sábado, fevereiro 16, 2019

LUIS MANUEL MARCELINO e MICAELA HIGINO PEREIRA MARCELINO


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 16 de fevereiro de 2019.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
LUIS MANUEL MARCELINO e MICAELA HIGINO PEREIRA MARCELINO 

ENTREVISTADOS: LUIS MANUEL MARCELINO e MICAELA HIGINO PEREIRA MARCELINO

Luis Manuel Marcelino, registrado na Sociedade Portuguesa de Autores, conhecido como Luís Marcelino, o poeta de Carreiro de Areia, escritor luso-canadense, fará o pré-lançamento de três livros, dois de poesias e um de relatos e ficção, será no dia 21 de fevereiro de 2019, no Instituto Beatriz Algodoal, situado a Rua São José, 446, centro de Piracicaba. No dia 23 de fevereiro, sábado às 10 horas fará uma pequena palestra e o lançamento das três obras no Recanto dos Livros, nas dependências do Lar dos Velhinhos. Uma rara oportunidade para ter as obras, conhecer o autor e sair com um livro autografado pelo mesmo. Autodidata, sensível, conseguiu transpor para o papel seus sentimentos de visão do mundo que o cerca.
Luís Manuel Marcelino nasceu a 13 de setembro de 1953, em uma pequena aldeia denominada Carreiro de Areia, pertencente a cidade de Torres Novas, em Portugal.


 É filho de Manuel Marcelino Pedro, pintor de construção civil e Maria da Guia, doméstica, que tiveram três filhos: Antônio, Regina e Luís.
Quantos habitantes tinha a aldeia quando o senhor nasceu?
Minha aldeia tinha 200 habitantes. A vocação da aldeia antigamente era agrícola, atualmente os habitantes trabalham em diversas atividades, fora da aldeia, em busca de um trabalho melhor. A aldeia mantém sua originalidade, as casas são feitas com pedra, umas assentadas com terra ainda, outras já com tijolos e cimento.   
A casa em que o senhor morou ainda existe?
Há três semanas atrás dormi no quarto em que nasci! A casa ainda é da nossa família.
Qual foi a sensação de passar a noite no quarto em que o senhor nasceu em Portugal?
É uma sensação boa, de estar em minha aldeia, e dormir no quarto em que nasci!
Como é a temperatura local?
No inverno, faz muito frio, dentro das casas é mais frio do que na rua, são casas antigas, não tem os recursos atuais, Temos que usar roupas e cobertores que nos protejam.
Pelo fato de ser uma construção muito antiga, o banheiro é externo?
O banheiro é interno. Tem todo o conforto normal a uma casa. Só não tem o aquecimento. Tudo no estilo rústico, que é o normal da aldeia. Frequentei a Escola Primária de Poços, um lugarzinho na aldeia. Essa escola atualmente está fechada, não há crianças em idade escolar na aldeia. Antes fazíamos os quatro primeiros anos nessa escola e depois seguia-se para a cidade para continuar os estudos.  Aos 11 anos de idade comecei a trabalhar em uma oficina mecânica e mais tarde dediquei-me à pintura de automóveis. Quando iniciei tínhamos carros ingleses Morris, alemães como Opel, Renault de origem francesa, isso foi por volta de 1965.
                                                        AUTOMÓVEL MORRIS 1952

