sexta-feira, junho 28, 2013

DEBORA FERNANDA DA SILVA NUNES

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 29 de junho de 2013
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/


ENTREVISTADA: DEBORA FERNANDA DA SILVA NUNES



Debora Nunes é atleta da Seleção Brasileira de Tae kwon do. Uma vencedora dentro e fora dos palcos de luta. Nas competições esportivas internacionais tem os famosos “membros da delegação” que em grande parte nada tem a ver com o esporte, apenas vão para desfrutar as mordomias da viagem, infelizmente alguns são vistos apenas nas viagens. Isso ocorre nas mais diversas modalidades esportivas. Sabe-se que o atleta deve receber dois capacetes, um azul outro vermelho, por medida de economia talvez, lhe é fornecido apenas um capacete de uma única cor. O Brasil tem grandes valores em todas as áreas esportivas, tem recursos financeiros, o que não existe é um emprego racional e efetivo desses recursos com o propósito de alavancar outras modalidades de esportes. O esporte assim como a cultura fortalecem uma nação. Quem deve tomar frente desssas iniciativas é o poder público e não a poderosa mídia dos grandes centros. Não existe uma preocupação com as reais necessidades do atleta, é um quase “se vire como pode”. Quando o atleta com esforço sobre-humano consegue galgar um lugar de destaque muitos querem pegar carona no sucesso alheio. É o velho ditado: “Quando o filho é bonito todo mundo quer ser o pai”. Muitos atletas iludem-se achando que ao atingir o auge se realizarão, na realidade são apenas integrantes de uma grande engrenagem, de certa forma são manipulados. Mais conhecida como Debora Nunes, filha de Claudete da Silva Nunes e Francisco Nunes nasceu a 19 de junho de 1983 em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, tem 1,75 metros de altura. Tem uma irmã de 20 anos e um irmão de 25 anos. Debora fez seus estudos na Escola Municipal Grande Oriente do Rio Grande do Sul e no Colégio Estadual Dom João Becker. Iniciou seus estudos na Universidade Feevale localizada no município de Novo Hamburgo.




Que curso você realizou na Feevale?


Iiniciei curso de Educação Física, mudei para São Paulo, continuei fazendo a faculdade na UNIP. Tudo através do esporte, sempre com bolsa de estudo. Acabei concluindo o curso aqui na UNIMEP em Piracicaba.


Você pratica qual esporte?


Tae kwon do .(Taekwondo também grafado taekwon-do ou TKD).


O que a levou a praticar esse esporte?


Minha mãe sempre quis que eu fizesse algum esporte de defesa pessoal. Sempre fui muito franzina, muito magrinha, as vezes voltava para casa chorando, vitima de alguma brincadeira ou discussões próprias de crianças. Um dia minha mãe disse-me: “- A partir de hoje você não vem mais para casa chorando!” Fui em busca de uma arte marcial, iniciei no judô, após uns seis meses não quiz mais. Um vizinho treinava Tae kwon do, disse-me: “Não desista não! Venha treinar comigo, vê se você gosta!”. No inicio relutei um pouco, ele foi me convencendo, iniciei com ele, seu nome é Francisco Godoi, foi meu primeiro professor, ele devereia ter uns quarenta anos. Ele convidou umas amiguinhas minhas, e montou uma turminha na garagem do prédio. Inicialmente improvisamos uns uniformes que nem eram da modalidade, às segundas, quartas e sexta-feiras ele dava o treinamento.


Como funciona essa arte marcial?


É uma arte marcial olímpica que trabalha muito a questão de chutes, pés. Mão muito pouco. Hoje com a implantação dos coletes eletrônicos você chuta em uma potência e afere o ponto. Não há mais a necessidade dos árbitros darem os pontos. Cada categoria tem uma potência. O soco passou a fazer parte também.


Vocês usam algum tipo de protetor?


Usamos protetor de peito, de canela, de antebraço, protetor genital, luva, capacete e protetor bucal.


Hoje o que a leva a praticar o esporte?


Eu tinha o sonho de participar de uma olimpíada. Em 2008 fui para a olimpíada. Em 2005 fui convidada para morar em São Paulo. Inicialmente morei no alojamento do Clube Rosa Mística em São Bernardo do Campo. Esse clube dava apoio para o clube de São Bernardo do Campo. Morei lá oito meses.




O que a trouxe do Rio Grande do Sul para São Paulo?


Em Porto Alegre eu treinava e trabalhava na Academia Lee, o mestre chama-se In Kyu Lee. Dava aula, trabalhava na recepção. Abria a academia, fechava a academia. Isso foi após eu estar treinando com o Francisco “Chinês” Godoi, eu estava super bem, ele então me disse: “ Debora, você tem muito potencial, só que aqui comigo não irá crescer, não tenho como fazer exame de faixa, com graduá-la, mas vou te levar para a academia onde eu treino”. Foi assim que fui para a Academia Lee. Isso foi em 1996.



Já a convidaram para desfilar em passarela como modelo?


Já participei de desfiles, fiz curso de modelo, em função da altura, pelo fato de ser magra. Mas não é uma área que pretendi seguir carreira. Um dos motivos pelos quais desisti é que tinha que emagrecer três quilos. Pensei: “Estou fora disso, já sou magra, vou ficar esquelética!” Fui competir Tae kwon do, eu pesava 57 quilos, hoje meu peso são 67 quilos.


Você é bem magra, isso é bom ou ruim?


Para o Tae kwon do isso é ótimo ser alta e magra, é o biotipo. Perna longa, magra e alta, ganha na questão de envergadura , distância. Uma adversária menor tem muito mais dificuldade em me acertar do que eu acertá-la.


Qual é a potência do seu soco?


Soco a gente não afere, aferimos o pé. Existe uma escala de potencia introduzida pelos coreanos.


Se você acertar o pé de forma bem colocada pode causar danos?


Machuca! Graças a Deus nunca precisei usar e nem quero utilizar. Só em competição mesmo.


Dentro de competições você já chegou a provocar alguma lesão na adversária?


Quebrei o nariz de uma menina, quebrei o braço de outra. Isso acontece em decorrência do contato, o capacete deixa a face desprotegida. O nariz é um dos pontos mais vulneráveis. O maxilar também é muito exposto.


Quanto tempo você permaneceu treinando com In Kyu Lee?


De 1996 até 2005. Lá disputei muitos campeonatos estaduais. Antes de vir para São Paulo, teve um ano em que decidi disputar uma seletiva, tem que se fazer diversas seletivas para poder chegar na seleção brasileira. Busquei ranking no Sul para poder vir à seletiva. Buscar ranking significa realizar pontuação. Só que quando chegou o campeonato ou eu ia para a seletiva ou ia para o brasileiro representando o Sul. Eu só tinha dinheiro para ir a um dos dois. Pensando bem, e aconselhada pelo In Kyu, fui para o Campeonato Brasileiro, fui classificada em primeiro lugar na categoria até 55 quilos, issso foi em 2003.


Apareceram muitos interessados em patrocinar seu trabalho?


Nada! Só teve dirigentes querendo tirar fotografia ao meu lado.


Nessa hora eles prometem muita coisa?


Sim. Dizem que vão dar apoio, estão pleiteando um patrocinador novo. Eu acreditava, hoje já não acredito mais.


Porque o futebol atrai tanto enquanto outros esportes são tão carentes de recursos? É a mídia que provoca isso?


Acho que em parte é a mídia que determina e também o fator cultural. Quando uma mãe tem um filho a primeira coisa que ela faz é colocar o filho em uma escolinha de futebol. O sonho dela é que o filho siga praticando futebol.


Isso sem contar que com apenas uma bola podem participar até 22 crianças.


Tem isso também. Pode-se jogar em qualquer lugar.


Muitos pensam que irão ficar ricos jogando futebol.


Exatamente, é a esperança.


Qual é o tempo de vida útil de um praticante de arte marcial Tae kwon do?


Masculino vai até mais longe, uns 35 a 36 anos. Feminino é um pouquinho mais complicado, geralmente até uns 31 a 32 anos.


