domingo, março 25, 2018

EDUARDO DARUGE JÚNIOR


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 24 de março de 2018.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: EDUARDO DARUGE JÚNIOR

Eduardo Daruge Júnior nasceu em Ribeirão Preto a 15 de novembro de 1960, tem seus irmãos Luis Antonio, Rinaldo Carlos, Cristiane, Adriano, Alexandre e Maria Eduarda. Eduardo Daruge Júnior é casado com Maísa Cruzatto Perrini Daruge que têm os filhos Eduardo Daruge Neto,médico, e Fernando Perrini Daruge, empresário.
Os primeiros estudos o senhor fez em qual escola?
Foi no Grupo Escolar Prudente de Moraes. No ano passado faleceu Dona Domingas Gallo, uma professora dedicada ao ensino, apaixonada pelo que fazia. Naquele tempo tínhamos um respeito pelo professor que hoje não existe mais, atualmente o aluno manda na escola, não é o professor e a escola que mandam no aluno. Tinha que entrar na classe em fila cantava-se o Hino Nacional com a mão no peito. Quando o professor entrava na sala de aula os alunos ficavam em pé. Lembro-me que quando fazíamos alguma “arte”, brincadeiras de criança, ela fazia escrevermos no caderno: “Cada coisa em sua hora, cada coisa em seu lugar” repetíamos essa frase exaustivamente a cada vez que fizéssemos algo errado. Tive uma afinidade pela sua didática, que mantive o relacionamento de amizade até ela falecer aos 96 anos. Em uma das últimas visitas que fiz à Dona Domingas, ela mostrou-me um pequeno caderno com o nome de todos seus ex-alunos, inclusive o meu, eu tinha escrito aos 10 ou 11 anos de idade. O detalhe, é que cada aluno que ela alfabetizava anotava com sua própria grafia o seu nome. Ela mantinha esse caderninho desde a década de 50. Depois que ela faleceu a família deu-me de presente o caderninho, tenho até hoje. Quando conclui o primário fui para a APAF Escola Estadual Dr. Antonio Pinto de Almeida Ferraz Em seguida fui para a Escola Estadual Professor José Mello Moraes. De lá fui estudar no Instituto de Educação Sud Mennucci. A Seguir estudei no Colégio Luiz de Queiroz, onde tive uma excelente formação. Lembro-me de que embora já estivesse no prédio novo, as provas eram feitas na cripta da Catedral de Santo Antonio. Quando eu fazia o colegial, fiz também o curso técnico de prótese, na Faculdade de Odontologia de Piracicaba - FOP.
Atualmente a prótese dentária está em uma fase de transição?
Quem permanece trabalhando com a prótese que se usava antigamente, que era a prótese total, popularmente chamada de dentadura, em sua maior parte está trabalhado com porcelana, muito envolvimento estético, houve uma evolução da prótese dentária, voltada para o desenvolvimento dos equipamentos que existem atualmente. Hoje conseguem confeccionar uma coroa dentária sem ter a intervenção manual. Usando o computador em três dimensões. Já está disponível em Piracicaba. Alguns clínicos já possuem esse equipamento. Através do scanner ele transmite as informações para o computador e já confecciona a peça. Logicamente que ainda existe a demanda para a prótese comum. Ainda se faz muita dentadura.
O poder aquisitivo de boa parte da população é limitado.
O Brasil é um dos poucos países que tem uma preocupação com a saúde oral muito grande. Existem países, inclusive muito desenvolvidos, onde uns bons números de indivíduos têm os dentes estragados. São países onde não há a cultura do tratamento odontológico.
O senhor estudou na FOP – Faculdade de Odontologia de Piracicaba, integrante da UNICAMP?
Estudei na FOP, conclui o curso em 1985. Trabalhei por seis meses com consultório, sempre adorei odontologia, sempre achei que seja qual for o trabalho tem que dar satisfação pessoal e uma forma de ver horizontes. No meio do ano prestei a Faculdade de Direito, fiz o mestrado em Odontologia Legal, eu já tinha essa vontade, pelo fato de sempre acompanhar os passos do meu pai, lembro-me de que na década de 70 ele publicou um artigo na Revista Quintessence ele descreveu uma ocorrência. Ele conseguiu identificar um delinqüente pela mordedura, pela mordida dele. Um casal estava namorando dentro de um Fusca, em uma área rural, na época era comum, tinham deixado uma