PROGRAMA
PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 16 de fevereiro de 2019.
Entrevista:
Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços
eletrônicos:
LUIS MANUEL MARCELINO e MICAELA HIGINO PEREIRA MARCELINO
ENTREVISTADOS: LUIS MANUEL MARCELINO e MICAELA
HIGINO PEREIRA MARCELINO
Luis Manuel Marcelino, registrado na Sociedade Portuguesa de
Autores, conhecido como Luís
Marcelino, o poeta de Carreiro de Areia, escritor luso-canadense, fará o
pré-lançamento de três livros, dois de poesias e um de relatos e ficção, será
no dia 21 de fevereiro de 2019, no Instituto Beatriz Algodoal, situado a Rua
São José, 446, centro de Piracicaba. No dia 23 de fevereiro, sábado às 10 horas
fará uma pequena palestra e o lançamento das três obras no Recanto dos Livros,
nas dependências do Lar dos Velhinhos. Uma rara oportunidade para ter as obras,
conhecer o autor e sair com um livro autografado pelo mesmo. Autodidata,
sensível, conseguiu transpor para o papel seus sentimentos de visão do mundo
que o cerca.
Luís Manuel Marcelino nasceu a 13
de setembro de 1953, em uma pequena aldeia denominada Carreiro de Areia,
pertencente a cidade de Torres Novas, em Portugal.
É filho de Manuel Marcelino
Pedro, pintor de construção civil e Maria da Guia, doméstica, que tiveram três
filhos: Antônio, Regina e Luís.
Quantos habitantes tinha a aldeia quando o
senhor nasceu?
Minha aldeia tinha 200
habitantes. A vocação da aldeia antigamente era agrícola, atualmente os
habitantes trabalham em diversas atividades, fora da aldeia, em busca de um
trabalho melhor. A aldeia mantém sua originalidade, as casas são feitas com
pedra, umas assentadas com terra ainda, outras já com tijolos e cimento.
A casa em que o senhor morou ainda existe?
Há três semanas atrás dormi no
quarto em que nasci! A casa ainda é da nossa família.
Qual foi a sensação de passar a noite no
quarto em que o senhor nasceu em Portugal?
É uma sensação boa, de estar em
minha aldeia, e dormir no quarto em que nasci!
Como é a temperatura local?
No inverno, faz muito frio,
dentro das casas é mais frio do que na rua, são casas antigas, não tem os
recursos atuais, Temos que usar roupas e cobertores que nos protejam.
Pelo fato de ser uma construção muito antiga,
o banheiro é externo?
O banheiro é interno. Tem todo o
conforto normal a uma casa. Só não tem o aquecimento. Tudo no estilo rústico,
que é o normal da aldeia. Frequentei a Escola Primária de Poços, um lugarzinho
na aldeia. Essa escola atualmente está fechada, não há crianças em idade
escolar na aldeia. Antes fazíamos os quatro primeiros anos nessa escola e
depois seguia-se para a cidade para continuar os estudos. Aos 11 anos de idade comecei a
trabalhar em uma oficina mecânica e mais tarde dediquei-me à pintura de
automóveis. Quando iniciei tínhamos carros ingleses Morris, alemães como
Opel, Renault
de origem francesa, isso foi por volta de 1965.
AUTOMÓVEL MORRIS 1952
OPEL 1959 Comecei limpando os carros, as
peças dos carros, varrer a oficina, pegava as ferramentas que os mecânico
pedia, após algum tempo segui da mecânica para a pintura de automóveis.
Qual é o segredo para fazer uma boa
pintura em um automóvel?
Tem que ter boas mãos para pintar, bons
olhos para ver o que está sendo feito e bons materiais. Apesar de que quando
comecei a ajudar os pintores não havia bons compressores. Era com um cilindro
de oxigênio, com essa pressão do oxigênio é que se pintava, não se usava
compressor. Onde fui trabalhar já havia energia elétrica.
Os clientes ficavam contentes com o seu
trabalho?
Sim, não posso me queixar. Quando ainda
era um garoto, os mestres é que faziam o trabalho. Eu só ajudava. Mais tarde comecei
a fazer os meus próprios trabalhos.
LUIS MANUEL MARCELINO e MICAELA HIGINO PEREIRA MARCELINO
Na época a política em Portugal era
pesada?
Era ditadura. Antônio de Oliveira Salazar foi um advogado, professor universitário e
presidente do Conselho de Ministro de Portugal de 1933 até 1968. Salazar foi
responsável pela consolidação do Estado Novo e pela implantação ideológica do
salazarismo. As regras eram difíceis, não podia ter ajuntamento nas ruas, Nunca
vivi muito isso por que sempre passei ao lado da política. Anterior a esse
período eu servi a tropa, ou seja serviço militar, foram 22 meses em Portugal,
antes servíamos quatro anos, metade do tempo em Portugal e a outra metade na
Províncias Ultramarinas, tínhamos cinco países na África: Guiné-Bissau,
Angola, São Tomé e Príncipe, Cabo Verde e Moçambique.
Vocês tinham televisão, rádio na aldeia?
Até os meus 12 anos não tínhamos
eletricidade na aldeia. Comecei a trabalhar na pintura de automóveis com 18
anos, parei de trabalhar com a pintura em 2012. Permaneci em Portugal até 1990
quando emigrei para o Canadá.
O que o levou a sair de Portugal?
Eu já tinha parentes no Canadá, minha
irmã já morava lá, a vida em Portugal não estava muito fácil, Portugal estava
passando por uma reconstrução, uma mudança.
Dona Micaela, a senhora tinha alguma
atividade em Portugal?
Sim, era costureira, aprendi tudo
sozinha. Corto o tecido, costuro, o desenho geralmente era da revista Burda,
desenhava o modelo para o papel, do papel para o tecido, cortava, costurava e
ficava bonito! Minha máquina era uma Singer elétrica. Trabalhava só com moda
feminina, pode-se dizer que era alta costura: vestidos de noivas, casacos
compridos, curtos, saias, blusas, o tecido a própria cliente escolhia, comprava
e trazia.
As clientes gostavam?
Adoravam! Eu costurava das nove horas da
manhã até as sete horas da noite.
Qual era a alimentação do dia a dia?
Acho que em Portugal nós variamos muito
de comida, tínhamos feijoada, massa. A feijoada é feita com feijão
encarnado(vermelho), com chouriço, cenoura, couve, carne de porco. Temos o
bacalhau, há também um consumo muito grande de caldos (sopas). Em Portugal
come-se muita sopa. No verão, como faz muito calor, comemos comidas mais leves.
No verão já tivemos a temperatura de 40 graus centigrados. Nesse ano em que a
temperatura chegou a 40 graus, muitos idosos faleceram. A temperatura mínima
onde morei eram 10 graus positivos.
Quem era o santo padroeiro do local onde a
senhora morava?
Nossa Senhora de Fátima, Santo Antônio,
isso em todo Portugal. Mais ao norte do país o padroeiro é São João e São
Pedro. São três santos padroeiros. Na aldeia do Manuel o santo padroeiro é
Santiago. Havia muitas procissões.
Em Portugal o catolicismo é muito forte?
Dona Micaela responde: A minha maneira de
ver, já foi mais forte. Portugal recebeu muitos imigrantes, com crenças diferentes.
Ainda prevalece o catolicismo.
Como vocês se conheceram?
Dona Micaela diz: “É interessante
essa história. Há seis anos eu fui para o Canadá, mais especificamente para Toronto,
onde tenho a minha mãe que mora no Canadá há 42 anos. Manuel e eu nos
conhecemos no Canadá, há quatro anos, vai fazer dois anos que estamos casados.
A senhora é de que região de Portugal?
Eu não sou de Portugal! Nasci em
Angola, na África. Com 5 anos fui para Moçambique, onde morei até os 19 anos. Meu pai é Joaquim Higino Pereira, era
enfermeiro, e a minha mãe Augusta Elias da Piedade. Tenho dez irmãos.
Quem foi primeiro para o Canadá?
Foram a minha mãe e o meu
padrasto. Estávamos em Moçambique quando se deu em Portugal a Revolução de 25 de Abril de 1974,
também conhecida como Revolução
dos Cravos, quase todos os portugueses saíram de Angola e Moçambique.
Muitos foram para a Austrália, África do Sul, Portugal outras pessoas foram
para o Canadá. Decidi ir para Toronto, no Canadá por que já havia família por
parte do meu padrasto. Isso foi em 1977. Infelizmente eu saí da África, minha
terra, com 19 anos, já se passaram 43 anos. Tenho imagens, boas recordações. E
digo: África é África!
Havia algum tipo de diferenciação entre o negro e o branco em
Angola e Moçambique?
