sábado, junho 04, 2011

Geraldo Ometto

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 28 de maio de 2011
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/

ENTREVISTADO: Geraldo Ometto
Para dar esta entrevista Geraldo Ometto teve que adiar um compromisso assumido anteriormente, ele iria podar uma quaresmeira que já estava com seus galhos muito altos. Na garagem da sua casa uma pick-up compacta, muito moderninha, com lona na caçamba, objeto de desejo de muitos jovens, sugere que ali mora alguém que dirige. Geraldo Ometto foi lavrador, pedreiro, motorista de taxi, poceiro (que fabrica poços de água), comerciante, carpinteiro, exímio fabricante de cachaça, atividade que ainda pratica, produzindo em um pequeno alambique, cachaça artesanal, destilada “gota a gota”, sem nenhuma pressa, como ele mesmo afirma, “- Só para o gasto”! No quintal da sua casa cultiva uma horta com boa variedade de verduras, que abastece a cozinha de cinco famílias. Com um torno elétrico faz peças de madeira, fabrica, conserta, cria objetos, móveis. Ele acabou de voltar de uma viagem á passeio em Recife, onde permaneceu por vários dias. Passear é com ele mesmo, regularmente ele assume com muita segurança o volante da sua reluzente pick-up e acompanhado da sua animada esposa vai até Santa Maria da Serra, cerca de 80 quilômetros de estrada, um motorista que deveria servir de modelo, caso os órgãos de trânsito o descobrisse, afinal em aproximadamente 60 anos dirigindo ele nunca levou uma única multa de trânsito. Geraldo Ometto tem quase 91 anos! Em determinado instante ele confidencia: “- Nem eu acredito que tenho essa idade!” Nascido no bairro rural Floresta, em Piracicaba, a 12 de janeiro de 1921, filho primogênito dos 10 filhos do casal Jorge Ometto e Assunta Scarpari Ometto.

Que atividade rural era exercida na propriedade dos pais do senhor?

