sexta-feira, abril 03, 2015

JOÃO DE OLIVEIRA

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 28 de março de 2015.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: JOÃO ANTONIO TEODORO DE OLIVEIRA

                                 JOÃO DE OLIVEIRA)

João Antonio Teodoro de Oliveira nasceu a 19 de setembro de 1950 em Tomazina, estado do Paraná. João de Oliveira, como é muito conhecido, é filho de Antonio Teodoro de Oliveira e Maria Aparecida de Oliveira que tiveram o s filhos João Antonio, Maria Francisca, Maria das Graças, José Teodoro e Isabel e mais dois outros filhos falecidos ainda muito novos.
Até que idade você permaneceu em Tomazina?
Até meus treze anos. Meu pai era agricultor, cultivava arroz, feijão, frutas, minha mãe trabalhava em nossa casa. Estudei até o segundo ano de ginásio em Tomazina, no Grupo Escolar Carlos Gomes. Embora fosse uma cidade pequena, tinha também uma escola de comércio.
Você lembra-se do nome do seu primeiro professor?
Lembro-me! Foi um tio meu, Alcides, irmão do meu pai, pai do Teodoro da dupla Teodoro e Sampaio! Era uma classe mista, onde estudavam alunos do primeiro, segundo, terceiro e quarto anos, todos na mesma sala. Não foi em Tomazina! Foi em Sertão de Cima, era um povoado, ficava a seis léguas de Itararé. Nós moramos em várias cidades do Paraná, o meu pai era telegrafista substituto antes de dedicar-se a agricultura. Ele trabalhou na Estrada de Ferro Sorocabana. Pelo fato de ser telegrafista substituto ele ficava três meses em uma localidade, seis meses em outra. Eu tinha de sete para oito anos.
Você ia ver seu pai trabalhar como telegrafista?
Ia! Meu pai tentou me ensinar o código Morse, Ele trabalhava muito bem com o telegrafo, eu não me adaptei.
Você então é primo do Teodoro da dupla Teodoro e Sampaio?
Sou primo do Teodoro (Aldair Teodoro da Silva) tanto que meu nome é composto pelo sobrenome Teodoro. Às vezes tenho contato com ele. Ele fazia o terceiro ou quarto ano do grupo escolar eu fazia o primeiro, isso em Sertão de Cima. Estudamos na mesma sala de aula. Lá estudei só o primeiro ano, em seguida fomos morar em outro patrimônio: Euzébio de Oliveira, no fim do ramal da Sorocabana. Nessa época meu pai era feitor de uma turma que dava manutenção na estrada de ferro. Meu pai trabalhou por dois anos lá, onde fiz meu segundo ano escolar, a professora chamava-se Dona Inês Marques Leal. De lá fomo morar em Arapoti onde fiz o terceiro ano primário. De Arapoti fomos para Tomazina onde estudei o quarto ano primário, o professor era Seu Manoel de Almeida, um excelente professor. Ele também dava aula de matemática para o primeiro e segundo ano de ginásio. Tenho muita saudade dele. Ele cobrava muito dos alunos, mas a classe sabia muito também.
Isso era no tempo em que o aluno ficava em pé assim que o professor entrava na sala de aula?
Exatamente! E só sentávamos depois que ele mandava.
Quanto tempo seu pai permaneceu na atividade rural?
Acredito que tenha sido por uns dois anos.
Por que seu pai escolheu Piracicaba para vir morar?
Meu pai já conhecia Piracicaba. Ele tinha pessoas da família que moravam em Piracicaba, seus pais viveram e faleceram aqui.
Em que local vocês vieram morar quando vieram do Paraná para Piracicaba?
Fomos morar no Rancho Alegre. Na casa da Dona Joaninha, casada com o Seu Luiz Acs, o húngaro. Essa história foi muito interessante, viemos para cá com o nome e a roupa do corpo! Conseguimos alugar uma casa de dois cômodos nas dependências do Rancho Alegre, que era uma chácara enorme. Conheci a filha deles a Magali, esposa do Zezo, que até hoje moram ali, em frente onde foi o Rancho Alegre, em uma casa de esquina que eles construíram. Morei 10 anos ali. A minha mãe ajudava Dona Joaninha e Seu Luiz, eles trabalhavam com festas.
Que tipos de festas eram realizadas no Rancho Alegre?
Eram eventos finos, os casamentos mais chiques da época eram comemorados ali. O Seu Luiz Acs trabalhou como confeiteiro no tradicional restaurante Fasano em São Paulo antes de vir para Piracicaba. Ele gostava de fazer palavras cruzadas que vinham impressas na Gazeta Esportiva. O Rancho Alegre ficava a uns trinta ou quarenta metros de distância dessa casa que a Dona Joaninha alugou para nós. Ela foi até a nossa casa e disse: ”- Estou vendo a família aí, mas não vi chegar caminhão de mudança!”. Ela não sabia que não tínhamos nada. Ela olhou, viu a situação em que estávamos e disse à minha mãe: “-Aparecida, não se preocupe, vamos dar um jeito!”. Não sei se ela era espírita ou tinha muita amizade com pessoas ligadas ao espiritismo, em dois dias tínhamos de tudo dentro de casa! Tinha coisas novas, outras usadas, mas em excelente estado de conservação, Dona Joaninha foi uma santa para nós! É por isso que gosto tanto de Piracicaba! Eu só cresci aqui em Piracicaba! Desde a época em que cheguei.
Qual era o acesso para o Rancho Alegre?
Você descia a rua da Mausa, passava em frente a Mescli, passava a linha da Estrada de Ferro Paulista, entrava na Rua Higienópolis, ali tinha um caminho que cortava, passava a linha da Estrada de Ferro Sorocabana, e entrava no Rancho Alegre. Dava também para seguir pela linha de trem da Sorocabana e sair logo abaixo do Seminário Seráfico São Fidelis, onde tem a praça, próxima ao Teatro Municipal Losso Neto.
Você conheceu o Olho da Nhá Rita?
Conheci. Era a nascente de água. Não existia a Avenida 31 de Março. Lembro-me quando abriram a Avenida 31 de Março, onde o trator passou íamos jogar bola. Cheguei a pegar o trem da Sorocabana para ir jogar bola em Rio das Pedras, cheguei a fazer esse trecho com a Maria Fumaça. Era uma viagem demorada. Parava em todo quanto é lugar.
Nessa época seu pai trabalhava em que atividade?
Ele trabalhava com o engenheiro Alberto Coury. Eles estavam fazendo a fundação do Edifício Bandeirantes, aquele prédio ao lado do então Cine Broadway, na Rua São José entre a Praça José Bonifácio e a Rua Alferes José Caetano quando caiu o Edifício Luiz de Queiroz (Comurba) isso foi em 1964. Meu pai estava na obra quando o Comurba caiu, a distância entre os dois edifícios era de uns 100 metros mais ou menos. Naquela época telefone era uma raridade, mas o Rancho Alegre tinha, e meu pai conseguiu avisar a família que estava tudo bem com ele. A telefonia era tão precária que para pedir um interurbano e falar com alguém em São Paulo levava umas seis horas!
Que idade você tinha?
Eu estava com uns treze anos quando vim do Paraná para Piracicaba. Surgiu uma oportunidade para trabalhar com o meu primo Garcia Netto, que veio da Rádio Piratininga de São Paulo para trabalhar em Piracicaba, ele era gerente da Rádio “A Voz Agrícola”, ele me chamou, entrei como Office boy, ia buscar jornais, revistas, a Dona Joaninha que me levou até o juiz para que me autorizasse a trabalhar, eu não tinha 14 anos ainda. Fomos até o juiz de ônibus. O fórum ficava na Praça José Bonifácio, onde hoje funciona o Banco do Brasil, na esquina da Rua Santo Antonio com a Rua Prudente de Moraes. Naquela época desde que tivesse o diploma do primário o juiz autorizava a trabalhar mesmo que fosse menor de 14 anos. Devo ter essa autorização guardada até hoje. Na rádio pela manhã eu ajudava a Dona Maria Navarro, que era a mulher que cuidava da limpeza, lá pelas nove horas ia até as agências buscar os jornais e revistas.