Geralmente são solteiras sem filhos?


O que acontece é isso, a mulher casa, tem filho. O homem consegue ter filho e continuar, para a mulher pesa esse lado família, o fato de ser mãe.


Você é casada?


Sou casada com Frederico Mitooka, mestre de Tae kwon do e técnico. Ainda não tenho filho.


Como é treinar com o marido?


É complicado, a cobrança é muito maior. Ele sempre exige mais de mim. A expectativa é sempre maior de que tudo seja melhor.



Você faz parte da Seleção Brasileira de Tae kwon do?


Já faz nove anos que sou titular da Seleção Brasileira. Em 2004 passei a ser titular, isso ocorreu porque uma atleta da categoria sofreu uma lesão, estavam reunidas, treinando para o mundial. Se não me engano foi em Londrina. Chamaram duas atletas, para treinar e participar de confrontos para ver quem iria no lugar dessa atleta. Uma menina do Pará e eu fomos convocadas. Treinamos juntas, depois fizemos uma seletiva onde eu ganhei e fui para o mundial em Madrid. Passei a integrar a Seleção Brasileira.


Quantos atletas fazem parte da Seleção Brasileira de Tae kwon do?


Dezesseis, sendo oito masculino e oito feminino. Existem dois técnicos que acompanham.


Em Madrid você ficou hospedada em hotel?


Fiquei em um hotel de excelente qualidade.


O integrante da seleção tem alguma remuneração?


Pela Lei Piva é destinado um salário para as atletas. Na época era de 600 reais. Em 2010 com a entrada da Petrobrás estipularam rankings e dentro de cada ranking cada um tinha um salário. O valor mais baixo acho que era R$ 1.200,00 e o mais alto R$ 3.000,00. Se você for pagar seu preparador fisico, seu fisoterapeuta, viagens, suplementação nutricional, material, verá que tem que tirar dinheiro do próprio bolso. A confederação é patrocinada pela Petrobras, foi informado que a Petrobrás liberou 10 bolsas das 16 que então patrocinava. Cortaram seis bolsas. Eu e outra atleta da nossa academia estamos dentro desses seis que foram cortados. Alegam diversos critérios que qualquer um poderia ser enquadrado nesses critérios. Não existe uma explicação clara dessa exclusão.



Você está com 30 anos, isso a deixa dentro da faixa etária competitiva?


Posso afirmar que sou uma atleta mais experiente. Se ganha na experiência.


Quais são seus planos para o futuro?


Poderia prolongar por mais alguns anos a minha participação em competições, mas não pretendo levar isso adiante por muito tempo. Pretendo trabalhar na academia, dar aulas. Acho que tenho muito a passar, do que já vivi. Considero uma forma valiosa com a qual posso ajudar. Contribuir com as novas atletas. Sempre me preocupei em fazer uma faculdade para quando chegasse a hora de deixar de competir ter novos horizontes.


Você tem quantas medalhas de ouro em seletivas?


Tenho nove medalhas de ouro em seletivas. Hoje as seletivas são mais importantes do que o campeonato brasileiro. Em 2004 ganhei a medalha de ouro no Campeonato Brasileiro.


O esporte a realizou financeiramente?


Posso afirmar que tenho uma vida mais tranqüila do que antes, quando iniciei. Tudo que consegui foi graças ao esporte.


Você transmite serenidade, isso é em decorrência do esporte?


Acredito que é uma característica pessoal, mas que o esporte também contribui muito para que isso ocorra. O Tae kwon do dá muito isso, a questão da disciplina, autocontrole, perseverança.


O fato de ser um ambiente onde se pratica arte marcial traz a imagem de um local onde a violencia está presente, e é exatamente o contrário.


Isso ocorre porque a pessoa não conhece o local. Há um ambiente harmonico.



Em algum momento você pensou como seria se tivesse seguido a carreira de modelo?


Possivelmente teria ganhado mais dinheiro, mas não teria vivido o que vivi. Nunca parei para contar quantos países conheci, mas foram muitos.


Como se deu a sua mudança para Piracicaba?


Foi após conhecer o Frederico em um campeonato na Grécia, lá nos conhecemos e fomos mantendo contato. Eu morava em São Paulo quando começamos a namorar. Ele me convidou para vir disputar os jogos abertos por Piracicaba. Lutei por Piracicaba por dois anos. Por outras cidades disputeis diversos anos, há muitas cidades que investem no esporte. Se não me engano, Piracicaba em Jogos Regionais é oito vezes campeã em Tae kwon do. Temos um núcleo de alojamento com 12 atletas no total. Tem gente do Ceará, da Bahia, Espirito Santo disputando por Piracicaba. E moram aqui na academia. Recebem uma ajuda de custo, a cidade mantém um núcleo, apoia diversos esportes.


Não há uma divulgação maçiça como ocorre com o futebol?


Mas existe uma cobrança muito forte de medalhas!


Hoje os pais se preocupam muito com os filhos, a questão da disciplina, para contribuir geralmente os pais trabalham e não tem como estar sempre por perto dos filhos. O Tae kwon do pode ajudar na formação do jovem?


Acho que sim. Parto do principio de que o Tae kwon do é uma filosofia de vida. O trabalho com as crianças envolve muita disciplina. Tem que haver repeito aos mais graduados. Tem que pedir para poder falar.


Qual é a idade mínima para iniciar?


Tres anos. Idade máxima não existe. Temos alunos de tres anos até com mais de sesssenta anos.


Quantas faixas existem?


É uma realização trocar de faixa. São nove faixas: branca, amarela, amarela ponta verde, verde, verde ponta azul, azul, azul ponta vermelha, vermelha, vermelha ponta preta e a preta. Depois tem primeiro, segundo, terceiro e quarto dan. Quarto dan já é mestre. Os nomes dos golpes, a contagem é tudo em coreano. Para entrar na sala é feita uma saudação pedindo permissão para entrar na sala. No final comprimenta-se os professores, assim como a cada um que estava na aula com você. Ha 10 anos fazemos trabalho principalmente com crianças. Quem quiser conhecer um pouco mais do esporte pode entrar em contato pela internet através do site www.dojannippon.com


Como boa gaúcha você gosta de churrasco?


Amo churrasco. Tomo chimarrão. Meu esposo é vegetariano. Ele tenta me convencer, mas parece impossível, está no meu sangue. Quando saio do Brasil gosto de experimentar as coisas, na China experimentei grilo assado, tem gosto de terra.








domingo, junho 23, 2013

HERBERT BARBOSA DE MATTOS

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 22 de junho de 2013
Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/


ENTREVISTADO:HERBERT BARBOSA DE MATTOS

Herbert Barbosa de Mattos é filho de José Alves de Mattos e Lázara Pires Barbosa, nasceu a 8 de dezembro de 1940. Sua mãe era professora primária e seu pai dentista formado pela Faculdade de Odontologia de Piracicaba então denominada “Washington Luiz”. Após exercer a profissão como dentista, seu pai decidiu optar em ser proprietário de farmácia exercendo a atividade de farmacêutico. A sua primeira farmácia foi em Artemis, naquela época chamada de Porto João Alfredo, isso no tempo em que a malária afetava a saúde pública, década de 30. Inclusive ele foi vítima da doença. Um dos seus conhecidos era o pai do atual vice-prefeito de Piracicaba, João Chaddad. Em agosto de 1941 José Alves de Mattos transferiu-se montando uma farmácia ma Rua Benjamin Constant, ficava entre a Avenida do Café e a Avenida Dr. João Conceição.


Como se chamava a farmácia?


Era a Farmácia Mattos, a primeira farmácia da Paulista foi a dele. Até duas casas acima, antes de chegar na Avenida do Café do lado esquerdo não havia nada. Era o muro do pasto do Pedro Ferrari. Quando a minha família mudou-se eu tinha oito meses de idade.


Ali em determinada época foi o depósito de entulho da cidade?