Era a lavoura, com plantação de milho, arroz, feijão algodão. Depois passaram a cultivar a cana de açúcar, passando a produzir pinga. Foi lá que aprendi a fazer cachaça. O sitio da nossa família era no Bairro da Floresta, ficava distante de 18 a 20 quilômetros de Piracicaba, quando chovia para vir à cidade só a cavalo, as carroças não passavam pelas estradas, o barro era tanto que em alguns lugares ao andar atolava até o joelho. Escola tinha apenas no Bairro do Serrote. Quando eu tinha 12 anos meu pai contraiu uma pneumonia muito forte, tive que deixar de ir á escola para ajudar na roça. Fui arar a terra, os vizinhos participavam de mutirão para se ajudarem. Eu não podia nem com o peso do arado.
Como o arado era puxado?
Arava com tração animal, lembro-me de dois animais com os quais trabalhei, a Calçada e a Estrela, enquanto eles puxavam o arado eu ia andando atrás, dirigindo onde ia passar a ferramenta. Até me casar aos 26 anos fiz essa vida. O meu avô barganhou o sítio da Floresta por outro na Fazenda da Glória, localizado no então Distrito de Charqueada, lá que aos 24 anos conheci a minha futura esposa, Maria Simonaggio Ometto nascida no Distrito de Charqueada, no dia 17 de janeiro de 1927, filha de Antonio Simonaggio e Judith Precoma Simonaggio O nosso casamento foi na casa do meu pai, tanto o Padre Luiz Perroni, como o escrivão foram até lá para celebrar o nosso casamento, isso no dia 26 de abril de 1947. Permanecemos residindo no sítio do meu pai. Alguns anos depois tive que deixar de trabalhar na roça, por ordem médica. Passei a exercer a atividade de comerciante. Comprei um armazém vizinho ao nosso sítio, nesse armazém permaneci por cinco anos. Em seguida adquiri um armazém na Usina Tamandupá, tinha de tudo, roupa, papelaria. Permaneci lá por uns cinco ou seis anos. A Usina Tamandupá era de Pedro Meneguel. Situav-s logo adiante da Usina Costa Pinto.
Quem fornecia as mercadorias para serem vendidas no armazém?
Itens de menor porte eram fornecidos por vendedores que iam oferecer seus produtos em nosso estabelecimento. Compras maiores eram feitas junto ao estabelecimento de Valentim Valério, situado na Vila Rezende. Da família Valério trabalhava no armazém a Alzira, Celeste, Neide, o prédio existe até hoje. As compras eram feitas uma vez por mês, eu vinha de trem da Estrada de Ferro Sorocabana, outras vezes eu vinha de ônibus. Eu tomava o trem pela manhã, na parada que existia no Recreio, fazia as compres e a tarde tomava outro trem de volta. As compras eram entregues pelo caminhão do Valério. Nós tínhamos cerca de 200 clientes que pagavam através de cadernetas. Alguns compravam durante o ano todo e o pagamento era feito uma vez por ano. Isso foi por volta de 1954.
O senhor teve quantos filhos?
Tivemos cinco filhos: Elza, Lúcia, Antonio, José Geraldo e Ângela Judith.
Em que ano o senhor mudou-se para Piracicaba?
Foi em 1956, viemos morar em frente a Igreja dos Frades, por seis anos fomos proprietários do bar existente na esquina da Rua Alferes José Caetano com Rua São Francisco de Assis, conhecido como “Bar dos Frades”. Foi uma época em que vinha muita romaria de outras cidades á procura de Frei Paulino. Íamos á missa todos os domingos. O prédio era de Mario Bressan.
Dona Maria, quando tinha casamento a senhora dava uma espiadinha para ver se a noiva estava bonita?
Claro que olhava!
Seu Geraldo, de lá o senhor mudou-se para onde?
Eu soube que iam construir uma nova igreja, a Igreja São José. Em frente na esquina, havia uma quitanda acanhada, pertencia a um senhor de nome Porfírio, era uma casinha baixa, simples, em volta não existia mais nada. A água era de poço. Na Rua Sud Mennucci entre a Avenida Dona Jane Conceição e Dr. Edgar Conceição havia uma santa cruz. O Cônego Luiz Juliani era bem jovem quando assumiu a Igreja São José, nem portas existiam nela! As ruas eram de pedregulho. Conheci a Paulista quando não havia quase nada aqui, a atual Rua Madre Maria Teodora era conhecida como Morro do Enxofre, para quem subia do lado esquerdo tinha valetas ao lado da rua, dava até medo, tinha bananal, cafezal isso em 1930. Meu avô Pedro Ometto e meu pai tinham 4 carroças, eles trabalharam no aterro da Cia Paulista aquela terra foi transportada em carroça, onde hoje estão construindo um viaduto.
Nesse local o senhor montou um comércio?
Montei um bar, com caldo de cana, sorvete. Hoje mesmo uma pessoa me perguntou se me lembrava do sorvete que eu inventei, o sorvete de cana! Era um sorvete muito bonito, feito com a garapa, eu não dava conta de produzir, de tão grande que era a procura. Foi um sucesso! Eu ia buscar a cana de açúcar pra fazer garapa com uma caminhonete Ford 1929, ia até o Bairro do Serrote.
Há quanto tempo o senhor é habilitado para dirigir veículos?
A minha carteira de habilitação é de 1956, nunca fui multado. Nunca perdi um ponto na carteira. Fui taxista por 15 anos, o meu ponto era na rodoviária, fui trabalhar com um Dodge ano 1945. Tive um Aero Willys branco, fazia muitos casamentos, inclusive os de sítios. Em um determinado dia levei um passageiro até o consultório do Dr. Samuel Neves, na Rua Prudente de Moraes, situado ao lado do famoso prédio Comurba, que estava em construção. Após deixar o passageiro segui na direção da Rua Governador Pedro de Toledo. Escutei um barulho ensurdecedor, uma enorme nuvem de poeira levantou-se, era o prédio que desabava, logo atrás de mim. Fiquei com muito medo, só fui parar na rodoviária, onde era o meu ponto de taxi. Naquela época não se via quase ninguém pelas ruas nas madrugadas. O pronto socorro, na época denominado de SAMDU - Serviço de Assistência Médica Domiciliar e de Urgência funcionava no mesmo prédio da rodoviária. Lembro-me do nome de alguns dos antigos colegas de taxi: Antonio Viana conhecido como Bigode, Osvaldo Regonha, Pancho, Paco, éramos em 10 motoristas, uma turma muito unida.