Quando eu vivia lá, não via muita diferença, talvez pela
minha idade. Mas de fato não se juntavam. Nas casas, habitações onde estávamos
não havia negros que vivessem lá. Havia uma zona deles. Nas lojas os
funcionários eram mais os negros do que os brancos, assim como nos cafés,
restaurantes. Íamos à mesma escola, negros e brancos. Morei em uma escola
interna onde havia uma negra interna. Por isso eu não via discriminação.
Você realizou todos os seus estudos nesse colégio interno?
Fiz o curso primário em uma aldeazinha em Moçambique, chamada
Buzi, depois então, fui para o colégio estudar do quinto ano até o oitavo ano,
o Colégio chamava-se Nossa Senhora da Conceição. Era um colégio de freiras.
Era uma disciplina muito rigorosa?
Havia regras, leis, tudo com horário determinado para
cumprir. Era muito rígido. As seis da manhã as freiras chegavam ao dormitório,
batiam palmas, para acordar-nos, levantávamos, ajoelhávamos logo para rezar.
Depois tínhamos meia hora, ou uma hora, para aprontarmo-nos, após o banho, íamos
para o refeitório. Tomar um pequeno almoço, depois íamos ás aulas, tudo isso
com horário. Missas só tínhamos aos domingos.
Qual foi a sua impressão ao chegar no Canadá?
Eu já tinha ido passar as férias no Canadá há 31 anos. Adorei
o Canadá. Amo o Canadá!
A senhora exerceu alguma atividade no Canadá?
Ainda trabalho! Em limpeza de casa. Há muita procura por quem
faz esse trabalho. Hoje já não é tão bem remunerado por ter muita concorrência.
Há muitos brasileiros que fazem limpeza de casa. Mas vale a pena ir.
Qual é o comportamento do canadense?
Eles têm um comportamento típico britânico. A parte do Canadá
em que estamos fala-se inglês. Moramos em um apartamento, eu, Micaela gosto do
trânsito de lá. É melhor do que em Lisboa. Eu adoro Lisboa também. No Canadá as
vias são todas regulares, paralelas e perpendiculares, bem sinalizadas.
O volante de direção do automóvel fica do lado esquerdo ou
direito, como o modelo inglês?
É igual ao do Brasil
O transporte público em Toronto é bom?
É ótimo!
Em Toronto que existe um shopping abaixo da calçada?
É o maior shopping do mundo! O PATH é um complexo de túneis
subterrâneos no Centro de Toronto. É como se fosse um shopping gigante debaixo
da terra. São cerca de 30 quilômetros de extensão e mais de 371 mil metros
quadrados que fazem do PATH o maior complexo comercial subterrâneo do mundo! O
local conta com mais de 1200 lojas dos mais variados segmentos, como academias,
mercados, lojas de fotocópias, restaurantes, clínicas médicas. É possível
encontrar de tudo por lá! Por isso, durante o inverno, muitas pessoas preferem
aproveitar tudo que o local tem para oferecer em vez de encarar o frio e a neve
do lado de fora. O metrô fica muito próximo do meu apartamento e ele nos leva
até o shopping.
O custo de vida, como é no Canadá?
Micaela diz: “Um bocadinho caro!”.
Muitos produtos são importados, o que é produzido lá fica longe da cidade, o
transporte encarece o produto.
Luís Marcelino o senhor escolheu
Piracicaba para lançar três dos seus livros no Brasil. No dia 21 de fevereiro
de 2019 o senhor fará o pré-lançamento de três livros, no Instituto Beatriz
Algodoal, e no dia 23, sábado, às 10 horas da manhã, fará uma breve
apresentação e o lançamento dos livros no Recanto dos Livros, no Lar dos
Velhinhos de Piracicaba. Quais são os nomes dos livros?
São: “Mensagens
e Pensamentos” que é a minha primeira obra, um conjunto de trabalhos
escritos ao longo de alguns anos. São mensagens que eu gostava, que o mundo lê.
Pensamentos que fui escrevendo de acordo com a minha paz de espírito, fiz em
2016. Em 2917 fiz “Nota de Música”,
uma história começada a ser escrita nos anos 70, interrompi a obra, mantive o
projeto, dediquei-me a outras obras e finalmente em 2013 a conclui e lancei em
abril de 2017. Em novembro lancei “Pedaços
de Silêncio”, um livro de poesias. Pedaços da vida retratados em silêncios
de poesia; sonhos sem guarida transportados entre a realidade e a fantasia.
O que o motivou a escrever esses livros?
O primeiro livro “Mensagens e
Pensamentos” tem poemas com mais de 20 a 30 anos, fui escrevendo e pondo na
gaveta. Em 2016 houve a oportunidade de publicá-lo. Tenho outras obras onde sou
coautor.
Luís, esses poemas foram inspirados em
seu dia a dia, em suas observações, colocava no papel seus sentimentos?
Me inspiro muito no meu dia a dia,
certas coisas que vejo, que eu sinto, muito sobre a natureza, certas coisas que
escuto, o mundo precisava mudar um pouco, escrevo algumas coisas românticas,
transporto para o papel meus sentimentos. Escrevo para que as pessoas que irão
ler sintam-se bem também.
Os seus poemas são para elevar a pessoa?
Eu penso que sim e espero que sim. Essa
é a minha ideia. Faço questão de que todos os meus livros sejam lançados
primeiramente em minha aldeia. Assim foi com todos que já lancei e espero fazer
o mesmo com os próximos.
É a primeira vez que vocês vem ao
Brasil?
Sim é a primeira vez! Micaela diz: “Amei
todos os dias em que estou aqui. Está me fazendo lembrar muito a minha África.”
Os negros brasileiros e os negros
africanos, a seu ver tem alguma semelhança?
Não. Eu até acho diferença entre o negro
angolano e o negro moçambicano. São diferentes em comportamento, fisionomia.
O que o Luís está achando do Brasil?
Respondendo em poucas palavras, espero
que não seja a última vez. Estou gostando! As praias brasileiras são banhadas pelo
Oceano Atlântico, assim como Portugal, só que no Brasil as praias são piscinas,
em Portugal o mar é mais revolto. As águas das praias de Portugal são frias.
Eliana Menegatti, anfitriã, menciona a
preocupação de Micaela antes de vir ao Brasil. A imagem do Brasil no exterior é
de um país violento, com todo tipo de crime ocorrendo a qualquer momento.
Eliana revela que Micaela disse-lhe:
“Eliana, eu tenho tantos colares, pulseiras, são bijuterias, que combinariam
com a minha roupa, deixei tudo no Canadá! De tanto que me falaram do Brasil!” A
imagem do Brasil no Canadá é assustadora. Somos terríveis, roubamos, matamos,
assaltamos, o tempo todo! Disse-lhe que quando ela voltar poderá repintar diferente
o Brasil! A Experiência que eles estão tendo, inclusive ao Luís que escreve
para o jornal Sol Português faço um apelo, que escreva um
texto sobre o Brasil.
Quantos
portugueses moram em Toronto?
Possivelmente
meio milhão sejam portugueses! (População estimada em Toronto é de 2.731.571
de habitantes em 2016).
PROGRAMA
PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 09 de fevereiro de 2019.
Entrevista:
Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços
eletrônicos:
A professora Josemeri Aparecida
Jamielniak possui bacharelado em MateUniversidade
Estadualmática pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), mestrado em Biometria pela Paulista (UNESP),
UNESP BOTUCATU na Université de Metz, Chargé de Recherches INRIA atuando na área de Modelagem Matemática e Simulação Computacional de
Biossistemas e, atualmente é doutoranda em Matemática Aplicada pela UNICAMP.
UNICAMP - VÍDEO INSTITUCIONAL Tem experiência em Matemática Aplicada com ênfase em Biomatemática, Modelagem
Computacional aplicada à sistemas ecológicos e biológicos e possui também
experiência em estatística computacional.
Josemeri Aparecida Jamielniak
nasceu a 9 de outubro de 1989, na cidade de Curitiba, no bairro Boqueirão, é um
bairro com muitas casas típicas alemãs.
Estudou sempre em escola pública. O
ensino fundamental foi na Escola Municipal Nossa Senhora do Carmo, o quinto ano
estudou no Colégio Estadual Professor
Victor do Amaral, o sexto, sétimo e oitavo anos foi na Escola Estadual Polivalente de Curitiba e o ensino médio foi no Colégio Dr. Xavier da Silva, bem
atrás do Shopping Estação.
É filha de Rosemeri da Silva Jamielniak e José Walter Jamielniak que tiveram os filhos Josemari e
Walter José.
