domingo, julho 01, 2012

JUSTINO (NEGO) ORIANI

JOÃO UMBERTO NASSIF

Jornalista e Radialista

joaonassif@gmail.com

Sábado 30 de junho de 2012 Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana

As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

http://blognassif.blogspot.com/

http://www.tribunatp.com.br/

ENTREVISTADO: JUSTINO (NEGO) ORIANI
Justino conhecido como Nego Oriani foi um grande industrial do setor calçadista. Com muita força de vontade aprendeu a fazer calçados, inovou, investiu, passou por inúmeras dificuldades, vivenciou as peculiaridades que envolvem a fabricação de um calçado. Homem de muita fé dedica-se a uma tradição religiosa que é a de dar o pouso ao Divino Espírito Santo. A instalação da antiga fábrica de calçados dá lugar a uma função considerada sagrada, que é abrigar os Irmãos do Divino por uma semana, no final da mesma ocorre uma verdadeira festa, o transito é interditado naquele quarteirão, montado um palco, é rezado o terço, cumprida as promessas com a passagem dos Irmãos do Divino sobre os penitentes, cerca de 30 a 40 pessoas deitam-se no leito da rua e cobertos por um lençol branco recebem as graças que a sua fé concebe. Após a celebração do sagrado vem a festa, com comida fornecida a vontade para todos os presentes, centenas de pessoas comemoram e são servidas com pratos tradicionais distribuídos gratuitamente na festa. Em diversas partes do prédio são vistas pinturas, imagens e até mesmo um pequeno oratório lembrando o Divino Espírito Santo. Justino nasceu a 12 de dezembro de 1930 no bairro rural Monte Branco, é um dos oito filhos do casal Benedito Oriani e Joana Grizzotto Oriani: Maria, Alice, Elídio, Antonio, Helena, Angelina, Justino e Rita. Desde muito pequeno Justino já ajudava nas tarefas diárias da Fazenda Serra Bonita, propriedade da família Oriani, trabalhou na roça até 20 anos, estudou até o quarto ano primário, ainda menino era responsável por ir a cavalo buscar a professora que descia do ônibus no bairro rural Água Bonita, por meia hora, cada um em seu cavalo dirigiam-se à escola na fazenda onde a professora ficava hospedada durante a semana, lecionando para as crianças das 40 famílias residentes na propriedade. A professora vinha na segunda feira e voltava para Piracicaba no sábado.

Como o senhor começou a trabalhar com calçados?

Meu irmão Antonio aprendeu a trabalhar como sapateiro, foi morar no Arraial São Bento, em um bairro rural chamado Peruca onde montou uma oficina de conserto de sapatos, eu tinha 20 anos quando fui aprender com ele o ofício de sapateiro. Por dois anos trabalhei para aprender a fazer consertos e fabricar sapatão que eram pregados com pregos (cravo) de madeira. Fazíamos alguns sapatos sob encomenda e sandálias simples para senhoras. Era um tempo em que muitos andavam descalços, adultos e principalmente crianças.

Após aprender o ofício o senhor mudou-se para a cidade de Piracicaba?

Vim morar no bairro da Paulista, na Rua Fernando de Souza Costa, número 2827. Quando mudamos a região era em grande parte coberta por plantação de algodão. Foi um período de grandes dificuldades, meu irmão Elídio comprou essa casinha e meus pais passaram a mora nela, Antonio Scarpari era proprietário de uma pequena casa nas imediações, na esquina de Rua Conselheiro Costa Pinto, montei ali uma oficina de conserto de sapatos. Sempre fui muito trabalhador e econômico, após dois anos com a permissão do meu pai fiz um rancho em sua propriedade e passei a trabalhar naquele local. Na Fazenda Costa Pinto morava um ramo da família Oriani, fui convidado para ir assistir o casamento de José Oriani foi quando conheci minha futura esposa, Cezira Brieda Oriani. Quando casei tinha 25 anos, por três anos depois de casado permaneci morando na casa do meu pai. Tivemos seis filhos: Valdir, Eliana, Therezinha, Heloisa, Vlade e Cláudia.

Continuando a trabalhar com sapatos?

Como eu não tinha tanto conhecimento na fabricação de sapatos, deixava todo material pronto e a noite funcionários de outras empresas vinham trabalhar para mim. Assim aprendi. Comprei uma faixa de terra vizinha e montei uma pequena fábrica de sapatos. O couro eu adquiria do curtume de Mário Maniero.

Qual era a preferência da moda masculina na época?

Sapatos de bico fino. Passei a comprar em São Paulo couro para fazer sapatos de cromo alemão, com isso meus calçados passaram a ganhar fama. Embarcava no trem da Companhia Paulista, ia até a região da Rua Rangel Pestana, onde havia fornecedores de material do setor calçadista. Trazia a peça de couro e aqui cortava, no inicio só fazia sapatos sob encomenda. Tinha duas máquinas de costura própria de sapateiro, mais conhecida como “máquina esquerda”. Eu trabalhava das cinco horas da manhã até as 22 horas. Trabalhei muito. Com o tempo ganhei o suficiente para adquirir um terreno na Rua Jorge Pacheco e Chaves, onde construí e montei a minha indústria de sapatos, com fabricação em série.
                                                            SALTO CARRAPETA

Qual é o número de sapato masculino mais procurado?

O número 39/40. Fiz sapatos masculinos com duas cores, branco e preto, branco e marrom, fabricava o famoso sapato de salto carrapeta, que é um salto de sapato bem mais alto do que o normal, masculino. Eu tinha um modelista, o José, ele pesquisava as tendências da moda através de revistas, publicações especializadas em calçados. Através de um pantógrafo reproduzia inúmeras peças a partir de um modelo. O couro era cortado a mão, havia uma prensa hidráulica que cortava a sola dos sapatos. A fábrica era grande, mas o máximo que eu produzia era 100 pares de sapatos por dia. Com o tempo fui comprando máquinas, importei três máquinas italianas, Tinha uma esteira onde entrava a matéria prima e no final o sapato estava pronto. Na época a maioria dos funcionários eram mulheres e adolescentes, era permitido o trabalho dos mesmos, ensinei o ofício a mais de 400 meninos. Os sapatos feitos naquela época eram para serem usados até onde fosse possível, diferente de hoje onde muitos usam o calçado e logo trocam por outro mais moderno. Hoje não se conserta mais sapato, na época faziam meia sola, sola inteira, trocavam o salto gasto. Em Piracicaba a maior fábrica era a minha, depois vinha a fábrica do Bachega, cheguei a ter 42 máquinas industriais. Eu tinha um viajante (vendedor) no Paraná que vendia muito, com isso forneci muito sapato para aquele estado. Em Piracicaba vendi muito para um grande comerciante do setor, Alberto Torossian. Em Piracicaba chegamos a ter uma dezena de fábrica de calçados. A fabricação de calçados é uma atividade muito sensível a tendências da moda, onerosa em função de impostos, e passa por uma concorrência muito forte no setor internacional. Um dia desses por curiosidade contei o número de peças que são usadas para compor um pé de um tênis, são 25 peças. O tênis tomou o espaço do sapato tradicional, estimo que 90% da população usam tênis. Eu acho que um sapato de bico fino é muito elegante.

Havia variedades de couro?

O couro do novilho era o de melhor qualidade. A fêmea tem tendência a barriga crescer, conforme o corte que o profissional faz no couro pode ocorrer de em um par de sapatos do mesmo lote de couro, ter um pé maior do que o outro, um dos pés tem o couro mais esticado com o uso pela origem do couro ou forma como foi cortado. Já fiz sapato com couro de crocodilo.

O que é pelica?

É o couro de cabra. Fiz muitas botinas de pelica. Eu tinha um funcionário que só fabricava botas, sanfonadas, de cano alto. Minha fábrica era completa.




O senhor é uma pessoa muito religiosa?
A minha família já era muito religiosa. Fui coroinha, mariano, saía da Serra Bonita ás quatro horas da manhã para vir assistir a missa na Igreja Sagrado Coração de Jesus ( Igreja dos Frades), vinha a cavalo. Deixava o cavalo em frente à igreja no espaço hoje ocupado por uma praça. Meu avô conhecia homeopatia, com o uso de ervas curava muitas doenças, minha mãe aprendeu com ele e eu a ajudava. Era uma época em que havia poucos médicos, estradas de terra, e meios de transportes difíceis. A maior parte das doenças tem origem emocional, muitas vezes a cura se dá através de auto-sugestão no simples fato da pessoa tomar um medicamento natural. A mente domina o corpo. Se pensar de forma positiva tudo será positivo. Quando alguém trata bem outra pessoa ela recebe tratamento semelhante, isso a beneficia. O mesmo ocorre quando o indivíduo trata mal alguém, ele estará trazendo malefícios para si mesmo.

Como começou a devoção do senhor para com o Divino Espírito Santo?