Qual atividade o senhor exerceu após deixar de trabalhar com taxi?
Fui proprietário do Supermercado Paulista, na Rua do Rosário esquina com a Avenida do Café, onde hoje funciona a Paulistinha Cosméticos. De dois a três anos depois vendi e adquiri uma chácara, passei a trabalhar como pedreiro, carpinteiro, marceneiro.
Atualmente o senhor tem uma horta em sua casa?
Tenho, com boa variedade de verduras, existem dois canteiros grandes, gosto muito de comer verduras.
O senhor dirige até hoje?
Dirijo! Temos uma chácara em Santa Maria da Serra, distante uns 75 quilômetros de Piracicaba, vou e volto, dirigindo, na cidade dirijo regularmente.
Qual é a receita para chegar a idade do senhor com essa disposição?
Acredito que seja comer na hora certa, tudo natural, nada de produtos enlatados, não abusar de bebidas alcoólicas, uma pinguinha pode tomar que não faz mal, desde meus 14 anos que trabalho com cana de açúcar, até hoje produzo pinga para o gasto. Ao levantar tomo apenas café com leite, às 11 horas eu almoço arroz, feijão, carne de frango, a carne bovina quase não como, salada e fruta o que vier eu como. Pão eu gosto de comer torrado, que eu me lembre nunca comi manteiga. Gosto de queijo meia cura. Às seis horas eu janto, geralmente uma sopa. As 9 ou 10 horas da noite vou dormir, acordo ás cinco da manhã.
Como se produz uma boa pinga?
A cana de açúcar deve ser cortada na hora de produzir a pinga, tem que estar no ponto certo de ser cortada, a fermentação natural deve ser respeitada, alambicar com a maior calma do Brasil, tem que sair aos pingos, sem garapa ou restilo. É uma cachaça com custo de produção alto, não tem como competir com os produtos industrializados. Meus amigos provam e gostam. Corto a cana, alambico, faço tudo sem auxilio de ninguém.
O senhor toma um aperitivo?
Só na hora do almoço ou se ficar encharcado de chuva, tomo uma pequena dose, apenas uma, não repito. De vez em quando tomo uma lata de cerveja, mas não gosto muito não. Faz 66 anos que convivo com a minha esposa, ela nunca me viu sequer ligeiramente “alto” por ter ingerido bebida alcoólica, e olha que sempre tive contato com bebida alcoólica, quer seja na produção da pinga ou na comercialização nos bares em que fui proprietário. Aprecio um bom vinho, faço o meu próprio vinho, atualmente não tenho uva plantada na minha chácara, em minha casa tenho dois pés de uva, nesse ano que passou fiz seis litros de vinho, sem conservantes, um vinho puro. Os tiroleses de Santana iam buscar pinga em nossa fazenda, fazíamos mil litros por dia, fornecíamos para indústrias como Tatuzinho, Cavalinho, Del Nero. Cem litros de garapa rendem vinte litros de pinga.
Seu Geraldo, o senhor gosta de bailes?
Quando eu era solteiro parecia um cachorro veadeiro, descobria bailes em todos os cantos, depois que me casei nunca mais freqüentei bailes. Morava no sítio, encilhava o cavalo e ia.
O senhor ainda sobe em árvore para apanhar frutos?
Subo! Agora mesmo vou sair para podar uma quaresmeira na casa de um amigo. Há pouco tempo tive que cortar uma árvore bem alta, com uma serra do tipo que eletricista usa, eu vim cortando a árvore de galho em galho.
O senhor toma algum remédio?
Nenhum! Até a minha pressão arterial é perfeita.
Gerolamo Ometto foi um comerciante muito expressivo em Piracicaba, qual era o parentesco com o senhor?
Era irmão do meu nono (avô), ele tinha agência de venda de veículos e outros negócios em Piracicaba. Pedro Ometto da Usina Costa Pinto era primo do meu avô, vieram como imigrantes da Itália para o Brasil.
Como se constrói um poço de água?
Marca-se no chão a medida da largura do poço, geralmente um metro, um metro e dez centímetros, dois metros, conforme a vontade do dono do poço cava-se, até chegar onde dá água. Se for local de terra mole tem que revestir com tijolo por dentro. Na minha chácara construí um poço com 21 metros de profundidade, sendo que revesti internamente por 10 metros. Ao cavar um poço se encontrar uma camada de rocha muito grande é necessário usar o auxílio de explosivos. Com uma broca é feito um buraco, coloca-se pólvora grossa, na ponta põe-se um pavio. Após a explosão com um feixe de ramos grandes retira-se a fumaça, basta subir e descer com uma corda esse feixe por duas ou três vezes. Uma pessoa cava o poço, outra fica em cima puxando a terra pela corda. O poceiro desce com uma corda amarrada em um ponto firme na superfície, outra corda enrolada na carretilha tem um pedaço de madeira amarrado na ponta, é onde o poceiro senta-se, segurando na primeira corda ele movimenta-se entrando e saindo do poço. Após a profundidade de vinte metros o ar já começa a ficar mais difícil de respirar.
O senhor já construiu chaminé?
Em dois meses construí na Fazenda Matão, de propriedade da nossa família, uma chaminé com 50 metros de altura, o segredo da construção de uma chaminé é trabalhar com o prumo, ele é “prumado” por dentro, por fora tem outro prumo com o desconto, em uma chaminé com 50 metros de altura pode sair de baixo com parede de dois metros de largura e vai afunilando até chegar ao topo com 50 centímetros de cada lado e um metro de boca. O miolo nunca se estreita, se tiver um metro em baixo, no topo terá também um metro. O material sobe por fora da chaminé.