                                                                 OPEL 1959
                                        
Comecei limpando os carros, as peças dos carros, varrer a oficina, pegava as ferramentas que os mecânico pedia, após algum tempo segui da mecânica para a pintura de automóveis.
Qual é o segredo para fazer uma boa pintura em um automóvel?
Tem que ter boas mãos para pintar, bons olhos para ver o que está sendo feito e bons materiais. Apesar de que quando comecei a ajudar os pintores não havia bons compressores. Era com um cilindro de oxigênio, com essa pressão do oxigênio é que se pintava, não se usava compressor. Onde fui trabalhar já havia energia elétrica.
Os clientes ficavam contentes com o seu trabalho?
Sim, não posso me queixar. Quando ainda era um garoto, os mestres é que faziam o trabalho. Eu só ajudava. Mais tarde comecei a fazer os meus próprios trabalhos.
              LUIS MANUEL MARCELINO e MICAELA HIGINO PEREIRA MARCELINO
Na época a política em Portugal era pesada?
Era ditadura. Antônio de Oliveira Salazar foi um advogado, professor universitário e presidente do Conselho de Ministro de Portugal de 1933 até 1968. Salazar foi responsável pela consolidação do Estado Novo e pela implantação ideológica do salazarismo. As regras eram difíceis, não podia ter ajuntamento nas ruas, Nunca vivi muito isso por que sempre passei ao lado da política. Anterior a esse período eu servi a tropa, ou seja serviço militar, foram 22 meses em Portugal, antes servíamos quatro anos, metade do tempo em Portugal e a outra metade na Províncias Ultramarinas, tínhamos cinco países na África: Guiné-Bissau, Angola, São Tomé e Príncipe, Cabo Verde e Moçambique.
Vocês tinham televisão, rádio na aldeia?
Até os meus 12 anos não tínhamos eletricidade na aldeia. Comecei a trabalhar na pintura de automóveis com 18 anos, parei de trabalhar com a pintura em 2012. Permaneci em Portugal até 1990 quando emigrei para o Canadá.
O que o levou a sair de Portugal?
Eu já tinha parentes no Canadá, minha irmã já morava lá, a vida em Portugal não estava muito fácil, Portugal estava passando por uma reconstrução, uma mudança.
Dona Micaela, a senhora tinha alguma atividade em Portugal?
Sim, era costureira, aprendi tudo sozinha. Corto o tecido, costuro, o desenho geralmente era da revista Burda, desenhava o modelo para o papel, do papel para o tecido, cortava, costurava e ficava bonito! Minha máquina era uma Singer elétrica. Trabalhava só com moda feminina, pode-se dizer que era alta costura: vestidos de noivas, casacos compridos, curtos, saias, blusas, o tecido a própria cliente escolhia, comprava e trazia. 
As clientes gostavam?
Adoravam! Eu costurava das nove horas da manhã até as sete horas da noite.
Qual era a alimentação do dia a dia?
Acho que em Portugal nós variamos muito de comida, tínhamos feijoada, massa. A feijoada é feita com feijão encarnado(vermelho), com chouriço, cenoura, couve, carne de porco. Temos o bacalhau, há também um consumo muito grande de caldos (sopas). Em Portugal come-se muita sopa. No verão, como faz muito calor, comemos comidas mais leves. No verão já tivemos a temperatura de 40 graus centigrados. Nesse ano em que a temperatura chegou a 40 graus, muitos idosos faleceram. A temperatura mínima onde morei eram 10 graus positivos.
Quem era o santo padroeiro do local onde a senhora morava?
Nossa Senhora de Fátima, Santo Antônio, isso em todo Portugal. Mais ao norte do país o padroeiro é São João e São Pedro. São três santos padroeiros. Na aldeia do Manuel o santo padroeiro é Santiago. Havia muitas procissões.
Em Portugal o catolicismo é muito forte?
Dona Micaela responde: A minha maneira de ver, já foi mais forte. Portugal recebeu muitos imigrantes, com crenças diferentes. Ainda prevalece o catolicismo.
Como vocês se conheceram?
