sábado, janeiro 19, 2019

IBRAHIM MATTUS


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 19 de janeiro de 2019.

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

http://blognassif.blogspot.com/


http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: IBRAHIM MATTUS     




Ibrahim Mattus nasceu a 2 de outubro de 1931na cidade de Conceição de Macabu, nome que deriva de Nossa Senhora da Conceição do Rio Macabu, naquela época era distrito de Macaé. É filho de Abdo Mattus e Izolina Pereira Mattus que tiveram sete filhos: Afair, que faleceu ao nascer,Fair, Nazira, Munira, Ibrahim, Nabile, Amira. Ibrahim Mattus é Procurador Federal. No Exército chegou ao posto de terceiro sargento. Iniciou-se profissionalmente como funcionário terceirizado do Instituto do Açúcar e do Álcool, galgando postos importantes, sendo inclusive nomeado como interventor pelo Presidente Fernando Collor. Batalhador incansável, trouxe ao Bairro Santa Terezinha melhorias usando sua influência pessoal, adquirida por mérito próprio. Uma narrativa de uma vida de lutas, glórias e desafios.                         


Qual era a atividade do pai do senhor? 

Mascate! Como todo bom árabe ele começou como mascate, trabalhou muito, pouco antes de falecer tinha um armazém que tinha de tudo. Era o shopping de hoje! De enxada até agulha, da banana ao feijão! Meu pai faleceu muito jovem, com 41 anos, possivelmente com um ataque cardíaco, naquela época não existia os recursos que existem hoje, era um mundo diferente.

Ele veio para o Brasil sozinho?

Veio sozinho, ele tinha um primo que já morava no Brasil, Jorge Tebet Jorge que morava em Conceição de Macabu. Ele e Jorge eram dois moços de chamar a atenção, meu pai era muito charmoso, um homem bonito, conheceu a minha mãe, ela com 17 anos, casaram-se. Era um período em que as famílias tinham muitos filhos.

Ao ficar viúva qual foram as providencias que a sua mãe tomou?

Eu tinha uns cinco anos. O meu pai estava muito bem de vida. Começaram a aparecer credores, minha mãe querendo honrar o nome do meu pai, as dívidas eram na palavra, não usava-se documentação escrita, ela pagou a todos que se apresentavam como credores. Com isso em pouco tempo os recursos escassearam. Como tínhamos uma conhecida em Niterói, fomos todos para lá. 



Uma viúva e seis filhos! Minha mãe era costureira, começou a trabalhar, fazia costuras para uma empresa do Rio de Janeiro, fazendo calças. Com 12 anos eu levava as calças prontas para o Rio de Janeiro. Ia de barca, naquela época a travessia Rio-Niterói era feita por barcas. Ainda não existia a ponte ligando as duas cidades. A ponte foi construída em 1964 pelos militares.

O senhor pequenininho ia sozinho?

Naquela época não havia maldade, os próprios passageiros se protegiam, assim como aquela criança desconhecida ,no caso, eu, levava as calças prontas e trazia a fazenda para costurar as calcas, camisas, o que precisasse. Minha mãe costurava bem.

Com isso ela conseguiu manter a família?

Conseguiu, e também havia muita solidariedade, por parte de famílias amigas, parentes. Ela costurou durante sua vida toda, faleceu em 1992, com 86 anos. Foi uma heroína, sozinha criou uma família. Criou os filhos, encaminhou-os, se relacionar, hoje nossa família tem mais de 100 descendentes.

O senhor trabalhava em algum local, quando era garoto?

Fui trabalhar em uma farmácia, fazendo entregas de medicamentos. Ia a pé, de bicicleta, dependia da distância. Eu me sentia importante! Depois fui trabalhar com um dentista, uma das minhas atividades era levar as marmitas para ele. Ele fazia restaurações utilizando ouro. Antigamente, o ouro era uma das ligas metálicas mais utilizadas por dentistas em restaurações devido a sua resistência. O procedimento sempre foi muito caro por se tratar de um material precioso. Por isso ter um ou mais dentes de ouro era um símbolo de status financeiro. Permaneci trabalhando para o consultório dentário por uns quatro anos.

O senhor não se interessou em ser dentista?

