domingo, junho 16, 2013

BIGETO - JOSÉ ADROALDO GUIDOLIN

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 18 de maio de 2013
Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/


ENTREVISTADO: BIGETO - JOSÉ ADROALDO GUIDOLIN




José Adroaldo Guidolin é a pessoa mais indicada para falar de uma figura lendária em Piracicaba há algumas décadas, o seu pai, Bigeto. O escritor, historiador e jornalista Cecílio Elias Netto chegou a experimentar e registrar as delícias gastronômicas do bar do Gigeto. Publicou em 9 de dezembro de 2004 um belo texto sobre elas: “Massas suculentas acompanhadas de caipirinha e cerveja. O inesquecível bar do Gigeto, na Rua Moraes Barros, próximo a Igreja Bom Jesus. Era bar, restaurante, casa de massas, com o inevitável e essencial espaço para jogo de bocha.”- Cecílio prossegue: “ Quem não comeu dos pratos preparados pelo Bigeto perdeu a alegria de saborear, por exemplo, polenta de reis. O Tone Kraide testemunha ocular de nossa história, no seu fulgor octogenário ainda conta com detalhes como foi o grande jantar do Bigeto, aos piracicabanos campeões do mundo de 1958. De Sordi e Mazolla. Duvido, porém, houvesse mulher boba ou inteligente, não importa, que resistisse ao encantamento rústico de um jantar no Bigeto: macarronada com sangria, sabe lá o que é isso madama? E filé com fritas e cerveja? Ou bife a cavalo com caipirinha? Haverá, ainda, quem saiba fazer bife a cavalo?” O autor prossegue: “Sangria do Bigeto, essa foi para poucos”.


Mário Guidolin, o Bigeto, nasceu em Rio das Pedras, a 13 de maio de 1917, exatamente no dia do aparecimento de Nossa Senhora de Fátima aos três pastores em Portugal. Mário casou-se com Leonésia Galesi Guidolin, tiveram os filhos José Adroaldo Guidolin e Creuza Maria Guidolin. A origem da família é Padova, na Itália, José Guidolin e Antonia Pesato Guidolin, tiveram os filhos: Renato, Filipe, Romilda, Angelina, Adele, Paula, Mário (Bigeto), Antonio Durvalino. Imigraram para o Brasil instalando-se em Rio das Pedras. Grande parte da família foi para a cidade de São Caetano do Sul, onde havia muitas fábricas de cerâmicas, porcelanas, a industrialização estava florescendo, foi na época em que havia muitas vagas para trabalhar na General Motors, praticamente todos os seus tios trabalharam na General Motors em São Caetano do Sul, isso foi na década de 40. Quando menino passava as férias em São Caetano do Sul. Permaneceram em Piracicaba os filhos Mário, Paula e Antonio Durvalino.


 

O senhor lembra-se onde morava a sua avó, em Piracicaba?


Após morar inicialmente em Rio das Pedras a família mudou-se para Piracicaba, sendo que a maioria foi trabalhar em São Caetano do Sul. Na minha infância eu ia com freqüência na casa da minha avó, ela morava em uma casinha na Avenida Independência, logo após a curva do Lar Franciscano de Menores. Não era asfaltada, a casa era bem pequena, tinha um banco de pedra na frente e ao lado uma árvore que fazia sombra. Meu avô trabalhava como jardineiro em Piracicaba, ele faleceu em setembro de 1940. Permaneceram em Piracicaba os filhos Mário, Paula e Antonio Durvalino.


Onde o senhor iniciou seus estudos?


Foi no Grupo Escolar Dr. Alfredo Cardoso, situava-se na Rua São José, onde mais tarde foram as instalações do Café Morro Grande. Depois passou para a Rua Moraes Barros onde permanece até hoje. Minha primeira professora foi Dona Olga Iatauro, mãe do médico Dr. Carmo Iatauro. Outras professoras foram: Dona Lourdes, Dona Belica Canto, Dona Branca Sachs Motta de Toledo. O ginásio eu fiz no Colégio Salesiano Dom Bosco que ainda não era no Bairro Alto, funcionava em um local emprestado que nós chamávamos de “coléginho”, ficava na Paulista, vizinho a Igreja dos Frades. Mais tarde ali funcionou o Grupo Escolar Dr. João Conceição e em seguida o Colégio Dr. Jorge Coury. Eu pegava o ônibus da Viação Marchiori, o Circular, na esquina do Orlando Françoso, na Rua Moraes Barros esquina com a Rua Visconde do Rio Branco descia na esquina da Igreja dos Frades. Entrei no Colégio Dom Bosco em 1951. Eles construíram parcialmente o novo prédio, estudei lá até 1958. Em 1959 prestei vestibular na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto. Não passei, voltei para Piracicaba. Alguns colegas disseram que era o único ano que estava tendo a segunda chamada na ESALQ, as 80 vagas não tinham sido preenchidas. Prestei vestibular, escrito e oral. A prova oral era constituída por uma banca com três professores, eles chamavam o candidato que retirava um ponto, era um saquinho com números de 1 a 15, por exemplo, eu retirei o número 12, tive que falar sobre o Teorema das Forças Vivas. (Relação entre o trabalho mecânico e a energia cinética, forças vivas era a expressão antiga para energia cinética). Quem deu esse ponto para mim foi um dos professores da banca: Jesus Marden dos Santos. Fui até a lousa demonstrar o teorema. Em 1960 entrei no primeiro ano de agronomia da ESALQ.


