terça-feira, abril 27, 2010

MISS SÃO PAULO 2010 É PIRACICABANA


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Tempo que foge

Tempo que Foge...


Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para frente do que já vivi até agora


Sinto-me como aquele menino que ganhou uma bacia de jabuticabas.


As primeiras, ele chupou displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço.


Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.


Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflados.


Não tolero gabolices.


Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte.


Já não tenho tempo para projetos megalomaníacos.


Não participarei de conferências que estabelecem prazos fixos para reverter a miséria do mundo.


Não quero que me convidem para eventos de um fim de semana com a proposta de abalar o milênio.


Já não tenho tempo para reuniões intermináveis para discutir estatutos, normas, procedimentos e regimentos internos.


Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar da idade cronológica, são imaturos.


Não quero ver os ponteiros do relógio avançando em reuniões de "confrontação", onde "tiramos fatos a limpo".


Detesto fazer acareação de desafetos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário do coral.


Lembrei-me agora de Mário de Andrade que afirmou: "as pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos".


Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos.


Sem muitas jabuticabas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita para a "última hora"; não foge de sua mortalidade, defende a dignidade dos marginalizados, e deseja andar humildemente com Deus.


Caminhar perto delas nunca será perda de tempo.


Quero sentir o prazer de ter ao meu lado pessoas que sejam positivas, que vibrem com a vida, que chorem, se desnudem, sejam frágeis de vez em quando, mas que sempre levantem e dêem a volta por cima...


Quero sentir a leveza dos sentimentos positivos, sentir o sorriso sem pudor, a gargalhada mais extravagante que deixa todo mundo ao lado contagiado, com vontade de rir...


Quero a loucura dos amigos ensandecidos de paixão pela vida, das noites mal dormidas de tantos papos e risadas, da falta de assunto com tanto assunto pra colocar em dia sempre...


Quero tomar muitos banhos de chuva, andar descalço, pisar na terra, sentir o cheiro de mato, do mar da vida...


Quero vocês a quem tanto amo do meu lado, todos os dias , por que isso sim vale a pena, o resto é conversa...


(Desconheço o Autor)