Faz quarenta anos que começou, fui assistir a uma Festa do Divino em Anhembi, gostei. Um amigo, Pedro Godoi, me ajudou a fazer a festa, no início muito simples. No dia 4 de julho, quarta feira, a Irmandade do Divino chega aqui onde foi a minha fábrica, de 30 a 40 irmãos pousam aqui. Permanecem até dia 10 de julho, terça feira. Às 5 horas da manhã se levantam saem em peregrinação e voltam ás 22 horas, passam o dia todo rezando. No dia 8 de julho é realizada a festa. Fecho o quarteirão para o trânsito, ás 17h30min horas os irmãos vão para o início do quarteirão, nós caminhamos em direção a eles, quem vai pagar promessa ou pedir alguma graça, deita-se no chão envolto em um lençol branco, ficam deitados 1 metro distante um do outro, são 50, 80 pessoas que se deitam. As pessoas que se deitam trazem o seu próprio lençol. Ficam com as costas apoiadas no chão, mãos e pés descruzados. Isso facilita quando o Irmão do Divino for pular sobre a pessoa. Conhecemos muitos casos de graças alcançadas. Minha esposa e eu voltamos ao palco, os Irmãos do Divino vem em direção ao palco, benzendo os corpos dos que estão deitados. Oram e benzem. No palco entoam musicas sacras, rezam o terço, após o terço as mesas e comidas estão prontas com capacidade para 100 pessoas. A comida, pratos, panelas, são todas benzidas. Ai já começa a musica profana sertaneja. Os irmãos, minha família e demais pessoas entram jantam e saem. Em seguida entram mais 100 pessoas, e assim prossegue noite adentro. No ano passado servimos 700 quilos de comida, estimamos em 1.500 o número de pessoas que estiveram presentes. A comida é composta por arroz, feijão gordo, carne com batata, macarronada e sopa de mandioca, conhecida como vaca atolada. Para beber é servida apenas água.

Como a igreja católica vê essa manifestação de fé popular?

Acredito que existe uma interpretação pessoal de cada religioso. Há os que aprovam e há os que não vêm com muita simpatia. Os Irmãos do Divino agem com muita seriedade, passam um mês andando e rezando.

O senhor é um dos colaboradores na construção da Igreja São José?

Sou do tempo que ali não existia nada além de um pasto. Reunimos umas 10 pessoas e iniciamos a construção, na época eu tinha um Ford 1929 e uma perua. Poucos tinham condução. Fazíamos reuniões na casa do Abel Pereira. Vitório Fornazier também participou muito da construção da igreja. Fazíamos festas para arrecadar dinheiro, chegamos a preparar 250 frangos.

O senhor gosta de música?

Gosto de baile freqüento sábado e domingo o Saudosista, vou aos bailes da “Estação Idoso José Nassif”, da terceira idade.



























































sábado, junho 23, 2012

ROBERTO FELÍCIO

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 23 de junho de 2012
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/