Dona Micaela diz: “É interessante essa história. Há seis anos eu fui para o Canadá, mais especificamente para Toronto, onde tenho a minha mãe que mora no Canadá há 42 anos. Manuel e eu nos conhecemos no Canadá, há quatro anos, vai fazer dois anos que estamos casados.
A senhora é de que região de Portugal?
Eu não sou de Portugal! Nasci em Angola, na África. Com 5 anos fui para Moçambique, onde morei até os 19 anos.  Meu pai é Joaquim Higino Pereira, era enfermeiro, e a minha mãe Augusta Elias da Piedade. Tenho dez irmãos.
Quem foi primeiro para o Canadá?
Foram a minha mãe e o meu padrasto. Estávamos em Moçambique quando se deu em Portugal a Revolução de 25 de Abril de 1974, também conhecida como Revolução dos Cravos, quase todos os portugueses saíram de Angola e Moçambique. Muitos foram para a Austrália, África do Sul, Portugal outras pessoas foram para o Canadá. Decidi ir para Toronto, no Canadá por que já havia família por parte do meu padrasto. Isso foi em 1977. Infelizmente eu saí da África, minha terra, com 19 anos, já se passaram 43 anos. Tenho imagens, boas recordações. E digo: África é África!
Havia algum tipo de diferenciação entre o negro e o branco em Angola e Moçambique?
Quando eu vivia lá, não via muita diferença, talvez pela minha idade. Mas de fato não se juntavam. Nas casas, habitações onde estávamos não havia negros que vivessem lá. Havia uma zona deles. Nas lojas os funcionários eram mais os negros do que os brancos, assim como nos cafés, restaurantes. Íamos à mesma escola, negros e brancos. Morei em uma escola interna onde havia uma negra interna. Por isso eu não via discriminação.
Você realizou todos os seus estudos nesse colégio interno?
Fiz o curso primário em uma aldeazinha em Moçambique, chamada Buzi, depois então, fui para o colégio estudar do quinto ano até o oitavo ano, o Colégio chamava-se Nossa Senhora da Conceição. Era um colégio de freiras.
Era uma disciplina muito rigorosa?
Havia regras, leis, tudo com horário determinado para cumprir. Era muito rígido. As seis da manhã as freiras chegavam ao dormitório, batiam palmas, para acordar-nos, levantávamos, ajoelhávamos logo para rezar. Depois tínhamos meia hora, ou uma hora, para aprontarmo-nos, após o banho, íamos para o refeitório. Tomar um pequeno almoço, depois íamos ás aulas, tudo isso com horário. Missas só tínhamos aos domingos.
Qual foi a sua impressão ao chegar no Canadá?
Eu já tinha ido passar as férias no Canadá há 31 anos. Adorei o Canadá. Amo o Canadá!
A senhora exerceu alguma atividade no Canadá?
Ainda trabalho! Em limpeza de casa. Há muita procura por quem faz esse trabalho. Hoje já não é tão bem remunerado por ter muita concorrência. Há muitos brasileiros que fazem limpeza de casa. Mas vale a pena ir.
Qual é o comportamento do canadense?
Eles têm um comportamento típico britânico. A parte do Canadá em que estamos fala-se inglês. Moramos em um apartamento, eu, Micaela gosto do trânsito de lá. É melhor do que em Lisboa. Eu adoro Lisboa também. No Canadá as vias são todas regulares, paralelas e perpendiculares, bem sinalizadas.
O volante de direção do automóvel fica do lado esquerdo ou direito, como o modelo inglês?
É igual ao do Brasil
O transporte público em Toronto é bom?
É ótimo!
Em Toronto que existe um shopping abaixo da calçada?
É o maior shopping do mundo! O PATH é um complexo de túneis subterrâneos no Centro de Toronto. É como se fosse um shopping gigante debaixo da terra. São cerca de 30 quilômetros de extensão e mais de 371 mil metros quadrados que fazem do PATH o maior complexo comercial subterrâneo do mundo! O local conta com mais de 1200 lojas dos mais variados segmentos, como academias, mercados, lojas de fotocópias, restaurantes, clínicas médicas. É possível encontrar de tudo por lá! Por isso, durante o inverno, muitas pessoas preferem aproveitar tudo que o local tem para oferecer em vez de encarar o frio e a neve do lado de fora. O metrô fica muito próximo do meu apartamento e ele nos leva até o shopping.