Não me interessei, talvez por não ter estudos na época. A minha vida de estudante foi muito difícil. Fiz o curso primário no hoje Colégio Estadual Melchiades Picanço em Niterói. O governo lançou um curso que dava a oportunidade de fazer o ginásio e o colegial em um tempo reduzido, proporcionando a oportunidade de fazer um curso superior. Tive um grande amigo chamado João Pires Ribeiro que era meu cunhado, casado com a minha irmã Fair. Ele me indicou a um senhor que tinha um restaurante na

Standard Oil Company era no Brasil a Esso Brasileira de Petróleo Ltda. Fui trabalhar com ele , no prédio que era do Instituto do Açucar e do Álcool, fundado em 1933 por Getúlio Vargas.

O senhor conheceu Getúlio Vargas?

Conheci! Cheguei a falar com ele. Eu tinha um amigo que era o mordomo do Getulio, ele me convidou para ir até o Palácio do Catete para conhecer o Dr. Getúlio. Fui. Ele me cumprimentou, de longe, aí nós fomos embora. Em 24 de agosto de 1954 ele suicidou-se.

Gregório Fortunato foi o chefe da guarda pessoal do presidente Getúlio Vargas, também  conhecido como "Anjo Negro", devido ao seu porte físico e sua pele negra. Gregório começou a ter muito poder, despachava com coronel, general. Antes de falar com o Getúlio os interessados tinham que passar primeiro com ele. Getúlio por suas idéias, foi se isolando, o Almirante Amaral Peixoto casou-se com Alzirinha (Alzira) Vargas filha dele, conheci esse pessoal todo, não tinha relações de amizade, mas quando ia ao Palácio do Catete sempre via um deles. Conheci o Copacabana Palace Hotel, mas não frequentava, era só para quem tinha muito dinheiro, geralmente turistas estrangeirs.

Existem até hoje pessoas que colocam em questão se Getúlio Vargas suicidou-se ou foi assassinado, a seu ver o que de fato aconteceu?

Getúlio sentiu-se encurralado. Tinha o Gregório Fortunato que praticamente mandava e desmandava, Carlos Lacerda, um grande orador, fez uma intensa campanha contra Getúlio. Teve um dia em que ele ficou 24 horas no ar falando mal do Getúlio. Conheci Adhemar de Barros, inclusive lembro-me do caso famoso de suposta "negociata" muito comentado foi o "Caso da Urna Marajoara" do Museu Paulista.

O senhor conhece a história de Jorgr Guinle dono do Copacabana Palace?

Carlos Guinle, seu pai, sabia que logo iria falecer, calculou o tempo de vida do filho Jorge (Jorginho) Eduardo Guinle, e disse-lhe: “Esse dinheiro é para você viver até morrer” Jorginho foi um socialite, playboy, e herdeiro milionário notável por suas conquistas amorosas e falência financeira. Após ter gastado quase todos seus bens, avaliados em cerca de 100 milhões de dólares, em festas, viagens e mulheres, Guinle faleceu aos 88 anos de idade, morando, por favor de seus novos donos, no hotel Copacabana Palace. O hotel fora fundado por seu tio, Octávio, em 1923. Conquistou grandes artistas, entre elas Ava Gardner, Anita Ekberg, Veronica Lake, Romy Schneider, Kim Novak, Hedy Lamarr, Susan Hayward, Zsa Zsa Gabor, Rita Hayworth, Lana Turner, Jane Russell. Casou-se quatro vezes com: Dolores Sherwood Bosshard, Ionita Sales Pinto, Tânia Caldas, Maria Helena Carvalho. Não há dinheiro que aguente!

O Rio de Janeiro dessa época era completamente diferente?

Você saía tranquilo, eu trabalhava no IAA, fazíamos horas extras, a noite saíamos para jantar a meia-noite, íamos no Spaghettilândia, vinham umas cumbucas com espaguete, ficava na Lapa, não havia riscos;

Como era a Confeitaria Colombo?

Ali era o ponto dos políticos, das atrizes, das candidatas a atrizes.

Carnaval, o senhor participou?

Participava mais como assistente. Naquela época havia um desfile de carros, com muito confete e serpentina. O povo se divertia de forma sadia. Era mais romântico.

O senhor chegou a frequentar a Rádio Nacional?