sábado, abril 24, 2010

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 22 de abril de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
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ENTREVISTADA: Rita de Cássia Domingues
A liberdade de expressão é a conquista mais preciosa do ser humano. Ela se manifesta de inúmeras formas, uma delas é a música. No amor e na guerra a música sempre esteve presente. Ela expressa de forma sublime o sentimento que se apossa do ser humano. O Brasil pela sua característica própria e única, multirracial e multicultural, é a fonte, aonde muitos artistas de outros países vem saciar a sua sede de musicalidade inovadora.
Talentosos artistas realizam obras de grande importância, passam pelo semi-anonimato, ou são conhecidos, mas não são reconhecidos। Alguns ainda têm o privilégio de serem devidamente valorizados após falecerem. Outros nem tanto. Piracicaba tem em seu seio grandes valores artísticos, verdadeiros operários da arte. Um desses grandes talentos é o Professor Erotides de Campos, natural de Cabreúva, onde nasceu em 15 de outubro de 1896. Compositor de marchinhas, sambas, choros, pianista e tocador de vários instrumentos, foi professor de física e química e passou parte da sua vida na cidade de Piracicaba. Compositores como Gounoud, Schubert, Puccinni, foram autores de obras com o mesmo nome: Ave-Maria. O nosso Erotides Campos, também é autor de uma obra que leva o nome Ave-Maria, e que também ultrapassou as nossas fronteiras e é executada até hoje pelo mundo afora. A casa em que viveu boa parte de sua vida, e onde faleceu, no dia 20 de março de 1945 está praticamente intacta. Mantém quase todas as suas características originais. É possível perceber a presença de Erotides, detalhista, perfeccionista. O teto em madeira envernizada mantém a originalidade, assim como a escada que leva ao andar superior, ainda de madeira. A cozinha onde degustava suas tão apreciadas laranjas lima. A impressão que se tem é de que Erotides de Campos foi até ali e volta já. Homem humilde, recatado, mulato, Erotides de Campos recebeu a homenagem de Piracicaba num enterro em que se revelou a comoção popular. Para falar com mais propriedade de Erotides de Campos ninguém melhor do que a sua filha.
Quais os nomes dos pais de Erotides de Campos?
Benedito da Silveira e Francisca da Silveira Neves. Aos 12 anos de idade já fazia parte da banda de Cabreúva, logo pode ouvir suas primeiras composições serem tocadas, os dobrados “Porto Artur” e “Saudades dos meus 12 anos” Quando ele tinha 14 anos de idade sua família transferiu-se para Piracicaba. Erotides de Campos integrou a famosa orquestra piracicabana que se apresentava nos cines Iris e Politeama. A orquestra, entre outros, contava com a participação de Osório de Souza, Melita e Carlos Brasiliense, João Viziolli, Renato Guerrini. Participou, também, da banda União Operária. Aos 15 anos iniciou seus estudos de piano sem o auxilio de professores, alguns pesquisadores afirmam que ele estudava piano com Francisca Júlia da Silva, poetisa de renome e pianista, ao mesmo tempo em que cursava escola municipal de Cabreúva. Em setembro de 1917 escreveu a valsa “Mariinha” com versos de Mello Ayres. Já nessa época era exímio flautista, e conhecedor de quase todos os instrumentos componentes de uma banda. Executava com perfeição clarineta, pistão, trombone, baixo, piano, violão e rabecão. Integrou a “Banda Musical Luiz Dutra”. Foi flautista de destaque na Orquestra Piracicabana regida pelos maestros Benedito Dutra Teixeira e Edgard Van den Brand. Do gênero popular foram compostas por ele valsas, canções, sambas, maxixes, tangos, chorinhos, marchinhas em estilo carnavalesco, fox-trot, rag-time, charleston, marchas patrióticas e dobrados, na maioria com versos. Musica sacra: “Salve-Maria”, “Hino á Santa Rita de Cássia” e uma marcha fúnebre. Hinos escolares: Hino à criança, Hino ao Dia das Mães, 8 hinos escolares para Grupos Escolares Estaduais, “Hino à despedida”. Das marchas patrióticas que escreveu destacam-se “Patriarca” à memória de José Bonifácio, e “Condores do Brasil” em homenagem ao aviador João Ribeiro de Barros, herói do “raid” realizado no avião “Jaú”. Vicentino dedicado, sua fé cristã originou os títulos das músicas: “Ave Maria”, Melodia da Fé”, “Êxtase”, “Preces de Natal” , “Murmúrios do Piracicaba”, “Alvorada de Lírios”, “Plenilúnio” e “Murmúrios Sonoros”. Suas músicas foram gravadas por Francisco Alves em disco da Odeon e Parlophon, Oscar Gonçalves e Yolanda Ozório em disco Bruswick, Artur Patti, solista de harmônica em disco Ouvidor. De todas as suas músicas, alcançaram grande sucesso “Ave-Maria” e “Vera”. As músicas de Erotides tornaram-se populares não só no Brasil como também na França, Itália, Portugal, Espanha, Polônia e outros países. “Ave-Maria” foi gravada por Pedro Celestino, sendo a primeira edição de mil exemplares, em disco Odeon, esgotada em menos de um mês. A valsa “Vera” com versos traduzidos para o italiano obteve medalha de ouro. O tango “Goal” classificado em segundo lugar, rendeu um prêmio em dinheiro no concurso musical promovido em 1919 pela Casa Editora Musical Brasileira. O concurso foi realizado no Teatro Boa Vista, em São Paulo, onde concorreram 180 compositores de todo Brasil. A marchinha “Um Róseo Carnaval” obteve o segundo lugar de um concurso de musica carnavalesca. Nos últimos anos Erotides dedicava-se a composição de música refinada, entre elas “Murmúrio do Piracicaba” e “Uma Barquinha Azul”. “Alvorada de Lírios” teve os versos escritos por Benedito de Almeida Júnior.