ENTREVISTADO: ROBERTO FELÍCIO

Roberto Felício nasceu a 11 de janeiro de 1952, em Itapuí, cidade localizada entre Jaú e Bauru. É um dos quatro filhos de Lauro Alberto Felício e Lúcia Zucholoto Felício: José Eduardo, Arlete. João Antonio e Roberto. Ele ainda não tinha um ano de existência quando sua família foi morar em Jaú onde viveu até os 21 anos. Seu pai exerceu diversas atividades, foi administrador de fazenda, trabalhou na Estação da Companhia Paulista em Jaú, com embarque e desembarque de café, foi metalúrgico, mais tarde, em 1965, tornou-se açougueiro, cuja prática já tinha, adquirida quando morava na zona rural. Roberto fez o grupo escolar e a escola técnica industrial em Jaú, na época equivalia ao ginásio, fez o instituto de educação, antigo colegial Em Bauru fez curso superior em Desenho e Plástica. Aos 21 anos mudou-se para São Paulo, onde além de lecionar fez a Faculdade de Educação Artística. Roberto fez diversas especializações na em linguagem cinematográfica, fotografia, gravura. Considera-se um teórico dentro da linguagem de Artes Plásticas, um estudioso da estética, filosofia, história da Arte. Não se considera um artista.
Ao chegar a São Paulo onde o senhor foi morar?
Meu irmão João Antonio (que mais tarde tornou-se presidente da CUT) e eu nos formamos juntos e fomos para São Paulo, onde alugamos um apartamento na região central entre os Bairros Santa Cecília, Perdizes, Barra Funda e Pacaembu. Comecei a lecionar no bairro Morro Grande, era uma periferia da Freguesia do Ó. Hoje Morro Grande não é considerado tão periférico, A cidade cresceu, avançou muito na direção da Cantareira. A maioria dos meus alunos era constituída por filhos de funcionários de uma pedreira, muito próxima do Grupo Escolar e Ginásio do Estado. Lecionei também em algumas escolas particulares em São Paulo: A SAA em Santana, na Escola Visconde Porto Seguro, antiga Escola Alemã de São Paulo ou Deutsche Schule. Trabalhei lá em 1974, foi no ano em que ela saiu da Praça Roosevelt e se transferiu para o Morumbi, uma vez que a maioria dos seus alunos era originária da região de Santo Amaro. Cheguei a conclusão de que não havia sentido ficar dando 60 aulas por semana em escolas publicas e particulares. Em 1980 tornei-me professor efetivo através de concurso prestado. Havia me casado com uma paulistana, morava na região de Santana, fui lecionar em uma escola chamada Professora Amenaide Braga de Queiroz próxima do Hospital da Água Fria. Lecionei na Escola Estadual Albino César, que é uma das maiores escolas da Zona Norte. Sou pai de três filhos: Renato, Ana Carolina e Júlia. Em 1978 tivemos os primeiros movimentos de professores, primeiras greves, mobilizações para denunciar as situações precárias do ensino, as más condições de trabalho dos professores, os salários inadequados. Em 1985 fui fazer parte da direção do sindicato, que era ainda a Associação dos Professores de Ensino do Estado de São Paulo a APEOESP. Em número de filiados é a maior organização sindical do país.
O senhor é militante do Partido dos Trabalhadores a partir de quando?
Participei da fundação do Partido dos Trabalhores em 1980. Eu e meu irmão João Felício não estavamos no Colégio Sion naquele dia, mas tomamos a decisão de formar o Partido dos Trabalhadores, nós não participamos porque não éramos delegados, mas participamos da eleição de pessoas que iriam tomar parte no processo de formação do partido. Portanto tenho 32 anos de militância partidária. Se voce considerar o espectro político do Brasl o PT é ainda um partido jovem com uma experiência fantástica. Em 1983 participei da Central Única dos Trabalhadores, em 1985 passei a integrar a diretoria do sindicato dos professores. Com o advento da nova constituição em 1988 transformamos a Associação APEOSP em Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo mantendo a sigla APEOESP por ela ser muto conhecida. Em 1987 fiz parte da direção da CUT São Paulo, fui secretário de informação da CUT em 1987,1988 e 1989. Em 1989 fui eleito presidente da CNTE Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação, que era a antiga Confederação dos Trabalhadores do Brasil, CTB, mudou de nome porque passou a absorver também os funcioários de escolas, gerou um conceito que abarcava professores, supervisores de ensino, diretores e os chamados funcionários de apoio. Fui presidente de 1989 até 1993, foram dois mandatos, com sede em Brasília. Ela representa os professores do Brasil inteiro, todos os sindicatos estaduais de professores eram ou passaram a serem filiados a essa confederação da qual fui presidente. Eu queria permanecer na CNTE porue estava fazendo um trabalho interessante. Inclusive fazendo a política internacional, tive a participação em diversos eventos internacionais, convenções, congressos de professores em Portugal, França, Suécia, México, Argentina, Costa Rica, Espanha, Tchecoslováquia. Quando fui para Portugal foi uma gentileza dos professores portugueses terem pago a passagem e garantido a estadia em Portugal, a nossa entidade não tinha fundos para essas viagens, quem custeava era quem convidava. Em Praga fiquei hospedado no alojamento dos estudantes de uma universidade de Praga.Fui eleito presidente da APEOESP, permaneci por dois mandatos de 1993 a 1999.
O senhor reside em Piracicaba desde que ano?
Por opção pessoal, em 1988 vim morar em Piracicaba, mesmo tendo que frequentar muito São Paulo, Brasília. Conheci Piracicaba, acho uma cidade fantástica, não me imagino morando em outro lugar. Piracicaba tem uma relação cultural muito forte com o seu rio, se devolveu tendo o Rio Piracicaba como um marco, para o piracicabano é mais do que um curso d`àgua, é um fenômeno cultural. A história, a cultura da cidadade foi se desenvolvendo a partir das margens do Rio Piracicaba. É uma cidade que se expandiu, de uma pujança econômica fantástica. Na pauta de exportações brasileira Piracicaba aparece em destaque. É uma cidade conhecida pela sua cultura fora do Estado de São Paulo e mesmo até fora do país.
O senhor foi candidato a deputado em que ano?
Em 2002 saí como candidato a deputado, fui eleito, e Piracicaba teve dois representantes na assembléia: o deputado Roberto Moraes e eu. Embora muitos professores de outras cidades tenham feito a minha campanha. O mesmo ocorreu em 2006. Boa parte das emendas que fiz na Assembléia Legislativa, junto ao orçamento do Estado foi no sentido de favorecer instituições de Piracicaba, de garantir algumas obras. Fiz emendas tanto na época em que o Machado era o prefeito da cidade, e do meu partido, como continuei postreiormente fazendo emendas na administração do prefeito Brajas Negri, porque mesmo eu sendo do PT e a administração local passou a ser do PSDB, o meu papel de deputado da cidade era favorecer eventos, realizações de obras na cidade. A questão partidária é no momento da disputa eleitoral, depois temos que abstrair. Eu me considerei e me considero um representante de Piracicaba, sem jamais abandonar a bandeira da educação. Na Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo fui presidente da Comissão de Educação. Era visto como “ O cara de Piracicaba e o cara da educação”. De certa forma representando o conjunto do funcionalismo. O pessoal da Saúde tinha feito a minha campanha. Eu trabalhava muito as bandeiras do serviço público.
Qual é o grande problema que a educação enfrenta no Brasil?
A educação é um grande desafio para todas as esferas do poder público: federal, estadual e municipal. Existe um resumo para os muitos problemas, por isso podemos chamar de grande problema, é o financiamento público. Temos problemas de qualidade, de baixo salário dos profissionais do ensino, de jornada de trabalho inadequada, não tem sentido um professor trabalhar 35 a 40 horas com alunos, em Portugal, um país que não dispõem dos recursos de países ricos, um professor trabalha 20 horas com os alunos e completa outras 20 horas em horas atividades, que é a preparação da aula, correção dos trabalhos dos alunos, atenção individualizada ao aluno que está tendo problemas. Reuniões pedagógicas com os colegas para poder definir política pedagógica. No Brasil começa a existir um pouco de tempo destinado a hora atividade, mas ainda o professor trabalha muita aula com o aluo e tem pouco tempo para preparar a atividade que ele vai desenvolver com esse mesmo aluno. Precisamos colocar nossas escolas em compasso com o desenvolvimento tecnológico, não temos essas ferramentes tecnológicas para o dia a dia do professor. Tem computador na escola, mas não pode se dizer que tem isso como uma ferramenta diária. A grande questão é que investimos muito pouco em educação, apesar da constituição dizer que os estados e municipios tem que gastar 25% , a união 18%. Se verifica que o investimento ainda é muito pequeno. A educação infantil na nova constituição, na lei de diretrizes e bases, não é mais creche, é educação infantil. Creche é o lugar onde se põe criança, se larga criança. A educação infantil é um novo conceito, onde os pais e as mães trabalham fora, precisam deixar a criança, mas é um lugar onde vamos já cuidar também do desenvolvimento intelectual. A ciência já demonstrou que o ser humano tem uma capacidade de desenvolvimento intelectual maior nos primeiros anos de vida. Se desenvolve mais rapidamente nos primeiros anos de vida do que nos últimos anos, quando já há um acumulo de desenvolvimento itelectual. Um exemplo que ocorre dentro de casa, quando você adquire um aparelho eletrônico, as crianças aprendem a lidar com esse aparelho antes dos pais, e acaba ensinando os pais. É uma curiosidade muito própria da idade. A educação infantil tem que lidar com esse desenvolvimento. Nós não podemos ter nenhuma criança fora da escola. Para essas crianças cujos pais trabalham fora, ter a garantia do tempo integral.
Qual é a opinião do senhor a respeito da aprovação continuada?
Como conceito pedagógico me parece algo extremamente positivo esse debate sobre essa nova pedagogia. A Educação tem que ter como meta a promoção. Um individuo se desenvolve mais rapidamente do que outros. As pessoas não são iguais, cada um tem o seu tempo, seu momento, sua experiência anterior. As pessoas vivenciaram suas experências antes de chegarem a escola. Uma criança cujos pais tem formação superior, ela já esta acostumada a uma outra linguagem, ela vai absorvendo palavras, o seu vocabulario as vezes é mais rico do que o de uma criança cujos pais são semi analfabetos. A escola tem que lidar com essas diferenças. Paulo Freire nos ensinava muito isso, como se trabalha com a criança, como se aproveita as experências de cada um, esses conceitos não equivocados, o problema é que isso virou uma maneirade dizer o seguinte: “ Uma criança custa dois mil reais por ano em uma escola, se ela for reprovada ela irá custar de novo os dois mil reais, vamos empurrar essa criança para frente.”. Isso vira uma lógica contábil. Na lógica paulista prevalece uma lógica contábil. Progressão continuada virou aprovação automática. Mesmo sem saber as pessoas saem da escola, o mercado de trabalho, a vida social e tudo mais, irá discriminá-la. Antigamente perguntava-se se a pessoa tinha diploma, atualmente com exceção das categorias de profissões que tem que ter ensino superior, se a pessoa tem 18 anos e vai para o mercado de trabalho o que menos importa é o diploma. Se você não tem um desenvovimento das suas capacidades cognitivas, se não souber operar uma máquina, o mercado não te quer. Imagine um semi-analfabeto indo para o mercado de trabalho, ele será inevitavelmente preterido por outro. Progressão continuada é um debate pedagógico importante, só que virou sinonimo de aprovação automática, esse foi o grande erro da política desenvolvida no Estado de São Paulo, sobretudo aprofundada pela Rose Neubauer, passaram todos os secretários e a politica continuou sendo empurremos as crianças antes que elas nos atrapalhem. Para não dizer que os tucanos são os responsáveis, essa discussão vem de algum tempo e a deterioração das condições de ensino do Estado de São Paulo remonta muito antes do Montoro, vem do Maluf, do Paulo Egídio, do Laudo Natel. O problema é que quando houve uma perspectiva de busca de universalização houve perversamente uma piora na qualidade. O aumento do número de escolas, de profissionais contratados não foi acompanhada por um aumento de investimentos. O grande bandido da história foi a ausência de investimentos. Gastamos pouco com educação, e não temos educação de qualidade com baixos investimentos. O FUNDEB Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação já é um fundo que tem como perspectiva da educação básica como um todo. Já é um avanço, mas insuficiente para conquistar a qualidade que precisamos. Desenvolvimento econômico, cultural, político, social de uma nação depende muito da educação. Acho que estamos acordando para isso, mas há muito que fazer.
Como educador qual é a opinião do senhor sobre o ECA Estatuto da Criança e do Adolescente?
O sonho dos pais não é ver seus filhos precocemente no mercado de trabalho, é ver seus filhos chegando até o ensino superior. Se possível sem ter que trabalhar e fazer um curso superior a noite. Caso queira, o aluno pode fazer um curso técnico. Existem excelentes colégios técnicos.
Com 32 anos de vida partidária o senhor teve uma convivência próxima com o ex-presidente Lula?
Convivi como vida partidária e no movimento sindical também. Enquanto ele surgia como lider sindicalista no ABC eu me tornava em um sindicalista na área da educação, na fundação da CUT estávamos juntos. Quando houve os primeiros movimentos do ABC fizemos entre os professores uma arrecadação de generos alimentícios e fomos entregar na Vila Euclides para o fundo de greve dos metalurgicos, era portanto um movimento de solidariedade. O sindicalismo no Brasil sempre foi muito forte, em 1906 se criou a COB Confederação Operária Brasileira. Durante a ditadura a primeira greve de resistencia, de embate político foi em Osasco. O passo seguinte foi em 1978 veio a greve do ABC e surgiu uma figura muito emblemática do movimento que se tornou presidente da república, que é talvez a maior liderança política da república brasileira. A História ainda fará justiça ao Lula. Ele não pode ser colocado na mesma dimensão de um Getulio Vargas porque está vivo. A greve do ABC parece a reinvenção do sindicalismo porque ela teve uma simbologia muito forte pela dimensão, aquilo era o maior parque indústrial do país, em um período em que o país estava em uma indústrialização muito forte. Com a figura emblematica do Lula parece que ele é o pai do sindicalismo. Ele é sim a figura mais expressiva do sindicalismo moderno no Brasil.
Porque figuras como Hélio Bicudo, Luiza Erundina se afastaram do partido?
Por questões absolutamete teóricas. Eu sou do PT porque me sinto representado pelo PT, corresponde as minhas expectativas de luta política. É um instrumento pelo qual eu acho que posso contribuir para transformações sociais importantes. Se o PT deixar de ser aquilo que corresponde ao meu itinerário vou fazer outra coisa na vida. Partido político é isso, ele não é comandado por algo sobrenatural ou alguma coisa metafísica. Partido é uma realidade objetiva. As pessoas dentro do partido além da possibilidade de acharem que não corresponde mais, elas também tem suas vontades, e as vezes ocorrem conflitos que levam a ter que tomar decisões. O partido teve a interpretação de que não deveriamos participar do governo Itamar Franco. A companheira Erundina com todo direito de achar que tinha que participar se achou no direito de se licenciar do partido foi participar inclusive de um ministério. Isso criou um ambiente que mais tarde a levou a se desligar do partido. O Hélio Bicudo, a quem respeito muito, não tem presença tão significativa no partido. A militância do PT continua tendo um carinho muito grande pela Luiza Erundina. Ela disse uma ocasião: “Eu saí de uma casa, estou em outra casa vizinha, mas estou no mesmo lado, no lado esquerdo da rua”. Teve gente que saiu do campo da esquerda e foi para outro lado, virou neo-liberal. Eu diria que a Erundina é uma pessoa que defende o programa do PT. Não duvido que a qualquer momento possa ter seu retorno, eu serei um daqueles que a receberão de braços abertos. Aqueles que sairam do partido criticando porque tiveram seus projetos pessoais contrariados é outro debate.
O PT virou vidraça, pelo fato de ocupar o poder, há criticas sendo feitas ao partido da mesma forma que ele criticou outros partidos no passsado?
O PT sempre foi muito duro na crítica aos desvios de natureza ética e moral na política. Sempre combateu e continua combatendo a corrupção. O problema da corrupção existe em qualquer aparelho do estado, como de resto em qualquer instituição. Um ato de corrupção pode se dar em um sindicato, em uma instituição patronal, em uma entidade beneficente, é um problema que a humanidade enfrenta, ocorre no mundo todo. O problema que ocorre no Brasil é como se lida com isso. Na época do Fernando Henrique não tinha a Controladoria Geral da União. A capacidade que a Policia Federal tem hoje para investigar, descobrir e combater o ato, o Ministério Público federal e estadual, o próprio Congresso Nacional e a imprensa estão capacitados para combater esse tipo de problema. O Lula de vez em quando brigva com a imprens porque ele tem o direito de dar a opinião dele assim como a imprensa tem o direito de emitir a opoinião dela. Na ditadura não é que não tinha corrupção, os jornais eram censurados e não podiam falar a respeito. Houve um processo de privatização do Estado nesse período. Quanto mais investigação for feita mais parece que tem. Está dificil combater o PT no que se refere ao itinerário político, o desenvovimento economico está numa velocidade maior, o Lula foi um desenvolvimentista, a presidenta agora está enfrentando a crise européia, mesmo assim o Brasil tornou-se a sexta maior economia do mundo, maior do que a da Inglaterra. Ainda no Brasil tem injustiça social, má distribuição de renda. Vinte e oito milhões de famílias mudaram de categoria social. Gente da classe E evoluiu para D, quem era da classse D evoluiu para classe C. È a maior mobilidade socil da história recente do país. O governo enfrenta o problema da corrupção, existem quadrilhas que se organizaram de uma tal forma, para poder capturar recursos do poder público, isso em todas as esferas, federal, estadual e municipal. Tanto que a Delta tem contrato em todos esses ambitos.