Foi em um período anterior, nessa época as crianças iam lá garimpar ferro, osso, vidro, para vender para o ferro-velho situado na Avenida Independência entre a Rua Benjamin Constant e o Córrego Itapeva. Era o ferro velho do Rodrigues, descendo, do lado esquerdo da Rua Benjamin Constant.


Na Avenida São Paulo também havia pouca coisa?


Tinha o Pompermayer que morava em frente ao campo do Paulista, era um brejo, virando a Rua Benjamin Constant e entrando na atual Avenida São Paulo não havia ninguém, era estrada ali. Do lado esquerdo não existia nada, do lado direito havia a Fazenda do Ditoca, bem mais acima.


Seu pai montou a farmácia no tempo em que o farmacêutico manipulava os remédios?


Quase tudo era feito na própria farmácia. A maioria era através de receituário formulado pelos médicos da época: Dr. Correa, Dr. Samuel. A letra mais difícil de compreender era a do Dr. Samuel, lembro-me de que eu tinha até a pouco tempo um óculos que precisávamos usar para conseguir ler a receita. O meu pai estava acostumado, vinha de farmácia, tinha feito farmacologia.


Era o tempo em que na farmácia havia inúmeros frascos, cada um com uma finalidade, você conserva algum desses vidros?


Não tenho quase nada, conservo daquele tempo um aparelho em que naquela época fazíamos cápsula antigripal. Era preparada a aspirina, apertada bem no aparelho, colocava em uma cápsula. Havia um vidro com uma telinha, onde havia água, a outra parte da cápsula passava na água, colocava em cima, e fechava a cápsula. Fiz muito disso ai. Assim como pomadas, xaropes.


Havia um consumo muito grande de xarope?


Tinha! A nossa era a única farmácia que havia na Paulista, na Rua do Rosário não tinha nenhuma. Meu tio, Nelson Alves de Mattos, montou a Farmácia São Judas Tadeu bem depois. Ele foi sócio do meu pai em Artemis, meu tio começou a exercer a profissão em Gália, com o cunhado dele. Como só havia a farmácia do meu pai, todo o pessoal da zona rural vinha ali. Lembro-me de uma característica do Dr. Correa, ele ia atender o paciente de taxi, não utilizava seu automóvel. A corrida do taxi era paga pelo cliente. Muitas vezes a noite, chovendo, ele vinha com o marido da paciente ou alguém da família da pessoa enferma, parava na farmácia, desciam, para fazer a receita. As vezes meu pai dizia: “- Dr. não tem esse produto, posso substituir por este outro?”. O médico então dizia: “- Pode Mattos, pode sim!”. Ele fazia a receita enquanto a pessoa descia, para levar o Dr. Correa até a sua casa, meu pai preparava, deixava tudo pronto para a pessoa passar e levar. No sítio, na parte sul do município, todo mundo conhecia meu pai.


Na época ali era tudo chão de terra?


A Rua Benjamin Constant era calçada com pedregulho.

                                          José Alves de Mattos e Lázara Pires Barbosa

Em que escola a sua mãe lecionava?


No Grupo Escolar Moraes Barros, para ir lecionar tomava o bonde na Avenida Dr. Paulo de Moraes, ia até o centro e dali ia até o grupo. Nas imediações da farmácia já havia a Padaria Cruzeiro, a fábrica de barcos do Ferrari, a carpintaria e marcenaria do Chico Carretel em sociedade com o Gobeth.


Naquele tempo o farmacêutico era praticamente o médico das famílias?


Eu fui ao médico quando era nenê, no Dr. Tito. Depois em agosto de 1945 fui ao hospital quando quebrei a perna.


Como você quebrou a perna?


Todos os domingos eu e a minha mãe íamos à casa da minha avó. Minha tia também ia. A família reunia-se na casa da minha avó, lá no Bairro dos Alemães, no fim da Rua Saldanha Marinho, ela não continuava, parava na Rua São João. Minha mãe saiu, meu pai tinha saído, eu estava com uma peteca na mão, ia levar para brincar na casa da minha avó, bati a peteca, havia umas árvores com um quadradinho de madeira em torno delas como proteção, fui pegar a peteca, havia enroscado, sem querer bati a canela, trincou. Fui levado para casa, meu pai me levou no dia seguinte até a Santa Casa. Tiraram radiografia, estava trincada, engessaram. Era época da guerra, a gasolina estava racionada, Dr. Toledo que disse: “- Mattos! Eu os levo!”.


Na esquina da Rua Benjamin Constant com Avenida Dr. Paulo de Moraes havia casas?


Nas duas esquinas havia casas construídas uma de João Elias, que morava em um sobrado com sua irmã Amélia, ambos eram solteiros, além de uma irmã que casou-se com o Macluf, e na outra esquina era o Bar do Latiffe Naime, pai do Walter Naime, onde hoje é uma casa de peças. Do outro lado, onde hoje existe uma farmácia, residiam os barbeiros Nelson e Antonio Marconi, irmão do Milico, que mais tarde teve salão de barbeiro na Rua Governador Pedro de Toledo esquina com a Rua Joaquim André. Ali também havia o João Fustaino que tinha uma sapataria. Os Filetti já estavam estabelecidos com fecularia na Avenida Dr. Paulo de Moraes.


Até que ano seu pai teve a farmácia na Rua Benjamin Constant?


Ali ele ficou até 1951, nesse salão, ai ele mudou para outro quarteirão quase na esquina com a Avenida São Paulo. Onde hoje tem um bar. Era em frente ao Angeli, que teve ali um bar. Depois quem mudou ali foi a família do Cristóvão Martins. Para onde meu pai mudou era a fábrica de balas do Benedito (Dito) Baglioni. Ele teve inicialmente a fábrica de balas do lado direito, onde é a sapataria do Cella, passando um pouco, onde há uma bicicletaria ao lado, era a fábrica de balas do Benedito. Ele saiu de lá, comprou do lado esquerdo da Rua Benjamin Constant. Ele fechou a fábrica de balas e acabou vendendo para o meu pai que se mudou para o salão enquanto construía a farmácia ao lado. Onde era a fábrica de balas meu pai construiu um bar, com bocce, e alugou. Ali meu pai permaneceu até 1957. Foi quando ele vendeu para o “Lico da Farmácia Neves”. O meu pai foi para Santa Terezinha, bem na esquina da praça. Ali ele ficou até 1974, acredito que mais. Sempre com o nome de Farmácia Mattos.


Nesse período você cresceu e foi estudar em que escola?


Minha primeira escola foi o Externato São José, localizado no prédio onde mais tarde funcionou a Escola de Odontologia de Piracicaba, Ali fiz o primeiro ano e metade do segundo ano, minha primeira professora foi Ruth Pilli , foi ela quem me alfabetizou. Eu descia de bonde, na época dava certo, ia com a minha mãe. Descia na esquina, ia pra o colégio e minha mãe seguia para a escola para lecionar. Na volta ela passava e me pegava. Íamos até a esquina da Rua XV de Novembro com a Rua Boa Morte, pegávamos o bonde e íamos para casa. Na esquina da Rua D. Pedro II com a Rua Boa Morte, havia um posto de gasolina, do Lú, o nome dele era Rocha, sogro do Samir que é professor da Faculdade de Odontologia. O prédio existe até hoje. O segundo semestre do segundo ano fui estudar no Grupo Escolar Moraes Barros, minha professora foi Dona Helena Pousa. No terceiro e quarto ano foi Maria José (Zizinha) Verderesi. O irmão dela, João Verderesi, foi assessor do deputado Pacheco Chaves. Em 1950 me formei. Ano do cinqüentenário do Grupo Moraes Barros. Tive a satisfação de cinqüenta anos, depois em 2000, participar das comemorações do centenário do Grupo Moraes Barros. Conclui o grupo com nove anos, naquela época a lei não permitia que aquele que fizesse dez anos depois de junho entrasse no ginásio. Com isso não pude prestar exame para entrar no ginásio. Estudei um ano inteiro de curso preparatório por causa da idade. Fiz na primeira turma do Colégio Dom Bosco, que funcionava ao lado da Igreja dos Frades. No “coléginho” como chamávamos. Na esquina da Rua Alferes José Caetano com a Rua São Francisco de Assis (que antes se chamava Rua Saldanha Marinho) tinha um salão de reuniões, de catecismo, era também onde havia um cineminha onde domingo a tarde passavam filmes para a turma que estudava catecismo. No fundo tinha um campinho de vôlei que a turma do Dom Bosco ia jogar antes de começar a aula. As quermesses eram feitas em frente a Igreja dos Frades, na praça. Só que era fechado. Tinha grade, porque o pessoal do sítio naquela época vinha de charrete e deixava o carrinho com o cavalo no lado interno.