fresta do vidro do carro aberta. O marginal encostou o revolver e anunciou o assalto, segundo o relato do delegado, o assaltado pediu para abrir o carro, o assaltante permitiu. Com a mão direita ele abriu o carro, pensando em segurar a arma do assaltante, e foi o que aconteceu, quando ele abriu a porta segurou a arma, o assaltante começou a disparar a arma porque esquenta o cano do revolver, como ele não soltou o assaltante começou a morder o braço do assaltado. Nisso a menina veio por trás e com as unhas compridas cravou no pescoço do assaltante e começou a puxar, ele largou a arma e saiu correndo. O Dr. Luiz T. Brienza era o delegado que fez o Boletim de Ocorrência do casal. Ele lembrou-se do meu pai, telefonou e perguntou se não seria interessante fazer a coleta das marcas das mordidas. Meu pai Eduardo Daruge, foi até a delegacia, moldou, fotografou, é moldado em silicone e depois coloca o gesso para ficar a delimitação da mordida. Uma semana depois, o Dr. Luiz Brienza estava de plantão novamente, atendeu um caso de atentado violento ao pudor. Quando o Dr. Luiz viu as marcas no pescoço do detido, lembrou-se do casal que tinha sido atacado. Dr. Luiz questionou o individuo sobre aquelas lesões, ele disse que foi pescar cascudo e enroscou no arame farpado. Era evidente que as marcas eram divergentes. Ele chamou o meu pai para fazer a moldagem da boca do detido. Ele moldou, comparou com as mordidas que ele tinha coletado no braço do rapaz que tinha sofrido o ataque, o resultado foi 100% de identificação. Isso acontece muito em estupro, o estuprador acaba mordendo a vítima.
Com relação ao DNA vocês usam como processo de identificação?
O DNA veio depois de um longo tempo, e ainda está muito novo no Brasil, isso porque o custo é muito alto, quando se fala em DNA para pessoas vivas é uma coisa, quando se fala em DNA para material necrótico é outra coisa. Exige uma técnica mais apurada. É mais cara também. O Estado paga, mas é um processo mais demorado. Vitimas em estado de decomposição ou esqueletizado, para trabalhar com DNA é um processo oneroso. Tanto que só é feito o DNA nesses casos quando se encontra uma família suspeita em pertencer ao individuo que foi encontrado.
Quando é feita a exumação como se encontra o corpo?
Depende de quanto tempo foi sepultado. As circunstâncias em que a pessoa faleceu influenciam. O individuo que passa por um tratamento quimioterápico acaba preservando esse corpo por uma longa data. A fauna cadavérica (que destrói o tecido mole) fica prejudicada, não consegue destruir aquele corpo. Uma vez foi encontrado um corpo em um poço de água desativado, a vítima era uma senhora que foi jogada ali. Entre o momento em que foi lançado e o momento em que foi encontrado, passaram-se trinta dias, Esse corpo estava muito bem preservado. Lá embaixo, no poço, é escuro, geralmente em corpos que estão expostos, o processo de decomposição começa com a mosca, que faz parte da fauna cadavérica. O processo de decomposição pode começar a partir de 12 dias, quando irá encontrar um corpo quase esqueletizando. Tem um caso recente, onde o prazo de desaparecimento e o encontro da ossada foram oito dias. Estava totalmente esqueletizado. Com partes ósseas destruídas. Existe a possibilidade de participação de animais carnívoros que devoram o corpo, tanto que vários ossos longos tinham as extremidades totalmente roídas. A literatura afirma que a decomposição normal é de dois a seis meses, podendo demorar até dois anos o tempo para esqueletização total.
A forma mais indicada de destino a um corpo, em termos de saúde pública, qual é?
É a cremação. Ela esbarra em um problema cultural. Até mesmo religiosa às vezes.
Após terminar o mestrado qual foi a sua próxima etapa?
Fui contratado na UNICAMP, em 1994, só que já trabalhava, dava aula em Araras, comecei a clinicar em 1986, na UNICAMP fui contratado como mestre tinha três anos para fazer o meu doutorado, hoje sou Livre Docente em Grau II,  o penúltimo degrau da carreira docente. O Departamento é da Odontologia Social, a área é de Odontologia Legal. A chefe do Departamento é a Dra. Gláucia Maria Bovi Ambrosano.