Frequentei no tempo de Cesar de Alencar, Cesar Ladeira, ali conheci Dalva de Oliveira, Emilinha Borba, Aracy de Almeida, Ataulfo Alves, Nelson Gonçalves, Silvio Caldas, era tudo ao vivo. Como bom niteroiense, não tinha o que fazer no domingo, atravessava com a barca, criança não pagava.

E bailes o senhor frequentava?

Fui uma vez no Bola Preta para conhecer. A conotação de baile naquela época era outra.

E o folclórico Tenório Cavalcante o senhor o conheceu?

Ele era de Duque de Caxias, o conheci, tem uma passagem em que o Tenório Cavalcante estava sendo entrevistado, ele andava com uma capa preta e embaixo da capa preta Tenório andava sempre ao lado de sua "Lurdinha", uma submetralhadora MP-40 de fabricação alemã, o entrevistador, radialista, fez uma pergunta ao Tenório, que não o agradou, o Tenório disse-lhe: “Pula na piscina!” O radialista disse-lhe “-Mas eu estou de roupa, com relógio”. O Tenório simplesmente disse-lhe: “Pula na piscina, senão vou lhe dar um tiro!”. Imediatamente o entrevistador mergulhou! Pelos cabos eleitorais, Cavalcanti fora conhecido como "O Rei da Baixada"; pelos rivais, era tachado de "O Deputado Pistoleiro".

Uma das figura folclóricas do Rio de Janeiro foi João Francisco dos Santos mais conhecido como Madame Satã?

Era um homossexual, com uma altura muito acima do padrão, musculoso, uma fera em qualquer briga, inclusive praticava o que na época era novidade Jiu-jitisu. E um exímio manejador de navalha. São fatos que existiram.

O senhor chegou a ir ao Cassino da Urca?

Não, não fui. Só iam artistas, pessoas com alto poder aquisitivo.

A barca que fazia a travessia Rio-Niterói transportava quantas pessoas?

Acho que umas 3.000 pessoas. Foram reformadas e estão funcionando até hoje. Depois vieram as aero barcas. Eram barcos para cerca de 50 pessoas, quando ele pegava uma certa velocidade ele inflava e deslizava na água, fazia o percurso em 8 a 10 minutos, a barca convencional levava 30 minutos.

O Rio de Janeiro lhe traz muita saudade?

Tenho saudade das amizades, bastante familiares que ainda moram lá. Rio de Janeiro, Niterói, eles tem uma característica própria que são as suas praias. Mesmo aborrecido, se você teve um dia pesado, vai para a praia, procura uma sombrinha, deita, você se recupera, se recompõem. Niterói é um município da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, no estado do Rio de Janeiro. Foi a capital estadual, entre 1834-1894 e novamente entre 1903-1975. A Guanabara foi um estado do Brasil de 1960 a 1975, que existiu no território do atual município do Rio de Janeiro. Em sua área, esteve situado o antigo Distrito Federal. Foi capital estadual fluminense até a fusão entre os estados do Rio de Janeiro e da Guanabara em 1974. Dista 15 km da Cidade do Rio de Janeiro e possui como acesso a Ponte Rio–Niterói Antes o Rio de Janeiro foi Estado da Guanabara, depois voltou a ser Rio de Janeiro. Niteroi deixou de ser a capital do Rio de Janeiro. Portanto Rio de Janeiro é a capital do Estado do Rio de Janeiro.

A mudança da Capital Federal para Brasília acelerou a deterioração do Rio de Janeiro?

O Rio politicamente não tem mais nada. Tem suas maravilhosas praias. Conheci Juscelino Kubitschek de Oliveira colocou ordem na casa. Transferiu a capital para Brasília. Hoje o Rio não comportaria além do espaço físico, a topografia impõem limites naturais.

Voltando à sua trajetória pessoal, o senhor foi trabalhar no prédio do IAA.

Esse meu cunhado João Pires da Costa Ribeiro, conhecia o Pires, que tinha o restaurante do IAA. Fui na Praça XV, 42, onde hoje é a sede da Policia Federal, disse ao Sr. Pires que eu era cunhado do João Pires. O restaurante ficava no último andar, 11º andar. Era para os funcionários. Me apresentei, o Sr. Pires disse-me: “Você é cunhado do Pires? “

 Respondi afirmativamente. Ele disse-me: “Pega um jaleco e pode começar a trabalhar!” A diretoria do IAA almoçava depois dos funcionários terem feito sua refeição.