O seu pai exerceu diversas atividades, sendo uma pessoa muio conhecida em Piracicaba.


Meu pai foi padeiro por muito tempo, ele não fabricava o pão e sim entregava pela cidade toda, com carrinho de tração animal. Trabalhou na Padaria Bom Jesus, do Juca Monteiro. Nessa época deveia ter seus vinte e cinco a vinte e seis anos. Depois ele trabalhou por longo tempo na Fábrica Aurora como vendedor de macarrão, massas, bolachas e biscoitos de pão de mel. A Fábrica Aurora ficava na hoje Rua Dona Felisbina Monteiro, no Largo do Bom Jesus. A concorrente era a Cacique. Era um concorrente forte, uma empresa dirigida por uma mulher, naquele tempo uma novidade, era Dona Augusta Maicon. Parece que a fábrica Aurora era maior em tamanho e produção. O logotipo da fábrica tinha um galo, por isso se chamava Aurora, o galo cantava na aurora. Meu pai deixou o carrinho de tração animal que entregava o pão e passou a trabalhar com um caminhão. Devia ser um furgão Ford da década de 40. O caminhão era pintado de azul escrito “Macarrão Aurora” Depois tinha uma faixa onde estava escrito: Massas, bolachas, biscoitos e pão de mel. A bolacha Maria era tradicional, havia o macarrão comum, o cortado, o Padre Nosso, o macarrão Ave Maria, usado mais para fazer sopa, não chamava espagueti, chamava macrrão comprido, vinha em uma pacote azul, pesava um quilo. Quando eu estava de férias ia ajudar meu pai, mais por brincadeira. Quanto macarrão comprido meu pai vendeu, ele conhecia os armazéns da cidade inteira, hoje foram sustituidos por quatro ou cinco supermercados.


José, lembra-se de alguns desses armazéns?


Subindo a Rua Moraes Barros havia o Munhoz, era o maior armazém da época, meu pai vendia para ele. No Bairro Alto tinha o Zé de Freitas, depois tinha o Orlando Françoso, em seguida vinha o Luiz Guirado, que era vizinho do Cemitério da Saudade. Na Vila Rezende, no começo era o Luiz Viliotti, no centro, o Dova, na rua Governador tinha o Café Brasil, de propriedade de Lélio Ferrari., proprietário do Armazém Brasil. Na Rua Benjamin Constant tinha a Casa Nê. Um pouco antes do meu pai trabalhar na Aurora ele trabalhou com o Zézinho Hellmeister que tinha uma fábrica de mortadela, onde mais tarde veio a ser o Bar do Bigeto, quase me frente ao Bar Cruzeiro, na Rua Moraes Barros.


O senhor chegou a ver a fabricação de mortadela?


Vi, a carne é picada, moída, ensacada, é um processo entre forno e defumada. Na época de frios só havia a mortadela, salsicha e lingüiça. Era isso que a fábrica produzia. Meu pai trabalhou bastante tempo lá, sempre na área de vendas. Depois ele passou para a fábrica de macarrão, o lugar onde ele permaneceu maior tempo.


O seu pai era um dos grandes nomes do esporte amador de Piracicaba?


Isso foi nos anos 36, 37,38 e 39. Ele era goleiro. Tem gente que diz que naquele tempo não é como hoje, que se for bom de bola ele vai para a linha do time, segundo informações, meu pai chegou a ser um goleiro conhecido, tão bom, que foi convidado para treinar no Ipiranga de São Paulo. Lá já tinha um goleiro chamado Osvaldo. Naquele tempo, só de ser chamado por um time era muito significativo.


O senhor sabe se ele se arrependeu em não ter seguido a carreira esportiva?


Naquele tempo futebol não corria dinheiro como hoje, jogava e tinha que pagar, tinha que lavar o uniforme, a bola, não tinha quem pagasse. Acredito que o Zé Tejada e o Toninho Pimenta não pagavam, um era lenhador, outro sapateiro. O Romano naquele tempo acho que ainda não era rico, acho que ele trabalhava em oficina mecânica ainda. O Xoxo mexia com pedra, fazia túmulos e revestia com pedras. O Becari tinha comércio de miudezas.


Quando seu pai abriu o restaurante?