Onde seu pai formou-se?
Seus estudos primários foram feitos em São Paulo, no Liceu Coração de Jesus. Estudou na Escola Normal, atual Sud Mennucci, formou-se em 1918 e foi lecionar na escola da estação de Monjolinho, em São Carlos. Conseguiu a segunda nomeação, retornando a Piracicaba onde lecionou no Grupo Escolar de Tanquinho e, depois, no de Dois Córregos. Em 1921, casou-se com a minha mãe Maria Benedita Germano.
De 1923 a 1932 lecionou em Pirassununga, voltou a Piracicaba em 1932, nomeado como professor de Química na Escola Normal.
Após o falecimento do seu pai sua mãe trabalhava com o que?
Ela fazia balas de coco, bolos de casamento, era doceira.
Os direitos autorais das músicas compostas por Erotides de Campos, entre elas a celebre Ave-Maria, não proporcionaram um bom rendimento financeiro?
Entre muitos intérpretes famosos, o Roberto Carlos é um dos que canta Ave-Maria, musica composta pelo meu pai. Minha mãe recebia o equivalente o que recebo ainda hoje, 10 a 15 reais a cada cinco ou seis meses. Falam que não toca, é musica muito antiga! Ele possui mais 350 músicas compostas, entre as publicadas e inéditas. Tanto musica popular, como música clássica e música sacra.
Erotides usou um pseudônimo ao compor Ave-Maria?
Usou Jonas das Neves, parte do seu nome completo, Erotides Jonas Neves de Campos.
Como surgiu a música Ave Maria?
Minha mãe contava que ele ficava muito aqui no quintal de casa, isso por volta de cinco ou seis horas da tarde, ele achava o cair do sol muito bonito. Um dia ele resolveu compor a musica Ave-Maria. Ele subiu para o seu escritório que ficava no andar superior da casa, lá ele permaneceu por horas. Minha mãe disse que quando subiu, entrou no escritório dele havia muito papel jogado no lixo. Eram esboços da música que ele estava compondo e não achando ainda satisfatório, jogava-os ao lixo.
Ela falava muito do seu pai Erotides?
Quando ela se referia a ele chorava muito, ela dizia ter sido muito feliz com o meu pai.
Como era o cotidiano de Erotides de Campos?
Ele levantava, banhava-se, colocava o terno, e ia lecionar no Sud Menucci. Voltava, almoçava, descansava e trabalhava corrigindo trabalhos, provas, preparando aulas. Ele permanecia sempre muito com a minha mãe em casa. Ás vezes os dois saiam davam uma volta no jardim. Os irmãos dele vinham visitá-lo.
Que destino teve os objetos de uso pessoal de Erotides de Campos?
Minha mãe doou a flauta, cadernos, para o Museu Histórico e Pedagógico Prudente de Moraes. O piano minha mãe doou para o Lar Escola Nossa Mãe.
Ele faleceu nessa casa?
Foi um infarto fulminante, foi onde hoje é o meu quarto. Ele estava fazendo uma capa do cancioneiro. No dia anterior ele sentiu um grande mal estar, a ponto de não ir lecionar. Uma das suas frutas prediletas era laranja lima, minha mãe providenciou algumas laranjas, e aqui na cozinha de casa ele chupou umas laranjas. As duas horas da manhã ele sentiu-se mal, dor no peito, disse á minha mãe: “-Tita estou me sentindo mal”. Ela disse-lhe: “-Chupe uma laranja!”. Assim ele fez, e ele com a minha mãe foram caminhar um pouco, isso ás duas horas da manhã, isso na Rua José Pinto de Almeida, foram devagar até perto da Rua XV de Novembro. Voltaram para casa e ele disse que não conseguia dormir, iria terminar de fazer a capa do cancioneiro. Ele subiu, estava escrevendo, sua letra era impecável, ela percebeu que ele tinha tremido a mão, ela então perguntou: “Que foi Erotides?”. Ele caiu sem falar nada. Assim ele faleceu.
A mãe da senhora faleceu com quantos anos?
Ela faleceu com 97 anos de idade, isso foi em 1993.
Como é ser filha de Erotides de Campos?
Tenho muito orgulho do meu pai!
Qual era a reação da sua mãe ao ouvir as musicas compostas pelo seu pai?
Ela chorava muito. O Manoel Lopes Alarcom era um grande amigo da nossa família, ele vinha visitá-la, quando falava sobre o meu pai ela punha-se a chorar. Ela dizia que meu pai ajudava muito as pessoas, não falava mal de ninguém.
Qual o prato imbatível que a Dona Titã, sua mãe, fazia?
O macarrão! Eu faço da mesma forma que ela fazia, mas não fica igual, até meu marido diz: “-Não é igual ao da sua mãe não!”.