ANTONIO MACIENTE

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS

JOÃO UMBERTO NASSIF

Jornalista e Radialista

joaonassif@gmail.com

Sábado 28 de maio de 2011

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana

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NTREVISTADO: ANTONIO MACIENTE
Em 1970 no Estado de São Paulo houve a fusão da Força Pública com a Guarda Civil e a adoção do nome Polícia Militar. Todas as datas comemorativas da Polícia Militar e até mesmo seu hino mantêm ainda hoje a menção e a memória da antiga Força Pública, pois no processo de junção com a Guarda Civil prevaleceu na corporação a cultura da Força Pública. Antonio Maciente nasceu 21 de maio de 1920 no distrito de Charqueada, filho de Vitório Maciente e Ana da Encarnacion Sota Maciente aos 91 anos conserva as lembranças dos nove anos em que trabalhou como soldado da Força Pública. Com uma memória prodigiosa, lembra-se dos nomes completos de personagens de outrora. Ainda menino, aos 12 anos, já iniciou a lide como tropeiro, conduzindo animais de um lado para outro. Ingressou na Força Pública servindo em diversas localidades do Estado de São Paulo, permanecendo por alguns anos em Piracicaba nos tempos em que a Força Pública mantinha nesta cidade pouco mais do que uma dezena de homens. Sem nenhuma consulta apenas recorrendo a memória ele narra fatos curiosos, cita locais, personalidades alguns até pitorescos como o conhecido João da Curva, pessoa que narrava seus feitos irreais com muita naturalidade. Após desligar-se da vida de soldado ingressou como um dos primeiros funcionários da Faculdade de Odontologia de Piracicaba, onde permaneceu até aposentar-se. Antonio Maciente e sua esposa tiveram seus dias de Romeu e Julieta, apaixonados lutaram muito para permanecerem juntos, na época tiveram que transpor obstáculos impostos aos enamorados. Embora seja muito ligado a família, Antonio atualmente viúvo, conserva sua vida própria, independente, mora sozinho, dando-se ao prazer de ir de ônibus da sua casa situada no centro até um conhecido supermercado localizado na Praça Takaki, não se esquecendo de passar em uma loja de variedades onde adquire as guloseimas das netas e bisnetas. Uma rotina que completa com a visita ás casas dos seus filhos aos fins de semana.

Quando o senhor nasceu a sua família morava em que local?

Morava em uma fazenda de propriedade de Acácio Ferreira, situada no então Distrito de Charqueada, era lavoura de café. São meus irmãos: Osório Benedito, Rosa, Belmira, Sebastião, Aparecida, Maria, Clementina, Benedita, João Batista, todos nós nascemos nas proximidades de Charqueada.

O senhor trabalhou na lavoura?

Até os 12 anos de idade trabalhei na cultura de café, milho, algodão, o meu pai era colono de café.

A partir dos 12 anos que trabalho o senhor passou a fazer?