Prof. Dr. Eduardo Daruge Júnior , Prof. Dr. Luiz Francesquini Júnior e equipe.
O senhor tem consulta de outros estados?
Sempre têm.
O que o senhor recomenda à população como fator de colaboração na identificação humana?
A pergunta que eu faço é se o senhor já fez radiografias? Dentárias? Tomografia? O senhor tem as radiografias guardadas? Tem algum documento guardado daquilo que fez em odontologia? Se tivéssemos essa orientação na nossa formação, e entender que cada documento que a gente faz, correspondente ao nosso corpo pode ser extremamente importante. Lógico que ninguém pensa em ter um falecimento trágico. Que esse material vai ser necessário para um processo de identificação. Muitas vezes até o DNA fica prejudicado.
O senhor tem exemplos dessa situação?
Muitos! Há uns dois anos foi encontrado um corpo carbonizado em uma cidade da região. No mesmo dia foi encontrado outro corpo carbonizado em outra cidade também da região. No primeiro caso descobrimos a quem pertencia o veículo. Supostamente o corpo poderia ser do proprietário do veículo. A mesma coisa aconteceu com esse outro corpo da outra cidade, com a diferença de que o corpo além de carbonizado estava calcinado, desintegrado, tinha virado pó. Não tinha mais dente, osso. Vieram os dois corpos para o IML. Pediram que os auxiliassem. O primeiro caso estava mais preservado, foi mais fácil fazer a identificação, o suspeito fazia tratamento odontológico aqui na FOP. Foi identificado pelos dentes. O outro caso, não tinha material para fazer DNA. Fui buscar informação médica e odontológica. O exame primário de identificação consiste em três exames: 1-) Datiloscópica; 2-) Dentes, nesse caso não tinha material; 3-) O DNA, possivelmente o DNA ali já estava prejudicado em decorrência do grau de carbonização. Comecei o trabalho de investigação, no seu de local de trabalho não havia nada, só que o pessoal me informou que ele estava fazendo correção ortodôntica. Documentação ortodôntica é centro de radiologia que faz. Fui e descobri onde ele tinha feito radiografia. Quem o atendeu foi Dr. Pérsio Faber e outro dentista de Saltinho. Dr. Pérsio Faber passou todo prontuário dele, ele havia feito um implante no incisivo lateral, o dentista de Saltinho tinha feito mais cinco implantes nele. Pedi ao delegado para ir ao local onde estava o carro, para peneirar todo o material que estava no carro. Fui com a minha equipe, peneiramos e fomos encontrando seis implantes com as coroas de porcelana nele. A porcelana, o ponto de fusão dela é bem alto. Pegamos as radiografias, os informes de Saltinho, reconstruímos aqueles dentes nas posições e radiografamos. Comparamos com as radiografias existentes. Eram exatamente os mesmos. Fiz o laudo e mandei. Após a identificação do corpo inicia-se a o processo da busca da autoria. Rastrearam o telefone da esposa dele, descobriram que estava em atividade, ela disse que só iria se apresentar em juízo. Ela foi presa, já está solta. O crime deve ter sido cometido por um terceiro a mando dela. Com o auxilio de Luminol descobriram que ele tinha sido executado dentro da casa dele.
O senhor participa de eventos específicos?
Existem congressos de odontologia legal e medicina legal. Nesses congressos ele trazem toda tecnologia existente hoje. Já estão fazendo autópsia digital. Uma necropsia envolve três aberturas: craniotomia; tórax e abdômen. Verificam-se as lesões existentes, para tentar diagnosticar a causa da morte. Na identificação o sistema mais utilizado é a datiloscopia ou papiloscopia é o sistema mais econômico, geralmente parte-se de um reconhecimento, há muitos casos de erro ou fraude de reconhecimento. O reconhecimento não é identificação, você conhece alguém e reconhece o corpo da pessoa. Há casos quase folclóricos sobre reconhecimento, envolvendo três corpos e três famílias, com trocas de corpos que passaram apenas por reconhecimento. A impressão datiloscópica em um deles desfez a confusão. Saiu até no Fantástico! O reconhecimento é o preâmbulo da identificação. A necropsia determina se foi crime ou não. A causa da morte sempre tem que ser determinada, para evitar qualquer tipo de defesa do possível homicida. Qualquer suspeita de morte por intoxicação é colhido material para fazer exame toxicológico. É colhido o material e remetido para o IMESC - Instituto de Medicina Social e de Criminologia de São Paulo.
A falta de informação geral prejudica a investigação?
Esse é o mal do Brasil! Só existe informação local ou nos arredores. O cadastro de pessoas desaparecidas é muito deficiente. Teve um caso de um corpo encontrado em um canavial, carbonizado, com uma lista de pessoas desaparecidas entrei em contato com várias famílias até que em uma delas a esposa disse que a pessoa tinha uma placa de metal no braço esquerdo, resultado de um processo cirúrgico em função de um acidente. Identifiquei o médico, ele trouxe todos os informes sobre a placa que foi fixada no braço dele. Todas as placas cirúrgicas têm o número de série, fabricante, os parafusos são todos numerados, no prontuário do paciente fica marcado isso. Não é comum o IML abrir braço, perna, por isso é importante o exame de imagem. Fui até o IML, abri o braço, conferi todos os informes, confrontou tudo certo. Hoje a Interpol aceita as placas
cirúrgicas no corpo, desde que tenham dados informativos, como metodologia primária de identificação.
O senhor tem algum livro publicado?
O livro “Tratado de Odontologia Legal e Deontologia” é de autoria do meu pai Eduardo Daruge, Eduardo Daruge Júnior e Luiz Francesquini Júnior.