Ave Maria De Erotides De Campos
Cai à tarde tristonha e serena
Em macio e suave langor
Despertando no meu coração
A saudade do primeiro amor

Lungio se esvai lá no espaço
Nesta hora de lenta agonia
Quando o sino saudoso murmura
Badalada da Ave Maria

Sinos que cantam com mágoa dorida
Recordando em toda a aurora da vida
Cabe ao coração paz e harmonia
Na prece da Ave Maria

No alto do campanário
Uma cruz simboliza o passado
E o amor que já morreu
Deixando um coração amargurado















sábado, abril 17, 2010

FRANCISCO DE ASSIS PEREIRA DE CAMPOS (FREI TITO)


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 15 de abril de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://www.teleresponde.com.br/
http://blognassif.blogspot.com/
ENTREVISTADO: FRANCISCO DE ASSIS PEREIRA DE CAMPOS (FREI TITO)







No princípio era a idéia: Missão.



No principio era o sonho:



apenas viver entre os pobres,



como pobre e para os pobres.



Foi assim que a idéia se fez sonho



e o sonho se fez idéia:



“Vida e Regra de Francisco”.



Não do Francisco de Assis



mas do Francisco do Glória,



que pela fé e doação,



idéia e sonho se fizeram ação.



Frei José Orlando Longarez, O.F.M. Cap.

Francisco de Assis Pereira de Campos ainda hoje é chamado de Frei Tito, nome adotado no período da sua vida dedicada exclusivamente á sua missão religiosa. Frade quer dizer irmão significa viver a fraternidade O frade capuchinho pode ser sacerdote ou irmão leigo, vivendo em fraternidade e servindo a Igreja, preferencialmente em tarefas e lugares difíceis. Realiza os serviços simples, humildes, estando entre os pobres e marginalizados. O frade capuchinho procura trabalhar pelo bem do povo com preparação e competência, sem ambições pessoais. Piracicaba tem grandes exemplos de frades capuchinhos como referência. Um nome inesquecível é o de Frei Francisco Erasmo Sigrist que exerceu o ministério sacerdotal durante quase 15 anos, somente em Piracicaba. Em janeiro de 1985 foi para a Fraternidade Nossa Senhora da Glória, no Jardim Glória, uma favela de Piracicaba, onde viveu e trabalhou até a morte, buscando realizar intensa e radicalmente a proposta fundamental do Evangelho. Frei Tito partilhou com Frei Sigrist o mesmo teto do barraco em que moravam, na favela, hoje tombado como patrimônio histórico. Frei Tito realizou a experiência de vida onde só a fé intensa desenvolve a coragem de vencer os inúmeros obstáculos encontrados. Vivenciou o mundo desconhecido pela maioria da população, o cotidiano dos marginalizados, onde o significado da vida tem referencias e valores próprios. Francisco de Assis Pereira de Campos tem formação em filosofia e teologia, especialização em filosofia política e filosofia da arte. Mestrado em educação. Hoje é Assessor Executivo do Gabinete do Prefeito de Sumaré, o piracicabano José Antonio Bacchin., foi Secretário de Obras, Diretor de Educação, Diretor de Cidadania, Gerente da Cidade, Chefe de Gabinete, na cidade de Sumaré.
Francisco de Assis Pereira de Campos, Frei Tito como ainda o chamam é piracicabano?
Nasci em 14 de junho de 1954 na Nova Suíça, bairro rural distante poucos quilômetros do centro de Piracicaba. Sou filho de Benedito Pereira de Campos conhecido como Dito Gica, meu avô paterno tinha o apelido de Seu Gica. Minha mãe é Barbara do Amaral Campos conhecida como Dona Barbica. Sempre foram agricultores, eram proprietários de um sítio com aproximadamente dez alqueires. Ao longo de muitos anos tivemos gado leiteiro, naquele tempo entregávamos o leite direto ao consumidor, em litros de vidro que eram acondicionados em um engradadinho de ferro, a entrega era feita de casa em casa. Era o tempo em que o padeiro também entregava o pão á domicilio. Éramos nove irmãos, Antonio, Maria José, Maria Alice, João Pedro, Maria de Lourdes, Francisco, José Deodato, Reinaldo, Vera. Na roça começa a se trabalhar logo que se aprende a andar. Era uma agricultura familiar, as crianças ainda muito novas já iam para roça. Na época ás três horas da manhã já se levantava para tirar leite, ás seis horas da manhã o leite deveria estar sendo entregue na rua.