 
No futuro o Lula poderá ser econhecido como o elemento que desarmou o gatilho de uma explosão social iminente?
É muito dificil afirmar categorimente. De certa forma foi aberta uma valvula de escape, diminuiu a tensão dentro da panela de pressão. Embora a história ainda vai ser escrita o Lula já entrou para a História. Acho que a Dilma irá entrar para a história do país como grande presidenta e até por ser a primeira mulher a presidir o país, assim como o Lula pelo fato da sua origem popular. A política do Lula diminuiu a tensão social.















sexta-feira, junho 15, 2012

FRANCISCO OSVALDO MARTINS HOPPE

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 16 de Junho de 2012
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.tribunatp.com.br/
http://www.teleresponde.com.br/

ENTREVISTADO: FRANCISCO OSVALDO MARTINS HOPPE

Francisco Osvaldo Martins Hoppe é nascido a 11 de janeiro de 1960 em Capivari, filho caçula do casal Mário de Barros Hoppe e Eugênia Martins de Toledo Hoppe que tiveram os filhos José, Mário, Maria de Lourdes, Solange, Eliana Maria e Francisco. Seu pai Mário de Barros Hoppe atuou sempre no comércio, tendo sido inclusive representante da Johnson & Johnson. Sua mãe foi professora primária na cidade de Rafard, cujo salão nobre da Câmara Municipal de Rafard foi denominado Eugênia Martins de Toledo Hoppe em homenagem póstuma pelos serviços prestados á cidade. Ela sempre lutou muito pela escola e sempre foi muito estimada pela população. Francisco fez seus estudos na Escola Estadual Padre Fabiano José Moreira de Camargo, formou-se pelo Curso Técnico de Contabilidade Capivari. Aos 23 anos foi trabalhar na Caixa Econômica Estadual, como estagiario pelo CIEE – Centro de Integração Escola Empresa, onde permaneceu por dois anos, no Banco Itaú permaneceu por mais um ano. Cursou Engenharia Civil por um ano na Escola de Engenharia de Piracicaba, foi o tempo suficiente para que preceber que a sua vocação estava voltada para outra àrea. Em 1981 foi cursar Direito na Unimep. Prestou o concurso para delegado de polícia, foi aprovado. Atualmente além de delegado de polícia Primeira Classe é Mestre em Direito e professor universitário. Tem como hobby música, pintura. Estudou violão com Alessandro Pinezzi, um dos grandes mestres do violão. Francisco gravou um CD incluindo composições suas. Foi aluno de desenho e pintura do grande artista Manoel Martho, quando Manoel Martho fez um busto de barro de Frei Paulo de Sorocaba, outro grande nome da pintura, Francisco fez a carvão uma pintura retratando Frei Paulo de Sorocaba.
Qual foi a primeira cidade em que o senhor assumiu como delegado de polícia?
Foi na cidade de Sete Barras , no Vale da Ribeira. Morava na própria delegacia. Tinha 30 presos, não havia investigador de polícia, tinha apenas um escrivão, a Polícia Militar tinha sua corporação na própria delegacia, onde permaneciam dois policiais militares e 6 carcereiros que se revesavam. Após permanecer por quatro meses fui transferido para Campos do Jordão. Permaneci por cinco meses, morando em hotéis e na delegacia também.
Em Sete Barras, morando na própria delegacia, como era o ponto de vista dos presos a respeito?
A maioria dos presos gostava de mim, porque eu conversava muito com eles, dava-lhes atenção. Logo que cheguei, encontrei alguns presos impondo-se junto aos demais através de um clima pesado. Consegui quebrar o domínio desse pequeno grupo sobre os demais. Pelas minhas atitudes sofri ameaças de morte por parte dos descontentes. A maioria dos presos me tratava muito bem, eu ia ao pátio, conversava com eles.
Presos têm ética?
É diferente da nossa, é uma ética própria. O problema junto a população carcerária é quando não impera os regulamentos legais lá dentro. A isso se dá o nome de anomia (desintegração das normas).
O que o motivou a ser delegado de polícia?
É o sonho de muitas crianças, ser policial. Eu tinha feito estágio no Forum de Capivari, junto ao juiz. Naquele meio conheci o promotor, delegado de polícia, juiz, advogados. Vi que na àrea criminal, que eu gostava, era essencial a existência da polícia civil. Existia uma investigação, qualquer condenação do autor de um crime, tinha seu inicio com a investigação da Polícia Civil. Vi a beleza envolvida na ciência da investigação, como era gostoso solucionar problemas com inúmeras variáveis. O contato com o público. Comecei a ter uma noção da realidade cotidiana. Dentro da polícia você vê o que é de fato realidade. O primeiro contato com essa realidade é feito pelo delegado de polícia, pela polícia civil. Os juízes, promotores, passam a conhecer logo em seguida o que de fato ocorreu.
Qual é a classificação do senhor dentro da hierarquia policial?
Tenho 25 anos de atuação como delegado de polícia. Sou Delegado de Polícia de Primeira Classe. O delegado inicia na quarta classe e vai sendo promovido. Após a Primeira Classe existe a Classe Especial, onde o delegado tem que ser convidado para ser promovido, não é apenas pelo tempo de serviço prestado.
No Brasil existe um jargão popular que diz: “A polícia prende e a justiça solta”. Como o senhor vê essa afirmação?
Toda vez que acontece algum crime que abala a sociedade, por pressão política endurecem a pena. Começam a criar novos crimes na lei positiva, passam a antecipar a ação do criminoso. Antigamente porte de arma era contravenção penal, hoje é crime. Foi endurecida a penalidade sobre crimes de trânsito. As penas sobre crimes hediondos endureceram. É muito difícil analisar o efeito dessas medidas, não diminui a criminalidade. Quando se fala em segurança pública as pessoas focalizam a polícia civil e a polícia militar. Segurança pública não é só isso. Um estudo sobre como trabalhar sobre segurança pública está na prevenção primária, prevenção secundária e prevenção terciária. Prevenção primária é a escola, a família, o meio em que o indivíduo vive, colocando valores morais, sociais, desde a infância. Tenho feito palestras sobre drogas em escolas, principalmente porque acredito nisso. A prevenção secundária é a presença nas ruas da Polícia Militar, com apoio da Guarda Civil para evitar que ocorram crimes. A terciária é quando termina o cumprimento de pena o detento seja colocado em liberdade ressocializado. O índice de reincidência é de 60% a 63%. Apesar de que existe não só no Estado de São Paulo, como também em Minas Gerais um bom trabalho das APACs - Associação de Proteção e Assistência aos Condenados. São entidades civis, ligadas a instituições religiosas trabalhando os valores morais com o reeducando.
Até hoje nas inúmeras escolas em que o senhor deu essas palestras quantos alunos assistiram?
Por volta de 6.000 pessoas. Acho que passei por todos os colégios de Piracicaba, dei palestras em colégios públicos e particulares, na igreja católica, centro kardecista. Há uma enorme carência de informações técnicas sobre os efeitos das drogas. É necessário que mais pessoas ministrem essas palestras, com base científica.
O senhor é pré-candidato a vereador para a Câmara Municipal de Piracicaba?
Sou. Muitas pessoas afirmam que não gostam de política. Acho isso um absurdo, tudo é político. Se ela não gosta de determinado político, é compreensível. Existe uma frase que diz: “Não tenho nada contra o fato de você não gostar de política, mas quem vai governar a sua vida é quem gosta de política”.
O que o senhor acha do voto obrigatório?
Nesse momento não deveria haver, pode ter sido necessário até certa época. Na medida em não for obrigatório votar, muitos vão querer votar. Até os que justificam o voto. Ninguém gosta de ser obrigado a fazer alguma coisa. Tem-se que entender que é muito importante votar, além de um dever é um direito.
Em seus 25 anos de trabalho como delegado o senhor observou que o indivíduo dependente químico sempre foi mais estimulado a cometer crimes?
Drogas sempre existiram, o que mudou foram as suas apresentações. A maconha hoje é potencializada, o índice de THC dela é bem maior do que era há 10 anos. O maior problema foi a banalização do uso da droga. Os meios de comunicação refletem o que existe na sociedade, de certa forma ajudaram nessa banalização. A sociedade em si banalizou a droga.
Programas populares que tratam de assuntos ligados ao crime funcionam como uma espécie de tele curso de crimes?
Acho que depende do tipo da abordagem. Quem assiste a programas policiais irá achar que no mundo só ocorre crimes, nada de bom acontece, que não existem pessoas boas, que o mundo está acabando, isso gera um negativismo muito grande. Isso gera depressão e medo. Quando é gerado o medo também é gerada a violência. O medo sempre foi tratado como instrumento, algumas crenças religiosas se impunham pelo medo, na área criminal a lei tem uma pena que impõem medo, pressão para que a pessoa não pratique crime. Só que quando é criada uma lei para inibir a ocorrência de um crime, essa lei não irá atingir a todos. Uma parcela jamais irá praticar crime, independente de lei, é uma parcela ética. Tem aqueles que não praticam crime por medo. Se vencerem o medo irão praticar crimes. E tem aqueles que irão praticar crime independente da pena que pese sobre eles. Nem a pena de morte irá inibi-los. Nos Estados Unidos, mesmo com pena de morte aumentou a criminalidade.
Não é um contra-senso a população ser desarmada e o delinqüente possuir arma?
Para se utilizar uma arma não é só puxar o gatilho, isso todo mundo sabe como fazer. Para utilizar bem uma arma tem que existir treinamento, além daquele que visa atingir o alvo, tem que existir o treinamento psicológico, ter equilíbrio, o que é mais difícil ainda. Uma arma dentro de casa não é certeza de proteção. Muito pelo contrário, pode ser que pelo fato de existir uma arma o criminoso atire primeiro. O fator surpresa está a favor do delinqüente. Se o cidadão tem uma arma em casa ao perceber a presença de um individuo, onde estará essa arma? Estará municiada? Possivelmente ela estará fora do fácil alcance de todos, ou seja, guardada em algum lugar.
Como anda o nosso código penal?
Foi criado na década de 50, passou por uma reforma na Constituição de 1988, ela visou mais a parte de direitos humanos e restringiu em parte a ação da polícia civil. Um delegado podia entrar em um domicílio mesmo não sendo flagrante delito. Hoje há a necessidade de um mandado judicial. Só em casos de flagrante isso é possível, se estiver ocorrendo um crime cabe a autoridade policial intervir. Acho que existem exageros na parte de entendimento de direitos humanos. Ninguém pode ser obrigado a fazer uma declaração que se torne prova contra ele mesmo. Só que permite também que a pessoa minta. Se ela mentir não estará praticando nenhum crime. Outros países admitem que permaneça calado, é um direito da pessoa para não produzir prova contra si mesma. Mas não admitem a mentira. Nossa legislação admite a mentira por parte do indiciado, que pode levar o foco da investigação para uma direção contrária a apuração da autoria. Se uma testemunha mentir ela é processada. Se o réu mentir não será processado pela sua mentira. O que provoca uma revolta social é a demora dos julgamentos, desde o crime, sua apuração, até mesmo a lentidão judiciária.