Havia diferença nas refeições servidas aos funcionários e aos diretores?

Havia! Não sei se era por ser novinho, talvez bonitinho, ele me mandou servir a mesa da diretoria. Tinha uma senhora, Dona Elza, muito fina, simpatizou-se comigo. Eu me esforçava para tratá-los da melhor maneira possível. Dona Elza perguntou-me: “Ibrahim você não quer ser ascensorista?” Respondi-lhe: “Se o Sr. Pires deixar, eu vou!”.  Ela disse-me: “Com o Pires eu me entendo!”. Eu fui falar com ele, contei-lhe o sucedido. Ele disse-me: “Vai embora, vai cuidar da sua vida”. Fui servir no IAA como ascensorista, era diarista, era terceirizado. Eram duas portas de metal sanfonadas, portas pantográficas. Ali trabalhei uns seis meses.

O que o senhor achou desse trabalho?

Melhor do que o anterior! Trabalhava em pé, tinha que abrir a porta para o acesso ou a saída dos ocupantes. No elevador conheci todo mundo. Tinha um senhor que era de uma usina de São Paulo, todo natal ele ia com uma nota de dinheiro no valor de 20 mil réis, naquela época era um bom dinheiro, notas novinhas, ele ia distribuindo, para o ascensorista, para o garçom, só para os funcionários com cargos mais modestos. Eu trabalhando no elevador, essa mesma senhora, Dona Elza, ela trabalhava no gabinete da presidência, era secretária do presidente Gileno De Carli, ele era de uma família de Pernambuco. Dona Elza disse-me: “Ibrahim, surgiu uma vaga de contínuo no gabinete, você quer ir para lá?” Na hora respondi:” Vou sim senhora, o que a senhora fizer por mim está ótimo!” Após uns seis meses no gabinete ela disse-me: “Ibrahim, você vai fazer um curso na IBM! Surgiu uma vaga e a diretoria disse-me para indicar uma pessoa. Vou indicar você.” Perguntei-lhe: “E o meu horário?” Ela respondeu” Você vai fazer o curso, portanto está dispensado do horário!”

Que curso o senhor foi fazer na IBM?

Um curso de mecanização. Eram digitados os dados e transferidos para um cartão perfurado. Fiz o curso que durava seis meses.

Nessa época o senhor já trabalhava de paletó e gravata?

Sim, eu trabalhava no gabinete da presidência!

Qual era a sua idade?

Eu me casei aos 20 anos, aos 20 anos entrei lá. Deveria estar com 21 a 22 anos.

Como se chama a sua esposa?

Em primeiras núpcias casei-me com Vanusa Barbosa Mattus, tivemos os filhos: Luiz Carlos (falecido precocemente), Paulo Roberto (falecido há uns seis anos), Júlio Cesar, Carlos Alberto, Marco Aurélio, Edna Lúcia, Ana Maria e Carmem Denise. Em segundas núpcias casei-me com Neide Terezinha Gentile Mattus. Além de criarmos uma sobrinha, Maria de Fátima, hoje residente na cidade de Campos, Rio de Janeiro.

Após fazer o curso na IBM o senhor foi trabalhar em que setor?