È alto o custo de um exame de DNA?
Se for um exame para um corpo em decomposição, o Estado fornece, mas a demora é de aproximadamente seis meses. Se a família for a um laboratório particular irá pagar uns 14.000,00 reais. O Exame de DNA que o Ratinho popularizou, para reconhecimento de paternidade fica em torno de 300,00 a 500,00 reais.
O esqueleto passa informações importantes?
Passa sim. Só que são secundárias: estimativa de estatura, de idade, de sexo e ancestralidade. O crânio fornece dados importantes, houve um caso em que eu tinha o crânio da pessoa falecida, após muitas buscas consegui uma imagem de uma tomografia do crânio, que ele havia feito no Hospital dos Plantadores de Cana, comparei um dado, que é a “impressão digital” do crânio: o seio frontal. Cada indivíduo tem um seio frontal único e exclusivo. Fica dentro do osso, em um espaço vazio. Entre a tábua óssea interna e a interna. Comparamos o seio frontal da tomografia anterior com a que fizemos aqui, sobrepomos um sobre a outra, deu certinho. Identificamos o individuo.

 

ANTONIO COSTA GALVÃO E THEREZA ANGÉLICA MARINO GALVÃO


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 03 de março de 2018.

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

http://blognassif.blogspot.com/







ENTREVISTADOS: ANTONIO COSTA GALVÃO
     E THEREZA ANGÉLICA MARINO GALVÃO

 

Antonio Costa Galvão nasceu a 9 de novembro de 1923 em Itu,  filho de Silvino Costa Galvão e Tereza Marques Galvão que tiveram os filhos Sebastião, Valter, Cilza, José Maria (Juquinha) e Antonio. Ficou órfão de mãe aos 2 anos e seu pai faleceu quando Antonio tinha 7 anos.