O senhor sabe ordenhar?

Tirei muito leite. Usava-se aquele tradicional banquinho, com um pezinho e amarrado á cintura, para poder fazer o trabalho de forma mais rápida.

Era necessário imobilizar a vaca?

Amarrava-se a cabeça para evitar chifradas, imobilizava as patas traseiras, para não tomar coices do animal. Era um serviço que oferecia riscos para uma criança. Cheguei a levar uma chifrada em uma das mãos, que provocou um ferimento sem nenhuma seqüela, mas de certa gravidade. Na época não havia mecanização, toda a lavoura era feita com arado, tracionado por burros. Uma das coisas que mais gostava de fazer era arar a terra, gradear a terra. Gradear a terra era quase uma diversão, nós subíamos em cima para ela ficar mais pesada. Era muito gostoso passar ferramenta em roça de milho, de arroz. Trabalhávamos com uma dupla ou “pareia” de animais até a hora do almoço e em função do calor após o almoço utilizávamos outra “pareia”.

Era comum dar nome aos animais?

Sem dúvida! Tínhamos uma mula chamada Chalana, era muito estimada. É interessante observar que meu pai gostava da música Chalana, e em função disso várias gerações de mulas receberam esse nome. As vacas também recebiam nomes como Mansinha, Pintada. Chegamos a ter vinte vacas produzindo leite diariamente.

O sítio ficava bem próximo da cidade?

Lembro-me de que vinha a pé assistir a missa na catedral de Piracicaba. A distância deve girar em torno de uns seis quilômetros. O nosso sítio ficava bem em frente ao Seminário Diocesano. A entrada do Seminário e uma faixa de terra que dá acesso ao mesmo foram cedidas pelo meu pai.

Houve uma época em que o leite “in natura” não podia mais ser vendido?

Vivemos esse tempo, no início do Morro do Enxofre a fiscalização pegava os leiteiros, prendia, dava banho de água fria nos leiteiros. Ainda pequeno, eu não entendia muito bem o que estava acontecendo, que por trás disso havia uma industrialização. A obrigatoriedade de colocar o leite nos laticínios e tirar o produtor da venda direta ao consumidor. A fiscalização era rigorosa. Havia produtores que vinham de longe para trazer o leite, com caminhonete carregada de leite, e era comum eles pararem em casa, por ser o sitio que também produzia leite e ficava mais próximo da cidade.

Em nome da pasteurização, da saúde pública, beneficiou-se muito o poder econômico?

Sem dúvida. Hoje o leite tem que passar pelos laticínios por conta de uma série de preocupações com a saúde pública, mas sem duvida nenhuma os beneficiários disso foi o poder econômico.

Havia rádio na sua casa?

O rádio chegou muito tarde á minha casa, deve ter sido na década de 60. Tínhamos um rádio á bateria, com válvula. Ouvíamos muito o Zé Béttio. Meu pai ouvia muito o Alziro Zarur da LBV – Legião da Boa Vontade.

O grupo escolar o senhor cursou onde?

Fiz o Grupo no Bairro Rural Pau Queimado. Lembro-me das nossas professoras, Dona Ruth, Dona Filomena e Dona Dalva. Na época acho que era a Dona Dalva que tinha um carro DKW branco e vermelho. Quando chovia, ás vezes elas não conseguiam chegar até a escola, nós ouvíamos o ronco do carro quando ele estava vindo. Em dia de chuva a molecada torcia para não ouvir o carro, assim não haveria aula.
A energia elétrica demorou á chegar ao bairro?

Chegou bem cedo á nossa região, por conta do prefeito Francisco Salgot Castillon. Ele levou também o telefone. Na minha casa havia um aparelho e na venda do Santo (Santin) Novello havia outro aparelho, o número do nosso telefone era 94. Para fazer uma ligação tinha que solicitar á telefonista que a fizesse. O telefone tocava em casa e tocava no Santin. Eram extensões um do outro. Esse telefone acabou virando um orelhão. E era esse também o objetivo, não era visto como um privilégio pessoal.