Fui trabalhar na seção de mecanização. Era ambiente com ar condicionado. Por causa dos equipamentos e dos cartões que no calor ficavam muito rígidos e no frio perdiam a resistência. Tinham que ter a elasticidade ideal. Era um setor de elite. Ali passava a contabilidade, serviço pessoal, naquela época não tinha o Departamento de Recursos Humanos(RH). O  IAA fazia muitos empréstimos para as usinas, tudo era controlado por lá. Imprimíamos os relatórios que o presidente pedisse. Os relatórios eram impressos em papel zebrado (duas cores, sendo cada linha uma cor), em impressoras matriciais, enormes, barulhentas. O IAA tinha no Brasil todo uns 3.000 funcionários. Eu não estacionei, fui evoluindo dentro da empresa, até quando eu estava no Departamento Pessoal veio a revolução de 1964. O General Vargas (Mera coincidência de sobrenome com Getúlio Vargas) foi nomeado interventor do IAA. O Departamento Pessoal sempre foi uma área especial por deter informações de cunho sigiloso. Esse General Vargas me chamava em seu gabinete e dizia: “Me traz a ficha do funcionário tal”. Eu trazia a ficha. E faz aquilo, e faz isso. Acabei fazendo amizade com ele. Lembro-me que um dia ele me disse: "Ibrahim, tem pessoas que vem aqui e me dá vontade de jogar escada abaixo! Você jogaria para mim?” Respondi-lhe: “General, não sou violento, não faço isso e sei que o senhor não faz também!”  A história vai mudar radicalmente. Fui nomeado interventor da Destilaria Gileno De Carli. a pessoa que estava aqui como gerente estava fazendo coisas erradas. Para você ter uma ideia ele andava de patinete no salão da usina. Era maluco. O jipe chapa branca (uso restrito serviço público) era como se fosse propriedade dele. Enfim, ele usava e abusava. Cheguei aqui, com ordem do General Vargas para mandar esse gerente para Ponte Nova - no estado de Minas Gerais, onde havia uma destilaria também. Isso foi no final de 1969. Vim com a missão de acabar com essa destilaria. Elas estão até hoje ai porque a pressão foi muito forte. Havia um serviço especial que administrava essas destilarias: Gileno De Carli, Lençois Paulista, Guararema, Ariranha, eram aproxiamadamente umas vinte destilarias do Instituto. Eu fazia todo mês uma vistoria nessas destilarias, isso no Estado de São Paulo, mandava um relatório para o Rio de Janeiro. Vajava de jipe. Eu tinha um carro Mercury conhecido como “Boi Deitado” . Foi um amigo meu, procurador lá do Rio de Janeiro, que tinha essa Mercury. Ele Disse-me: “- Ibrahim, fica com essa Mercury, vai usando até eu precisar dela”. A cor era verde-água,oito cilindros, muito robusta,era um trator.Fiquei aqui como administrador dessas destilarias, vi que não tinha jeito como acabar. Na Destilaria de Guararema quem mandou invadir a destilaria foi um padre!

Onde situava-se a Destilaria Gileno De Carli?

Ficava em Santa Terezinha , no atual bairro IAA. Levei para Santa Terezinha: Correios, Caixa Econômica Federal e farmácia. Santa Terezinha era constituida pelo Matadouro, IAA e a pracinha, com algumas casas dos moradores mais antigos. Levei água, o prefeito era Adilson Benedito Maluf. Eu liguei para o General Vargas, disse-lhe: “General, aqui não tem água, ela vem de uns dois quilômetros, eu preciso de tubo para levar para a destilaria”.

Mas como funcionava a destilaria sem água ?

Ela tirava água do rio e tratava, era independente. A questão era levar água para a população de Santa Terezinha. Levamos água para toda Santa Terezinha até a destilaria. Precisávamos de luz, eu só poderia deixar as casas terem luz com autorização da Companhia Paulista de Força e Luz., ela era a dona dos postes. Entrei em contato com o IAA para fazer o uso dos postes. A CPFL autorizou o IAA a utilizar a energia, Antes só tinha luz no IAA e no Frigorífico Angeleli.

O senhor morava lá?

Morava na casa nº 1.

Quanto tempo o senhor permaneceu em Santa Terezinha?