Quem cuidou do senhor quando perdeu os pais?

Nas férias escolares o meu pai me levou para passear em Santo Amaro na casa do meu padrinho Manoel Severino, enquanto eu estava lá ele faleceu em Itu. Meu padrinho passou a tomar conta de mim. Passei a freqüentar o Grupo Escolar Paulo Eiró. Permaneci morando com meu padrinho até os 10 a 12 anos. Eles já tinham uma idade mais avançada, e eu era um garoto muito ativo. Minha irmã Cilza, que fez o magistério em São Paulo me trouxe para morar em Palmital. Permanecemos alguns anos em Palmital, até que ela veio lecionar em Santa Cruz do Rio Pardo, ela casou-se. Um amigo da família, Odilon Bueno e sua esposa me receberam em sua casa. Passei a freqüentar o Colégio Rio Branco, em São Paulo, isso foi por volta de 1937,1938.Terminei os estudos no Rio Branco fiz um ano de cursinho e entrei na Universidade Mackenzie em 1950, me formei em 1954 como Engenheiro Civil. Fiz o CPOR (Centro de Preparação de Oficiais da Reserva) de onde sai como Segundo Tenente. O quartel ficava no centro de São Paulo, próximo ao Parque D.Pedro II. Era para eu ter ido para a FEB  Força Expedicionária Brasileira, para lutar na Segunda Guerra, na Itália, o fato de estar fazendo o CPOR impediu que eu fosse para a Itália. Conhecendo a minha vida nota-se que sempre teve a presença de Deus.

Na época em que o senhor estudava já trabalhava?

Para estudar eu trabalhava, lecionava, fazia pequenos serviços, trabalhei no Sindicato dos Alfaiates de São Paulo, situado a Rua Libero Badaró esquina com a Avenida São João. Era escriturário. Morei na Rua 7 de abril, foi no tempo em que fiz o CPOR. Morava em pensão. Aos domingos ia à missa na Igreja Consolação. Nessa época a USP tinha a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras na Rua Maria Antonia, sempre houve uma divergência com o pessoal do Mackenzie.

Após formar-se como Engenheiro Civil onde foi o seu primeiro emprego?

Fui trabalhar na Prefeitura de Santo Amaro. Naquela época o hoje bairro Santo Amaro era outro município. Ia trabalhar de bonde, era uma viagem, saia da Conselheiro Brotero segui em direção a Santo Amaro, naquele tempo chamavam Estação Indianópolis,Estação Moema, Estação Brooklin, não me lembro exatamente o tempo que demorava para chegar a Santo Amaro, mas era próximo a uma hora. Tinha o bonde aberto e o bonde fechado, denominado “Camarão” por causa da sua cor vermelha.  Não permaneci muito tempo na prefeitura. Fui trabalhar em uma empresa de fundações a S/A. Sociedade Brasileira de Fundações (SOBRAF), o escritório ficava na Rua Libero Badaró. Às vezes ia ao Restaurante Brahma, na Avenida Ipiranga esquina com a Avenida São João, tinha uma exímia violinista. Ia a um concerto na Gazeta, que ficava na Rua Florêncio de Abreu. Na SOBRAF fui tomar conta de uma fábrica de bate estacas, estacas de prédio. Fiquei lá algum tempo, até que o Dr. Lorena que era o proprietário estava com uma obra de expansão da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) em Volta Redonda, fui enviado para lá, Eu tinha que tomar conta de 400 funcionários. Tinha a estrutura do Núcleo de Expansão da Usina (NEU) que dava suporte. Tinha que fazer as fundações do novo alto forno, era uma obra pesada.

Tinha assessoria estrangeira?  

Tinha orientação norte-americana.

Após trabalhar na SOBRF qual foi a próxima empresa que o senhor trabalhou?