Era a famosa época do “Gillete Press” recortavam-se as notícias publicadas em jornais, colava numa folha de papel jornal e entregava no estúdio, para o locutor do horário ler com aquele entusiasmo que dava a impressão de que o fato estava acontecendo naquele exato momento e na presença do repórter. As revistas da época eram a Fatos e Fotos, Cruzeiro, Manchete, Intervalo. Horóscopo de Omar Cardoso (Homar Henrique Nunes mais conhecido por Omar Cardoso). Trazia tudo para a rádio.  O Celso Ribeiro fazia o horário da uma hora da tarde às sete horas da noite. Ele disse-me: “-João, vem cá, você vai trabalhar na mesa!”. Fiquei lá uns quinze ou vinte dias. Fui pegando o jeito. Trabalhava com picape, era muito mais difícil de trabalhar. Gravador Akai. Para que o som não ficasse muito ruim, cortava-se a fita original e emendava-se com durex.

Tinha que ser meio mágico?

Tinha que gostar muito. Se passasse de um gravador para outro, o original já era ruim! O outro você nem entendia então. Na época futebol utilizava a linha física, se tivesse uma chuva forte no meio do caminho acabava a transmissão.

Pode-se dizer que Celso Ribeiro é o seu padrinho?

Foi o Celso quem me ensinou. Isso foi no final de 1964, começo de 1965.

Você conheceu figuras históricas nesse período todo que vem trabalhando com rádio?

No começo de 1965, eu já sabia trabalhar na mesa. O Garcia Neto ia para São Paulo, para a Rede Piratininga. Ia ser comentarista esportivo da Rede Piratininga junto com Wilson Brasil. Quem assumiu a Rádio “A Voz Agrícola” em Piracicaba foi Pantaleão Pirillo Júnior. O Celso de Moura ia sair de férias, o Pirillo Junior pediu para que eu cobrisse as férias dele. Até então eu não tinha carteira de trabalho assinada. Ele disse-me que iria providenciar minha carteira e eu iria trabalhar na rádio. Na época eu trabalhava com Garcia Neto que era comentarista, Ary Pedroso, que era o primeiro narrador, Jamil Netto que narrava basquete, vi absurdos acontecer no basquete, vi cesta contra, a parte técnica sempre acompanhava o locutor.

João, alguma vez você viu algum locutor narrando uma partida sem ver o jogo?

Já! Ouvindo outra rádio e transmitindo como se estivesse no local! Já vi locutor deixar de narrar um gol porque não viu.

Em que rádios você já trabalhou?

Na “Voz Agrícola”, que mudou de nome diversas vezes, lá eu trabalhei 25 anos. E depois trabalhei na Rádio Educadora. E desde 1999 eu trabalho também na Rádio Educativa.

João de Oliveira, você é um operador, um sonoplasta, que qualquer locutor sente muita segurança para trabalhar com você, qual é o segredo?

Os bons técnicos que eu conheci foram aqueles que nunca tiveram a ambição de ser locutor. É muito comum o técnico usar a mesa como um trampolim para a locução.

Uma grande parte do sucesso de um programa de rádio está na qualidade e profissionalismo do técnico?

Acredito que depende de ambos: operador e locutor, ambos tem que falarem a mesma linguagem. Um tem que olhar para o outro e conhecer. Trabalhando juntos se entendem pelo olhar.

O técnico sabe quando o locutor terá sucesso ou não?

Sabe! Alguns têm muita vontade, mas não tem futuro.

Com sua experiência, quais qualidades você acredita ser importante para um locutor ter sucesso?

A humildade é indispensável. Ler muito. Estar muito bem informado sempre. Isso dará um campo enorme para ele trabalhar. Fazer o rádio para os ouvintes e não para ele. A meu ver esse é o pecado maior do radialista, querer fazer o programa para ele. Quem tem que achar que o programa está bom é o ouvinte. O operador é a mesma coisa, não vou deixar de colocar uma música porque não gosto, não estou fazendo o programa para mim.

Houve uma grande evolução na parte técnica, no momento você está administrando quatro monitores, além de todo complexo de chaves e botões, isso requer uma qualificação muito especializada?

No inicio o técnico aprende o principal. A medida que vai evoluindo ganhará mais segurança para ir desenvolvendo seu aprendizado. Não dá para queimar etapas!

Você é o braço direito e esquerdo de uma figura muito importante do rádio piracicabano: Titio Luiz.  Como é trabalhar com um mito?

Damo-nos muito bem Com Titio Luiz trabalho já há 15 anos, temos uma excelente relação, ao entrarmos no estúdio já o fazemos de forma muito alegre, brincamos muito um com o outro, para descontrair um pouco. São três horas de programa ao vivo., diariamente. Titio Luiz não tem nada redigido, é tudo de improviso. É uma característica que poucos têm. Sempre dizemos que o locutor de AM é capaz de fazer o FM. O locutor de FM não faz o AM. Não é culpa dele, é o sistema em que ele trabalha.

Essa mudança que está havendo de tudo passar para FM, você acha que é bom para o rádio?

O radio em AM irá ganhar em qualidade. Poderá perder em alcance, se for ver que a internet permite com que seja sintonizada no mundo todo, então não perderá seu alcance. No receptor comum irá diminuir seu alcance. Creio que será mantida a rádio em AM. São dois segmentos diferentes com a mesma qualidade.

Você chegou a trabalhar com Nadir Roberto?