Ao lado do coléginho, na década de 60 havia quermesses, o que funcionava ali anteriormente?


Era o campo de futebol dos cordigeros. Ali embaixo, atravessando a Rua Alferes José Caetano havia um túnel que levava ao vestiário no outro lado da rua.


Você chegou a passar por esse túnel?


Oh! Joguei muita bola lá. O túnel deve existir até hoje, devem ter fechado ambas as entradas. Esse túnel saia do campinho de futebol e ia do outro lado, no vestiário atrás da igreja. Ao lado da Igreja dos Frades, além da calçada, existe um degrau com uma segunda calçada, era fechado com muro e aberto em cima sem telhado. Ali era o vestiário da turma que jogava bola. O vestiário não tinha comunicação com a igreja.


Esse túnel era iluminado?


Não era pelo fato de ser aberto em ambas as extremidades e relativamente pequeno. Só para passar debaixo da rua.


Você chegou a ser coroinha?


Fui coroinha um ano na capela das freiras do Lar Escola Maria Nossa Mãe, na Rua da Boa Morte, no Do Bosco, no Colégio Assunção, eu não era coroinha na Igreja dos Frades. Eu tinha 10 anos, foi quando entrei no Colégio Dom Bosco, em fevereiro de 1951. Os padres do Dom Bosco passaram a dar assistência religiosa tanto na Colégio Assunção como no Lar Escola, a missa era as seis horas da manhã no Lar Escola. No Assunção era aos domingos, onde havia a missa dos alunos. Eu morava na Rua Benjamin Constant, saia de casa as 5:30 da manhã, naquele tempo a Avenida Dr. Paulo de Moraes era uma escuridão, tinha muitas árvores, era uma rua calçada com paralelepípedo com um enorme tanque onde os animais que tracionavam as carroças vinham beber água. A missa terminava a sete horas, as irmãs davam café, eu andava pelo pomar que existia lá e depois vinha embora para casa. Fiz isso todos os dias nesse período de um ano e pouco. Com a mudança do Dom Bosco para o local onde se encontra, passei a ajudar missas apenas lá. O Colégio Dom Bosco tinha o compromisso de iniciar suas atividades naquele local em 1952 ou perderia a concessão do terreno. Lá estudei o ginásio e o curso científico.


Você chegou a conhecer Mamãe Cecília, ou Madre Cecília?


Conheci, ela é parente nossa. Tanto que quando fizeram a documentação para o processo de canonização dela vieram conversar com o meu pai.


Ao terminar o curso científico, você já sabia qual seria a carreira a seguir?


Conclui em 1959 o científico, meu pai queria que eu fizesse medicina. Com uns três colegas fomos fazer cursinho para prestar vestibular, morei em uma pensão em frente ao Cine Regina que depois se tornou auditório de TV do Silvio Santos, na Avenida Brigadeiro Luiz Antonio, o cursinho era na Liberdade. Ao lado da pensão onde morava ficava o Restaurante Zillertal, a Federação Paulista de Futebol. Permaneci por dois anos morando em São Paulo. Percebi que não tinha vocação para fazer medicini, prestei exame na ESALQ e em 1963 entrei para a faculdade. Sou formado na turma de 1967. O CALQ – Centro Acadêmico Luiz de Queiroz mudou para prédio próprio no ano em que entrei. Antes era na Rua Prudente de Moraes onde hoje é o HSBC. Ficava no andar superior. No meu tempo foram diretores da ESALQ o Malavolta, o Salim e o Galli.


Ao sair formado como engenheiro agronomo qual foi o seu primeiro emprego?


Sai da faculdade e fui trabalhar na Ultrafertil o presidente da empresa era Pery Igel.Era uma empresa multinacional de origem norte mericana. A Ultrafértil veio com a mentalidade da venda técnica, contrataram agrônomos, que iam conversar com os fazendeiros em suas fazendas, realizavam análises de solo e recomendavam o uso do produto adequado. A Ultrafértil trouxe o que não existia na época: adubo concentrado, a quantidade utilizada era muito menor do que a quantidade utilizada normalmente.


A origem da matéria prima do fertilizante é totalmente nacional?


Não. Fósforo existe alguma coisa, mas a maioria vinha do Marrocos. Potássio, Nitrogênio e o Fósforo é o básico de qualquer fertilizante. Permaneci um ano e meio na Ultrafértil. O Dr. Dimer Accorsi, irmão do Dr. Walter Acccorsi, era diretor do Ensino Agrícola, em São Paulo, eles estavam ampliando, só existiam Colégios Agricolas em São Manoel, Jaboticabal, Jacarei e Espírito Santo do Pinhal. Contratado fui dar aula no Colégio Agrícola de Santa Rita do Passa Quatro. Lá fiquei pouco tempo, saiu o concurso do Instituto de Zootecnia de Nova Odessa, que é do Parque da Água Branca. Passei no concurso, permaneci de 1969 até outubro de 1993, onde me aposentei.


Você conheceu sua esposa em que ano?


Conheci minha esposa Maria Cecília Teixeira de Mattos no carnaval do Clube Cristóvão Colombo, quando ainda era na Rua Governador Pedro de Toledo, em fevereiro de 1964. Casamos na Igreja São Judas Tadeu, no dia 29 de junho de 1969. Temos dois filhos: Waldssimiler e Wlastmiler.


Você pratica algum esporte?


Pratiquei até 2004, jogava futebol, pratiquei todo tipo de esporte, mas a minha paixão sempre foi jogar bola.


Como você vê a realidade dos Centros Acadêmicos atuais?


Algumas decadas passada, por exemplo, o estudante que estava em Piracicaba e tinha sua família em Ribeirão Preto, para sair daqui e ir até lá, o estudante levava quase um dia de viagem. Ia daqui para Limeira, de Limeira à Pirassununga e de lá para Ribeirão Preto, os horários de onibus não coincidiam. Sábado tinha aula até meio dia. Então ele saia ao meio dia e ia chegar a noite em Ribeirão. No outro dia tinha que sair cedo para vir embora, segunda feira cedo ele tinha aula. Quando ele ia visitar a família? Ou por necessidade, quando tinha feriado ou nas férias. Não havia onibus de meia em meia hora para Campinas, a maioria do pessoal de Campinas morava aqui. Iam aos finais de semana porque era mais perto. Sábado após o almoço pegavam carona, naquele tempo dinheiro não era como hoje. Poucos tinham carro. Para ir a São Paulo levava-se tres horas e meia quatro horas. Com isso o pessoal permanecia mais em Piracicaba, acabava a aula de sábado vinham para a Brasserie, Bar do Tanaka, tomar chopes, caipirinha. A vida social do estudante era na cidade de Piracicaba. A noite iam ao cinema, quadrar jardim. Por isso essa foi a época em que o Centro Acadêmico mais cresceu.








domingo, junho 16, 2013

ALAIDES PUPPIN RUSCHEL

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 15de JUNHO DE 2013.
Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/