Trabalhei na Construtora Mauá, em São Paulo. Morei 2 anos em Campinas construindo os laboratórios da Rhodia.

Quando o senhor conheceu a sua esposa?

Quando eu trabalhava em Volta Redonda, vim para São Paulo, e tinha uma família amiga, fui visitá-la, foi quando conheci a Thereza que estava com suas amigas. Em seis meses namoramos e casamos. Estamos 63 anos juntos!

Da. Thereza Angélica Marino Galvão a senhora nasceu em que cidade?

Nasci a 6 de abril de 1933, em Rio das Pedras, fiz o curso primário no Grupo Escolar Barão de Serra Negra, com 11 anos fui estudar no Colégio Assunção, em Piracicaba. Meu pai é Nicolau Marino, foi prefeito de Rio das Pedras, a avenida que vai para o bairro Nosso Teto chama-se Nicolau Marino em sua homenagem, minha mãe é Luca Marino, minha mãe era de São Paulo e o meu pai era italiano, veio da Itália com nove anos ele também estudou no Grupo Escolar Barão de Serra Negra. O meu avô Donato Marino veio da Itália, da região de Potenza, deixou a minha avó na Itália com três filhos, quando ele se estabeleceu aqui foi buscar a minha avó. Aqui em Rio das Pedras ele teve comércio. No inicio ele era mascate. Ele não veio chamado pelo governo para trabalhar na lavoura, veio com recurso próprio. Primeiro ele parou no Rio de Janeiro,  ficou sabendo de Rio das Pedras e veio para cá. Estabeleceu-se com um armazém de secos e molhados, na Rua Rangel Pestana, tradicionalmente conhecida como Rua Torta, era a rua principal da cidade. Ai ele foi buscar vovó Maria Carmela Marino, meu pai, Nicola, que aqui passou a ser chamado como Nicolau. Veio a minha tia Rosa Marino que se casou com Paschoal Limongi. Veio também minha outra tia, Vicentina. E sete dos meus tios nasceram em Rio das Pedras. Tiveram no total 10 filhos: Nicola, Rosa, Vicentina, Antonio, Vicente, Elvira, Maria Thereza, Aurora, Miguel, Américo. Meus tios foram estudar no Dante Alighieri, só meu pai que não foi. As áreas do cemitério, do clube, da praça central, da igreja, foram doadas pelo meu pai. Quando o meu pai chegou aqui só existia uma igreja pequenininha, não era a atual. Rio das Pedras tinha uma rua só, o resto era sítio, fazenda. Onde hoje é o bairro São Cristóvão era a Fazenda Fortaleza, uma das propriedades do meu avô. Meu avô naturalizou-se brasileiro. Meu pai permaneceu com a nacionalidade italiana, o que lhe causou alguns aborrecimentos na época da Segunda Guerra Mundial. Para viajar precisava de salvo-conduto. Não era permitido ouvir rádio, nosso rádio foi confiscado. O clube era uma sociedade formada por italianos, era denominada Societá Patria e Lavoro mudaram para Cultural Riopedrense. Com o fim da guerra muita coisa mudou, meu pai chegou a ser prefeito de Rio das Pedras, o clube que ele fundou rendeu-lhe uma homenagem. Minhas tias foram para o Colégio Assunção em Piracicaba. Fui também para o Colégio Assunção onde permaneci por 7 anos, de 1945 a 1952. Formei-me como professora. Ficava interna, naquela época não tinha estrada, meu pai tinha um Fordinho 1929! Tinha que colocar correntes nos pneus, por causa do barro. Perto da Caninha da Roça tem um morro conhecido como Morro do Sarapião, a saída para Piracicaba era por ali, não existia a estrada Valério Pedro da Silveira Martins. Fui visitar uma ex-colega, Terezinha, que morava em São Paulo, nós nos formamos juntas, foi na casa dela que conheci o Galvão. Dei aula em São Paulo no Itaim-Bibi por dois anos, Escola Estadual Diva Maria B. Toledo na parte da manhã e a tarde no Colégio das Irmãs de São José, na Rua da Glória, no Cambuci.