Trabalhei! Era fantástico! Era um grande companheiro, um grande vendedor, excelente profissional, eu trabalhei bastante tempo com Nadir. Tenho muita saudade dele. Com Marcio Terra trabalhei bastante tempo fazendo esporte, no olhar um para o outro eu já sabia o que ele queria. Ele também já sabia o que eu estava fazendo. Fiz esporte com Mario Luiz também. É mais agitado. É um ótimo narrador, ele fica preocupado às vezes com a transmissão. Quem está em casa não tem a menor idéia dos problemas que enfrentamos com linha de som. Temos que ir bem cedo para o estádio para deixar tudo em ordem. Com o Mário Luiz eu sempre consegui fazer uma excelente transmissão. Deixava tudo pronto, testadinho, dizia: “_Mário, pode vir !”.

João em sua trajetória, já aconteceu de estar o microfone aberto e a pessoa falar aquilo que não deseja que o ouvinte escute?

Isso acontece sempre! Para nossa sorte e também pelo próprio ambiente, o que vai para o ar geralmente é conversa sem nenhuma importância ou que cause impacto ao ouvinte.

Por muito tempo trabalhei com o Rubens Lemaire de Morais que cobria a polícia. Ele transmitia do carro, naquele tempo tinha muito ruído, dependendo do lugar não funcionava. Trabalhei com Roberto Cabrini, na rádio “A Voz Agrícola de Piracicaba” no tempo em que o Caldeira comandava a rádio. O Cabrini dizia: “- João eu vou para casa agora, qualquer noticia que chegue, seja a hora que for eu venho para a rádio.” Cabrini sempre teve o jornalismo no sangue. Era magrinho e alto. O Francisco Silva Caldeira trabalhou muito tempo como gerente da Rádio Difusora, foi trabalhar como diretor comercial da rádio “A Voz Agrícola”, era uma rádio bem mais simples e tinha certa dificuldade para vender publicidade. Situava-se na Rua Moraes Barros, 1191. O telefone da rádio era 27491. Era 590 Khertz, uma freqüência fantástica. Não sofria pressão de nenhuma outra rádio de São Paulo, ela pegava com 250 watts onde outra rádio precisava de 500 ou 1.000 para ir ao ar. Quem trouxe a radio para o meio do dial foi o Caldeira.

Isso foi em um tempo em que a audiência do rádio era muito grande?

Sem dúvida! Mesmo porque a transmissão da televisão era um desastre! Imagem ruim, em preto e branco. Saía fora do ar.

A internet ajudou ou atrapalhou o rádio?

Acho que ajudou. Se souber usar é uma das melhores ferramentas disponíveis. Para você fazer um programa de duas horas de jornalismo, é só selecionar o material que está a sua disposição. Coloca em uma pasta só para você, na hora em que abrir o programa é só abrir a pasta. Você não tem a menor dificuldade do mundo.

João você é casado?

Sou casado desde 1973 com Maria de Fátima Teles de Oliveira, nos casamos na igreja velha de São Judas Tadeu. Quando me casei o piso da igreja era terra. Eles estavam construindo a igreja nova por fora. A igreja velha estava dentro. O vestido de noiva da minha mulher ficou uma beleza! O véu arrastando na terra vermelha! Temos um sobrinho que é praticamente nosso filho, Rodrigo Teles, trabalha em rádio também.

Você tem algum hobby?

Gosto de futebol, sou corintiano, joguei futebol por alguns tempos, a turma do Rancho Alegre me conhecia pelo apelido, acho que poucas pessoas que moraram lá me conhece pelo nome.

Qual era o seu apelido, João?

Ratinho! Naquela época eu era pequeno. Desenvolvi-me bastante depois de fazer o Tiro de Guerra, que na época já estava na Avenida Dr. Paulo de Moraes. Eu era da turma do Sargento Guatura. Era muito enérgico, mas estava sempre de bom humor. Eu fazia o Tiro de Guerra das cinco às sete horas da manhã.

Você conheceu inúmeras personalidades trabalhando em rádio?

Principalmente cantores. O cantor Daniel, o próprio Nelson Gonçalves, Perla, Altemar Dutra, Nelson Ned, Cezar e Paulinho, João Mineiro e Marciano, Moacyr Franco, Milionário, Teodoro e Sampaio. Os principais nomes passaram pelo rádio. Além do talento esse pessoal lutou muito para vencer. Conheci a maioria dos políticos de renome que vieram a Piracicaba.

Pode-se dizer que hoje o sonoplasta recebe a programação praticamente pronta, com isso seu poder de decisão fica bem limitado?

Antes ficávamos bem mais a vontade.

João se você não trabalhasse em rádio em qual outra área você gostaria de trabalhar?

Bom, eu só fiz isso! Rádio para mim está no sangue! Mas antes de fazer rádio eu pensava em ser engenheiro. Sempre tive muita facilidade com ciências exatas. 

Atualmente você é o técnico de som, ou sonoplasta, com mais tempo de trabalho e que continua trabalhando?