Fui viajar com tropa, os tropeiros eram Alfredo Rodrigues de Moraes, Domingos Chiaramelo, João Sebe. Mais tarde em Piracicaba trabalhei com o famoso tropeiro José Pretel, que construiu a casa situada na Rua São José esquina com a Rua do Rosário, onde veio a ser gabinete do Prefeito Municipal (Adilson Benedito Maluf) e onde funcionou o Samdu (Serviço de Atendimento Médico de Urgência), e até pouco tempo foi sede da Uniodonto de Piracicaba. Trabalhei como tropeiro até os meus 22 anos. Eu era bom cavaleiro, um tropeiro se interessou pelo meu desempenho e me colocou como “madrinheiro de tropa” que é o cavaleiro cujo cavalo tem um sino dependurado no pescoço e é seguido pelos demais animais da tropa (cavalos, éguas, mulas, burros).

Como era composta a tropa?

Geralmente viajávamos em três tropeiros levando um número variável de animais, 20, 30, 50. Andávamos o dia todo, parávamos em lugares pré-determinados, os proprietários desses locais, chamados de pousos, alugavam os pastos para deixarmos os animais. Dormíamos onde dava até mesmo ao relento, tínhamos o pelego que fazíamos de colchão e o poncho era o nosso cobertor. Viajávamos pela região de Piracicaba: Rio Claro, Botucatu e outras localidades próximas.

O senhor foi jóquei?

Em São Pedro havia uma raia, onde havia as corridas de cavalo, lá eu disputei muitas corridas, tenho 1,60 de altura e sempre pesei 60 quilos.

Quando foi seu ingresso na Força Pública?

Foi nessa época, achei que deveria trabalhar na polícia, havia um decreto recrutando candidatos á soldados da Força Publica, uma comissão veio até Piracicaba onde cadastrou os interessados, nas instalações existentes até hoje na Rua São José esquina com Luiz de Queiroz foi feito o cadastro de mais de uma centena de candidatos. Dormíamos lá, e fazíamos os exames na Rua do Porto, um médico acompanhava as provas de resistência, corridas de 100 metros com pés descalços, 1000 metros calçado com botina ou sapatão, o chão era de terra. De 300 candidatos apenas 106 seguiram para São Paulo, para realizarem exames mais detalhados. Fomos de trem com passagem fornecida pelo Governo do Estado. Dessa centena de candidatos foi escolhida uma dezena, os demais foram dispensados.
Chegando a São Paulo para onde os candidatos se dirigiram?
Fomos para a Avenida Tiradentes esquina com Jorge Miranda, junto ao Primeiro BC (Batalhão de Cavalaria) e o Primeiro BG. (Batalhão de Guarda) na esquina havia a escola de polícia. Após seis meses de estudos, em 1942, eu “passei a pronto”, pedi para trabalhar em Campinas, pois era o batalhão que destacava em Piracicaba.

Como soldado da Força Publica qual foi seu primeiro trabalho em Piracicaba?

Nos tempos da Segunda Guerra Mundial, as usinas de força eram guarnecidas, na região tínhamos diversas usinas de energia em Piracicaba, Carioba, Joaquim Egidio, Salto Grande. Em Piracicaba ainda existe os prédios onde funcionava a usina de força, próxima á Fábrica de Tecidos Boyes. Quando vim trabalhar pela primeira vez em Piracicaba vim para a guarda da usina, eu morava no quartel situado na esquina da Rua São José com Luiz de Queiroz, o prédio permanece ainda lá, em cima funcionava a Força Pública, embaixo no porão era o quartel da Guarda Noturna. Por muito tempo fiz as refeições na pensão do João Buriol, ele era negro, sua esposa chamava-se Escolástica, situava-se na Rua Boa Morte entre a XV de Novembro e Rangel Pestana, aonde mais tarde veio a funcionar o Hotel Brasil. Na esquina da Rua Boa Morte com D.Pedro II havia um posto de gasolina, era o Posto São João, de propriedade do Nathan, e arrendado ao Benedito Rocha, o prédio existe ainda. Por um período de tempo tomei as refeições no Bar São Benedito de propriedade de João Zaia, ao lado da catedral e junto onde hoje existe um supermercado, entre Rua XV de Novembro e Moraes Barros. Naquele local existiam os chamados “expressinhos”, de propriedade da família Gianetti, era automóveis Ford 1941 que faziam viagens de Piracicaba á São Paulo, era o único meio de transporte rodoviário para São Paulo, não existia linha de ônibus.

Como era o leito das ruas de Piracicaba nessa época?

Era chão de terra com pedregulho, um determinado vereador não dizia “pedregulhar a cidade” e sim “apedrejar a cidade”.

