PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 22 de junho de 2013
Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
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ENTREVISTADO:HERBERT BARBOSA DE MATTOS
Herbert Barbosa de Mattos é filho de José Alves de Mattos e Lázara Pires Barbosa, nasceu a 8 de dezembro de 1940. Sua mãe era professora primária e seu pai dentista formado pela Faculdade de Odontologia de Piracicaba então denominada “Washington Luiz”. Após exercer a profissão como dentista, seu pai decidiu optar em ser proprietário de farmácia exercendo a atividade de farmacêutico. A sua primeira farmácia foi em Artemis, naquela época chamada de Porto João Alfredo, isso no tempo em que a malária afetava a saúde pública, década de 30. Inclusive ele foi vítima da doença. Um dos seus conhecidos era o pai do atual vice-prefeito de Piracicaba, João Chaddad. Em agosto de 1941 José Alves de Mattos transferiu-se montando uma farmácia ma Rua Benjamin Constant, ficava entre a Avenida do Café e a Avenida Dr. João Conceição.
Como se chamava a farmácia?
Era a Farmácia Mattos, a primeira farmácia da Paulista foi a dele. Até duas casas acima, antes de chegar na Avenida do Café do lado esquerdo não havia nada. Era o muro do pasto do Pedro Ferrari. Quando a minha família mudou-se eu tinha oito meses de idade.
Ali em determinada época foi o depósito de entulho da cidade?
Foi em um período anterior, nessa época as crianças iam lá garimpar ferro, osso, vidro, para vender para o ferro-velho situado na Avenida Independência entre a Rua Benjamin Constant e o Córrego Itapeva. Era o ferro velho do Rodrigues, descendo, do lado esquerdo da Rua Benjamin Constant.
Na Avenida São Paulo também havia pouca coisa?
Tinha o Pompermayer que morava em frente ao campo do Paulista, era um brejo, virando a Rua Benjamin Constant e entrando na atual Avenida São Paulo não havia ninguém, era estrada ali. Do lado esquerdo não existia nada, do lado direito havia a Fazenda do Ditoca, bem mais acima.
Seu pai montou a farmácia no tempo em que o farmacêutico manipulava os remédios?
Quase tudo era feito na própria farmácia. A maioria era através de receituário formulado pelos médicos da época: Dr. Correa, Dr. Samuel. A letra mais difícil de compreender era a do Dr. Samuel, lembro-me de que eu tinha até a pouco tempo um óculos que precisávamos usar para conseguir ler a receita. O meu pai estava acostumado, vinha de farmácia, tinha feito farmacologia.
Era o tempo em que na farmácia havia inúmeros frascos, cada um com uma finalidade, você conserva algum desses vidros?
Não tenho quase nada, conservo daquele tempo um aparelho em que naquela época fazíamos cápsula antigripal. Era preparada a aspirina, apertada bem no aparelho, colocava em uma cápsula. Havia um vidro com uma telinha, onde havia água, a outra parte da cápsula passava na água, colocava em cima, e fechava a cápsula. Fiz muito disso ai. Assim como pomadas, xaropes.
Havia um consumo muito grande de xarope?
Tinha! A nossa era a única farmácia que havia na Paulista, na Rua do Rosário não tinha nenhuma. Meu tio, Nelson Alves de Mattos, montou a Farmácia São Judas Tadeu bem depois. Ele foi sócio do meu pai em Artemis, meu tio começou a exercer a profissão em Gália, com o cunhado dele. Como só havia a farmácia do meu pai, todo o pessoal da zona rural vinha ali. Lembro-me de uma característica do Dr. Correa, ele ia atender o paciente de taxi, não utilizava seu automóvel. A corrida do taxi era paga pelo cliente. Muitas vezes a noite, chovendo, ele vinha com o marido da paciente ou alguém da família da pessoa enferma, parava na farmácia, desciam, para fazer a receita. As vezes meu pai dizia: “- Dr. não tem esse produto, posso substituir por este outro?”. O médico então dizia: “- Pode Mattos, pode sim!”. Ele fazia a receita enquanto a pessoa descia, para levar o Dr. Correa até a sua casa, meu pai preparava, deixava tudo pronto para a pessoa passar e levar. No sítio, na parte sul do município, todo mundo conhecia meu pai.