A lentidão judiciária traz benefícios para muitos envolvidos, como é de conhecimento público.
Além de beneficiar muita gente, tira o animo do brasileiro reclamar seus direitos, isso na área cívil. Quantos brasileiros têm seu direito negado, mas pelo valor envolvido na causa ele não se anima a ir adiante. Existe o juizado especial civil, sabemos que está sobrecarregado.
São criadas dificuldades burocráticas em registros de Boletim de Ocorrências para não aumentar estatísticas de criminalidade? Ao registrar um B.O., por melhor que seja o atendimento dado, o tempo gasto é de várias horas.
O plantão policial à noite ou final de semana pode receber várias ocorrências simultâneas. Um flagrante por simples que seja demora um bom tempo. Não são só as oitivas das pessoas. Tem outras peças que são obrigatórias a serem elaboradas. Ofícios. É um calhamaço de papel. É cumprimento de lei.
Seria interessante se esse sistema fosse simplificado?
Muito interessante, teria que haver um estudo, de uma maneira que não vá prejudicar posteriormente a formalização da investigação e das comunicações necessárias, mostrando a transparência do serviço policial, bem como as garantias constitucionais de quem está sendo preso.
Em 25 anos atuando como delegado de polícia o senhor conviveu com situações e pessoas mais diversas possíveis. Algum fato permanece em suas lembranças?
Muitos, envolvendo todo tipo de sentimento inerente ao ser humano, inclusive muitos de comportamento alterado, distúrbios mentais. Sempre gostei de conversar muito com as pessoas, apesar de que dentro de uma delegacia o expediente é muito corrido e nem sempre é possível dar a devida atenção. Um fato atípico, até singelo, ocorreu quando fui procurado por uma senhora muito humilde, dizendo que seu filho faltava ás aulas, não estudava. Disse-lhe: “- O que posso fazer para resolver seu problema?” Aquilo não tinha nada a ver com a função de uma delegacia de polícia. Ela disse-me “-Ele respeita a polícia, se o senhor conversar com ele com certeza ele irá mudar”. Eu já fazia palestras em escolas, ela se prontificou a levar seu filho de 12 anos para conversar comigo. Disse-lhe: “- Vamos tentar.”. O menino veio com a mãe, foi em um dia em que a delegacia estava com o expediente mais tranqüilo, ficamos uma hora conversando, a princípio os três, depois a mãe saiu da sala, e conversei com o menino. Ele saiu de lá se sentindo meu amigo, e prometeu que iria mudar. Passado algum tempo, eu já tinha até esquecido do episódio, quando a mãe do menino foi me agradecer, realmente o menino tinha mudado sua conduta. O sonho dele era ser policial.
Faltava a figura paterna a esse menino?
Faltava um pai.
Exercer a função policial é um sacerdócio?
É um sacerdócio. Tudo que consegui na minha vida foi através do meu salário, mesmo não sendo compatível com a função. É um trabalho difícil, muitas vezes em uma investigação se trabalha muito e não se consegue nada. De repente de uma ponta de um fio, ao puxar, começamos a resolver e as coisas começam a dar certo. Só que nesse período as pressões são fortes, da sociedade, da instituição, de todos os meios. Agora em Piracicaba estão sendo repostos novos policiais, estamos defasados. Há uma sobrecarga.
Piracicaba é uma cidade em franco crescimento, em todos os campos, inclusive na delinqüência?
Piracicaba ocupa a 47ª posição do PIB brasileiro e 12ª do PIB do Estado de São Paulo, só que junto com todas as atividades industriais e comerciais aparecem problemas também. Com a implantação de novas indústrias, se hoje temos um determinado número de postos de saúde, teremos que ter um número maior desses postos. O trânsito da cidade na área central, talvez alguém venha pensar em um sistema de rodízio de veículos baseado em suas placas.
O senhor não acha que o detento deve se ocupar com atividades produtivas?
A Lei de Execução Penal a LEP é maravilhosa, tudo isso está previsto. O problema no Brasil não é criar leis, não se resolve apenas com intenções, tem que ser feita uma política voltada para tal situação. Tem que executar, fazer parcerias. A APAC de Minas Gerais ajuda a fazer a política do trabalho ocupacional. Realiza contratos com empresas onde os presidiários são motivados a exercer uma ocupação. Os proventos resultantes do seu trabalho são para o Estado, para a sua família, para a vítima e finalmente para ele. Outra ponta da criminalidade é a ressocialização do preso. Não adianta nada colocar o preso em uma cadeia e quando ele ganha a liberdade muitas vezes sai pior do que entrou. Temos que parabenizar as APACs pelo trabalho que desenvolvem. Precisamos ter presídios dignos para os presos, são seres humanos que estão ali, assim como é lógico implantarmos uma cultura junto a população carcerária. Todo diretor de cadeia tem que verificar a alimentação do preso, na minha primeira delegacia em Sete Barras, eu peguei uma marmitex das que eram destinadas aos detentos, e comi e era muito boa. Não era almoço de luxo, de várias iguarias, mas era muito bom. Se o detento não quisesse almoçar ele tinha direito a um lanche, no mesmo valor da marmitex, só que tinha que avisar com antecedência. Convivíamos com uma inflação muito grande, o reajuste dos valores pagos pela alimentação tinham que obedecer uma burocracia.
Circula pela internet uma lenda onde o preso e sua família recebem um bom dinheiro do Estado, valor que se torna altamente significativo a medida que aumenta o número de filhos do detento.
Ele ganha um valor, que é para ajudar a manter a sua família, para que não seja mais criminalizado, mas não é nenhum absurdo. Até hoje nunca vi ninguém querer ser preso para auferir tal fortuna.
O menor é um problema sério?
O problema do menor é de valores, e isso todos nós somos culpados, não só a família dele. Somos omissos. Se os bons não se unirem para serem fortes, os ruins vão ganhar a parada. Temos que nos unirmos e tentarmos fazer uma sociedade melhor.
Um delegado de polícia eleito vereador pode fazer com que as leis que já existem sejam aplicadas?
Não só um delegado como qualquer outro político pode fazer isso. Muitas vezes não são problemas de ordem municipais, e sim federais com atribuições estaduais. Mas através da política pode ser facilitado o acesso aos canais competentes.
A criminalidade está aumentando ou se mantém?
Entre os fatores que aumentam a criminalidade está o aumento da população, a nossa educação piorou, até algumas décadas só os melhores alunos conseguiam entrar na escola pública. Existe um estudo que para recuperar a educação num patamar elevado demora três gerações, são 100 anos. Não existe uma grande melhora de uma hora para outra.
Isso é um fenômeno do nosso país.
Do nosso país, vários fatores concorreram para que a educação piorasse, desde a política salarial até o fato de promover o aluno automaticamente, o aluno não é reprovado. O pior ainda é não conquistar o aluno para a escola, o aluno gostar e ter respeito pela escola. Em meu tempo o aluno participava, tinha voz ativa. Sugeria eventos. Chegamos a ter clube de cinema dentro do colégio, pagávamos uma mensalidade, um aluno sabia onde adquirir os filmes pegava os melhores clássicos, que eram projetados no salão nobre da escola, o professor de literatura ia junto, após o término do filme ficávamos discutindo os mais diversos aspectos do filme. As coisas funcionavam, havia a fanfarra, inclusive onde toquei caixinha e surdo.
Turbinados pelo consumismo exacerbado ou movidos pela necessidade de sobrevivência, muitos pais deixam seus filhos entregues aos cuidados de terceiros, por muitos anos a televisão fez o papel de educadora, hoje os jogos, os famosos games, geralmente muito violentos ocupam boa parte do tempo da criança e do adolescente, isso pode influenciar a personalidade do indivíduo?
É difícil avaliar. O noticiário mostra a violência. Nas ruas há violência. Especialistas dizem que se o indivíduo tem uma tendência patológica, uma pré-disposição para a violência, com esses estímulos ela aflora.
O senhor está sempre buscando aperfeiçoamento profissional?
Recentemente fiz o Curso Superior de Polícia, é um curso com duração de seis meses. Há uma grande participação conjunta com a Polícia Militar, estivemos na Academia de Polícia Civil e depois estivemos na Academia de Polícia Militar do Barro Branco. Trocamos informações sobre os métodos usados pelas duas instituições. Além da formação e informação, o estreitamento de relações entre a Polícia Civil e Polícia Militar foi muito importante. Tenho uma grande admiração pela Polícia Militar. Como parte do curso tivemos a oportunidade de conhecer a Scotland Yard, tradicional polícia inglesa, fomos conhecer os métodos aplicados por eles em Londres. O respeito aos direitos humanos tem sua origem na Inglaterra. Lá não existe a policia militarizada, o que há é a polícia civil, a fardada e a não fardada. Apenas um terço da polícia anda com arma de fogo, a grande maioria, que faz policiamento preventivo, não ttem arma de fogo. O panico deles tem como foco o terrorismo. O indice de furto é minimo, embora exista bastante consumo de tóxico.
A Holanda tentou flexibilizar o uso da droga, qual foi o resultado?
Deu errado, tentaram liberar a droga leve. A luta contra a droga não vamos ganhar com repressão. Os limites territoriais do nosso pais são extensos. Temos drogas socialmente aceitas, como remédios, álcool, tabaco. É dificil acabar com isso pelo volume de dinheiro envolvido. Temos o exemplo do cigarro, houve um trabalho de conscientização. Antigamente era bonito a pessoa fumar. Charmoso. Hoje é feio. Por isso eu estava fazendo as palestras sobre drogas. Quando os “heróis”, ídolos, pop-star, que todo mundo gosta, são consumidos de uma forma barata, principalmente pela televisão, dizem que a droga faz mal, quem experimentou droga diz que não faria isso. Antes pareciam que falavam com orgulho o fato de terem experimentado tal droga. Não entendo porque fazem passeata pedindo a liberação de drogas leves, mas não fazem passeata pedindo maior número de empregos, solicitando mais esolas como o SENAI que é uma maravilha. A liberdade é uma aspiração do homem, só que poucos pensam o que fazer com essa liberdade. Parece que a humanidade está um pouco vazia.