Acho que sou! No dia 4 de abril vou completar 51 anos de trabalho em técnica de som. 

JACOB DAS ARTES

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 4 de abril de 2015.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: JACOB PIRES DE TOLEDO


                                (JACOB DAS ARTES)



Jacob Pires de Toledo, mais conhecido como Jacob das Artes, nascido a 23 de junho de 1977 em Piracicaba, é filho de Jonas de Toledo e Iraci da Conceição Pires de Toledo, seu pai era pedreiro, até falecer ele trabalhou muito tempo na Esalq. Seu avô Jacob Gil de Oliveira foi funcionário do Engenho Central até o mesmo encerrar as atividades. No inicio sua mãe trabalhou em casas de família, depois passou a trabalhar apenas em sua casa. Jacob tem dois irmãos: Eliane e Claudio. Casado com Eliana Correr, com quem tem um filho, Marchello.
Em que escola você estudou?
Até os 16 anos morei no Jardim Caxambu, estudei no APAF- Escola Estadual "Dr. Antonio Pinto de Almeida Ferraz", lá fiz desde o pré-escola até a oitava série. Depois mudei para o Tatuapé, no Jardim Itapuã, estudei na Escola Estadual Professor Jethro Vaz de Toledo onde fiz o primeiro e segundo colegial, depois fui estudar na Escola Estadual Sud Mennucci.
Nessa época você já trabalhava?
Trabalhava em loja de decoração. Aos finais de semana ajudava meu pai a construir nossa casa. Meu primeiro trabalho foi em um sítio, sempre gostei de animais, ajudava a tratar dos cavalos. Esse sítio era localizado entre o Parque Primeiro de Maio e o Jardim Caxambu. Era onde terminava a cidade. O proprietário explorava a venda de leite.
Como a arte entrou na sua vida?
Eu sempre vivia na beira do Rio Piracicaba, meu pai tinha bote, pescava. Ele mesmo tinha feito um bote de madeira, semelhante aos de alumínio. Lembro-me que ele fez uma impermeabilização muito bem feita. Ele e meu tio desceram o rio até Ártemis, levaram umas duas horas no percurso, sem motor. Em uma área deserta, a beira do rio, ele fez um ranchinho de madeira e deixou o barco lá. Ele ia até Ártemis de ônibus, eu o acompanhava, descíamos do ônibus e íamos a pé. Passávamos ali o final de semana. Nunca tive muitos brinquedos industrializados. Tinha que fabricar meu próprio brinquedo. Pegava as ferramentas do meu avô, fabricava coisas. Fiz muitos carrinhos para correr na rua. Não gostava de carrinho de rolemã porque fazia muito barulho. Pegava na época o que era chamado de Velotrol, geralmente a roda dianteira estava danificada enquanto as rodas traseiras estavam boas, eu as usava para fazer meus carrinhos. Minha diversão era subir até a esquina e descer a rua com esses carrinhos. Com isso fui desenvolvendo o espírito de criar.
Atualmente você está com um veículo que originalmente é uma Kombi, só que totalmente personalizada, inclusive com quatro rodas na parte traseira. Acho que nem a Volkswagen sabe que existe isso!
Adquiri essa Kombi para poder fazer as coletas, não só por ser uma Kombi, um veiculo que muita gente gosta, quando a adquiri há uns seis ou sete anos, não existia essa febre pela Kombi. Eu a adquiri pela sua mecânica simples, facilitava meu trabalho com meu artesanato. Até então eu estava em um segmento mais comercial, que era fazer móveis, eu fabrico móveis artesanais. A Kombi foi muito útil nessa época.  Depois, para poder chamar a atenção, fazer as pessoas olharem para os meus móveis, meu trabalho de arte, pintei a Kombi toda.