Quando o senhor se casou?

Casei em 1 de dezembro de 1946 com Zoraide Conceição, como na época a catedral estava em reforma o meu casamento foi celebrado na Igreja São Benedito, tive como padrinhos Antonio Oswaldo e Serafim Tricânico proprietário de dois ônibus que faziam a linha de Piracicaba a Torrinha. Fomos residir na Rua D.Pedro II próximo a Rua Boa Morte, em frente ao Externato São José. É anterior a minha época, mas diziam que ali havia carrinhos de tração animal que transportavam quem os contratasse, á semelhança dos carros que servem como taxi. Contava-se na época que Nhô Felix tinha ali um carrinho de aluguel, era um carrinho muito bonito, puxado por um cavalo também muito bonito, com isso todo mundo dava preferência ao carrinho de Nhô Felix. Por esse motivo o cavalo trabalhava demais. Isso gerou uma referência, quando a pessoa sentia que estava trabalhando demais ela dizia: “- Você está pensando que eu sou cavalo de Nhô Felix?”

Nessa época o senhor era soldado, como era a farda?

Usava-se sapatão onde era encaixada a perneira, usava-se culote, que era uma calça sem barra, era amarrada embaixo, em seguida tinha a túnica e o quepe. A túnica tinha sete botões, o quepe tinha a figura de dois fuzis cruzados. Na cintura tinha um revolver Colt Cavalinho calibre 38, tambor de seis tiros, oxidado. Levava também um fuzil que tinha um pente com 5 balas. Durante todo o tempo em que estive no Oitavo BC em Campinas eu tive um fuzil, para onde eu fosse como destacado ou em diligencia eu levava esse mesmo fuzil. Aos 23 anos fui destacado como soldado em Santa Maria da Serra, na época uma pequena vila, havia um cidadão de nome Antonio Ribas, trabalhador de roça, que respondia pela segurança da localidade, fazia as vezes de delegado, eu era a única força policial local.

Em que local o senhor se hospedava?

Eu morava na cadeia. Na pensão de Olimpio de Campos eu tomava minhas refeições. Eu preferia dormir na cadeia onde tinha mais conforto e segurança. Não havia ninguém preso. Naquele tempo ninguém tinha chuveiro quente, tomava-se banho em uma bacia. Quando estive no quartel em São Paulo existia o banho de chuveiro, porém com água fria. Na cidade de Piracicaba não existia chuveiro elétrico, a energia elétrica distribuída não suportava a instalação de chuveiro.
O senhor trabalhou em Limeira?

No tempo da Segunda Guerra trabalhei na Machina S.Paulo em Limeira, dizia-se que era indústria de material bélico, de propriedade do Dr. Trajano de Barros Camargo, a empresa era guardada por 10 soldados, as refeições eram feitas em uma pensão da cidade, foi adaptado um quarto para os soldados dentro da própria indústria.

O senhor estava aquartelado em Campinas?

Estava, até que veio uma comissão para selecionar soldados para completar o batalhão de São Paulo. Pela ficha sanitária dos 1800 soldados existentes em Campinas, Geraldo Arruda que era da cidade de Rio das Pedras e eu, fomos os selecionados para integrar o Primeiro BC, em São Paulo.

Qual foi o local em que o senhor passou a trabalhar?

Fui prestar serviços no Carandiru, no bairro Santana., ficava na muralha vigiando os presos, com o fuzil embalado. Permaneci trabalhando lá por uns três anos. Dormia no quartel na Avenida Tiradentes. Todos os dias um grupo de 30 soldados saia do quartel e ia até o Carandiru, a pé.

O senhor conheceu Meneghetti?

Cheguei a ver o famoso ladrão Gino Amleto Meneghetti, era um homem de estatura pequena, mas muito esperto.

O senhor trabalhou em Pirassununga?

Em Pirassununga havia uma escola voltada ao ensino agrícola, a grama dos jardins dessa escola foi plantada por presos de guerra. Éramos em 14 soldados para cuidar de pouco mais de duas dezenas de presos italianos, eles foram aprisionados quando estavam no navio SS Conte Grande. Foi feito um cercado eles não podiam fugir de lá. Tinha um alojamento de presos e outro menor para os soldados. Eram presos que não ofereciam nenhum perigo, tinhamos uma relação muito cordial, havia um soldado que era o nosso cozinheiro e um preso italiano que era cozinheiro dos presos, muitas vezes fui comer no alojamento dos presos, a comida era bem melhor. Isso foi no tempo em que Fernando de Souza Costa era o interventor no Estado de São Paulo.