HISTÓRIA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
UFPR 105 ANOS
Você lembra-se do nome da sua
primeira professora?
Foi a professora Nilcéia! Tenho
contato com ela até hoje.
Até que idade você morou em
Curitiba?
Permaneci lá até os meus 22 anos.
Você nesse período nunca
trabalhou?
Quando estudava no ensino médio, trabalhei em uma
padaria, trabalhava na parte da tarde e à noite, atendendo no balcão. Era muito
divertido, eu ia de bicicleta para o trabalho, minha mãe me encontrava no meio
do caminho.
COMO FAZER O PÃO CHINEQUE
Os pães de Curitiba são diferentes dos de Piracicaba?
Há o pão francês, mas consome-se muito o pão d`agua, o chineque que é um pão doce de origem
alemã, a cuca ou kuka, tem cara de bolo,
vai ao forno em assadeira de bolo e
até seu nome vem da palavra alemã para bolo, Kuchen. Tecnicamente, porém, cuca não é bolo,
e sim um tipo de pão. Um pão doce macio e úmido, caracterizado pela cobertura
do tipo de uma farofa, feita com manteiga, farinha e açúcar. É muito popular e
consumida em Curitiba.
Como você sentia-se trabalhando com o público e sendo ainda
muito jovem?
Sempre achei muito boa essa experiência de poder atender
aos clientes, poder conversar, para mim é muito divertido.
O seu poder de ser comunicativa já se revelou nesse
trabalho?
Imagino que sim! Há uma afirmação de que o curitibano é
muito fechado, na realidade ele é reservado, após você fazer amizade com um
curitibano irá ter amizade para sempre.
Você permaneceu a sua adolescência e parte da juventude
em Curitiba quais eram as formas de diversões da época?
Os cinemas tradicionais já tinham migrado para os
shoppings, lembro-me de que a primeira vez em que fui ao cinema com os meus
pais, foi em um cinema no centro, que era no estilo clássico: um local que era
apenas cinema. Fomos assistir Scooby-Doo, um
desenho animado americano.
CINEMAS DE RUA DE CURITIBA
CINEMAS DE RUA DE CURITIBA
Por que você decidiu vir para Piracicaba?
Eu vim para cá, junto com o meu marido, Adriano
Gomes Garcia, que começou a fazer doutorado na Esalq. Ele fez Biologia na Ufscar
- Universidade Federal de SÃO Carlos. Fizemos o mestrado no mesmo período, foi
quando nos conhecemos. Casamos e mudamos para Piracicaba.
Você tem ascendência alemã?
Tenho,
a minha avó paterna é alemã: Augustin. (Rui Augustin desvendou
e registrou a origem histórica e cultural da família Augustin que resultou em
uma obra muito interessante). Ela me contava que a própria família a proibia de
falar alemão. Ela passou para nós, apenas uma música infantil em alemão
(Josemeri põe-se a cantar, relembrando alguns trechos), meus pais cantavam para
mim, minha tia sabe até hoje. Minha avó manteve a comida alemã, o pirogue (ou 'pierog') é um
pastel salgado cozido, ou frito, meu pai prefere frito. Fácil de fazer e que
faz muito sucesso na época do Natal.
Você guarda boas lembranças de
Curitiba?
Curitiba
foi onde vivi por 22 anos, frequentei a igreja católica, fui catequista, ainda
frequento as festas relativas a datas comemorativas, padroeiros, juninas.
Apesar de ser destaque por
suas inovações, em alguns aspectos Curitiba ainda conserva suas tradições?
Conserva
bastante! Essa igreja que eu frequentava, todos os anos eram feitas procissões
de páscoa, de Natal, e com o passar dos anos, aumenta o número de pessoas que
frequentam esses eventos, eu imaginava que a tendência fosse de diminuir, mas
não, cada vez tem mais participantes.
Você conheceu seu marido em
qual cidade?
Em
Botucatu, no curso de mestrado.
Até algumas décadas, o olhar
feminino não era muito voltado à matemática.
Hoje
é muito comum alunas interessarem-se por matemática. Tenho mais alunas do que
alunos no curso de Matemática da Unimep.
O que a atrai em matemática?
Tudo!
Considero o mundo da matemática maravilhoso! Ela está presente em tudo! Sem a
matemática não teríamos o grau de evolução que temos. O mundo da matemática é
fascinante!
Alguém disse que a matemática
é uma expressão da natureza.
Segundo consta quem afirmou foi Galileu Galilei físico, matemático, astrônomo e filósofo italiano.
Galileu Galilei foi personalidade fundamental na revolução científica. Disse a
frase: "A Matemática é o alfabeto que Deus usou para escrever o
Universo."
GALILEU GALILEI
É uma realidade! Faço doutorado em Matemática Aplicada, a
matemática, pela matemática pura, acho fascinante, maravilhosa a regra dos
números, mas eu gosto da Matemática Aplicada em nosso dia a dia, hoje trabalho
com transmissão de doenças. Em meu trabalho de doutorado estudo a dinâmica de
um fungo que tem sido o autor principal do declínio proporcional de sapos. Esse
fungo levou à extinção de aproximadamente 40% da população de sapos.
Acredita-se que essa redução é consequência do surto dessa doença que chama-se
quitridiomicose. O fungo que atinge os anfíbios é o Batrachochytrium
dendrobatidis (BD) ameaça a população mundial de anfíbios.
Está relacionado com o impacto humano, o aumento da temperatura, diminuição de
habitat. Esse fungo ataca a pele do sapo e o leva à morte em 20 dias. Ele já
dizimou espécies e é o principal causador da morte de sapos nos últimos 20
anos. Joaninha é o nome popular
dos insetoscoleópteros da família Coccinellidae. Geralmente têm o corpo redondo e colorido, com
muitas espécies predadoras de pragas agrícolas e com grande importância na agricultura, pois
atuam como controle
biológico, está sendo reproduzida em alta escala em laboratórios,
ela está ameaçada de extinção. A próxima espécie em extinção são as abelhas.
Estamos nos envenenando?
Sim, com certeza! Isso é uma das coisas em que a minha
área de trabalho atua! Como estudamos dinâmica, estudamos a dinâmica entre
hospedeiros e parasitoides. Como no caso da Joaninha. Já é a área do meu
marido, como ele é entomólogo (Entomologia é a
especialidade da biologia que estuda os insetos sob todos os seus aspectos e
relações com o homem, as plantas, os animais e o meio-ambiente) ele estuda como
as espécies interagem, qual tem que ser o espalhamento quando você quer
controlar uma população invasora, qual é o parasitoide ou predador dela que
você tem que liberar, qual a quantidade para manter um controle populacional
ótimo, sem usar inseticida, usando controle biológico. Usamos equações
matemáticas para esse tipo de estudo.
Há uma relação direta entre a
matemática, biologia e o próprio homem?
Totalmente! Eu estudo especificamente
Biomatemática (matemática aplicada à biologia, à medicina ou às ciências
humanas (por ex.: em estatísticas demográficas, modelos funcionais de fibras
nervosas etc.). Essa junção das duas ciências é nova. É uma junção fantástica! Você
consegue descrever qualquer fenômeno biológico usando equações matemáticas.
Em que ano vocês vieram para Piracicaba?
Foi em 2014. Em fevereiro de 2019 serão
cinco anos. Ainda conservo um pouco do sotaque original, embora ache bonito o
sotaque piracicabano. Temos muitas palavras muito específicas de Curitiba: "Penal:
estojo escolar para guardar lápis e canetas."; “vina (salsicha)”; "Piá:
usado para se referir a um garoto, adolescente ou entre amigos do sexo
masculino"; “Mimosa.
Não é mexerica, nem tangerina. É mimosa”.
Qual
é sensação em ainda muito jovem, dar aulas em Universidade para alunos da sua
idade ou com mais idade?
Eu já
lecionei no ensino fundamental, 7° ano. É pior do que lecionar no ensino
superior. Pelo fato de eu ser nova o pessoal do 7º ano não tem respeito.
Acredito que no ensino superior as pessoas tem mais consciência da importância
do estudo. De fato eles ficam admirados em ter uma pessoa mais nova do que eles
lecionando. Já tive aluno de quase 60 anos. Para mim é muito bom, desafiador,
matemática em si oferece desafios, o fato da pessoa estar muito tempo fora da
escola, tem-se que resgatar conhecimentos de bons anos passados.
Matemática
é difícil?
Tenho
que concordar que sim. Você tem que ter um nível de abstração muito alto, e as
pessoas as vezes não tem. Tem que pensar em uma coisa que não tem uma aplicação
imediata, mas que faz sentido para uma outra área de estudo. Os alunos querem
saber: “Aonde vou usar isso?”. Ou “Para que tenho que aprender isso?”. As vezes
tem um porque imediato, as vezes não. A matemática é bonita por ter um padrão.