A sua Kombi é uma ferramenta de marketing?
È uma ferramenta de marketing! Toda essa logística para que eu possa sobreviver da arte, eu não tenho a segurança de um salário, não sou funcionário de uma empresa, tenho que sobreviver dos meus meios. A Kombi é um atrativo, as pessoas vêm junto à perua para serem fotografadas junto a ela, é uma forma de estabelecer um contato.
Foi você mesmo que desenvolveu e realizou as mudanças feitas nela?
Na realidade é uma coisa simples. Ela estava com o chassi comprometido, o ano de fabricação dela é de 1969, um veículo com mais de quarenta anos! Eu não conseguia soldar com o equipamento que eu tenho uma máquina de solda elétrica comum. Tirei toda a lataria, isso eu mesmo que fiz, deixei só a estrutura dela. Sem a lataria eu tinha acesso ao chassi. A parte de baixo é o chassi original, coloquei um reforço em cima,  outra chapa que ajuda, ela liga onde vai a suspensão dianteira até passar a suspensão traseira. Foi feito um reforço sobre o chassi. A ferragem eu adquiri onde vende material reciclado.
E a história da Kombi “trucada”, ou seja, com quatro rodas na parte traseira?
A questão do “truck” nada mais é do que quatro parafusos, soldados no final do chassi, nesses parafusos, posicionados de forma correta, eu encaixo o estepe. Ela não tem estepe no local original, que era atrás do banco dianteiro. É interessante porque desperta a imaginação de quem olha: será que essas rodas traseiras rodam? Elas abaixam? Elas são fixas, eu poderia fazer com que movimentassem, mas não teriam utilidade para mim. Na realidade são dois estepes, que estimulam a imaginação de quem olha. Abaixa? Não abaixa? Ela é útil para mim assim.
É movida a álcool ou a gasolina?
Funciona com gasolina.
Como a fiscalização vê essa Kombi tão diferente da original?
Tive que fazer algumas alterações na sua documentação, uma delas é a cor, ela não tem uma cor definida. Consta como “Fantasia”. Gosto muito de viajar com ela, atravessei São Paulo, marginal Tietê, já percorri o litoral paulista até a divisa do estado com ela, fui até Paraty, até Carrancas, Minas Gerais. Viajei pelo sul de Minas com ela.
Apesar de serem decorativas as rodas traseiras pagam pedágio?
Quando não existiam quatro rodas na traseira, era cobrado o pedágio normal. Por praticidade já peço que a pessoa da cabine de pedágio arrecade por três eixos, evita a dúvida, perda de tempo, elimina qualquer questionamento.
Bem na frente, logo acima do para brisas, você colocou o nome Jesus. Alguma razão especial?
Eu sou cristão, acredito que Cristo veio para ensinar a seguir a bíblia, procuro viver a minha vida em cima dos mandamentos que Ele deixou, o principal é “Amar ao seu próximo como a ti mesmo”.
Você fez uma decoração muito interessante em um estabelecimento situado na Rua do Rosário esquina com a Rua Monsenhor Francisco Rosa?
É um restaurante, chama-se “Porto do Norte”, um dos sócios é dono de outro restaurante situado na badalada Avenida Carlos Botelho, o “Manga Rosa”. Tenho obras de decoração interna em diversos estabelecimentos comerciais na área central de Piracicaba.
Como você foi descoberto?
Comecei a espalhar a minha arte, a fazer algumas exposições, eu tinha uma banquinha na Praça da Boyes, permaneci ali por dois anos.