Isso tornou a sua família popular na comunidade?

Havia um espírito de solidariedade na alegria e na tristeza. Quando ouvíamos o porco gritando lá no sítio do vizinho nós sabíamos que iria aparecer um pouco de carne para comermos. O vizinho matava o porco e trazia um pedaço de carne. Isso era recíproco. Era interessante essa relação de vizinhança, quase nunca um vizinho chegava á casa do outro de mãos vazias. Sempre trazia limão, laranja, pão caseiro.
Houve um período em que a família veio morar em Piracicaba?
Tivemos um momento de dificuldades, fomos morar na Vila Boyes, próximo a Igreja São Dimas. Meu pai adquiriu de um tio um armazém. Permanecemos por um tempo em Piracicaba, preservamos o local onde morávamos na zona rural. Meu primeiro emprego ficava embaixo da rádio PRD-6, em um laboratório de prótese de propriedade de Washington e Roberto. Faziam dentaduras, pontes. Trabalhei um tempo também como cobrador de ônibus, da Viação Marchiori, fazia a linha Piracicaba-Rio Claro, depois eles passaram a fazer também a linha Piracicaba-Pirassununga, após trabalhar por um determinado tempo nessa linha, voltamos para o sítio novamente. Com 15 para 16 anos de idade fui estudar no Colégio Agrícola de Rio das Pedras. Estudei por três anos lá, sou da primeira turma formada pelo Colégio Agrícola de Rio das Pedras. Quando iniciamos os estudos lá, o alojamento não estava ainda pronto, permanecemos morando em umas casas do CDHU na entrada de Rio das Pedras. O caminhão do colégio nos levava para lá, subíamos em cima da carroceria, era um frio danado.
Como jovem, é natural ter algumas distrações, quais eram as suas?

Eu gostava de jogar futebol, sempre fui goleiro. Jogava também na linha. Em Rio das Pedras, na Rua Prudente de Moraes, havia um cinema, era também um local de distração. As quartas-feiras eu saia do colégio e ia ás reuniões dos vicentinos. Eu era vicentino. Conheci muito Caetano Gramani, uma pessoa que sempre esteve muito presente na minha vida.

Saindo do Colégio Agrícola o senhor foi trabalhar onde?

Surgiu um concurso na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, fiz, fui aprovado e passei a trabalhar na ESALQ no departamento de solo e geologia, o responsável pelo departamento era o Prof. Dr. Guido Ranzani, sogro de João Hermann Neto. Morava no Bairro da Suíça e trabalhava na ESALQ, Pedro Hidalgo era um vizinho de sítio e que trabalhava em uma metalúrgica próxima, ele tinha um fusca novinho, eu ia e voltava com ele. Permaneci trabalhando na ESALQ por dois anos.

O que aconteceu depois?

Eu sempre tive uma vida muito ligada á igreja, em especial aos franciscanos. Meu avô, Seu Gica, foi Terceiro Franciscano, foi sepultado com habito da Ordem Terceira. Hoje eu pertenço á Ordem Terceira. São Francisco queria uma ordem de irmãos, por isso a denominação “frei”. A origem está em “fratello”. Na idade média para pregar o evangelho precisava ser diácono, não era padre, mas pertencia ao clero Ele fundou a ordem dos frades e abriu a possibilidade para que todos possam viver o evangelho na sua espiritualidade. A Ordem Terceira é para todos cristãos que querem viver o espírito franciscano. Naquele momento em que trabalhava na ESALQ eu fazia a coordenação da Pastoral Rural da Diocese de Piracicaba, foi no período em que ocorreram os movimentos como Topada, Gen, TLC. Nós criamos na Igreja dos Frades a Pastoral Rural, o capelão na época era Frei Saul Perón. Lembro-me do Frei Afonso. Frei Marcio era o frei mais jovem. Essa relação com os frades acabou criando um envolvimento, Frei Marcio era responsável pela pastoral vocacional, com isso éramos provocados em determinadas situações a ser padre. Éramos jovens empolgados com a pastoral. Gostava e gosto da Igreja até hoje, na época entendi que deveria tomar uma decisão.

Qual foi a reação da sua família?