Na época ali era tudo chão de terra?
A Rua Benjamin Constant era calçada com pedregulho.
Em que escola a sua mãe lecionava?
No Grupo Escolar Moraes Barros, para ir lecionar tomava o bonde na Avenida Dr. Paulo de Moraes, ia até o centro e dali ia até o grupo. Nas imediações da farmácia já havia a Padaria Cruzeiro, a fábrica de barcos do Ferrari, a carpintaria e marcenaria do Chico Carretel em sociedade com o Gobeth.
Naquele tempo o farmacêutico era praticamente o médico das famílias?
Eu fui ao médico quando era nenê, no Dr. Tito. Depois em agosto de 1945 fui ao hospital quando quebrei a perna.
Como você quebrou a perna?
Todos os domingos eu e a minha mãe íamos à casa da minha avó. Minha tia também ia. A família reunia-se na casa da minha avó, lá no Bairro dos Alemães, no fim da Rua Saldanha Marinho, ela não continuava, parava na Rua São João. Minha mãe saiu, meu pai tinha saído, eu estava com uma peteca na mão, ia levar para brincar na casa da minha avó, bati a peteca, havia umas árvores com um quadradinho de madeira em torno delas como proteção, fui pegar a peteca, havia enroscado, sem querer bati a canela, trincou. Fui levado para casa, meu pai me levou no dia seguinte até a Santa Casa. Tiraram radiografia, estava trincada, engessaram. Era época da guerra, a gasolina estava racionada, Dr. Toledo que disse: “- Mattos! Eu os levo!”.
Na esquina da Rua Benjamin Constant com Avenida Dr. Paulo de Moraes havia casas?
Nas duas esquinas havia casas construídas uma de João Elias, que morava em um sobrado com sua irmã Amélia, ambos eram solteiros, além de uma irmã que casou-se com o Macluf, e na outra esquina era o Bar do Latiffe Naime, pai do Walter Naime, onde hoje é uma casa de peças. Do outro lado, onde hoje existe uma farmácia, residiam os barbeiros Nelson e Antonio Marconi, irmão do Milico, que mais tarde teve salão de barbeiro na Rua Governador Pedro de Toledo esquina com a Rua Joaquim André. Ali também havia o João Fustaino que tinha uma sapataria. Os Filetti já estavam estabelecidos com fecularia na Avenida Dr. Paulo de Moraes.
Até que ano seu pai teve a farmácia na Rua Benjamin Constant?
Ali ele ficou até 1951, nesse salão, ai ele mudou para outro quarteirão quase na esquina com a Avenida São Paulo. Onde hoje tem um bar. Era em frente ao Angeli, que teve ali um bar. Depois quem mudou ali foi a família do Cristóvão Martins. Para onde meu pai mudou era a fábrica de balas do Benedito (Dito) Baglioni. Ele teve inicialmente a fábrica de balas do lado direito, onde é a sapataria do Cella, passando um pouco, onde há uma bicicletaria ao lado, era a fábrica de balas do Benedito. Ele saiu de lá, comprou do lado esquerdo da Rua Benjamin Constant. Ele fechou a fábrica de balas e acabou vendendo para o meu pai que se mudou para o salão enquanto construía a farmácia ao lado. Onde era a fábrica de balas meu pai construiu um bar, com bocce, e alugou. Ali meu pai permaneceu até 1957. Foi quando ele vendeu para o “Lico da Farmácia Neves”. O meu pai foi para Santa Terezinha, bem na esquina da praça. Ali ele ficou até 1974, acredito que mais. Sempre com o nome de Farmácia Mattos.
Nesse período você cresceu e foi estudar em que escola?