O custo de vida, como é no Canadá?
Micaela diz: “Um bocadinho caro!”. Muitos produtos são importados, o que é produzido lá fica longe da cidade, o transporte encarece o produto.
Luís Marcelino o senhor escolheu Piracicaba para lançar três dos seus livros no Brasil. No dia 21 de fevereiro de 2019 o senhor fará o pré-lançamento de três livros, no Instituto Beatriz Algodoal, e no dia 23, sábado, às 10 horas da manhã, fará uma breve apresentação e o lançamento dos livros no Recanto dos Livros, no Lar dos Velhinhos de Piracicaba. Quais são os nomes dos livros?
São: “Mensagens e Pensamentos” que é a minha primeira obra, um conjunto de trabalhos escritos ao longo de alguns anos. São mensagens que eu gostava, que o mundo lê. Pensamentos que fui escrevendo de acordo com a minha paz de espírito, fiz em 2016. Em 2917 fiz “Nota de Música”, uma história começada a ser escrita nos anos 70, interrompi a obra, mantive o projeto, dediquei-me a outras obras e finalmente em 2013 a conclui e lancei em abril de 2017. Em novembro lancei “Pedaços de Silêncio”, um livro de poesias. Pedaços da vida retratados em silêncios de poesia; sonhos sem guarida transportados entre a realidade e a fantasia.
O que o motivou a escrever esses livros?
O primeiro livro “Mensagens e Pensamentos” tem poemas com mais de 20 a 30 anos, fui escrevendo e pondo na gaveta. Em 2016 houve a oportunidade de publicá-lo. Tenho outras obras onde sou coautor.
Luís, esses poemas foram inspirados em seu dia a dia, em suas observações, colocava no papel seus sentimentos?
Me inspiro muito no meu dia a dia, certas coisas que vejo, que eu sinto, muito sobre a natureza, certas coisas que escuto, o mundo precisava mudar um pouco, escrevo algumas coisas românticas, transporto para o papel meus sentimentos. Escrevo para que as pessoas que irão ler sintam-se bem também.
Os seus poemas são para elevar a pessoa?
Eu penso que sim e espero que sim. Essa é a minha ideia. Faço questão de que todos os meus livros sejam lançados primeiramente em minha aldeia. Assim foi com todos que já lancei e espero fazer o mesmo com os próximos.
É a primeira vez que vocês vem ao Brasil?
Sim é a primeira vez! Micaela diz: “Amei todos os dias em que estou aqui. Está me fazendo lembrar muito a minha África.”
Os negros brasileiros e os negros africanos, a seu ver tem alguma semelhança?
Não. Eu até acho diferença entre o negro angolano e o negro moçambicano. São diferentes em comportamento, fisionomia.
O que o Luís está achando do Brasil?
Respondendo em poucas palavras, espero que não seja a última vez. Estou gostando! As praias brasileiras são banhadas pelo Oceano Atlântico, assim como Portugal, só que no Brasil as praias são piscinas, em Portugal o mar é mais revolto. As águas das praias de Portugal são frias.
Eliana Menegatti, anfitriã, menciona a preocupação de Micaela antes de vir ao Brasil. A imagem do Brasil no exterior é de um país violento, com todo tipo de crime ocorrendo a qualquer momento.
Eliana revela que Micaela disse-lhe: “Eliana, eu tenho tantos colares, pulseiras, são bijuterias, que combinariam com a minha roupa, deixei tudo no Canadá! De tanto que me falaram do Brasil!” A imagem do Brasil no Canadá é assustadora. Somos terríveis, roubamos, matamos, assaltamos, o tempo todo! Disse-lhe que quando ela voltar poderá repintar diferente o Brasil! A Experiência que eles estão tendo, inclusive ao Luís que escreve para o jornal Sol Português faço um apelo, que escreva um texto sobre o Brasil.
 
Quantos portugueses moram em Toronto?
Possivelmente meio milhão sejam portugueses! (População estimada em Toronto é de 2.731.571 de habitantes em 2016).

Um comentário:

Unknown disse...

João parabéns pelo seu fantástico trabalho, pela sua atenção e dedicação! Agradeço também pela oportunidade prestada ao meu amigo Luis Marcelino e Micaela Marcelino! Forte abraço! Eliane Menegatti

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