Você
começou a lecionar quando?
Comecei
em 2014 em uma faculdade em Tatuí. Ensinava Cálculo Integral e Diferencial I,II
e III para as faculdades de engenharia. Lecionava Estatística também.
O que
você acha do Ensino à Distância?
Eu
fico um pouco preocupada com o Ensino à Distância. Isso porque exige do aluno
uma dedicação muito grande que a maioria dos alunos não tem essa disciplina,
essa rigorosidade. Vejo na Universidade, quando passo um exercício, muitos dos
meus alunos, a primeira coisa que fazem é ir buscar a resposta na internet.
Você não está saindo da sua zona de conforto para ir conhecer uma coisa nova,
irá apenas copiar alguma coisa que alguém já fez. Quais serão as profissões que
teremos daqui a 10 anos? A Tecnologia está tomando conta do nosso dia a dia.
Muitas cidades não têm mais cobrador de ônibus. No supermercado já tem caixas onde
você paga sem a necessidade de ter uma pessoa cobrando. Empregos básicos, que
exigem uma formação básica estão acabando. Me preocupo porque estou formando
professores que irão ser professores desses profissionais daqui há 10 anos. O
que tenho que ensinar para os meus alunos que serão professores desses
profissionais do futuro? Acredito que a tecnologia nunca irá tirar a nossa
capacidade de raciocínio. É o que a minha geração não faz! Minha geração não
pensa mais. Busca as coisas prontas.
O
brasileiro têm consciência do orçamento doméstico básico?
Não
têm! Nós precisamos muito aplicar a área de ciências exatas, desde ao mais
singelo orçamento doméstico até cálculos avançados. Hoje lecionando na Unimep,
sou considerada uma das professoras mais “difíceis” pelo aluno. Não sou
considerada chata, mas dizem que as minhas provas são muito difíceis. Eu passo
exercícios contextualizados, dando uma situação e um problema, quero que eles
pensem como resolver aquela situação! É isso que nós precisamos! Para os meus
alunos da engenharia também, sempre digo a eles: “-Seu chefe nunca irá falar:
Calcule isso!”. Isso o computador faz. O seu chefe vai dar-lhe um problema e
você terá que resolver esse problema. Digo-lhes: “Aí você irá usar a matemática
a seu favor para resolver esse problema”. Quero que você saiba passar um
problema real para a linguagem matemática, tirar o resultado, mesmo que seja no
computador, e saber resolver o seu problema da melhor maneira possível.
CAMPUS UNIMEP
40 ANOS COMO UNIVERSIDADE
A
Esalq tem bastante coisa que a atrai nessa área?
A Estatística
só. Gosto muito de Estatística principalmente inferência bayesiana (IB) que consiste na avaliação de
hipóteses pela máxima
verossimilhança, da inferência
estatística para a inteligência
computacional (IC), onde é
sinônimo de aprendizado bayesiano (ou aprendizado de máquina bayesiano), e encontra aplicações na biomedicina, computação em
nuvem, pesquisa de algoritmos, criatividade computacional. Além da utilidade
singular para implementações e lida com problemas reais (através da modelagem e
da consideração dos dados).
Introdução ao Algoritmo Naive Bayes
Você já teve aluno
que sofreu pressão familiar para não estudar matemática?
Tem.
Uma aluna minha começou a fazer engenharia em Araras, no terceiro descobriu que
não gostava de engenharia, queria mesmo fazer matemática, isso criou uma grande
polemica na família, queriam que ela fosse engenheira, todo mundo acha que a
área da matemática não dá dinheiro, não tem futuro.
Tem futuro e
dá dinheiro?
É um
campo que ainda está em crescimento, nos últimos cinco anos tem matemático
sendo contratado para altos cargos em empresas, as portas estão se abrindo
muito para quem é matemático, físico e estatístico. O cérebro de quem faz
exatas pensa de forma diferente de quem estuda ciências humanas. Há uma maneira
diferente de estruturar as coisas. Acho que é essa busca que está acontecendo.
Quem é mais sensível
ao ser humano o matemático ou quem estuda ciências humanas?
Eu não
sei! Talvez quem faz ciência humanas! Acho que os matemáticos são um pouco
frios! (risos). Os matemáticos têm o habito de trabalharem de forma solitária,
um dos últimos ganhadores de um prêmio, morava com a mãe, e desenvolveu toda a
sua teoria fechado em um quarto. Não há muita interação entre os matemáticos.
Você joga
xadrez?
Ultimamente
não porque não tenho mais tempo, mas gosto bastante. Meu marido também joga,
perco para ele! Em programação de computador eu levo vantagem! Uso Assembler programa que transforma o código
escrito na linguagem Assembly em linguagem de máquina, substituindo as
instruções, variáveis pelos códigos binários.
Você tem algum hobby?
Gosto muito de ler! Antigamente eu lia
uns 15 livros por ano, antes do doutorado. Nesses últimos quatro anos só leio um
por ano!
Pratica algum esporte?
Faço musculação, para manter a saúde,
não que eu goste! Por um período fiz Muay
Thai.
Você tem
algum animal de estimação?
Tenho!
Três cachorros: Grega, Zorro e Cinderele e uma gatinha: Orange. A Cinderele é
manca, lembrei-me da princesa que perdeu o sapatinho. A Grega já era do meu
esposo, ele achou-a filhotinha na rodoviária. O Zorro eu o encontrei próximo a
minha casa, a Cinderele encontrei na Unimep de Santa Barbara d`Oeste, era
filhotinha, com a patinha manca. Fiquei com pena e peguei. A Orange era uma
filhotinha que estava perdida na rua da minha casa. Peguei também. Agora
pretendo ficar só com esses!
Seus pais vêm
para Piracicaba visita-los?
Vêm.
Devem vir agora no carnaval. Minha mãe ama Piracicaba, ela adora o calor.
Quais são
seus planos para o futuro?
Tenho
muitos projetos, plano para morar fora do país, só que fico muito apegada ao
trabalho que desenvolvo, gosto muito da minha profissão, me preocupo com os
meus alunos que serão professores no futuro. Acho a minha carreira aqui muito
bonita. Abrir mão disso tudo e ir para outro país, conheço pessoas que não
gostaram do país para onde foram, mesmo sendo considerado país de grandes
recursos.
A seu ver a
idade influi na capacidade cerebral?
Eu acho
que não é a idade que influencia, são os estímulos. Quanto menos você estimula,
mais velho o seu cérebro vai ficando. Muito mais influente do que o tempo são
os estímulos. Quando você para de aprender coisas novas, para aprender uma
outra coisa fica mais difícil. Temos que estar continuamente aprendendo.
9 Provas de que Você pode Aumentar a Capacidade do Seu Cérebro
A Biomedicina
usa matemática?
Meu
trabalho de mestrado foi na área médica. Trabalhei com infeções hospitalares.
Fiz parceria com um médico que era chefe de um hospital de Botucatu. Um dos
grandes problemas na área médica são as infecções hospitalares. Ele estava em
um hospital de pessoas que sofreram queimaduras graves. Eu não tinha contato
com o paciente, o médico fornecia os dados e eu fazia os modelos. A presença
junto ao paciente deve ser de pessoas estritamente essenciais. Na área médica a
matemática pode contribuir muito. Podemos criar cenários na matemática que não
são possíveis em experimentos laboratoriais por exigirem uma infraestrutura que
o modelo matemático não precisa. Você passa para uma equação, usa o computador
e simula situações. Por exemplo: “-Se a temperatura aumentar 30 graus, o que
irá acontecer com determinado fenômeno?”. Só que para desenvolver esse modelo
matemático é preciso ter muito conhecimento do processo, como eu precisava do
médico para me falar como aconteciam as coisas.
O
talento, a determinação e a disciplina da jovem Professora e Doutoranda
Josemere muda o ponto de vista dos mais experientes com relação as futuras
gerações.
{\displaystyle
h_{a}=argmax_{h}\left[p(h|e)={\frac {p(e|h)p(h)}{p(e)}}\propto
p(e|h)p(h)\;\;{\text{ pois }}\;\;p(e)|h=p(e)\right]}
PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E
MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 19 de janeiro de 2019.