Em que ano o senhor voltou á Piracicaba?

Fui destacado para Piracicaba em 1944, fiquei alojado no quartel situado na esquina da Rua Luiz de Queiroz com São José. Nessa época a cidade não tinha calçamento, só havia pedregulho na cidade. Como soldado trabalhava a pé. Por muito tempo trabalhei na Caça e Pesca, os fiscais eram Geraldo Pinto de Almeida e Nonô, ambos civis.

O senhor conheceu João da Curva?

Conheci-o e o irmão dele o Titi. João da Curva morava na Rua Alferes José Caetano, entre as Ruas D. Pedro I e Rua Ipiranga, era proprietário de um rancho de pescaria, Estive no rancho dele varias vezes, era um bom cozinheiro. Entre as muitas histórias que ele contou, uma delas foi a seguinte: “Ele foi fazer uma necessidade orgânica, tirou o relógio do pulso e colocou em uma pequena árvore, após satisfazer a necessidade, saiu e esqueceu o relógio. Passados 10 anos ele lembrou-se, voltou ao local, a árvore estava crescida, grande, foi quando ele viu lá no alto o relógio, escutou tic...tic...tic....o relógio trabalhando!”. Ele passou a ser chamado de João da Curva pelo causo que ele contou para muita gente, inclusive para mim, dizia que queriam matar um veado, na hora em iam atirar o veado fazia uma curva e erravam o tiro. O que ele fez? Entortou o cano da espingarda, quando o veado fez a curva ele atirou, acertando o veado. Isso ele contou para mim!

O que o senhor disse á ele?

Apenas dei risada! Não queria perder o amigo. Ele contava tudo isso muito sério.

Quanto tempo o senhor permaneceu na Força Pública?

Trabalhei por nove anos, dei policiamento quando Getúlio Vargas, Brigadeiro Eduardo Gomes, Luis Carlos Prestes estiveram em Piracicaba. Quando o Partido Comunista foi fechado em Piracicaba eu tomei posse do prédio em nome da lei, localizava-se em uma rua existente onde mais tarde foi construído o Comurba e hoje abriga o Poupa Tempo. Conheci Adhemar de Barros, o primeiro delegado regional de Piracicaba Dr. Calmon de Brito foi até um rancho de pescaria, onde Adhemar estava pescando, sem camisa, chinelo, shorts, foi Dr. Calmon quem cuidou para preservar a privacidade de Adhemar, achei um gesto muito bonito.
O senhor fez muitas prisões em Piracicaba, pode citar algum nome em especial?

Prendi Pedro Lopes, um conhecido ladrão de cavalo, recebemos a denuncia de que ele estava em Pirassununga, tomei um carro de aluguel (taxi) e fui até aquela cidade onde dei voz de prisão a ele. Na noite de 29 a 30 de agosto de 1945 estavam presos Pedro Lopes, Mathias Gonçalves e Sérgio Bandido, três malfeitores que batiam, roubavam e matavam. Eu era responsável pela guarda, também chamado de “cabo de guarda”. Desconfiei do comportamento dos presos, alertei os dois soldados que estavam subordinados as minhas ordens. No dia seguinte Pedro Lopes teve a fuga facilitada por outro cabo de guarda, que foi expulso da polícia.

Em que ano o senhor deixou a polícia?

Foi em 1949. Fiz uma abordagem á um marginal armado de revólver que apontava a mesma á cabeça de um refém, com um golpe só desarmei-o. Ele foi ferido, correu um processo, onde por interferências políticas fui afastado da Força Publica. Mais tarde tive reconhecido meu perfeito desempenho na ação, e poderia ser reintegrado, mas já estava trabalhando em melhores condições na Faculdade de Odontologia de Piracicaba, onde permaneci por 26 anos, como responsável pela manutenção e almoxarifado. Na FOP convivi com grandes nomes como Prof. Liberalli, Prof. Antonio Carlos Nedeer, Profa. Clotildes Fernandes, Prof. Miguel Morano Júnior, Prof. Eduardo Daruge, Prof Waldemar Romano e tantos outros.





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