A minha família gostou. Lembro-me que estava sentado na soleira da porta, quando disse á minha mãe que estava pensando seriamente em ir para o seminário. Ela disse-me: “-Mas você já está muito velho para isso!”. Na época quem ia ser padre ia para o seminário muito cedo. Fui para o seminário onde tive formação da filosofia antiga e da nova, sobretudo a filosofia da libertação. Tive professores como Hugo Assmann, Frei Beto, Rubem Alves, Leonardo Boff.

Há a possibilidade de ser frade sem ser padre?

Perfeitamente! O frade pode morar em um convento e exercer o trabalho como advogado, médico, veterinário, professor, temos um caso de um frade que exerce a profissão de cobrador de ônibus. Tem que estar ligado a fraternidade. Tem que ser feito os estudos e fazer a profissão de fé.

Quando foi a profissão do senhor?

Meus primeiros votos foi em 1980, aqui no Seminário Seráfico São Fidelis. Fiz meus estudos em Nova Veneza. Em 1982 fui morar na periferia de Sumaré, com Frei João, que hoje é bispo. Eu entendi que o meu papel na igreja era fundamentalmente o de contribuir para a formação da catequista, dar cursos bíblicos aos leigos e, sobretudo estar presente nos movimentos sociais.

O ser humano constrói seus próprios obstáculos?

Sem dúvida. Só que ele não procede assim por acaso. Somos frutos de uma formação. Paulo Freire diz que: “-A nossa cabeça é onde estão os nossos pés”. Somos produtos do meio.

O senhor é conhecido como Frei Tito?

Frei Tito por conta da ordem. E permaneceu. Na favela algumas crianças me chamavam de Título. Vim morar em uma fraternidade nossa no Jardim Glória. Frei Sigrist tinha acabado de voltar da Alemanha onde tinha feito teologia. Ele era uma pessoa muito especial, de grande espiritualidade, grande senso de humor. Alguns estudantes tinham construído um barraco na favela e foram morar lá. Pedi ao Provincial Frei Sermo Dorizotto para vir morar na favela.

Como é morar em uma favela?

É uma experiência muito boa. Foi o período mais interessante da minha vida. Eu já tinha convivido com uma favela, mas não havia morado em um barraco, junto com o povo, vivendo 24 horas por dia na favela. Acabei vindo morar com Frei Sigrist. Nesses anos todos que vivemos na favela tínhamos apenas um pequeno rádio, quando ia lavar roupa eu ficava ouvindo “Toninho da Engenhoca”. Não tinha televisão, não tinha muro, não tinha cerca. Criamos uma relação muito saudável com a população. O barraco não tinha fechadura. Quando chegamos á favela tínhamos problemas de todas as ordens. A primeira coisa que fizemos foi capacitar algumas mulheres de boa vontade no sentido de elas fazerem curativos, procedimentos básicos de saúde. O barraco acabou sendo um pequeno ambulatório.

Próximo existe o Pronto Socorro?

Existe. Mas não é só a questão do atendimento ser bom ou ruim. O sentimento das pessoas das favelas é de quem está á margem da sociedade. Sem auto-estima. Ás vezes o único espaço que encontram é na marginalidade. Eu participei de mutirão rebocando casa. A nossa presença ali era de extrema importância para eles. Aprendi a fazer muitas coisas com eles. Montamos uma fábrica de blocos lá dentro. Compramos um caminhão Mercedes-Bens e eu dirigindo o caminhão ia buscar areia na Codistil. Ganhamos do Colégio Dom Bosco a antiga estrutura, eu e Frei Sigrist em cima de andaimes, vigotas, com a criançada, mulherada, todos juntos derrubamos aquilo tudo. Isso os animava e mudava a vida deles. Foi um trabalho de muita integração, viver a vida deles. Desistimos de ter colchão nas duas camas, tanto na minha como na do Frei Sigrist. Um dia chegando em casa, chovendo, o Sigrist me disse: “- Tito, você me desculpe, mas chegou uma mãe com o filho deitado no chão, no barro, eu disse a ela que só tinha o meu colchão e o seu para dar á ela. Ela aceitou. Não fique bravo, Tito, amanhã eu compro outro colchão”. Eu respondi: “-Vamos ficar sem colchão! Se comprar você vai doar de novo!”. Ficamos por vários anos sem colchão. O barraco está lá, do jeito que deixamos, aberto á visitação.







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