Posso dizer que estou até hoje lá! Tenho filho que mora lá. Levei a água, luz e depois o asfalto para Santa Terezinha. Quando era terra eu mandava passar o trator da Destilaria. Um episódio curioso ocorreu quando trouxemos uns ferros de outra destilaria para cá. Um amigo nosso, um negro de sobrenome Bispo, ao perceber que uma barra de aço de uns 200 quilos ia cair e poderia causar uma tragédia, ele abraçou a barra, sózinho, seu corpo tremia com o peso, até chegarem os companheiros e ajudá-lo. Isso ficou na história. Eu era o administrador quando veio a Planalsucar, Com os laboratórios que analisavam as amostras de açúcar que colhíamos. A Planalsucar saiu, uma parte da área está com o municipio, outra com escolas, há outra parte com a Justiça do Trabalho. Em 1970 abriu o vestibular para a Faculdade de Direito em São Carlos, fiz o vestibular e passei. A Unimep tinha faculdade de Direito, já estava no primeiro ano. Passei a cursar a Faculdade de Direito de São Carlos, ia todas as noites eram 240 quilômetros ida e volta, ia com meu fusquinha. No semestre abriu a segunda turma aqui em Piracicaba, pedi transsferência de lá e me inscrevi aqui na UNIMEP. Sou da segunda turma de Direito da Unimep, me formei em 1974. Abriu concurso para procurador do IAA. Eram sete vagas disponíveis, eu entrei. Fui aprovado em primeiro lugar. Fui nomeado procurador, hoje sou aposentado como Procurador Federal. Em 1992, quando o Collor entrou, ele me nomeou interventor no Rio de Janeiro, para fechar o IAA. Todos os dias em meu gabinete havia uma fila de mulheres que descia a escada, a conversa era muito parecida: “ Seu Ibrahim , não manda a minha filha embora!” Eu explicava: “Minha senhora, a minha missão é essa!”. Nesse interim a minha mãe ficou doente, ela veio a falecer em 1992. Passei um telegrama ao Collor pedindo que me substituisse por questão de saúde, a não adaptação as ordens que ele deu, ele atendeu o meu pedido. Eu ainda estava em Niteroi, ele nomeou outro interventor, que foi uma senhora. Pensei: “-Estou com 40 anos de IAA. O que estou fazendo aqui?”. Passei um telegrama ao Collor, agradecendo e pedindo a aposentadoria. Ele imediamente concedeu. Saiu no Diário Oficial, ai me aposentei, em 1992. Aí vim para Piracicaba , de volta.

Hoje o que o senhor faz?Tem algum hobby?

Eu já estou aposentado! Uso muito o computador, converso, telefono. Me lembro de tudo na minha vida.

Em seu trabalho o senhor pegou muitos voos?

A Ponte Aérea era a minha casa! O Constellation foi uma aeronave comercial famosa  operado pelas extintas Varig e Panair do Brasil. Tinha cabine pressurizada, o que era novidade naquela época e era movido por quatro motores radiais a pistão de 18 cilindros. Tinha dias em eu ia e voltava até o Rio. Demorava 45 a 50 minutos de voo. Saia do aeroporto de Congonhas e descia no Santos Dumont.

O senhor chegou a montar escritório de advocacia em Piracicaba?

Montei, no Edifício Kennedy, na Praça José Bonifácio. Após algum tempo decidi fechar. Já estava aposentado.

O bairro de Santa Terezinha conhece o trabalho do que o senhor fez em benefício da localidade?

Eis a questão! O pessoal que vivenciou cada melhoria feita, quase todos faleceram. Quem vai acreditar que levei água, luz e asfalto, correio, Caixa Econômica Federal para Santa Terezinha? O Adilson Benedito Maluf teve participação com recursos locais, mas tive que usar meus contatos em esferas superiores. Fui muito amigo do Deputado Federal João Hermann  Netto, do Deputado Federal Pacheco Chaves, do Deputado Estadual Francisco Antonio Coelho, o Coelhinho, do José Machado. João Chaddad é muito meu amigo. Em 1982 o Chaddad concorreu ao cargo de prefeito de Piracicaba e eu era o candidatado a vice-prefeito. A política é envolvente. E perigosa. Assim como você faz uma amizade pode despertar uma inimizade. Passei por essa experiência e posso afirmar que não gosto. Ouço todo mundo, tiro as minhas conclusões.

O que o senhor acha de Piracicaba?

Quem conhece Piracicaba de 1969! A primeira vez que vim para cá o Edifício COMURBA tinha caído seis meses antes, estava tudo lá, as lajes dos andares dependuradas na parte do prédio que não caiu, ainda tinha muito entulho. Fiquei apavorado com aquilo. A sorte de muitas pessoas, é que o cinema que existia embaixo, Cine Plaza, iria funcionar à tarde e o prédio desmoronou antes.

O senhor foi colaborador com artigos para algum jornal?

Quando o Jornalista Evaldo Vicente iniciou o seu trabalho com “A |Tribuna Piracicabana”, eu escrevia uma página inteira sobre Santa Terezinha. Lá tudo que acontecia em Santa Terezinha eu noticiava, Meu filho o jornalista, apresentador e produtor de televisão Kal  Mattus era garoto, ele era  o responsável pela distribuição de “A Tribuna Piracicabana” em Santa Terezinha. (Alguns anos passados e sua neta, a jornalista Marina Mattus, filha de Kal Mattus, estreou na última sexta-feira, dia 18 de janeiro, uma página/coluna no jornal “A Tribuna Piracicabana”, com seus textos falando sobre nossa cidade e, principalmente, sobre seus cidadãos!).