Entrevista: Publicada aos sábados
no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços
eletrônicos:
http://www.teleresponde.com.br/ ENTREVISTADO: IBRAHIM MATTUS
Ibrahim
Mattus nasceu a 2 de outubro de 1931na cidade de Conceição de Macabu, nome que deriva de
Nossa Senhora da Conceição do Rio
Macabu, naquela época era distrito de Macaé. É filho de Abdo
Mattus e Izolina Pereira Mattus que tiveram sete filhos: Afair, que faleceu ao
nascer,Fair, Nazira, Munira, Ibrahim, Nabile, Amira. Ibrahim Mattus é Procurador Federal. No Exército chegou ao posto de terceiro sargento. Iniciou-se
profissionalmente como funcionário terceirizado do Instituto do Açúcar e do
Álcool, galgando postos importantes, sendo inclusive nomeado como interventor
pelo Presidente Fernando Collor. Batalhador incansável, trouxe ao Bairro Santa
Terezinha melhorias usando sua influência pessoal, adquirida por mérito
próprio. Uma narrativa de uma vida de lutas, glórias e desafios.
Qual era a atividade do
pai do senhor?
Mascate!
Como todo bom árabe ele começou como mascate, trabalhou muito, pouco antes de
falecer tinha um armazém que tinha de tudo. Era o shopping de hoje! De enxada
até agulha, da banana ao feijão! Meu pai faleceu muito jovem, com 41 anos,
possivelmente com um ataque cardíaco, naquela época não existia os recursos que
existem hoje, era um mundo diferente.
Ele veio para o Brasil
sozinho?
Veio
sozinho, ele tinha um primo que já morava no Brasil, Jorge Tebet Jorge que morava em Conceição de Macabu. Ele
e Jorge eram dois moços de chamar a atenção, meu pai era muito charmoso, um
homem bonito, conheceu a minha mãe, ela com 17 anos, casaram-se. Era um período
em que as famílias tinham muitos filhos.
Ao ficar viúva qual foram as providencias que a sua mãe
tomou?
Eu tinha uns cinco anos. O meu pai estava muito bem de
vida. Começaram a aparecer credores, minha mãe querendo honrar o nome do meu
pai, as dívidas eram na palavra, não usava-se documentação escrita, ela pagou a
todos que se apresentavam como credores. Com isso em pouco tempo os recursos
escassearam. Como tínhamos uma conhecida em Niterói, fomos todos para lá.
Uma
viúva e seis filhos! Minha mãe era costureira, começou a trabalhar, fazia
costuras para uma empresa do Rio de Janeiro, fazendo calças. Com 12 anos eu
levava as calças prontas para o Rio de Janeiro. Ia de barca, naquela época a
travessia Rio-Niterói era feita por barcas. Ainda não existia a ponte ligando
as duas cidades. A ponte foi construída em 1964 pelos militares.
O senhor pequenininho ia sozinho?
Naquela época não havia maldade, os próprios passageiros
se protegiam, assim como aquela criança desconhecida ,no caso, eu, levava as
calças prontas e trazia a fazenda para costurar as calcas, camisas, o que
precisasse. Minha mãe costurava bem.
Com isso ela conseguiu manter a família?
Conseguiu, e também havia muita solidariedade, por parte
de famílias amigas, parentes. Ela costurou durante sua vida toda, faleceu em
1992, com 86 anos. Foi uma heroína, sozinha criou uma família. Criou os filhos,
encaminhou-os, se relacionar, hoje nossa família tem mais de 100 descendentes.
O senhor trabalhava em algum local, quando era garoto?
Fui trabalhar em uma farmácia, fazendo entregas de
medicamentos. Ia a pé, de bicicleta, dependia da distância. Eu me sentia
importante! Depois fui trabalhar com um dentista, uma das minhas atividades era
levar as marmitas para ele. Ele fazia restaurações utilizando ouro. Antigamente,
o ouro era uma das ligas metálicas mais utilizadas por dentistas em
restaurações devido a sua resistência. O procedimento sempre foi muito caro por
se tratar de um material precioso. Por isso ter um ou mais dentes de ouro era
um símbolo de status financeiro. Permaneci trabalhando para o consultório
dentário por uns quatro anos.
O senhor não se interessou em ser dentista?
Não me interessei, talvez por não ter estudos na época. A
minha vida de estudante foi muito difícil. Fiz o curso primário no hoje Colégio
Estadual Melchiades
Picanço em Niterói. O governo lançou um curso que
dava a oportunidade de fazer o ginásio e o colegial em um tempo reduzido,
proporcionando a oportunidade de fazer um curso superior. Tive um grande amigo
chamado João Pires Ribeiro que era meu cunhado, casado com a minha irmã Fair.
Ele me indicou a um senhor que tinha um restaurante na
Standard Oil
Company era
no Brasil a Esso Brasileira de Petróleo
Ltda. Fui trabalhar com ele , no prédio que era do Instituto do Açucar e do
Álcool, fundado em 1933 por Getúlio Vargas.
O senhor conheceu Getúlio Vargas?
Conheci!
Cheguei a falar com ele. Eu tinha um amigo que era o mordomo do Getulio, ele me
convidou para ir até o Palácio do Catete para conhecer o Dr. Getúlio. Fui. Ele
me cumprimentou, de longe, aí nós fomos embora. Em 24 de agosto de 1954 ele
suicidou-se.
Gregório
Fortunato foi o chefe da guarda pessoal do presidente Getúlio Vargas, tambémconhecido como "Anjo Negro", devido
ao seu porte físico e sua pele negra. Gregório começou a ter muito poder,
despachava com coronel, general. Antes de falar com o Getúlio os interessados
tinham que passar primeiro com ele. Getúlio por suas idéias, foi se isolando, o
Almirante Amaral Peixoto casou-se com Alzirinha (Alzira) Vargas filha dele,
conheci esse pessoal todo, não tinha relações de amizade, mas quando ia ao
Palácio do Catete sempre via um deles. Conheci o Copacabana Palace Hotel, mas
não frequentava, era só para quem tinha muito dinheiro, geralmente turistas
estrangeirs.
Existem até hoje pessoas que colocam
em questão se Getúlio Vargas suicidou-se ou foi assassinado, a seu ver o que de
fato aconteceu?
Getúlio sentiu-se encurralado. Tinha
o Gregório Fortunato que praticamente mandava e desmandava, Carlos Lacerda, um
grande orador, fez uma intensa campanha contra Getúlio. Teve um dia em que ele
ficou 24 horas no ar falando mal do Getúlio. Conheci Adhemar de Barros,
inclusive lembro-me do caso famoso de suposta "negociata" muito comentado
foi o "Caso da Urna Marajoara" do Museu Paulista.
O senhor conhece a história de Jorgr
Guinle dono do Copacabana Palace?
Carlos Guinle, seu pai,
sabia que logo iria falecer, calculou o tempo de vida do filho Jorge (Jorginho)
Eduardo Guinle, e disse-lhe: “Esse dinheiro é para você viver até morrer”
Jorginho foi um socialite,
playboy, e herdeiro
milionário notável por suas conquistas amorosas e falência financeira. Após ter
gastado quase todos seus bens, avaliados em cerca de 100 milhões de dólares, em
festas, viagens e mulheres, Guinle faleceu aos 88 anos de idade, morando, por
favor de seus novos donos, no hotel Copacabana Palace. O hotel
fora fundado por seu tio, Octávio, em 1923. Conquistou grandes artistas, entre elas Ava Gardner, Anita
Ekberg, Veronica
Lake, Romy
Schneider, Kim Novak, Hedy
Lamarr, Susan
Hayward, Zsa Zsa
Gabor, Rita
Hayworth, Lana
Turner, Jane
Russell. Casou-se quatro vezes com: Dolores Sherwood Bosshard, Ionita
Sales Pinto, Tânia Caldas, Maria Helena Carvalho. Não há dinheiro que aguente!
O Rio de Janeiro dessa época era completamente diferente?
Você saía
tranquilo, eu trabalhava no IAA, fazíamos horas extras, a noite saíamos para
jantar a meia-noite, íamos no Spaghettilândia,
vinham umas cumbucas com espaguete, ficava na Lapa, não havia riscos;
Como
era a Confeitaria Colombo?
Ali era o
ponto dos políticos, das atrizes, das candidatas a atrizes.
Carnaval,
o senhor participou?
Participava
mais como assistente. Naquela época havia um desfile de carros, com muito
confete e serpentina. O povo se divertia de forma sadia. Era mais romântico.
O
senhor chegou a frequentar a Rádio Nacional?
Frequentei
no tempo de Cesar de Alencar, Cesar Ladeira, ali conheci Dalva de Oliveira,
Emilinha Borba, Aracy de Almeida, Ataulfo Alves,
Nelson Gonçalves, Silvio Caldas, era tudo ao vivo. Como bom niteroiense, não
tinha o que fazer no domingo, atravessava com a barca, criança não pagava.
E
bailes o senhor frequentava?