O senhor se interessou de imediato pela Dona Thereza?

Conversamos na casa dos nossos amigos, estava a Terezinha, sua mãe, uma reunião social. Daí uns dias entrei de férias e fui para São Paulo, a Thereza morava na casa do seu avô materno, Sr. João Luca. As estradas eram precárias, de São Paulo à Piracicaba só até Jundiaí a estrada tinha calçamento, o resto era chão de terra, o pessoal de Rio das Pedras ia até a Estação Taquaral para tomar trem para São Paulo, pela Companhia Paulista de Estradas de Ferro. A Sorocabana tinha que fazer baldeação (troca de trem) Era outra época.

O senhor lembra-se do dia em que se casou?

Foi dia 4 de maio de 1954! Na Igreja Imaculada Conceição, na Avenida Brigadeiro Luiz Antonio, próximo a Avenida Paulista.

Dona Thereza a senhora morava nas proximidades?

Morava na Brigadeiro Luiz Antonio, região dos Jardins, lembro-me das mansões da Avenida Paulista, da Madame Rosita, freqüentada pelas moças da família Matarazzo. Eu tinha uma tia, irmã da minha mãe, que costurava muito bem, ela que fez o meu enxoval, em Piracicaba tinha a Madame Georgina, que fazia os vestidos chiques.

Após casarem, foram morar em que cidade?

Lá em Volta Redonda, em um hotel. Naquela época Volta Redonda era bem dividida, quem era engenheiro da Siderúrgica tinha um bairro lindo, com casas lindas, outro bairro era dos operários. Nós que éramos empreiteiros tínhamos que morar no hotel. O nosso patrão pagava o hotel. Havia diversos casais nas mesmas condições, que também moravam no hotel. Em Volta Redonda tinha um bairro chamado Niterói, e tinha um pessoal que tinha condições de pagar o aluguel, que era caríssimo, no mesmo hotel tinha um casal, ele o engenheiro José Buschinelli de Rio Claro e a Maria Emilia, eles tinham casado em fevereiro e nós em maio, ela ficou grávida do primeiro filho e eu também, o quarto dela ficava no andar logo acima da cozinha, com isso ela teve muito enjôos, O José foi encontrar uma casa nesse bairro, do outro lado da ponte. Fomos morar juntos os dois casais, dividíamos todas as despesas, sempre fomos religiosos, eles eram muito religiosos, com eles aprendemos a rezar o terço como casal. Rezávamos juntos todas as noites. Ela era muito devota de Nossa Senhora de Fátima. Após seis meses a empresa nos mandou para o Rio de Janeiro.

Vocês tiveram quantos filhos?

Tivemos três filhos: José Célio, Antonio Carlos e Ana Thereza.

No Rio de Janeiro qual foi a atividade do senhor?

Fui tomar conta de uma obra na Gamboa, morava na Rua Siqueira Campos, em Copacabana. Do Rio voltamos para São Paulo, fomos morar no Boaçava, bairro entre a Lapa e Pinheiros, próximo a Rua Cerro Corá. A água era de poço, não tinha asfalto, era loteamento novo. Não havia a Avenida Marginal, foi no tempo em que construíram o CEASA. Já tinham retificado o curso do Rio Pinheiros. Eu trabalhava na Empresa Mauá. Fui convidado par construir um hospital de altíssimo padrão em Uberaba. Fomos morar em Uberaba por uns tempos. Nesse meio tempo eu havia feito uma sociedade com possivelmente o maior conhecedor de edificações hospitalares, Jarbas Karman. De lá nós voltamos, eu deixei a empresa porque tinha que ter recursos para expandir os negócios. Assim mesmo fui construir o Hospital São Jorge, no primeiro quarteirão da Avenida Consolação, junto a Avenida Paulista. Esse hospital não existe mais naquele local.  Construí um hospital na Rua Juriti, no bairro de Moema. Nesse meio tempo ajudei a construir a Igreja dos Frades Dominicanos no bairro da Saúde. Ficou muito bonita a igreja. Fui diretor de Obras do Clube Alto de Pinheiros, do Clube Paineiras do Morumby. Em Três Lagoas fui fazer a fundação de uma ponte sobre o Rio Sucuriú, a CESP estava construindo a ponte, eu morava em um hotel em Andradina.  Fiquei um ANP e pouco.