Nessa época o senhor foi administrador de Sanmta Terezinha?

Na época tinha um amigo, já falecido, o Brandão, que foi diversas vezes candidato a vereador. Fui administrador de Santa Terezinha.

O senhor nunca pensou em ser vereador?

Só em 1982 fiz essa aventura de sair candidato a vice-prefeito! Paulo Maluf estava no auge estávamos o Chaddad, eu e Paulo Maluf na mesma chapa. Eu telefonava para a casa dele, Dona Sylvia Lutfalla Maluf atendia, eu pedia material de propaganda, a noite, no dia seguinte estava aqui em Piracicaba. O Maluf veio à Piracicaba, fazer um comício onde era o COMURBA, eu estava na casa do Dr. Jairo Ribeiro de Mattos, que era candidato a deputado. Disse ao Jairo: “Jairo, nossos votos estão lá na praça, vamos para lá!”. Fomos, o Maluf veio nos cumprimentar. O cantor em alta na época era Waldick Soriano, com a música “Eu Nao Sou Cachorro Não”. Ele apresentou-se com seu repertório incluindo essa música que fazia muito sucesso. Era uma pessoa carismática.

Temos constantemente notícias sobre o desvio de conduta de alguns políticos. Do alto da sua experiência, qual é a solução para essa situação?

Não têm! O mundo não tem solução! A França é um ícone da perfeição política, eu adoro os franceses, pela arte, filosofia, mas a França está corrompida. A Inglaterra está corrompida. A Alemanha está corrompida. 

O senhor sempre foi muito ativo!

Fui! Eu estava no IAA no Rio, adquiri três Gordinis novos, financiados. Coloquei-os para trabalhar como taxi, em uma semana um foi roubado, outro pegou fogo e o terceiro eu devolvi. Quando cheguei aqui em Piracicaba em 1969, estava ainda pagando carnê referente aos carros!

Ir morar no Rio de Janeiro era o sonho de muitos brasileiros?

Era onde tudo acontecia! Tinha tipos característicos como toda cidade têm. Um deles era o Poeta Gentileza. Eu estava em casa dormindo.  Minha esposa disse-me “Levante que o circo pegou fogo vai que estão lá assistindo ao espetáculo sua mãe, sua irmã e sua sobrinha!”, Era o Gran Circo Norte-Americano. Peguei o carro, nessa época eu trabalhava no IAA durante o dia e trabalhava como taxista com um Chevrolet 1938, até umas dez ou onze horas da noite. Fui até onde estava o circo, quando cheguei vi uma cena dantesca, muitas pessoas mortas, desfiguradas. Encontrei minha mãe, minha irmã e a minha sobrinha. Elas me contaram que durante o fogo se abraçaram e colocaram a minha sobrinha no meio. Hoje minha irmã e minha sobrinha moram nos Estados Unidos. A Olga, minha sobrinha, ficou com cicatrizes das queimaduras nas costas. Não sei se ela fez depois alguma cirurgia plástica. Minha irmã Nabile também ficou com marcas das queimaduras. Levei-as ao hospital, e voltei, com o meu carro passei a levar os feridos ao Hospital D. Pedro I, em Niterói. Ficamos a noite toda prestando socorro. José Datrino, o Poeta Gentileza falecido em 1996, perdeu a família toda. José acordou alegando ter ouvido "vozes astrais", segundo suas próprias palavras, que o mandavam abandonar o mundo material e se dedicar apenas ao mundo espiritual. Datrino possuía uma empresa de transporte de cargas e residia, com sua família, no bairro de Guadalupe pegou um de seus caminhões e foi para o local do incêndio onde hoje encontra-se a Policlínica Militar de Niterói. Plantou jardim e horta sobre as cinzas do circo em Niterói, local que um dia foi palco de tantas alegrias, mas também de muita tristeza. Aquela foi sua morada por quatro anos. Lá, José Datrino incutiu nas pessoas o sentido das palavras Agradecido e Gentileza. Foi um consolador voluntário, que confortou os familiares das vítimas da tragédia com suas palavras de bondade. Daquele dia em diante, passou a se chamar "José Agradecido", "Profeta Gentileza" ou “Poeta Gentileza”

 Percorreu toda a cidade. Era visto em ruas, praças, nas barcas da travessia entre as cidades do Rio de Janeiro e Niterói, em trens e ônibus, fazendo sua pregação e levando palavras de amor, bondade e respeito pelo próximo e pela natureza a todos que cruzassem seu caminho. Aos que o chamavam de louco, ele respondia: - "Sou maluco para te amar e louco para te salvar". O Profeta Gentileza, também oferecia, em gesto de gentileza, flores e rosas para as pessoas que cruzavam seu caminho nas ruas do Rio de Janeiro.