Fui uma vez
no Bola Preta para conhecer. A conotação de baile naquela época era outra.
E o folclórico Tenório
Cavalcante o senhor o conheceu?
Ele era de
Duque de Caxias, o conheci, tem uma passagem em que o Tenório Cavalcante estava
sendo entrevistado, ele andava com uma capa preta e embaixo da capa preta Tenório andava sempre
ao lado de sua "Lurdinha", uma submetralhadora MP-40 de fabricação alemã, o
entrevistador, radialista, fez uma pergunta ao Tenório, que não o agradou, o
Tenório disse-lhe: “Pula na piscina!” O radialista disse-lhe “-Mas eu estou de
roupa, com relógio”. O Tenório simplesmente disse-lhe: “Pula na piscina, senão
vou lhe dar um tiro!”. Imediatamente o entrevistador mergulhou! Pelos cabos
eleitorais, Cavalcanti fora conhecido como "O Rei da Baixada"; pelos
rivais, era tachado de "O Deputado Pistoleiro".
Uma das figura folclóricas do Rio de
Janeiro foi João Francisco dos Santos mais
conhecido como Madame Satã?
Era um
homossexual, com uma altura muito acima do padrão, musculoso, uma fera em
qualquer briga, inclusive praticava o que na época era novidade Jiu-jitisu. E
um exímio manejador de navalha. São fatos que existiram.
O
senhor chegou a ir ao Cassino da Urca?
Não, não fui.
Só iam artistas, pessoas com alto poder aquisitivo.
A barca
que fazia a travessia Rio-Niterói transportava quantas pessoas?
Acho que umas
3.000 pessoas. Foram reformadas e estão funcionando até hoje. Depois vieram as
aero barcas. Eram barcos para cerca de 50 pessoas, quando ele pegava uma certa
velocidade ele inflava e deslizava na água, fazia o percurso em 8 a 10 minutos,
a barca convencional levava 30 minutos.
O Rio
de Janeiro lhe traz muita saudade?
Tenho
saudade das amizades, bastante familiares que ainda moram lá. Rio de Janeiro, Niterói,
eles tem uma característica própria que são as suas praias. Mesmo aborrecido, se
você teve um dia pesado, vai para a praia, procura uma sombrinha, deita, você
se recupera, se recompõem. Niterói é
um município da Região Metropolitana do Rio de
Janeiro, no estado do Rio de Janeiro. Foi a capital
estadual, entre 1834-1894 e
novamente entre 1903-1975. A Guanabara foi um estado do Brasil de 1960 a 1975,
que existiu no território do atual município do Rio de Janeiro. Em sua área, esteve
situado o antigo Distrito Federal. Foi capital
estadual fluminense até a fusão entre os estados do Rio de Janeiro e da Guanabara em 1974.
Dista 15 km da Cidade do Rio de Janeiro e possui como acesso a Ponte Rio–Niterói Antes o Rio de
Janeiro foi Estado da Guanabara, depois voltou a ser Rio de Janeiro. Niteroi
deixou de ser a capital do Rio de Janeiro. Portanto Rio de Janeiro é a capital
do Estado do Rio de Janeiro.
A mudança da Capital
Federal para Brasília acelerou a deterioração do Rio de Janeiro?
O Rio
politicamente não tem mais nada. Tem suas maravilhosas praias. Conheci Juscelino Kubitschek de Oliveira colocou
ordem na casa. Transferiu a capital para Brasília. Hoje o Rio não comportaria
além do espaço físico, a topografia impõem limites naturais.
Voltando à sua
trajetória pessoal, o senhor foi trabalhar no prédio do IAA.
Esse meu
cunhado João Pires da Costa Ribeiro, conhecia o Pires, que tinha o restaurante
do IAA. Fui na Praça XV, 42, onde hoje é a sede da Policia Federal, disse ao
Sr. Pires que eu era cunhado do João Pires. O restaurante ficava no último
andar, 11º andar. Era para os funcionários. Me apresentei, o Sr. Pires
disse-me: “Você é cunhado do Pires? “
Respondi afirmativamente. Ele disse-me: “Pega
um jaleco e pode começar a trabalhar!” A diretoria do IAA almoçava depois dos
funcionários terem feito sua refeição.
Havia diferença nas refeições
servidas aos funcionários e aos diretores?
Havia! Não
sei se era por ser novinho, talvez bonitinho, ele me mandou servir a mesa da
diretoria. Tinha uma senhora, Dona Elza, muito fina, simpatizou-se comigo. Eu
me esforçava para tratá-los da melhor maneira possível. Dona Elza perguntou-me:
“Ibrahim você não quer ser ascensorista?” Respondi-lhe: “Se o Sr. Pires deixar,
eu vou!”.Ela disse-me: “Com o Pires eu
me entendo!”. Eu fui falar com ele, contei-lhe o sucedido. Ele disse-me: “Vai embora,
vai cuidar da sua vida”. Fui servir no IAA como ascensorista, era diarista, era
terceirizado. Eram duas portas de metal sanfonadas, portas pantográficas. Ali
trabalhei uns seis meses.
O que o senhor achou
desse trabalho?
Melhor do
que o anterior! Trabalhava em pé, tinha que abrir a porta para o acesso ou a saída
dos ocupantes. No elevador conheci todo mundo. Tinha um senhor que era de uma
usina de São Paulo, todo natal ele ia com uma nota de dinheiro no valor de 20
mil réis, naquela época era um bom dinheiro, notas novinhas, ele ia
distribuindo, para o ascensorista, para o garçom, só para os funcionários com
cargos mais modestos. Eu trabalhando no elevador, essa mesma senhora, Dona
Elza, ela trabalhava no gabinete da presidência, era secretária do presidente
Gileno De Carli, ele era de uma família de Pernambuco. Dona Elza disse-me:
“Ibrahim, surgiu uma vaga de contínuo no gabinete, você quer ir para lá?” Na
hora respondi:” Vou sim senhora, o que a senhora fizer por mim está ótimo!”
Após uns seis meses no gabinete ela disse-me: “Ibrahim, você vai fazer um curso
na IBM! Surgiu uma vaga e a diretoria disse-me para indicar uma pessoa. Vou
indicar você.” Perguntei-lhe: “E o meu horário?” Ela respondeu” Você vai fazer
o curso, portanto está dispensado do horário!”
Que curso o senhor foi
fazer na IBM?
Um curso de
mecanização. Eram digitados os dados e transferidos para um cartão perfurado.
Fiz o curso que durava seis meses.
Nessa época o senhor já
trabalhava de paletó e gravata?
Sim, eu
trabalhava no gabinete da presidência!
Qual era a sua idade?
Eu me casei
aos 20 anos, aos 20 anos entrei lá. Deveria estar com 21 a 22 anos.
Como se chama a sua
esposa?
Em primeiras
núpcias casei-me com Vanusa Barbosa Mattus, tivemos os filhos: Luiz Carlos (falecido
precocemente), Paulo Roberto (falecido há uns seis anos), Júlio Cesar, Carlos
Alberto, Marco Aurélio, Edna Lúcia, Ana Maria e Carmem Denise. Em segundas
núpcias casei-me com Neide Terezinha Gentile Mattus. Além de criarmos uma
sobrinha, Maria de Fátima, hoje residente na cidade de Campos, Rio de Janeiro.
Após fazer o curso na
IBM o senhor foi trabalhar em que setor?
Fui
trabalhar na seção de mecanização. Era ambiente com ar condicionado. Por causa
dos equipamentos e dos cartões que no calor ficavam muito rígidos e no frio
perdiam a resistência. Tinham que ter a elasticidade ideal. Era um setor de
elite. Ali passava a contabilidade, serviço pessoal, naquela época não tinha o
Departamento de Recursos Humanos(RH). O IAA fazia muitos empréstimos para as usinas,
tudo era controlado por lá. Imprimíamos os relatórios que o presidente pedisse.
Os relatórios eram impressos em papel zebrado (duas cores, sendo cada linha uma
cor), em impressoras matriciais, enormes, barulhentas. O IAA tinha no Brasil
todo uns 3.000 funcionários. Eu não estacionei, fui evoluindo dentro da
empresa, até quando eu estava no Departamento Pessoal veio a revolução de 1964.