ENTREVISTADA: ALAIDES PUPPIN RUSCHEL




A artista plástica Alaídes Puppin Ruschel é a representação gritante do potencial do ser humano e em especial do Brasil. Com sólida formação acadêmica em área totalmente diversa, mais uma vez ela prova que os gênios não se limitam, alimentam-se do saber, seja qual for sua origem. Durante décadas atuou em pesquisas científicas. Quando encerrou sua atuação profissional, quase por acaso, se é que existe acaso, descobriu ser exímia escultora, com composições de vanguarda, obras inovadoras, formas coerentes e arrojadas. Peças de volume respeitável, compostas por materiais diversos se interligando em perfeita harmonia, Alayde, seu nome artístico, sem nunca antes ter tido contato com esculturas, aos 60 anos iniciou uma carreira de artista plástica gloriosa, fundamentada em rigor científico e extrema sensibilidade. Alayde não é apenas uma artística plástica a mais no mercado, nem uma senhora da sociedade que ocupa seu tempo ocioso com figuras imaginárias. Ela é o verdadeiro exemplo da energia que cada ser humano tem em seu interior. Premiada e homenageada, em Piracicaba, no exterior, infelizmente ela segue a trilha determinada pela sina dos que fazem arte com vocação: o verdadeiro valor do artista só é reconhecido de fato após deixar de existir fisicamente. Seja por falta de conhecimento das obras do artista, por ego envaidecido de terceiros, por fatores culturais, interesses comerciais, grandes nomes vão para a vala comum até que algum estudioso resgata seu valor e o coloca em seu merecido lugar. É então declarada a temporada de caça a obras do artista, alcançando às vezes cifras inimagináveis. São incensados no altar da fama e glória.
Filha de Santos Puppin Neto e Emília Bressan Puppin, nasceu a 12 de dezembro de 1931, no distrito de Araguaia, pertencente ao município de Alfredo Chaves, no estado do Espírito Santo. São seus irmãos Luiz Puppin Neto e Edson Puppin. Seu pai era agricultor, com a crise do café ele enfrentou uma derrocada, que o levou a trabalhar na cidade de Cachoeiro de Itapemirim onde passou a ser vendedor de títulos de capitalização, profissão que o levou a morar em Itajubá, no sul de Minas Gerais.


Que idade a senhora tinha quando a família transferiu-se para Itajubá?


O curso primário eu fiz em Cachoeiro do Itapemirim, no Grupo Escolar Graça Guardia, em Itajubá fiz o ginásio e o científico. Meu pai incentivava-nos a estudar. Éramos pessoas simples, sem grandes recursos que permitisse ir estudar longe de casa. Eu tinha uma amiga, Elenita Sobral do Nascimento, cujo pai, Augusto, era militar, e ele a levou até a escola de agronomia onde até hoje ela é professora, situada próxima a 47 quilômetros do Rio de Janeiro, distrito de Campo Grande, era a Escola Nacional de Agronomia. Ela iniciou na Praia Vermelha, no Rio de Janeiro, depois foi transferida para esse local, um campus construído pelo paulista Fernando Costa.


Em que ano a senhora prestou o vestibular?


Foi e 1951 e formei-me em 1955 como engenheira agrônoma.


Na época não era comum mulher estudar agronomia.


Era raro. Naquela época houve um “boon” dentro da universidade porque uma escola da Colômbia fechou, muitos colombianos vieram para cá, éramos três alunas, eu, a Elenita e outra aluna isso no meio de outros 55 alunos do sexo masculino. Moramos em um alojamento que tinha sido construído naquela época, dentro da própria escola. Os rapazes, todos moravam nos alojamentos antigos, mas as meninas não tinham alojamento próprio, então foi feito um alojamento feminino, enquanto isso nós moramos a dois quilômetros da escola, o Ministério da Agricultura tinha muitas casas onde residiam seus funcionários. Íamos à escola de carona, desde aquela época aprendi que a carona é uma das coisas politicamente correta de ajudar as pessoas. De manhã vinha um carro e nos pegava, morávamos em sete moças nessa casa. À tarde esse carro nos trazia, se quiséssemos vir almoçar em casa tínhamos que conseguir uma carona. Embora na escola houvesse um refeitório maravilhoso.


Ao formar-se em que local a senhora foi trabalhar?


O único jeito era trabalhar no Ministério da Agricultura. Lá existia o Instituto de Ecologia, era antigo, tinha vindo da Praia Vermelha. Fui trabalhar com microbiologia do solo, tinha uma alemã chamada Johanna Döbereiner (Johanna Liesbeth Kubelka Döbereiner), no tempo da guerra ela refugiou-se no Brasil, mas ela tinha feito cursos semelhantes a agronomia, ela tinha estudado com um francês muito importante no estudo de microbiologia do solo. Ela trouxe todas as práticas que eram feitas no laboratório, fomos indicados a trabalhar e conhecer bacterias que fixavam nitrogênio do ar. Nós respiramos o nitrogênio existente no ar, assim como oxigênio, carbono. Mas nós só usamos o oxigênio. O nitrogênio que está no ar tem a fórmula N2, ele passa pelo nosso organismo e não faz nada. Existem umas bactérias que são responsáveis por tudo isso que você vê de natureza. Essas bactérias pegam esse nitrogêncio e transformam em amônia, que é um produto que toda planta precisa ter para se formar a proteina, que é oxigênio, nitrogênio e hidrogênio. Toda a fotosintese é dependente desse nitrogênio que é assimilado do solo. Essas bactérias são as mais importantes para a formação de toda a natureza.


Isso significa que bactéria não são só prejudiciais?


Posso lhe dar uma aula sobre os benefícios realizados pelas bactérias. Ela está no seu corpo, estômago, intestino, são as bactérias e fungos existentes em nosso corpo que fazem com que ele funcione e absorva tudo que é bom. Quem destroi o lixo? São as bactérias, os fungos, os microrganismos. São os seres mais poderosos e benéficos para o homem e para a natureza toda.


O homem tem consciencia disso?


Nós que estudamos isso sim, mas eu tenho a certeza de que a maioria dos seres humanos não sabe disso. É ilógica a pecha que dão aos microorganismos como destruidores. O nosso pão, só fermenta e se transforma em pão por causa de um fungo.


Como a senhora vê a industrialização dos alimentos, a existência de produtos enlatados, por exemplo?


Acho isso até certo ponto bom. Pessoas que não estão convivendo na natureza podem ter certo tipo de alimento. Só me revolto quando vejo quem vai levar todos os dias alimento aos quinze milhões de habitantes que moram em São Paulo. Quem? É o fruto do trabalho do homem que está no campo que vai chegar através de algo que é uma rodovia, onde milhares de pessoas estão trabalhando para trazer isso para cá. O homem não pensa. Como por exemplo, quando destruiu toda a via férrea no Brasil, o que ele fez de prejudicial ao nosso país. Hoje gastamos tanto combustível para transportar tudo, estamos poluindo a natureza. Eu vivi essa época, nós já tínhamos as estradas de ferro, mas começamos a importar o petróleo dos Estados Unidos. O solo do Brasil central é um solo paupérrimo e tem deficiência só de um elemento: o zinco. A EMBRAPA se expandiu através de Brasília, alguém que veio do exterior, fazendo pesquisas no solo descobriu que tinha que colocar zinco. A agricultura se expandiu, agora temos a melhor agricultura do mundo.


O Brasil tem petróleo?


Tem e muito! Sabemos que na Amazônia há muito petróleo.


No Nordeste pode haver muito petróleo?


Acho que pode ser que tenha. O petróleo é fruto das grandes florestas que haviam em um passado muito remoto, sucumbiram, os microorganismos produziram o petróleo que é a decomposição de toda matéria orgânica. Aquilo que foi enterrado. A nossa capacidade de trabalho é muito grande, um exemplo disso é a EMBRAPA.


O fato do Brasil mais do que duplicou a sua população em um curto espaço de tempo é um fator positivo?