sexta-feira, junho 08, 2012

JOÃO CHADDAD

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 9 de junho de 2012
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.tribunatp.com.br/
http://www.teleresponde.com.br/

ENTREVISTADO: JOÃO CHADDAD
João Chaddad é carismático, participativo, dinâmico, muito conhecido e estimado em Piracicaba. Ainda menino limpou vitrines, engraxou sapatos na Praça José Bonifácio, teve aulas de pinturas com o lendário Frei Paulo. Com talento e esforço conquistou seu espaço. Arquiteto diplomado pela famosa escola Mackenzie de São Paulo, aos poucos foi galgando fama e colecionando inúmeras obras realizadas, no setor público e privado. Construiu uma edificação, para sua residência, que deu a denominação a um bairro: Castelinho. Uma obra feita movida pelo prazer de sua realização. Brincou com as formas geométricas em muitas de suas obras. Inovou. É considerado por muitos o “Oscar Niemeyer Piracicabano”. Ocupou importantes cargos na administração municipal sem se deixar ofuscar pela vaidade. João Chaddad é artista, esportista, cantor de voz afinada já animou muitos auditórios. João Chaddad pertence a galeria das celebridades piracicabanas. Nascido a 16 de juno de 1935, em Artemis, filho de Manoel (o nome original em árabe era Mansur) Chaddad e Angelina Scarpari Chaddad. O casal teve seis filhos: Calil, Joege, Valdemira (Georgina), Zilá, Lucila e João.

O seu pai imigrou de qual localidade do Líbano?

Ele veio de Zahle, devia ter entre 11 a 14 anos, veio como foguista, alimentando as caldeiras do navio. Chegando ao Brasil, seu início foi como o da grande maioria dos imigrantes daquele pais, foi ser mascate. Inclusive ele me contava um fato pitoresco. Os tecidos naquela época eram feitos de algodão, não havia o aprimoramento que existe hoje, era muito comum o tecido ao ser lavado, encolher. Após três meses quando ele voltava onde tinha vendido, a roupa tinha encolhido, ficava mais evidente principalmente nas crianças e adolescentes em fase de crescimento. Ele já entrava falando alto: “ Nossa que beleza! Benza Deus como cresceu!” Uma das coisas que me orgulho muito a respeitto do meu pai, é que morávamos em Artemis, e aos sábados e domingos, eles relizavam casamentos. Invariavelmente meu pai era padrinho de casamentos, batizados. Meu pai é padrinho de Cecílio Elias Neto, nós sempre adoramos o Cecílio, meu pai gostava muito dele. Meu pai pode-se dizer que foi o campeão mundial de compadres, o folclorista e historiador João Chiarini fez um levantamento e chegou a um número aproximado de que Manoel Chaddad teve 700 compadres.

Ele tinha qual tipo de comércio em Artemis?

Era um armazém, houve outro caso verídico, que é contado em tom de folclore. Meu pai logo perdeu o sotaque árabe. Lá ele fazia o jogo de bicho, na época não havia a Loteria Federal. Em uma lousa com uma cortina, situada no fundo do armazém, meu pai escrevia os nomes dos bichos do primeiro ao quinto prêmio. Escrevia por exemplo, Leão, Jacaré, Cobra, Camelo, Burro. Fechava a cortina, a lousa ficava em local visível e alto, a tarde abria-se a cortina para ver quem ganhou. Em uma dessas vezes, a cortina ficou com uma pequena fresta, e aparecia em primeiro lugar a letra “A”. Artemis inteira jogou na àguia e no avestruz. As seis horas da tarde quando foi aberta a cortina estav escrito “alefante”.
Como Manoel Chaddad foi morar em Artemis?