O senhor praticava algum esporte?

Jogava tênis. Fui destaque no jogo de xadrez no Mackenzie. Na época existia a MAC-MED entre Associação Atlética Acadêmica Oswaldo Cruz dos alunos da Faculdade de Medicina da USP e a Associação Atlética Acadêmica Horácio Lane dos alunos da Faculdade de Engenharia da Universidade Mackenzie. Eu jogava pelo Mackenzie. Hoje jogo com o computador. Faço algum trabalho no Word, Excel. Envio e recebo e-mails.

O senhor foi prefeito de Rio das Pedras em que ano?

Fui de 2001 a 2004.

É uma experiência boa?

Para mim e para a Thereza a experiência resulta hoje nas amizades, no conceito que o pessoal acha que nós temos.

Dona Thereza complementa:

O Galvão pegou a prefeitura em sérias dificuldades financeiras, ele não tinha vinculo com ninguém, conseguiu 19 pessoas comissionadas, fortaleceu os funcionários, conseguiu pagar as dividas fazer com que a prefeitura tivesse confiabilidade, quando entramos tinha uma única ambulância com o motor fundido! Precisamos colocar dinheiro do nosso bolso, a oficina de Rio das Pedras não aceitava consertar mais, a administração anterior não pagava. Não pagava farmácia. Tudo isso colocamos em ordem, fizemos muitas solicitações, somos do PSDB, foram pedidas mais ambulâncias, mais carros para a polícia, que na nossa gestão não chegou, toda a documentação exigida o Galvão teve que arrumar. Para poder pedir. Com essas 19 pessoas certas, técnicas, ele conseguiu. O prefeito sozinho não faz nada, ele precisa de pessoal técnico. E que os funcionários dediquem-se.

O senhor aposentou-se quando?

Aposentei com pouco mais de 50 anos. Vim para Rio das Pedras, construí um prédio, junto com um sócio, financiado por uma instituição financeira. Construí também o prédio onde funcionou por muitos anos a Padaria Cristal, foi a primeira vez que um bate estaca trabalhou na cidade. Construí a Igreja Mãe Rainha. Fiz o primeiro loteamento asfaltado da cidade.

O senhor veio para Rio das Pedras já aposentado.

Vim para cá para não fazer mais nada, fiz essas construções, acabaram me convidando para ser candidato, eu nem político não era. Tinha na igreja um grupo denominado Grupo de Apoio Político, o Padre Eugênio Broggio Neto me entusiasmou muito. Ganhei na segunda eleição em que concorri.

Como o senhor vê a Rio das Pedras de quando a conheceu e a Rio das Pedras atualmente?

Mudou muito! São épocas diferentes, não há como comparar. Rio das Pedras não era nem calçada. O Prefeito Gramani entre outras obras fez o encanamento, Como prefeito consegui tirar o esgoto do Ribeirão Tijuco Preto. Realizamos obras no sistema viário, demos inicio no Centro Pedagógico. O povo sempre me recebeu muito bem, sou cidadão riopedrense, sempre me senti muito bem aqui. E também a Thereza fez muita coisa pela parte social da cidade. O meu casamento com ela foi um presente de Deus.

Em Rio das Pedras tinha um cinema, a senhora lembra-se do nome dele?

Tinha sim, o Cine Ipiranga. Era do meu pai. Pela primeira vez Rio das Pedras tinha um cinema CinemaScope, foi feito com inclinação, papai trouxe um engenheiro de Piracicaba para fazer uma planta apropriada. Meu pai doou o prédio para a Igreja Católica, Fizemos pela cidade o que pudemos fazer e fizemos com amor. Pensando no povo, na melhoria da cidade.

 

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