores colecionadores de caricaturas e cartuns. Quem sabe um dia ele empreste esse material para expormos em Piracicaba, eu sei que ele tem muitos amigos em Piracicaba. Podemos até mandar um fotógrafo para fotografar o material. Isso para evitar qualquer risco de extravio. Sei que o Barjas é um grande colecionador de charges e caricaturas, tem muitas obras do Erasmo Spadoto.

O Erasmo tem um humor mordaz?

Mordaz! É uma capacidade de reação ao momento. O Barjas era prefeito, recebeu uma verba para pintar o Estádio Barão de Serra Negra. Houve uma especulação de que ele iria pintar o estádio de amarelo e azul, que são as cores do seu partido PSDB. O Erasmo fez uma charge de um assessor perguntado ao Barjas. Como irá se chamar o estádio após a pintura: “ Barjão de Serra Negra” ou “Barão de Serra Negri”? .O artista gráfico tem um poder de síntese que nós jornalistas não possuímos.

Quantos livros sobre cartuns você já editou?

No campo de cartum já editei seis livros. Fiz o primeiro do Erasmo sobre as capivaras; do Luciano Veronezzi que publica na Gazeta de Piracicaba; do Edson Rontani, “A História do Nhô Quim”; fizemos três livros de trabalhos vencedores do Salão: “Balas Não Matam Idéias”; “Caixara de Forfe” e o “Risadaria no Salão”. A partir deste ano com a instituição da AHA (Associação dos Amigos do Salão Internacional de Humor de Piracicaba) Estamos lançando uma coleção de livros sobre humor gráfico. Quem gostar de humor, e queira filiar-se pode entrar em contado através do e-mail adolpho.queiroz@mackenzie.br. Podem participar pessoas de toda a região. Temos também o “Salãozinho” para crianças de 7 a 14 anos. Este ano tivemos 4.000 trabalhos inscritos.






                                   O Pasquim - A Subversão do Humor - PARTE1



 
                                   O Pasquim - A Subversão do Humor - PARTE2



                                   O Pasquim - A Subversão do Humor - PARTE3



                                 O Pasquim - A Subversão do Humor - PARTE4




                                         A Subversão do Humor - PARTE5



                                 



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