O General Vargas (Mera coincidência de sobrenome com Getúlio Vargas) foi
nomeado interventor do IAA. O Departamento Pessoal sempre foi uma área especial
por deter informações de cunho sigiloso. Esse General Vargas me chamava em seu
gabinete e dizia: “Me traz a ficha do funcionário tal”. Eu trazia a ficha. E
faz aquilo, e faz isso. Acabei fazendo amizade com ele. Lembro-me que um dia
ele me disse: "Ibrahim, tem pessoas que vem aqui e me dá vontade de jogar
escada abaixo! Você jogaria para mim?” Respondi-lhe: “General, não sou
violento, não faço isso e sei que o senhor não faz também!”A história vai mudar radicalmente. Fui
nomeado interventor da Destilaria Gileno De Carli. a pessoa que estava aqui
como gerente estava fazendo coisas erradas. Para você ter uma ideia ele andava
de patinete no salão da usina. Era maluco. O jipe chapa branca (uso restrito
serviço público) era como se fosse propriedade dele. Enfim, ele usava e
abusava. Cheguei aqui, com ordem do General Vargas para mandar esse gerente
para Ponte Nova - no estado de Minas Gerais, onde havia
uma destilaria também. Isso foi no final de 1969. Vim com a missão de acabar
com essa destilaria. Elas estão até hoje ai porque a pressão foi muito forte. Havia
um serviço especial que administrava essas destilarias: Gileno De Carli,
Lençois Paulista, Guararema, Ariranha, eram aproxiamadamente umas vinte
destilarias do Instituto. Eu fazia todo mês uma vistoria nessas destilarias,
isso no Estado de São Paulo, mandava um relatório para o Rio de Janeiro. Vajava
de jipe. Eu tinha um carro Mercury conhecido como “Boi Deitado” . Foi um amigo
meu, procurador lá do Rio de Janeiro, que tinha essa Mercury. Ele Disse-me: “-
Ibrahim, fica com essa Mercury, vai usando até eu precisar dela”. A cor era
verde-água,oito cilindros, muito robusta,era um trator.Fiquei aqui como
administrador dessas destilarias, vi que não tinha jeito como acabar. Na
Destilaria de Guararema quem mandou invadir a destilaria foi um padre!
Onde situava-se a Destilaria Gileno
De Carli?
Ficava em Santa Terezinha , no atual
bairro IAA. Levei para Santa Terezinha: Correios, Caixa Econômica Federal e
farmácia. Santa Terezinha era constituida pelo Matadouro, IAA e a pracinha, com
algumas casas dos moradores mais antigos. Levei água, o prefeito era Adilson
Benedito Maluf. Eu liguei para o General Vargas, disse-lhe: “General, aqui não
tem água, ela vem de uns dois quilômetros, eu preciso de tubo para levar para a
destilaria”.
Mas como funcionava a destilaria sem
água ?
Ela tirava água do rio e tratava,
era independente. A questão era levar água para a população de Santa Terezinha.
Levamos água para toda Santa Terezinha até a destilaria. Precisávamos de luz,
eu só poderia deixar as casas terem luz com autorização da Companhia Paulista
de Força e Luz., ela era a dona dos postes. Entrei em contato com o IAA para
fazer o uso dos postes. A CPFL autorizou o IAA a utilizar a energia, Antes só
tinha luz no IAA e no Frigorífico Angeleli.
O senhor morava lá?
Morava na casa nº 1.
Quanto tempo o senhor permaneceu em
Santa Terezinha?
Posso dizer que estou até hoje lá!
Tenho filho que mora lá. Levei a água, luz e depois o asfalto para Santa
Terezinha. Quando era terra eu mandava passar o trator da Destilaria. Um
episódio curioso ocorreu quando trouxemos uns ferros de outra destilaria para
cá. Um amigo nosso, um negro de sobrenome Bispo, ao perceber que uma barra de
aço de uns 200 quilos ia cair e poderia causar uma tragédia, ele abraçou a
barra, sózinho, seu corpo tremia com o peso, até chegarem os companheiros e
ajudá-lo. Isso ficou na história. Eu era o administrador quando veio a
Planalsucar, Com os laboratórios que analisavam as amostras de açúcar que
colhíamos. A Planalsucar saiu, uma parte da área está com o municipio, outra
com escolas, há outra parte com a Justiça do Trabalho. Em 1970 abriu o
vestibular para a Faculdade de Direito em São Carlos, fiz o vestibular e
passei. A Unimep tinha faculdade de Direito, já estava no primeiro ano. Passei
a cursar a Faculdade de Direito de São Carlos, ia todas as noites eram 240
quilômetros ida e volta, ia com meu fusquinha. No semestre abriu a segunda
turma aqui em Piracicaba, pedi transsferência de lá e me inscrevi aqui na
UNIMEP. Sou da segunda turma de Direito da Unimep, me formei em 1974. Abriu
concurso para procurador do IAA. Eram sete vagas disponíveis, eu entrei. Fui
aprovado em primeiro lugar. Fui nomeado procurador, hoje sou aposentado como
Procurador Federal. Em 1992, quando o Collor entrou, ele me nomeou interventor
no Rio de Janeiro, para fechar o IAA. Todos os dias em meu gabinete havia uma
fila de mulheres que descia a escada, a conversa era muito parecida: “ Seu
Ibrahim , não manda a minha filha embora!” Eu explicava: “Minha senhora, a
minha missão é essa!”. Nesse interim a minha mãe ficou doente, ela veio a
falecer em 1992. Passei um telegrama ao Collor pedindo que me substituisse por
questão de saúde, a não adaptação as ordens que ele deu, ele atendeu o meu
pedido. Eu ainda estava em Niteroi, ele nomeou outro interventor, que foi uma
senhora. Pensei: “-Estou com 40 anos de IAA. O que estou fazendo aqui?”. Passei
um telegrama ao Collor, agradecendo e pedindo a aposentadoria. Ele imediamente
concedeu. Saiu no Diário Oficial, ai me aposentei, em 1992. Aí vim para
Piracicaba , de volta.
Hoje o que o senhor faz?Tem algum
hobby?
Eu já estou aposentado! Uso muito o
computador, converso, telefono. Me lembro de tudo na minha vida.
Em seu trabalho o senhor pegou
muitos voos?
A Ponte Aérea era a minha casa! O Constellation foi uma aeronave
comercial famosaoperado pelas extintas
Varig e Panair do Brasil. Tinha cabine pressurizada, o que era novidade naquela
época e era movido por quatro motores radiais a pistão de 18 cilindros. Tinha
dias em eu ia e voltava até o Rio. Demorava 45 a 50 minutos de voo. Saia do
aeroporto de Congonhas e descia no Santos Dumont.
O senhor chegou a montar escritório de advocacia em
Piracicaba?
Montei, no Edifício Kennedy, na Praça José Bonifácio. Após algum tempo
decidi fechar. Já estava aposentado.
O
bairro de Santa Terezinha conhece o trabalho do que o senhor fez em benefício
da localidade?
Eis a questão! O pessoal que vivenciou cada melhoria
feita, quase todos faleceram. Quem vai acreditar que levei água, luz e asfalto,
correio, Caixa Econômica Federal para Santa Terezinha? O Adilson Benedito Maluf
teve participação com recursos locais, mas tive que usar meus contatos em
esferas superiores. Fui muito amigo do Deputado Federal João HermannNetto, do Deputado Federal Pacheco Chaves, do
Deputado Estadual Francisco Antonio Coelho, o Coelhinho, do José Machado. João
Chaddad é muito meu amigo. Em 1982 o Chaddad concorreu ao cargo de prefeito de
Piracicaba e eu era o candidatado a vice-prefeito. A política é envolvente. E
perigosa. Assim como você faz uma amizade pode despertar uma inimizade. Passei
por essa experiência e posso afirmar que não gosto. Ouço todo mundo, tiro as
minhas conclusões.
O que o senhor acha de Piracicaba?
Quem conhece Piracicaba de 1969! A primeira vez que vim
para cá o Edifício COMURBA tinha caído seis meses antes, estava tudo lá, as
lajes dos andares dependuradas na parte do prédio que não caiu, ainda tinha
muito entulho. Fiquei apavorado com aquilo. A sorte de muitas pessoas, é que o
cinema que existia embaixo, Cine Plaza, iria funcionar à tarde e o prédio
desmoronou antes.
O senhor foi colaborador com artigos para algum jornal?
Quando o Jornalista Evaldo Vicente iniciou o seu trabalho
com “A |Tribuna Piracicabana”, eu escrevia uma página inteira sobre Santa
Terezinha. Lá tudo que acontecia em Santa Terezinha eu noticiava, Meu filho o jornalista,
apresentador e produtor de televisão KalMattus era garoto, ele erao
responsável pela distribuição de “A Tribuna Piracicabana” em Santa Terezinha. (Alguns
anos passados e sua neta, a jornalista Marina Mattus, filha de Kal Mattus, estreou na
última sexta-feira, dia 18 de janeiro, uma
página/coluna no jornal “A Tribuna Piracicabana”, com seus textos falando sobre
nossa cidade e, principalmente, sobre seus cidadãos!).