Acho que como mascate ele fazia aquela região, gostou de lá e acabou adquirindo propriedade lá.

Ele desembarcou no Brasil com apenas muita coragem, sem conhecer o povo, costumes e idioma?

Exatamente! Como outros libaneses que vieram para Piracicaba. Na época em que ele veio muitos libaneses vieram para o Brasil.

O senhor estudou o curso primário em Artemis?

Metade do curso primário estudei em Artemis. Lembro-me que o rio era navegável, chegavam imensas toras de madeira, assistiamos ao desenbarque, a madeira vinha rolando até o barranco. Era uma coisa bacana de assistir. O vapor chegava, apitando. Outra metade estudei no Grupo Moraes Barros. Nessa época meu pai passou a viajar muito, adquiria batatas e cebolas que vinham do Paraná. Eram transportadas por trem. Em uma dessas ocasiões, acredito que por causa de chuva, o trem demorou muito para fazer o trajeto, quando chegou em Piracicaba metade da carga estava comprometida, podre. Meu pai tinha um depósito na Sorocabana, eu estudava no Grupo Escolar Moares Barros, ia lá após as aulas para ajudar a separar a parte podre das cebolas da parte boa. Fazia o mesmo com as batatas. Com isso ele perdeu todo seu dinheiro. Todos os filhos se uniram e formaram uma lojinha, como sempre, a lojinha do àrabe. Situava-se no Largo Santo Estevão, do lado do Teatro Santo Estevão, mais tarde derrubada para fazer o Comurba. Lá nasceu o “Céu Cor de Rosa”, nome com origem na música do mesmo nome (João Chaddad cantarola a música): “Ontem/Na tarde formosa/No céu cor-de-rosa/Longe, longe/Divagando e pensando em ti, fiquei/Tuas juras de amor eu recolherei”. Alguns irmãos eram contra, achavam um absurdo esse nome. A Valdemira bateu firme, queria que se chamasse “Céu Cor de Rosa”. A loja depois foi transferida para a Rua Governador Pedro de Toledo. Lembro-me que já estudando no Sud Mennucci, precisava de um dinheirinho para ir ao cinema, eu limpava os vidros da loja dos irmãos, às vezes arrumava uma namorada linda, rica, eu estava limpando o vidro e ela passava na rua, eu ficava chateado. Mas eu ganhava mil réis para ir á matinê no Broadway ou no Cine São José. Como na loja não ganhava muito resolvi ganhar um dinheirinho como engraxate, minha mãe nem meu pai não queriam. Eu tinha uns 12 a 13 anos, como bom árabe, eu fiz três caixinhas de engraxate, e já peguei dois ajudantes. Engraxava na Praça José Bonifácio. O interessante em ter uma origem humilde é que se um dia a pessoa retornar às suas origens terá mais facilidades em adaptar-se. Nessa mesma época eu meu amigo Hélio Vicino, varríamos o Cine Broadway, cada um varria metade do cinema, isso todos os dias da semana, após terminar a última sessão. Em troca tínhamos o direito de entrar e sair do cinema na hora que desejassemos e a assistir a todos os filmes. Era trabalhoso, tínhamos que levantar todos os assentos das cadeiras, além da inclinação do piso que dificultava o trabalho. Levávamos uns 40 minutos para limpar o cinema inteiro. Nessa época já estava morando na Rua Governador Pedro de Toledo, na loja. Depois mudamos para a Rua do Rosário, 620, bem em frente ao Grupo Moraes Barros. Conheci Bento Chulé, Nhô Lica, no lado oposto da praça existia a Fábrica de Bebidas Andrade, da família do escritor Thales Castanho de Andrade, eram nossos conhecidos, assim como o famoso refrigerante Cotubaina que eles produziam.

Com que idade o senhor foi estudar em São Paulo?

Com aproximadamente 17 anos fui para São Paulo para fazer o vestibular. Até então eu ia com meu irmão Jorge uma vez por mês à São Paulo, para fazer compras para a loja, íamos de trem da Companhia Paulista. A viagem durava mais ou menos 4h30.

Quando foi realizar seus estudos onde o senhor morava?

Fui morar no porão de uma pensão, perto do Mackenzie. Os irmãos Dutra, o Clayton Belmudes, moravam perto de mim. Eu dividia o quarto com Aderbal Pinto Cesar. Morava conosco Délio Guerrini, filho de Leandro Guerrini. Os primeiros tempos em São Paulo foram terríveis, tínhamos que pegar um bonde e ir até o cursinho que ficava em Perdizes. Fui aluno de Arquimedes Dutra e do Frei Paulo Devo muito ao Arquimedes Dutra, ele percebeu a minha tendência para o desenho, foi falar com o meu pai que eu precisava fazer o curso de Arquitetura. Quando eu passei no vestibular no Mackenzie meu pai me deu uma quitinete, na Rua Santa Isabel, 230, em frente a Santa Casa de São Paulo. O apartamento era novo, eu não tinha dinheiro para mandar raspar o taco, não tive nenhuma dúvida, comprei umas lixas grossas e eu mesmo acertei os tacos, passei uma cera. Fiz um armário dividindo, de um lado eu fazia desenho e do outro lado tinha o sofá cama. Havia uma fábrica de aparelhos de televisão em Piracicaba, toda a caixa era de madeira, pesada, meu pai me deu uma, eu não tive dúvida, comprei duas passagens de ônibus, uma para mim e outra para a televisão. Cheguei a São Paulo, na Estação Rodoviária, era em frente a Estação da Luz, na época eu era atleta, fazia ginástica, jiu-jítsu, sempre pratiquei ginástica. Nunca fumei, nem bebi. Da rodoviária, peguei a Avenida Duque de Caxias, passei pelo Largo do Arouche e fui até a Rua Santa Isabel, com a televisão na minha cabeça. Fiz tudo isso com muita alegria, muita satisfação. Em São Paulo a sintonia da televisão era melhor do que aqui em Piracicaba, era em preto e branco e sintonizava a TV Record e TV Tupi. Eu gostava de imitar a voz de Walter Forster. Um programa de muito sucesso era “Almoço com as Estrelas” apresentado por Airton e Lolita Rodrigues. Os programas apresentados pela TV Record eram o máximo. Permaneci lá até o quinto ano. No terceiro ano de arquitetura comecei a lecionar em uma escola técnica próxima ao Banco do Estado de São Paulo, no centro. Durante o dia eu fazia o curso de arquitetura e a noite dava aulas. Saia da escola as 23hs, atravessava a Rua Barão de Itapetininga, Praça da República, Largo do Arouche, chegava a minha casa em torno de 24hs. Passava pelas animadas casas noturnas que existiam no centro e continuava caminhando com meus livros embaixo do braço.

Em que ano o senhor entrou no Mackenzie?

Entrei em 1968 e sai em 1973.

Foi um período político de muita tensão, e onde o senhor estudava era um dos focos.

Havia uma rivalidade entre estudantes do Mackenzie e da USP que ficava em frente. E dentro do nosso diretório havia o domínio da esquerda. Todo mundo queria saber de estudar, esse pessoal do diretório não, eles tinham muito tempo para fazer política. É como hoje, tem alunos que estão a sete, oito anos fazendo política, não se formam nunca. Naquela época esse aspecto era mais forte. Do terceiro para o quarto ano casei-me com Ester Sornsen Chaddad, descendente de dinamarqueses, a família dela residia em Piracicaba, onde a conheci, quando nos casamos ela foi trabalhar na Casa da Agricultura, na Água Branca. Tivemos nosso nenê, Regiane Chaddad, que no primeiro ano de vida ficou muito doente. Eu com a Ester comíamos sopa de fubá, com bastante alho. Ela tomava o ônibus Estações, lotado, com o nenê no colo. A mesa em que ela trabalhava tinha uma gaveta enorme, o chefe dela permitiu que ela colocasse o nenê na gaveta. Um dia em visita inesperada, apareceu o Secretário da Agricultura, era Rui Francês. Ela fechou a gaveta, com o nenê dentro. Após examinar tudo, cumprimentar a todos, ele ia saindo quando ouviu um choro de criança. O chefe da Ester empalideceu, o Rui Francês voltou e foi ver o que estava acontecendo. Ester disse que era a sua filhinha, ele então começou a brincar com o nenê, achou engraçado, riu. Tivemos além dessa menina a Regiane, o João Chaddad Júnior e o Marcos Cesar Chaddad.

Quando o senhor passou a ter obras em Piracicaba?