(“Fogo!”, gritou a trapezista Nena. Antonietta Stevanovich  foi a primeira a dar o alerta dentro do circo. Junto com os colegas Vicente Sanches e Santiago Grotto, ela apresentava o quadro final de acrobacia, clímax do espetáculo da tarde quente de domingo em Niterói. Foi quando um clarão pode ser notado na parte inferior da lona, à esquerda da entrada. O fogo se alastrou rapidamente e, nos 10 minutos seguintes, as 3 mil pessoas que lotavam o Gran Circo Norte-Americano viveram um inferno. Foi o maior incêndio da História do Brasil. Montado num grande terreno na avenida Feliciano Sodré, no centro da cidade, o circo, de propriedade do empresário Danilo Stevanovich, era um dos maiores da América Latina. Contava com 60 artistas, das mais diversas nacionalidades, A lona verde e laranja, pesava 6 toneladas. Resultou em 503 mortos e 300 feridos foi uma das maiores tragédias do Brasil, ocorreu na tarde de 17 de dezembro de 1961. Foi um incêndio provocado por Adílson Marcelino Alves, o “Dequinha”, que tinha antecedentes por furto e apresentava problemas mentais, motivado por vingança contra o dono do circo que o dispensou. O Gran Circo Norte-Americano comportava tantas pessoas quanto o Cirque du Soleil hoje em dia. O incêndio que o destruiu deu um impulso à cirurgia plástica no país).

O cansaço e o sono do senhor o salvou?

Nós íamos todos ao circo, só que almocei, deitei, adormeci. Com isso meus filhos permaneceram em casa. Minha esposa foi me chamar para levar as crianças ao circo, foi quando veio a notícia pelo rádio, de que o circo estava em chamas. O “Poeta Gentileza”, andava pela Avenida Amaral Peixoto, onde no número 55 minha sobrinha que é médica do Exército tem consultório. Ele usava terno, lembra a figura do artista falecido Pedro de Lara.

Ainda no IAA, em Piracicaba, trabalhava uma personalidade: José Carlos Brasil.

Ele era funcionário do IAA, e projetava filmes para a população. A princípio era projetado a céu  aberto, depois ele passou a passar no galpão do IAA. Naquela época, eu trouxe um costume do Rio, o IAA dava brinquedos através de uma associação que nós tínhamos. Antes tínhamos uma missa e nós chamávamos o Padre Otto Dana para celebrar essa missa. Todo Natal era assim. Na época o Padre Otto estava como pároco em Santa Terezinha.

Às margens da Rodovia Piracicaba-Limeira, em terras da ESALQ, há uma estrutura enorme de uma usina de açúcar, qual é a origem dela?

Aquilo foi doado pelo Instituto do Açúcar e do Álcool, foi iniciada a construção, quando chegou a Revolução de 1964. Parou tudo. Aquilo era para ser um protótipo de usina para formar os engenheiros agrônomos ligados a cultura da cana-de-açúcar, canavieiros, teriam uma usina como laboratório.

Qual é um dos seus sonhos que gostaria de realizar?

Gostaria muito de ir ao Líbano e ao Egito! Conhecer o Vale dos Reis, no Egito, onde dezenas de antigos faraós foram sepultados. Onde foi descoberta a famosíssima tumba de Tutankhamon (1341 a.C. – 1323 a.C.), abriga o túmulo dos filhos de Ramsés II (a.C. 1290 a 1224 a.C.). Neste último foram achados 130 corredores e câmaras, o que o torna o maior do local e um dos maiores do mundo. Com o avançar das pesquisas, aquele número pode, talvez, chegar a 200. Em 1922 foram realizadas grandes descobertas no Vale dos Reis.

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