Minha primeira escola foi o Externato São José, localizado no prédio onde mais tarde funcionou a Escola de Odontologia de Piracicaba, Ali fiz o primeiro ano e metade do segundo ano, minha primeira professora foi Ruth Pilli , foi ela quem me alfabetizou. Eu descia de bonde, na época dava certo, ia com a minha mãe. Descia na esquina, ia pra o colégio e minha mãe seguia para a escola para lecionar. Na volta ela passava e me pegava. Íamos até a esquina da Rua XV de Novembro com a Rua Boa Morte, pegávamos o bonde e íamos para casa. Na esquina da Rua D. Pedro II com a Rua Boa Morte, havia um posto de gasolina, do Lú, o nome dele era Rocha, sogro do Samir que é professor da Faculdade de Odontologia. O prédio existe até hoje. O segundo semestre do segundo ano fui estudar no Grupo Escolar Moraes Barros, minha professora foi Dona Helena Pousa. No terceiro e quarto ano foi Maria José (Zizinha) Verderesi. O irmão dela, João Verderesi, foi assessor do deputado Pacheco Chaves. Em 1950 me formei. Ano do cinqüentenário do Grupo Moraes Barros. Tive a satisfação de cinqüenta anos, depois em 2000, participar das comemorações do centenário do Grupo Moraes Barros. Conclui o grupo com nove anos, naquela época a lei não permitia que aquele que fizesse dez anos depois de junho entrasse no ginásio. Com isso não pude prestar exame para entrar no ginásio. Estudei um ano inteiro de curso preparatório por causa da idade. Fiz na primeira turma do Colégio Dom Bosco, que funcionava ao lado da Igreja dos Frades. No “coléginho” como chamávamos. Na esquina da Rua Alferes José Caetano com a Rua São Francisco de Assis (que antes se chamava Rua Saldanha Marinho) tinha um salão de reuniões, de catecismo, era também onde havia um cineminha onde domingo a tarde passavam filmes para a turma que estudava catecismo. No fundo tinha um campinho de vôlei que a turma do Dom Bosco ia jogar antes de começar a aula. As quermesses eram feitas em frente a Igreja dos Frades, na praça. Só que era fechado. Tinha grade, porque o pessoal do sítio naquela época vinha de charrete e deixava o carrinho com o cavalo no lado interno.
Ao lado do coléginho, na década de 60 havia quermesses, o que funcionava ali anteriormente?
Era o campo de futebol dos cordigeros. Ali embaixo, atravessando a Rua Alferes José Caetano havia um túnel que levava ao vestiário no outro lado da rua.
Você chegou a passar por esse túnel?
Oh! Joguei muita bola lá. O túnel deve existir até hoje, devem ter fechado ambas as entradas. Esse túnel saia do campinho de futebol e ia do outro lado, no vestiário atrás da igreja. Ao lado da Igreja dos Frades, além da calçada, existe um degrau com uma segunda calçada, era fechado com muro e aberto em cima sem telhado. Ali era o vestiário da turma que jogava bola. O vestiário não tinha comunicação com a igreja.
Esse túnel era iluminado?
Não era pelo fato de ser aberto em ambas as extremidades e relativamente pequeno. Só para passar debaixo da rua.
Você chegou a ser coroinha?
Fui coroinha um ano na capela das freiras do Lar Escola Maria Nossa Mãe, na Rua da Boa Morte, no Do Bosco, no Colégio Assunção, eu não era coroinha na Igreja dos Frades. Eu tinha 10 anos, foi quando entrei no Colégio Dom Bosco, em fevereiro de 1951. Os padres do Dom Bosco passaram a dar assistência religiosa tanto na Colégio Assunção como no Lar Escola, a missa era as seis horas da manhã no Lar Escola. No Assunção era aos domingos, onde havia a missa dos alunos. Eu morava na Rua Benjamin Constant, saia de casa as 5:30 da manhã, naquele tempo a Avenida Dr. Paulo de Moraes era uma escuridão, tinha muitas árvores, era uma rua calçada com paralelepípedo com um enorme tanque onde os animais que tracionavam as carroças vinham beber água. A missa terminava a sete horas, as irmãs davam café, eu andava pelo pomar que existia lá e depois vinha embora para casa. Fiz isso todos os dias nesse período de um ano e pouco. Com a mudança do Dom Bosco para o local onde se encontra, passei a ajudar missas apenas lá. O Colégio Dom Bosco tinha o compromisso de iniciar suas atividades naquele local em 1952 ou perderia a concessão do terreno. Lá estudei o ginásio e o curso científico.
Você chegou a conhecer Mamãe Cecília, ou Madre Cecília?
Conheci, ela é parente nossa. Tanto que quando fizeram a documentação para o processo de canonização dela vieram conversar com o meu pai.
Ao terminar o curso científico, você já sabia qual seria a carreira a seguir?