Do terceiro ano em diante passei a pegar serviços em Piracicaba. No Edifício Comurba, no primeiro andar, existia o Clube dos 120, fiz um projeto de decoração para esse clube. Naquele tempo não se fazia essa perspectiva bonita que sai em jornais. Eu fazia em aquarela e guache, painéis de 1 metro por 90 centímetros. Fiz oito pranchas daquele tamanho mostrando as vistas internas do clube. Quando apresentei o clube, houve um coquetel. Eu acabei comprando uma sala, que se situava na parte que não caiu. O Tal, Alberto Coury, João Fleury, Raul Coury, Grego são alguns dos muitos a quem sou grato pelo apoio que me deram no início da minha carreira. Penso que se não tenho o que fazer, por que não fazer um projeto de graça? Quando sobrava um espaço de tempo em que não havia serviço eu faia uma igreja, um centro espírita, isso sempre disse aos meus alunos quando fui professor na Escola de Engenharia por sete anos e na Arquitetura mais dois anos. Sempre disse aos jovens, não fique parado quando você não tem serviço, faça de graça, você vai ter que pesquisar aprender, desenhar. Isso não é perder tempo, é ganhar tempo. Em 1964 quando caiu o Comurba, o Edifício Bandeirantes, ao lado do Broadway estava no sexto andar, é projeto meu. O Edifício Rio Negro, graças ao Alberto Coury é projeto meu. Nessa mesma época estava iniciando a fundação do Edifício Tapajós, era o Coba quem tocava. Esse pessoal para quem fiz o projeto do Clube dos 120, a um custo muito acessível, acabou me arrumando muitos serviços. Nós todos dependemos uns dos outros.
O senhor participou de projetos em São Paulo?
Eu já tinha obras em Piracicaba, quando surgiram muitos projetos para decoração de bancos, até então banco era um barracão. Depois passaram a fazer decoração em mármores, painéis, murais, vidros. Com mais dois sócios fizemos muitas decorações em agências de bancos em São Paulo. Cheguei a ter 30 obras em andamento em Piracicaba, nessa época, eu ia e voltava para São Paulo toda semana. Numa dessas ocasiões, Jayme Rosenthal com uma perua DKW, a Vemaguete, me levou para São Paulo, na Via Anhanguera, em certo momento entrou uma Kombi na rodovia, capotamos, caindo com as rodas do carro para cima, conosco não aconteceu nada, o Jayme imediatamente saiu, eu permaneci procurando a minha maleta, onde tinha cheques, plantas. O Jayme gritava: “Turco! Você está vivo?” Eu ficava quieto, estava procurando a maleta. Fiquei preocupado com os projetos que estava fazendo. Sai rastejando, tinha feito um pequeno corte na cabeça, onde normalmente sangra muito, juntou ao barro onde tinha apoiado as mãos, o meu rosto ficou com muito barro e sangue, o pessoal que parava para ver o acidente ficava muito impressionado com a cena.
     Residêencia projetada por Chaddad (Pirâmides invertdas)A queda do Comurba atrapalhou a construção em Piracicaba?
Por 10 anos atrapalhou muito. Eu tinha uns quatro ou cinco projetos em andamento que foram paralisados por total desmotivação dos empreendedores. A essa altura eu estava muito bem na Cidade Jardim, onde 50% das casas foram projetos meus. No Jardim Europa uns 30%. Eu calculo ter feito mais de 200 residências de alto nível. À véspera do Comurba cair eu estava trabalhando em um apartamento de propriedade do Lico Gatti, nesse período todo dia à uma hora da tarde eu ia até o Comurba, juntamente com o Lico, para discutir o assunto, geralmente o Alberto Coury ia junto. No dia em que o Comurba caiu, dirigi-me a portaria que ficava onde hoje é o Bradesco, fiquei no portão de entrada, esperando-o e conversando com o mestre de obras, depois de uma meia hora de espera,o Lico não apareceu, fui embora, meu pai tinha um escritório na Rua XV de Novembro logo atrás da Catedral. Na sala de espera eu tinha colocado uma prancheta ficava desenhando lá. Assim que cheguei ao escritório ouvi o estrondo do Comurba. Eu estaria lá, no primeiro andar.

Qual é o seu sentimento ao término de uma obra fruto de um projeto seu?
É uma sensação muito gostosa, entre as artes a arquitetura é uma das que mais aparece e que permanece por mais tempo. Hoje sinto uma sensação totalmente contrária, muitas edificações que projetei estão sendo demolidas para dar espaço a construções maiores, outras estão deixando de ser residências e passando a ser casas comerciais. Na Avenida Carlos Botelho demoliram, reformularam, mudaram de finalidade, umas 20 casas projetadas por mim. Quando isso começou, eu passei a me sentir mal, depois me acostumei. É tirar tijolo, matéria.

Entre inúmeros projetos de sua autoria alguns merecem destaque especial.

O projeto da Igreja da Vila Rezende foi o que mais me emocionou. Mario Dedini queria fazer uma igreja igual a de Lendinara, na Itália. O Mário dormia pouco, ele me convidava para ir até a sua casa discutir o projeto. Eu nunca gostei de cópias, fizemos um pacto, eu teimava em fazer uma arquitetura moderna e ele teimava em fazer a igreja de Lendinara como era. Fizemos um acordo, a torre seria igualzinha a de Lendinara, e a igreja moderna, com toques parecidos com Lendinara. Ele concordou. Eu fiz um painel de 14 metros de altura por 14 metros de largura no fundo, outro com as mesmas medidas na frente. Na inauguração foi uma choradeira, no painel do fundo colocamos um grande número de lâmpadas de 1.000 watts, foram apagando as luzes da igreja e acendendo as luzes do painel, a igreja ficou escura e o painel super iluminado, com a imagem de Nossa Senhora. O Mário chorava, eu chorava, Dona Inês chorava o órgão executando uma música muito bonita. Foi um momento muito feliz da minha vida. Construí 18 edifícios em Piracicaba, o Palladiun, na Rua do Rosário com José Ferraz de Carvalho, me trouxe muita satisfação. Fiz o projeto com um andar no esquadro e outro fora do esquadro, são 16 pavimentos, os 8 pavimentos fora do esquadro venderam mais rápido. O solo da área central da cidade é formado por rochas variando de 5 a 10 metros de profundidade. Isso é muito bom, porque apóia-se o edifício na rocha, que tem resistência superior ao concreto. Na Igreja da Vila Rezende, a rocha estava muito profunda, foram feitas sapatas de 4 por 4 metros.

O senhor é a única pessoa em Piracicaba, que ainda em vida, realizou uma obra que deu origem ao nome de um bairro, o Castelinho. Qual foi o significado da construção daquele castelo?

Meu pai já tinha falecido, nós sempre falávamos em fazer uma casa naquele estilo, fui ver o terreno de propriedade da Chácara Nazareth, o mato era bem alto, fui uma vez com o Walter Naime, cada um de nós compramos cinco lotes. Em 1972 comecei a construir o castelo, não havia mais construções, a não ser a minha e a peixaria do Garcia, era uma rua de terra, lá no fundo havia uma ou duas casinhas. Fiz o castelo, financeiramente eu errei, o Geraldo Quartim Barbosa tinha dito: “Você vai fazer uma obra gigantesca, é bom para a cidade, mas para você não é um bom negócio”. Mas era um desejo meu fazer essa obra. Ele tem 900 metros quadrados de construção. Chamava-se Bairro São Miguel, a Câmara Municipal mudou o nome do bairro para Castelinho.

Recentemente o senhor estava trabalhando como presidente do IPLAP?

O IPLAP é um órgão exclusivamente de planejamento. Ele planeja o futuro da cidade para 10 a 15 anos seguintes, muita coisa para o futuro está sendo planejada no IPLAP. As radiais, perimetrais, saem do IPLAP. Se alguma secretaria quer fazer alguma obra, o começo é lá. Eu agradeço ao prefeito Barjas Negri pela oportunidade de poder fazer urbanismo, planejamento, coisa que poucos arquitetos têm a chance de fazer na vida. Fiquei sete anos e meio no IPLAP. O Plano Diretor estabelece o crescimento ordenado da cidade, nós terminamos e aperfeiçoamos o Plano Diretor e tivemos o mesmo aprovado pela Câmara Municipal. Nós temos duas grandes cidades, Piracicaba, centro com 250 mil habitantes e Piracicaba Vila Rezende, Santa Terezinha com 120 mil habitantes. São duas grandes cidades que deveriam estar unidas não só por quatro ou cinco pontes, mas por 14 ou 15 pontes. Em minha opinião já poderia ter já mais quatro ou cinco pontes. Existem verbas específicas, destinadas a cada pasta, como educação, saúde, obras.

O senhor tem uma grande participação nas administrações da prefeitura municipal de Piracicaba?

Essa experiência que eu tenho, poucos tiveram a chance de ter. Fui seis vezes secretário de diferentes pastas. E uma vez vice-prefeito. Trabalhei com cinco prefeitos: Luciano Guidotti, Homero Paes de Athaide, Thame onde ocupei a Secretaria do Trânsito e depois a de Obras, com o prefeito Humberto de Campos era vice-prefeito, ocupei provisoriamente diversas secretarias, e nas duas administrações do prefeito Barjas Negri. Falam que o Luciano Guidotti e o Barjas são grandes prefeitos, por coincidência trabalhei com os dois.

Do alto da sua experiência profissional e pessoal o senhor decidiu enfrentar um novo desafio?

Sou pré-candidato a vereador. Tenho um sonho, colaborar com o legislativo para incrementar mais a apresentação de projetos para o executivo.








Postagem em destaque

História do Brasil: Juscelino Kubitschek