Acho que só seria positivo se a população tivesse condições de receber uma educação perfeita. Atualmente está se tentando fazer isso, o governo tem oferecido escolas boas como SESC, SENAI, ETEC, está tentando melhorar o ensino primário, mas não consegue melhorar o salário dos professores. Se esse processo evoluir como é feito pelo americano, aonde as crianças vão para a escola onde permanecem oito horas por dia, as crianças recebem uma alimentação adequada, muito boa, praticam esportes. No Brasil só se pensa que o aluno vai para a escola para estudar. Ler. O professor não tem nem a capacidade de fazer isso porque ele não tem instrumentos. Enquanto não isso não existir no Brasil no sentido de que ela evolua sem ser pela televisão, que só traz coisas erradas. Eu tenho pena da juventude atual.


Há estatísticas que apontam que a maior fonte de lazer da população brasileira é a televisão.


As mensagens que são passadas através das novelas são criticas. Tudo é uma negação. A mensagem que eles estão passando agora, meninas com 12 anos apresentando uma sensualidade fora do normal. Não é uma questão de moralismo, é definição do que é certo e do que é errado. O certo é não ser desse jeito. Eu assisto a novelas da TV Globo, ela tenta passar uma coisa de arte, os atores são bons, os diretores também são mais ou menos bons, quem escreve uma novela é que deturpa as coisas. O pensamento do homem em chamar a mídia dentro das casas.


Na opinião da senhora os autores de uma novela a deturpam?


Deturpam! Impõem um pensamento negativo.


Em seu ponto de vista há interesses externos de que o Brasil não avance em seu progresso?


No passado, tempo de D.Pedro II, os europeus vieram para o Brasil, fizeram várias coisas boas, mas também levaram muitas riquezas do Brasil. Quando vou à Europa e vejo lugares com aquele ouro todo, fico pensando: “Meu Deus! Veio lá da minha terra!”. Consegui através do estudo, melhorar muito meu entendimento do mundo. Meu pai gostava de ler, comprava jornais, líamos, quando eu perguntava algo, porque determinada coisa estava acontecendo ele dizia: “– Minha filha leia sempre nas entrelinhas!” Se você ler um jornal você tira suas conclusões, A imprensa deveria ser sucinta, dando a mensagem correta e final.


A senhora acessa a internet?


Através do Google consegui acessar dois PowerPoint muito interessante. O local da ciência também me instruiu bastante. As noticias veiculadas pelo meio eletrônico é só no sentido negativo.


Qual é a opinião da senhora sobre a construção dos estádios para a Copa de Futebol?


Me lembro do dia em que foi aprovado que a Copa viria para o Brasil, o Lula fazendo aquela festa toda. Eu pensei: “-Será que essa pessoa não esta sabendo o que está acontecendo no Brasil?” E agora está acontecendo! Dinheiro jogado fora! Algumas pessoas irão frequentar aqueles estádios, algumas vezes, vão ficar felizes ou infelizes. Esse dinheiro poderia ser canalizado para pesquisa de alta tecnologia.


O Brasil tem fontes de pesquisas?


Eu acho que tem, mas tudo direcionado para ganhar dinheiro. O pesquisador tem que ser protegido, através do seu trabalho é que tudo evolui. Até a política pode evoluir.


Há interesse político em evoluir?


Diante agora da competição com outros núcleos na Europa, Estados Unidos, eu acho que deveria haver um interesse.


A senhora aposentou-se em que ano?


Aposentei-me em 1994, na EMBRAPA. Trabalhei 38 anos como agronoma, hoje os grandes agricultores estão apoiados na EMBRAPA. A EMBRAPA foi criada no Rio de Janeiro, nessa ocasião eu trabalhava no Instituto de Ecologia, houve um grande movimento da EMBRAPA ser fundada dentro do Ministério da Agricultura, muitos pesquisadores americanos chegaram ao Brasil e viram que nós tinhamos uma agricultura o ano inteiro, issso abriu os olhos dos brasileiros, tinha um instituto que trabalhava com a cana-de-açucar ha trinta anos no Ministério da Agricultura, em Campos. Eles viram o potencial que existia no Brasil para tudo. Fundou-se a EMBRAPA em 26 de abril de 1973, o banco de germoplasma, todas as sementes do Brasil, ia ser em Piracicaba, meu marido Renato Ruschel foi convidado para ser o presidente. Éramos colegas de turma e casamo-nos em maio de 1957 no quilômetro 47 da Via Dutra, Estrada Velha Rio-São Paulo, a igreja era dentro do anfiteatro da universidade. Tivemos quatro filhos: Regina Celi, Ricardo Henrique, Rosane e Roberto.


A senhora chegou a fazer cursos fora do Brasil?


Fiz o meu Master of Science nos Estados Unidos, na Purdue University Soil Science. Quando fomos já tínhamos quatro filhos, sendo que o mais novo tinha sete anos. Permanecemos lá por dois anos e pouco. Meu marido fez PhD. Quando voltei fiz doutoramento na ESALQ. Ai fui trabalhar no CENA, onde permaneci por 10 anos., trabalhava com microbiologia. Voltei para a EMBRAPA onde permaneci por mais 10 anos. Tive projeto durante doze anos, eu ia à Viena representar o CENA.


Em que ano a senhora mudou-se para Piracicaba?


Foi em 1971, tinha ocorrido a queda do Comurba, não havia quase edifícios na cidade.




 
 

Quando a arte passou a ser uma atividade para a senhora?


Começou quando eu estava para me aposentar em Goiás. Eu gostava muito de Goiânia, tenho muitas saudades de lá. Construímos uma casa em Caldas Novas, havia umas freiras que tinham uma espécie de mini hotel, no período em que estávamos construindo ficávamos hospedados lá. Eram dominicanas, fizemos uma amizade maravilhosa, nos fins de semana ou feriados nós íamos lá. Após a conclusão da nossa casa íamos fazer as refeições no mini hotel das freiras. Um dia uma das freiras me disse “-Alaides, queria que você levasse esse santo para a Irmã Letícia consertar!”. Ficava no centro de Goiânia, onde moravam essas freiras dominicanas. Levei esse Cristo para essa freira consertar, estava todo quebrado. Quando cheguei lá não encontrei a freira, mas deixei o Cristo lá. Na outra semana fui lá e peguei o Cristo, coloquei no meu colo, abri o embrulho, vi que era tão lindo! Mas era tão lindo! Até hoje tenho aquela imagem na minha cabeça. Pensei: “-Vou aprender a fazer isso!”. Falei com a freira de Goiânia, pedi que me apresentasse à Irmã Letícia. Em um sábado falei com ela: “-Eu queria aprender a fazer esculturas, pinturas”. Ela disse-me; “-Toma esse pedaço de barro e faça alguma coisa para que veja como você faz. Na semana seguinte levei um rosto de boneca que eu queria dar de presente para a minha neta. Ela pegou, olhou, falou assim: “-Alaides, não está bom! Você vai melhorar!”. Tive mais duas aulas com ela, ai soube que lá perto tinha um escultor que era filho do presidente do Lions que nós pertencíamos. Falei com esse rapaz se ele podia me ensinar a fazer esculturas maiores, ele me ensinou por três aulas. Aprendi a fazer esculturas grandes. Ele “queimou” a minha primeira peça. Trouxe essa peça para cá, soube que vinha uma pessoa de Campinas à Piracicaba para fazer na fundição a queima das peças dela. Fiquei lá uns quatro a cinco meses. Fui fazendo as minhas peças, fui crescendo, via as peças do pessoal que vinha do exterior e produzia esculturas. Assim fui evoluindo. Sozinha. O prateado das escultura é uma liga de alumínio com sílica, nunca fica escuro. Algumas peças são só em alumínio. Eu faço a minha peça na argila, quando a queimo vira cerâmica. É o mesmo principio de fazer tijolo, pega-se o barro, põem no forno e queima. Eu levo para a fundição a cerâmica ou só no barro mesmo. Eles tiram o molde e fazem o que eu quero.




Isso aqui em Piracicaba?