Você tem obras de sua autoria que estão fora de Piracicaba?
Nessas minhas viagens sempre acabo realizando algum tipo de negociação com o meu artesanato. Gosto muito de Ubatuba, tenho muitos trabalhos realizados lá. Uma prima levou uns trabalhos meus para a Espanha, portugueses, canadenses, já adquiriram trabalhos meus em Ilhabela. Atualmente tudo que faço é para poder viajar com a minha esposa, com meu filho. Sinto que a cada dia as pessoas distanciam mais das suas raízes.
Você pensa em conhecer locais fora do país?
Eu gostaria de conhecer alguns lugares dentro do meu país: Amazônia, algumas aldeias indígenas. Sou voltado a essa questão indígena. Tenho o desejo de conhecer o Nordeste do país, sua cultura. Enriquecer meus conhecimentos através da arte. Sempre que vou a alguma cidade de Minas Gerais, procuro conhecer o que aquela determinada região oferece de cultura.
Com qual material que você mais gosta de trabalhar?
O material que eu mais trabalho é a madeira. Para mim o ideal é a madeira que está em condições de uso e encontra-se jogada em alguma caçamba, ontem mesmo encontrei uma janela de peroba. Estava em uma caçamba de entulho. Às vezes o progresso se dá em prejuízo ao meio ambiente, infelizmente uma madeira nobre pode ter como destino servir como lenha para ser queimada. Se parar para pensar na história dessa madeira, ela não pode ser tratada dessa forma. Uma peroba, para ser cortada passou dezenas de anos se desenvolvendo. É diferente de um eucalipto, um pinus, que são madeiras de crescimento rápido, cujo objetivo é atender ao mercado de imediato. A meu ver, o ser humano está tomando um rumo diferente do que deveria ter, parece estar adormecido.
Você realiza trabalhos em casas particulares?
Já fiz em casas situadas em condomínios. Muitas vezes por mais elevado que seja o padrão de vida de uma família, há aqueles que se sentem atraídos pelo rústico. Basta você ver pessoas que residem em apartamento de alto luxo, quando saem passear muitos procuram a praia mais deserta possível, onde há areia, o mar e a mata. Por maior que seja seu poder aquisitivo, dentro dele sentirá uma atração por um local pouco explorado pelo homem. É o contraste. Tenho feito trabalhos que muitos arquitetos gostam.  Procuro fugir do padrão normal, fazer da minha forma. Não tenho medo de fazer uma ousadia.
Um trabalho de Jacob das Artes é caro?
Não sei afirmar se é caro ou barato. Coloco um valor que acho justo. O mais importante para mim é que o futuro proprietário de uma obra minha tenha gostado da mesma. Posso estipular um valor que não agrade ao interessado, essa obra então não será adquirida. Faço isso de forma consciente. Assim como posso estipular um valor bastante razoável pelo prazer que essa obra despertou na pessoa que a vê.  É uma luta diária dos meus pensamentos como artista conflitando com os pensamentos de uma sociedade capitalista que não mede esforços para conseguir suas metas. Se o rio ficar mais ou menos poluído para ela não importa, às vezes para ela ganhar dinheiro implica em poluir.
Quantas exposições individuais você já realizou?
Acredito que foram em torno de uma dezena.
Você tem comunicação com o público através de meios eletrônicos?
Tenho o meu Facebook “Jacob das Artes”. Acredito que o progresso é necessário, só que penso que o caminho que está sendo tomado provoca poluição, destruição da natureza, esse desrespeito provoca conseqüências graves. Já estamos vivendo uma delas, que é essa escassez de água. O planeta está em desequilíbrio.
É muito comum as pessoas procurarem atingir um objetivo financeiro, após um imenso esforço, conseguem e ai usa boa parte dessa conquista para sanear os problemas que provocou nessa corrida pelo seu objetivo.
É aquela velha teoria! Muitas vezes quando estou conversando com uma pessoa ela diz que encontram em mim coisas boas, que traz paz à elas. Sou muito transparente em tudo que faço. Prefiro assumir algum tipo de prejuízo a provocar prejuízo para alguém. Isso reflete através da emoção, é passada a pessoa com quem tenho algum diálogo. Isso exala para o próximo.
Você lê a bíblia?
Pela manhã, quando acordo,procuro buscar a palavra na bíblia. Ando sempre com a bíblia, ela me dá muitas respostas. É onde você consegue ver a mão de Deus trabalhar.
Jacob, a primeira vista, é difícil imaginá-lo lendo a bíblia!