Conclui em 1959 o científico, meu pai queria que eu fizesse medicina. Com uns três colegas fomos fazer cursinho para prestar vestibular, morei em uma pensão em frente ao Cine Regina que depois se tornou auditório de TV do Silvio Santos, na Avenida Brigadeiro Luiz Antonio, o cursinho era na Liberdade. Ao lado da pensão onde morava ficava o Restaurante Zillertal, a Federação Paulista de Futebol. Permaneci por dois anos morando em São Paulo. Percebi que não tinha vocação para fazer medicini, prestei exame na ESALQ e em 1963 entrei para a faculdade. Sou formado na turma de 1967. O CALQ – Centro Acadêmico Luiz de Queiroz mudou para prédio próprio no ano em que entrei. Antes era na Rua Prudente de Moraes onde hoje é o HSBC. Ficava no andar superior. No meu tempo foram diretores da ESALQ o Malavolta, o Salim e o Galli.
Ao sair formado como engenheiro agronomo qual foi o seu primeiro emprego?
Sai da faculdade e fui trabalhar na Ultrafertil o presidente da empresa era Pery Igel.Era uma empresa multinacional de origem norte mericana. A Ultrafértil veio com a mentalidade da venda técnica, contrataram agrônomos, que iam conversar com os fazendeiros em suas fazendas, realizavam análises de solo e recomendavam o uso do produto adequado. A Ultrafértil trouxe o que não existia na época: adubo concentrado, a quantidade utilizada era muito menor do que a quantidade utilizada normalmente.
A origem da matéria prima do fertilizante é totalmente nacional?
Não. Fósforo existe alguma coisa, mas a maioria vinha do Marrocos. Potássio, Nitrogênio e o Fósforo é o básico de qualquer fertilizante. Permaneci um ano e meio na Ultrafértil. O Dr. Dimer Accorsi, irmão do Dr. Walter Acccorsi, era diretor do Ensino Agrícola, em São Paulo, eles estavam ampliando, só existiam Colégios Agricolas em São Manoel, Jaboticabal, Jacarei e Espírito Santo do Pinhal. Contratado fui dar aula no Colégio Agrícola de Santa Rita do Passa Quatro. Lá fiquei pouco tempo, saiu o concurso do Instituto de Zootecnia de Nova Odessa, que é do Parque da Água Branca. Passei no concurso, permaneci de 1969 até outubro de 1993, onde me aposentei.
Você conheceu sua esposa em que ano?
Conheci minha esposa Maria Cecília Teixeira de Mattos no carnaval do Clube Cristóvão Colombo, quando ainda era na Rua Governador Pedro de Toledo, em fevereiro de 1964. Casamos na Igreja São Judas Tadeu, no dia 29 de junho de 1969. Temos dois filhos: Waldssimiler e Wlastmiler.
Você pratica algum esporte?
Pratiquei até 2004, jogava futebol, pratiquei todo tipo de esporte, mas a minha paixão sempre foi jogar bola.
Como você vê a realidade dos Centros Acadêmicos atuais?
Algumas decadas passada, por exemplo, o estudante que estava em Piracicaba e tinha sua família em Ribeirão Preto, para sair daqui e ir até lá, o estudante levava quase um dia de viagem. Ia daqui para Limeira, de Limeira à Pirassununga e de lá para Ribeirão Preto, os horários de onibus não coincidiam. Sábado tinha aula até meio dia. Então ele saia ao meio dia e ia chegar a noite em Ribeirão. No outro dia tinha que sair cedo para vir embora, segunda feira cedo ele tinha aula. Quando ele ia visitar a família? Ou por necessidade, quando tinha feriado ou nas férias. Não havia onibus de meia em meia hora para Campinas, a maioria do pessoal de Campinas morava aqui. Iam aos finais de semana porque era mais perto. Sábado após o almoço pegavam carona, naquele tempo dinheiro não era como hoje. Poucos tinham carro. Para ir a São Paulo levava-se tres horas e meia quatro horas. Com isso o pessoal permanecia mais em Piracicaba, acabava a aula de sábado vinham para a Brasserie, Bar do Tanaka, tomar chopes, caipirinha. A vida social do estudante era na cidade de Piracicaba. A noite iam ao cinema, quadrar jardim. Por isso essa foi a época em que o Centro Acadêmico mais cresceu.
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