È a Fundiarte, a melhor fundição da América do Sul. Vem pessoas de todo lugar para fundir suas peças ali. Esse negócio de fundir em uma só peça prateado com dourado fui eu que comecei. Na minha tecnologia eu uso o buraco, chamo de “buraco vazio”, eu pintei o buraco com tinta automotiva. Com isso dei uma nova estrutura na minha obra. Eu uso a linha helicoidal. Há escultores que realizam obras sem nenhum vazio. O meu primeiro trabalho está em nosso museu no Lar dos Velhinhos, eu o levei para a Europa, ele foi apresentado lá. Fui assistir a abertura da mostra, em Roma, tinha muita gente em volta da minha obra e não tinha gente em volta da obra de ninguém. Sabe por que? Porque tinha essa tecnologia: bronze e alumínio. Todos que estavam lá eram artistas plásticos da cidade que queriam ver a artista que tinha feito aquela obra. Isso foi em 1975. Eu fiz isso porque o Luiz da Fundiarte me ajudou a fazer, aqui em Piracicaba! Lá eu ganhei o primeiro prêmio. Tenho obra que ganhou medalha de bronze em São Paulo., no Salão Paulista de Belas Artes. Tenho vários prêmios, até medalha de ouro.








BIGETO - JOSÉ ADROALDO GUIDOLIN

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 18 de maio de 2013
Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/


ENTREVISTADO: BIGETO - JOSÉ ADROALDO GUIDOLIN




José Adroaldo Guidolin é a pessoa mais indicada para falar de uma figura lendária em Piracicaba há algumas décadas, o seu pai, Bigeto. O escritor, historiador e jornalista Cecílio Elias Netto chegou a experimentar e registrar as delícias gastronômicas do bar do Gigeto. Publicou em 9 de dezembro de 2004 um belo texto sobre elas: “Massas suculentas acompanhadas de caipirinha e cerveja. O inesquecível bar do Gigeto, na Rua Moraes Barros, próximo a Igreja Bom Jesus. Era bar, restaurante, casa de massas, com o inevitável e essencial espaço para jogo de bocha.”- Cecílio prossegue: “ Quem não comeu dos pratos preparados pelo Bigeto perdeu a alegria de saborear, por exemplo, polenta de reis. O Tone Kraide testemunha ocular de nossa história, no seu fulgor octogenário ainda conta com detalhes como foi o grande jantar do Bigeto, aos piracicabanos campeões do mundo de 1958. De Sordi e Mazolla. Duvido, porém, houvesse mulher boba ou inteligente, não importa, que resistisse ao encantamento rústico de um jantar no Bigeto: macarronada com sangria, sabe lá o que é isso madama? E filé com fritas e cerveja? Ou bife a cavalo com caipirinha? Haverá, ainda, quem saiba fazer bife a cavalo?” O autor prossegue: “Sangria do Bigeto, essa foi para poucos”.


Mário Guidolin, o Bigeto, nasceu em Rio das Pedras, a 13 de maio de 1917, exatamente no dia do aparecimento de Nossa Senhora de Fátima aos três pastores em Portugal. Mário casou-se com Leonésia Galesi Guidolin, tiveram os filhos José Adroaldo Guidolin e Creuza Maria Guidolin. A origem da família é Padova, na Itália, José Guidolin e Antonia Pesato Guidolin, tiveram os filhos: Renato, Filipe, Romilda, Angelina, Adele, Paula, Mário (Bigeto), Antonio Durvalino. Imigraram para o Brasil instalando-se em Rio das Pedras. Grande parte da família foi para a cidade de São Caetano do Sul, onde havia muitas fábricas de cerâmicas, porcelanas, a industrialização estava florescendo, foi na época em que havia muitas vagas para trabalhar na General Motors, praticamente todos os seus tios trabalharam na General Motors em São Caetano do Sul, isso foi na década de 40. Quando menino passava as férias em São Caetano do Sul. Permaneceram em Piracicaba os filhos Mário, Paula e Antonio Durvalino.


 

O senhor lembra-se onde morava a sua avó, em Piracicaba?


Após morar inicialmente em Rio das Pedras a família mudou-se para Piracicaba, sendo que a maioria foi trabalhar em São Caetano do Sul. Na minha infância eu ia com freqüência na casa da minha avó, ela morava em uma casinha na Avenida Independência, logo após a curva do Lar Franciscano de Menores. Não era asfaltada, a casa era bem pequena, tinha um banco de pedra na frente e ao lado uma árvore que fazia sombra. Meu avô trabalhava como jardineiro em Piracicaba, ele faleceu em setembro de 1940. Permaneceram em Piracicaba os filhos Mário, Paula e Antonio Durvalino.


Onde o senhor iniciou seus estudos?


Foi no Grupo Escolar Dr. Alfredo Cardoso, situava-se na Rua São José, onde mais tarde foram as instalações do Café Morro Grande. Depois passou para a Rua Moraes Barros onde permanece até hoje. Minha primeira professora foi Dona Olga Iatauro, mãe do médico Dr. Carmo Iatauro. Outras professoras foram: Dona Lourdes, Dona Belica Canto, Dona Branca Sachs Motta de Toledo. O ginásio eu fiz no Colégio Salesiano Dom Bosco que ainda não era no Bairro Alto, funcionava em um local emprestado que nós chamávamos de “coléginho”, ficava na Paulista, vizinho a Igreja dos Frades. Mais tarde ali funcionou o Grupo Escolar Dr. João Conceição e em seguida o Colégio Dr. Jorge Coury. Eu pegava o ônibus da Viação Marchiori, o Circular, na esquina do Orlando Françoso, na Rua Moraes Barros esquina com a Rua Visconde do Rio Branco descia na esquina da Igreja dos Frades. Entrei no Colégio Dom Bosco em 1951. Eles construíram parcialmente o novo prédio, estudei lá até 1958. Em 1959 prestei vestibular na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto. Não passei, voltei para Piracicaba. Alguns colegas disseram que era o único ano que estava tendo a segunda chamada na ESALQ, as 80 vagas não tinham sido preenchidas. Prestei vestibular, escrito e oral. A prova oral era constituída por uma banca com três professores, eles chamavam o candidato que retirava um ponto, era um saquinho com números de 1 a 15, por exemplo, eu retirei o número 12, tive que falar sobre o Teorema das Forças Vivas. (Relação entre o trabalho mecânico e a energia cinética, forças vivas era a expressão antiga para energia cinética). Quem deu esse ponto para mim foi um dos professores da banca: Jesus Marden dos Santos. Fui até a lousa demonstrar o teorema. Em 1960 entrei no primeiro ano de agronomia da ESALQ.


O seu pai exerceu diversas atividades, sendo uma pessoa muio conhecida em Piracicaba.


Meu pai foi padeiro por muito tempo, ele não fabricava o pão e sim entregava pela cidade toda, com carrinho de tração animal. Trabalhou na Padaria Bom Jesus, do Juca Monteiro. Nessa época deveia ter seus vinte e cinco a vinte e seis anos. Depois ele trabalhou por longo tempo na Fábrica Aurora como vendedor de macarrão, massas, bolachas e biscoitos de pão de mel. A Fábrica Aurora ficava na hoje Rua Dona Felisbina Monteiro, no Largo do Bom Jesus. A concorrente era a Cacique. Era um concorrente forte, uma empresa dirigida por uma mulher, naquele tempo uma novidade, era Dona Augusta Maicon. Parece que a fábrica Aurora era maior em tamanho e produção. O logotipo da fábrica tinha um galo, por isso se chamava Aurora, o galo cantava na aurora. Meu pai deixou o carrinho de tração animal que entregava o pão e passou a trabalhar com um caminhão. Devia ser um furgão Ford da década de 40. O caminhão era pintado de azul escrito “Macarrão Aurora” Depois tinha uma faixa onde estava escrito: Massas, bolachas, biscoitos e pão de mel. A bolacha Maria era tradicional, havia o macarrão comum, o cortado, o Padre Nosso, o macarrão Ave Maria, usado mais para fazer sopa, não chamava espagueti, chamava macrrão comprido, vinha em uma pacote azul, pesava um quilo. Quando eu estava de férias ia ajudar meu pai, mais por brincadeira. Quanto macarrão comprido meu pai vendeu, ele conhecia os armazéns da cidade inteira, hoje foram sustituidos por quatro ou cinco supermercados.