É interessante, às vezes leio algumas passagens pela manhã e vejo que aquilo se concretizou até o final do dia! Faço sempre essa busca e as respostas chegam!
Como artista quais são as técnicas que você usa em seu trabalho?
Uso qualquer coisa, o que tiver ao alcance da mão. Já fiz esculturas com facão. Trabalho com solda, às vezes crio alguma coisa com solda. Trabalho com cimento, mosaico. Faço esculturas em paredes, com detalhes.
Quanto tempo você leva para fazer um trabalho como o que fez no restaurante Porto do Norte?
Lá foi um trabalho de meses. Pode acontecer de ter que mudar uma porta de lugar. Isso envolve o serviço de um pedreiro. Há diversas alterações internas que são às vezes necessárias para se realizar um trabalho de decoração interna.
O que a sua esposa pensa a respeito da sua arte?
Ela participa ativamente. É muito companheira. Meu filho também, ele está com 15 anos. Ele tem como objetivo estudar teologia.  Esta seguindo outro caminho. A orientação que eu dou-lhe é não entrar nessa vida maluca que muitos levam a busca da satisfação material.
Sob o seu ponto de vista falta a humanidade procurar desfrutar mais da vida?
Acho que falta esse espírito. Falta voltar as suas raízes principalmente com relação a questão alimentar. Hoje a máquina planta a semente na terra, a máquina colhe, a máquina processa o alimento, industrializa e embala. A máquina apita no supermercado, avisa que é seu aquele produto. O ser humano perdeu o contato da semente na palma da mão, a cova no chão, o pé no chão amassando a terra que cobre a semente. Às vezes quem planta faz uma oração junto aquele saco de semente pedindo a Deus que venha a chuva. Pedindo à natureza a proteção a lavoura. Quando é feita a colheita ela é celebrada com uma festa. Atualmente as festas tem o sentido comercial, a origem era as festas de agradecimento. Hoje vem alguém, analisa a terra, determina a deficiência de tal elemento, ele não irá fazer uma oração em benefício àquela terra, através de um processo químico ele irá jogar algum nutriente no solo. Planta-se a qualquer custo. O Brasil é um dos países onde mais se usa agrotóxicos e fertilizantes. Não há um estudo conclusivo sobre o que um alimento transgênico pode causar ao ser humano em longo prazo.  Foi estudado e chegou-se a conclusão de que terá uma produção maior, mas a conseqüência que poderá causar ao homem está muito distante de ser definida. Pode ser que alguns pensem que estou ficando louco, mas basta raciocinar e verá que todos com quem converso me dão razão. Poucos pensam em levar uma vida mais saudável.
Qual é a sua visão dos jovens atualmente?
A juventude está descontente com o mundo que ela tem hoje. A internet, a tecnologia, a medicina, tudo isso é bom. Só que estão tomando um rumo que estão se esquecendo das suas raízes. Você já viu uma árvore ficar em pé sem a sua raiz? Atualmente o ser humano abandonou suas raízes, como irá ficar em pé? Dia 19 de abril será o Dia do Índio. Aqui em Piracicaba você não vê um jornal anunciado: “Hoje é Dia do Índio, haverá uma comemoração na margem do Rio Piracicaba ao povo que deu origem ao nome da cidade!”. Todo dia 19 de abril vou para uma aldeia em Bertioga, onde nesse dia há uma comemoração. É a aldeia Rio Silveiras, fica em uma reserva indígena, formada por índios guaranis. Eles fizeram uma pintura em mim, de um camaleão, eu gostei tanto que mandei fazer uma tatuagem desse desenho.  Essa aldeia fica em uma reserva de terra determinada pela Funai, nessa aldeia, o cacique, Adolfo, líder da Funai no Estado de São Paulo, promove o festival indígena, onde cada ano traz etnias de regiões variadas do Brasil. É feita uma concentração, são realizados rituais, gosto de ficar ali.
Você gostaria de deixar uma mensagem aos leitores?
Penso que o ser humano terá que fazer uma reviravolta na sua forma de vida, o tipo de vida que está sendo levado está longe de ser o modelo ideal Esse modelo não existe pronto, tem que ser construído, um modelo correto de vida. O modelo que está aí irá levar a humanidade a sua própria destruição.
Você acredita que o ser humano morre e tudo acaba?
Não consigo ver um final, acho que uma essência permanece. Sigo o que diz a bíblia: a carne vai, seu espírito permanece, e aqui realmente é uma passagem. O que você fez de bom ou ruim terá um resultado. 