Nessa época o senhor foi
administrador de Sanmta Terezinha?
Na época
tinha um amigo, já falecido, o Brandão, que foi diversas vezes candidato a
vereador. Fui administrador de Santa Terezinha.
O senhor nunca pensou em
ser vereador?
Só em 1982
fiz essa aventura de sair candidato a vice-prefeito! Paulo Maluf estava no auge estávamos o Chaddad,
eu e Paulo Maluf na mesma chapa. Eu telefonava
para a casa dele, Dona Sylvia Lutfalla Maluf atendia, eu pedia material de
propaganda, a noite, no dia seguinte estava aqui em Piracicaba. O Maluf veio à
Piracicaba, fazer um comício onde era o COMURBA, eu estava na casa do Dr. Jairo
Ribeiro de Mattos, que era candidato a deputado. Disse ao Jairo: “Jairo, nossos
votos estão lá na praça, vamos para lá!”. Fomos, o Maluf veio nos cumprimentar.
O cantor em alta na época era Waldick
Soriano, com a música “Eu Nao
Sou Cachorro Não”. Ele apresentou-se com seu repertório incluindo essa música
que fazia muito sucesso. Era uma pessoa carismática.
Temos
constantemente notícias sobre o desvio de conduta de alguns políticos. Do alto
da sua experiência, qual é a solução para essa situação?
Não têm! O
mundo não tem solução! A França é um ícone da perfeição política, eu adoro os
franceses, pela arte, filosofia, mas a França está corrompida. A Inglaterra
está corrompida. A Alemanha está corrompida.
O senhor sempre foi
muito ativo!
Fui! Eu
estava no IAA no Rio, adquiri três Gordinis novos, financiados. Coloquei-os
para trabalhar como taxi, em uma semana um foi roubado, outro pegou fogo e o
terceiro eu devolvi. Quando cheguei aqui em Piracicaba em 1969, estava ainda
pagando carnê referente aos carros!
Ir morar no Rio de
Janeiro era o sonho de muitos brasileiros?
Era onde tudo acontecia! Tinha
tipos característicos como toda cidade têm. Um deles era o Poeta Gentileza. Eu
estava em casa dormindo. Minha esposa disse-me
“Levante que o circo pegou fogo vai que estão lá assistindo ao espetáculo sua
mãe, sua irmã e sua sobrinha!”, Era o Gran Circo Norte-Americano. Peguei o
carro, nessa época eu trabalhava no IAA durante o dia e trabalhava como taxista
com um Chevrolet 1938, até umas dez ou onze horas da noite. Fui até onde estava
o circo, quando cheguei vi uma cena dantesca, muitas pessoas mortas,
desfiguradas. Encontrei minha mãe, minha irmã e a minha sobrinha. Elas me
contaram que durante o fogo se abraçaram e colocaram a minha sobrinha no meio.
Hoje minha irmã e minha sobrinha moram nos Estados Unidos. A Olga, minha
sobrinha, ficou com cicatrizes das queimaduras nas costas. Não sei se ela fez
depois alguma cirurgia plástica. Minha irmã Nabile também ficou com marcas das
queimaduras. Levei-as ao hospital, e voltei, com o meu carro passei a levar os
feridos ao Hospital D. Pedro I, em Niterói. Ficamos a noite toda prestando
socorro. José Datrino, o Poeta Gentileza falecido em 1996, perdeu a família
toda. José acordou alegando ter ouvido "vozes astrais", segundo suas
próprias palavras, que o mandavam abandonar o mundo material e se dedicar
apenas ao mundo espiritual. Datrino possuía uma empresa de transporte de cargas
e residia, com sua família, no bairro de Guadalupe pegou um de seus caminhões e
foi para o local do incêndio onde hoje encontra-se a Policlínica Militar de
Niterói. Plantou jardim e horta sobre as cinzas do circo em Niterói, local
que um dia foi palco de tantas alegrias, mas também de muita tristeza. Aquela
foi sua morada por quatro anos. Lá, José Datrino incutiu nas pessoas o sentido
das palavras Agradecido e Gentileza. Foi um consolador
voluntário, que confortou os familiares das vítimas da tragédia com suas
palavras de bondade. Daquele dia em diante, passou a se chamar "José Agradecido", "Profeta Gentileza" ou “Poeta Gentileza”
Percorreu toda a
cidade. Era visto em ruas, praças, nas barcas da travessia entre as cidades do
Rio de Janeiro e Niterói, em trens e ônibus, fazendo sua pregação e levando
palavras de amor, bondade e respeito pelo próximo e pela natureza a todos que
cruzassem seu caminho. Aos que o chamavam de louco, ele respondia: - "Sou maluco para te amar e louco para te
salvar". O Profeta Gentileza, também oferecia, em gesto de
gentileza, flores e rosas para as pessoas que cruzavam seu caminho nas ruas do
Rio de Janeiro.
(“Fogo!”, gritou a
trapezista Nena. Antonietta Stevanovichfoi a primeira a dar o alerta dentro do circo. Junto com os colegas
Vicente Sanches e Santiago Grotto, ela apresentava o quadro final de acrobacia,
clímax do espetáculo da tarde quente de domingo em Niterói. Foi quando um clarão pode ser notado
na parte inferior da lona, à esquerda da entrada. O fogo se alastrou
rapidamente e, nos 10 minutos seguintes, as 3 mil pessoas que lotavam o Gran
Circo Norte-Americano viveram um inferno. Foi o maior incêndio da História do
Brasil. Montado num grande terreno na avenida Feliciano Sodré, no centro da
cidade, o circo, de propriedade do empresário Danilo Stevanovich, era um dos
maiores da América Latina. Contava com 60 artistas, das mais diversas
nacionalidades, A lona verde e laranja, pesava 6
toneladas. Resultou em 503 mortos e 300 feridos foi uma das maiores
tragédias do Brasil, ocorreu na tarde de 17 de dezembro de 1961. Foi um
incêndio provocado por Adílson Marcelino Alves, o “Dequinha”, que tinha
antecedentes por furto e apresentava problemas mentais, motivado por vingança
contra o dono do circo que o dispensou. O Gran Circo Norte-Americano
comportava tantas pessoas quanto o Cirque du Soleil hoje em dia. O incêndio que
o destruiu deu um impulso à cirurgia plástica no país).
O cansaço e o sono do senhor o
salvou?
Nós íamos todos ao circo, só que
almocei, deitei, adormeci. Com isso meus filhos permaneceram em casa. Minha
esposa foi me chamar para levar as crianças ao circo, foi quando veio a notícia
pelo rádio, de que o circo estava em chamas. O “Poeta Gentileza”, andava pela
Avenida Amaral Peixoto, onde no número 55 minha sobrinha que é médica do
Exército tem consultório. Ele usava terno, lembra a figura do artista falecido
Pedro de Lara.
Ainda no IAA, em Piracicaba,
trabalhava uma personalidade: José Carlos Brasil.
Ele era
funcionário do IAA, e projetava filmes para a população. A princípio era
projetado a céuaberto, depois ele
passou a passar no galpão do IAA. Naquela época, eu trouxe um costume do Rio, o
IAA dava brinquedos através de uma associação que nós tínhamos. Antes tínhamos
uma missa e nós chamávamos o Padre Otto Dana para celebrar essa missa. Todo
Natal era assim. Na época o Padre Otto estava como pároco em Santa Terezinha.
Às margens da Rodovia
Piracicaba-Limeira, em terras da ESALQ, há uma estrutura enorme de uma usina de
açúcar, qual é a origem dela?
Aquilo foi doado pelo Instituto do
Açúcar e do Álcool, foi iniciada a construção, quando chegou a Revolução de
1964. Parou tudo. Aquilo era para ser um protótipo de usina para formar os
engenheiros agrônomos ligados a cultura da cana-de-açúcar, canavieiros, teriam
uma usina como laboratório.
Qual é um dos seus sonhos que
gostaria de realizar?
Gostaria muito de ir ao Líbano e ao
Egito! Conhecer o Vale dos Reis, no Egito, onde dezenas de antigos faraós
foram sepultados. Onde foi descoberta a famosíssima tumba de Tutankhamon
(1341 a.C. – 1323 a.C.), abriga o túmulo dos filhos de Ramsés II (a.C. 1290 a
1224 a.C.). Neste último foram achados 130 corredores e câmaras, o que o torna
o maior do local e um dos maiores do mundo. Com o avançar das pesquisas, aquele
número pode, talvez, chegar a 200. Em 1922 foram realizadas grandes
descobertas no Vale dos Reis.