José, lembra-se de alguns desses armazéns?


Subindo a Rua Moraes Barros havia o Munhoz, era o maior armazém da época, meu pai vendia para ele. No Bairro Alto tinha o Zé de Freitas, depois tinha o Orlando Françoso, em seguida vinha o Luiz Guirado, que era vizinho do Cemitério da Saudade. Na Vila Rezende, no começo era o Luiz Viliotti, no centro, o Dova, na rua Governador tinha o Café Brasil, de propriedade de Lélio Ferrari., proprietário do Armazém Brasil. Na Rua Benjamin Constant tinha a Casa Nê. Um pouco antes do meu pai trabalhar na Aurora ele trabalhou com o Zézinho Hellmeister que tinha uma fábrica de mortadela, onde mais tarde veio a ser o Bar do Bigeto, quase me frente ao Bar Cruzeiro, na Rua Moraes Barros.


O senhor chegou a ver a fabricação de mortadela?


Vi, a carne é picada, moída, ensacada, é um processo entre forno e defumada. Na época de frios só havia a mortadela, salsicha e lingüiça. Era isso que a fábrica produzia. Meu pai trabalhou bastante tempo lá, sempre na área de vendas. Depois ele passou para a fábrica de macarrão, o lugar onde ele permaneceu maior tempo.


O seu pai era um dos grandes nomes do esporte amador de Piracicaba?


Isso foi nos anos 36, 37,38 e 39. Ele era goleiro. Tem gente que diz que naquele tempo não é como hoje, que se for bom de bola ele vai para a linha do time, segundo informações, meu pai chegou a ser um goleiro conhecido, tão bom, que foi convidado para treinar no Ipiranga de São Paulo. Lá já tinha um goleiro chamado Osvaldo. Naquele tempo, só de ser chamado por um time era muito significativo.


O senhor sabe se ele se arrependeu em não ter seguido a carreira esportiva?


Naquele tempo futebol não corria dinheiro como hoje, jogava e tinha que pagar, tinha que lavar o uniforme, a bola, não tinha quem pagasse. Acredito que o Zé Tejada e o Toninho Pimenta não pagavam, um era lenhador, outro sapateiro. O Romano naquele tempo acho que ainda não era rico, acho que ele trabalhava em oficina mecânica ainda. O Xoxo mexia com pedra, fazia túmulos e revestia com pedras. O Becari tinha comércio de miudezas.


Quando seu pai abriu o restaurante?


No lugar onde a minha sogra e meu sogro tinham a doceria, na Rua Moraes Barros vizinha ao nosso campeão mundial De Sordi, meu pai acabou montando uma mercearia. Quase toda semana ele ia para São Paulo, o João Carlos Rocha que dirigia para ele, a mercearia para aquele tempo era bem montada, tinha um sortimento grande de frios, começou a vir salaminho, copa, presunto. Começou a sofisticar perto do que existia. Era uma mercearia pequena. Foi até certo ponto, depois parou. Ai ele abriu o restaurante, isso porque meu pai gostava muito de cozinhar nos ranchos, e uma das coisas que ele fazia com freqüência para vários grupos, era a feijoada. A churrascaria acabou quase por ser especializada em feijoada. Segundo um amigo meu, professor da ESALQ, que vinha comprar feijoada, dizia que era a melhor feijoada da cidade servida inclusive em porções generosas. O restaurante do Bigeto foi um dos mais tradicionais da cidade. Era chamado de Churrascaria do Bigeto. A feijoada era feita aos sábados, durante a semana eram feitos churrascos, peixes.


De onde surgiu o nome Bigeto?


Eu já fiz essa pergunta ao meu tio nem ele soube responder. Em certos ambientes se falasse sobre Mário Guidolin ninguém conhecia, mas se falasse sobre o Bigeto, na hora se lembravam. O apelido sobrepujou o nome. Os banheiros eram impecáveis, isso era uma obsessão da minha mãe. Chamava a atenção de quem freqüentava.


Por quantos anos existiu a Churrascaria do Bigeto?


Uns seis anos. Meu pai era uma pessoa muito boa. Délio Lovadini, distribuidor da Brahma em Piracicaba foi um irmão para o meu pai. Ele levou o meu pai para trabalhar com ele, depositando confiança total na honestidade que sempre foi a marca registrada do meu pai. Toda a movimentação de numerário junto aos bancos era feita pelo meu pai. Isso lhe proporcionou uma aposentadoria digna.


Quais eram as bebidas da moda na época?


Água Tonica de Quinino, Gim Tonica, Run, Cuba Libre, Fernet.


O senhor cozinha também?


Sou um colecionador inveterado de receitas, tenho mais de 6.000 receitas catalogadas. Até o momento tenho 92 cadernos de receitas.


Como engenheiro agrônomo em qual empresa foi seu primeiro emprego?


Foi na Nestlé. Quando me formei na ESALQ em 1964, já podíamos escolher o curso optativo, fiz a opção por tecnologia de alimentos, que é uma matéria que eu gosto muito. Dos 86 alunos, 14 ganharam uma viagem de 40 dias para os Estados Unidos. Visitamos as indústrias de alimentos daquele tempo nos Estados Unidos. Um exemplo mais gritante para nós foi a soja, aqui no Brasil não havia nem o cultivo de soja. E lá eles já faziam carne de soja. Cinco professores da ESALQ nos acompanharam nessa viagem. Um dos que colaboraram para que viajássemos foi o Dedini. Meu pai tinha muita amizade com o Jordão, que era professor do Senai e tinha excelente relacionamento com o Comendador Mário Dedini, Meu pai falou com o Jordão sobre a nossa necessidade de complementar recursos para a viagem. O Jordão falou com Mário Dedini, eu e outro colega fomos até a casa do Comendador Mário Dedini que autorizou o seu departamento financeiro a colaborar no complemento de verbas para viajarmos. A estadia foi paga pelos americanos. O ponto alto dessa visita é que cada professor americano era especialista em um assunto, e aqui no Brasil havia professores com conhecimentos genéricos. Os americanos ficaram assombrados em saber que um só professor conhecia tecnologia de óleo, de carne, de frutas, açúcar e álcool. Só que o especialista americano conhecia determinado assunto com profundidade. Quando voltei fui trabalhar na Nestlé em Araras. Permaneci lá por uns quatro anos.


Depois da Nestlé qual foi seu próximo local de trabalho?


Fui para o Instituto Brasileiro do Café, o IBC, onde permaneci por oito anos. Trabalhei em Nova Esperança, a 30 quilômetros e Maringá. Quando cheguei lá tinha 18 milhões de pés de café só na redondeza de Nova Esperança. Setenta por cento da produção mundial do café é Coffea arabica, outros trinta por cento do consumo é do café conilon.


Quantas espécies de café existem?


Umas 18 ou 20. Comercialmente falando no Brasil predomina o Coffea arabica. O Brasil até certo tempo vendia o café commodity, de um tempo para cá, de uns 10 anos para cá, o Brasil acordou para um nicho de cafés especiais. Ai entra um conjunto comerciantes de café americano, produtores de café brasileiro. O café foi deslocado para Minas Gerarais na região do serrado, o diretor da Associação da Indústria Brasileira do Café – ABIC, fez uma comparação do café com a produção do vinho francês, ou seja, agregar valores ao café. Isso está sendo feito.


Quais são os efetos do café no organismo humano?


Há controvérsias. Poucos sabem que a cafeina contida no café é menor do que no chá.


O Brasil depende muito ainda da exportação do café?


Em torno de vinte por cento das exportações brasileiras são de café, parece que não porque a soja cresceu muito. Chegamos a exportar oitenta e oito por cento do café consumido no mundo. Existe um trabalho feito no México onde conclui que o aproveitamento do café ao fazer a infusão (café) o aproveitamento é de apenas seis por cento. Desse resíduo era tudo jogado fora, Hoje estão procurando fazer uma série de indústrias baseadas no resíduo do café.








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