No lugar onde a minha sogra e meu sogro tinham a doceria, na Rua Moraes Barros vizinha ao nosso campeão mundial De Sordi, meu pai acabou montando uma mercearia. Quase toda semana ele ia para São Paulo, o João Carlos Rocha que dirigia para ele, a mercearia para aquele tempo era bem montada, tinha um sortimento grande de frios, começou a vir salaminho, copa, presunto. Começou a sofisticar perto do que existia. Era uma mercearia pequena. Foi até certo ponto, depois parou. Ai ele abriu o restaurante, isso porque meu pai gostava muito de cozinhar nos ranchos, e uma das coisas que ele fazia com freqüência para vários grupos, era a feijoada. A churrascaria acabou quase por ser especializada em feijoada. Segundo um amigo meu, professor da ESALQ, que vinha comprar feijoada, dizia que era a melhor feijoada da cidade servida inclusive em porções generosas. O restaurante do Bigeto foi um dos mais tradicionais da cidade. Era chamado de Churrascaria do Bigeto. A feijoada era feita aos sábados, durante a semana eram feitos churrascos, peixes.


De onde surgiu o nome Bigeto?


Eu já fiz essa pergunta ao meu tio nem ele soube responder. Em certos ambientes se falasse sobre Mário Guidolin ninguém conhecia, mas se falasse sobre o Bigeto, na hora se lembravam. O apelido sobrepujou o nome. Os banheiros eram impecáveis, isso era uma obsessão da minha mãe. Chamava a atenção de quem freqüentava.


Por quantos anos existiu a Churrascaria do Bigeto?


Uns seis anos. Meu pai era uma pessoa muito boa. Délio Lovadini, distribuidor da Brahma em Piracicaba foi um irmão para o meu pai. Ele levou o meu pai para trabalhar com ele, depositando confiança total na honestidade que sempre foi a marca registrada do meu pai. Toda a movimentação de numerário junto aos bancos era feita pelo meu pai. Isso lhe proporcionou uma aposentadoria digna.


Quais eram as bebidas da moda na época?


Água Tonica de Quinino, Gim Tonica, Run, Cuba Libre, Fernet.


O senhor cozinha também?


Sou um colecionador inveterado de receitas, tenho mais de 6.000 receitas catalogadas. Até o momento tenho 92 cadernos de receitas.


Como engenheiro agrônomo em qual empresa foi seu primeiro emprego?


Foi na Nestlé. Quando me formei na ESALQ em 1964, já podíamos escolher o curso optativo, fiz a opção por tecnologia de alimentos, que é uma matéria que eu gosto muito. Dos 86 alunos, 14 ganharam uma viagem de 40 dias para os Estados Unidos. Visitamos as indústrias de alimentos daquele tempo nos Estados Unidos. Um exemplo mais gritante para nós foi a soja, aqui no Brasil não havia nem o cultivo de soja. E lá eles já faziam carne de soja. Cinco professores da ESALQ nos acompanharam nessa viagem. Um dos que colaboraram para que viajássemos foi o Dedini. Meu pai tinha muita amizade com o Jordão, que era professor do Senai e tinha excelente relacionamento com o Comendador Mário Dedini, Meu pai falou com o Jordão sobre a nossa necessidade de complementar recursos para a viagem. O Jordão falou com Mário Dedini, eu e outro colega fomos até a casa do Comendador Mário Dedini que autorizou o seu departamento financeiro a colaborar no complemento de verbas para viajarmos. A estadia foi paga pelos americanos. O ponto alto dessa visita é que cada professor americano era especialista em um assunto, e aqui no Brasil havia professores com conhecimentos genéricos. Os americanos ficaram assombrados em saber que um só professor conhecia tecnologia de óleo, de carne, de frutas, açúcar e álcool. Só que o especialista americano conhecia determinado assunto com profundidade. Quando voltei fui trabalhar na Nestlé em Araras. Permaneci lá por uns quatro anos.


Depois da Nestlé qual foi seu próximo local de trabalho?


Fui para o Instituto Brasileiro do Café, o IBC, onde permaneci por oito anos. Trabalhei em Nova Esperança, a 30 quilômetros e Maringá. Quando cheguei lá tinha 18 milhões de pés de café só na redondeza de Nova Esperança. Setenta por cento da produção mundial do café é Coffea arabica, outros trinta por cento do consumo é do café conilon.


Quantas espécies de café existem?


Umas 18 ou 20. Comercialmente falando no Brasil predomina o Coffea arabica. O Brasil até certo tempo vendia o café commodity, de um tempo para cá, de uns 10 anos para cá, o Brasil acordou para um nicho de cafés especiais. Ai entra um conjunto comerciantes de café americano, produtores de café brasileiro. O café foi deslocado para Minas Gerarais na região do serrado, o diretor da Associação da Indústria Brasileira do Café – ABIC, fez uma comparação do café com a produção do vinho francês, ou seja, agregar valores ao café. Isso está sendo feito.


Quais são os efetos do café no organismo humano?


Há controvérsias. Poucos sabem que a cafeina contida no café é menor do que no chá.


O Brasil depende muito ainda da exportação do café?


Em torno de vinte por cento das exportações brasileiras são de café, parece que não porque a soja cresceu muito. Chegamos a exportar oitenta e oito por cento do café consumido no mundo. Existe um trabalho feito no México onde conclui que o aproveitamento do café ao fazer a infusão (café) o aproveitamento é de apenas seis por cento. Desse resíduo era tudo jogado fora, Hoje estão procurando fazer uma série de indústrias baseadas no resíduo do café.








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