MARGARETE ZENERO

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 14 de março de 2015.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADA: MARGARETE ZENERO 
                     (CASA DO POVOADOR)



Margarete Zenero é a diretora da Casa do Povoador, situada em Piracicaba. Nascida em Piracicaba, a 29 de maio de 1960, filha de Pascoal Zenero e Nilva Tedesco Zenero que tiveram também os filhos Tânia e Paulo.
Você iniciou seus estudos em qual escola?
O pré-primário fiz ainda muito nova, em função dos meus desenhos, estudei com a Terezinha Moraes. Estudei no Instituto Sud Mennucci até a quarta série primária. Depois fui estudar no Colégio Dr. Jorge Coury, uma das minhas professoras foi Clemência Pizzigatti. Como não havia o curso colegial no Jorge Coury, voltei para o Instituto Sud Mennucci. Em seguida fiz um ano de cursinho preparatório no Curso Luiz de Queiroz – CLQ fiz o vestibular e passei a cursar Psicologia na Unimep. Fomos a primeira turma do Campus Taquaral. Em torno da universidade era um deserto, não existia nada. Íamos de ônibus fretado pela faculdade. Era uma área considerada fora da cidade, hoje está inserida no meio da cidade.
Em que ano você formou-se em psicologia?
Foi em 1983.
A arte faz parte da sua vida?
Sempre tive uma ligação forte com a arte. Do lado da família do meu pai há o Rudnei Zenero, engenheiro, que gosta de desenho, tem essa veia artística. O irmão da minha mãe, Norival Tedesco, é um artista reconhecido pelo seu talento e perfeição nas peças que realiza como ourives. Posso afirmar que tenho a influência dos desenhos do Rudnei e a influência da arte, cor, beleza por parte do Norival.
Quando você se deu conta de que podia fazer arte?
Sempre tive uma amizade muito próxima com a Leda Cançado, ela e minha mãe sempre me incentivaram muito. Eu trabalhei na arte com cerâmica por muito tempo. Posso afirmar que em minha vida sempre tive atividades que tinha a arte em paralelo. A arte é uma atividade que pratico para mim.



Você atua na área de psicologia?
Atuo, tenho clinica há mais de 30 anos. Mantenho meu ateliê, onde desenvolvo a minha arte.
Por que geralmente quem trabalha na área de psicologia gosta de fazer poesias?
Porque o psicólogo é sensível! Se não for sensível não entra na alma da outra pessoa. Se não puder entrar na vida da pessoa não poderá fazer nada por ele. A arte tem esse ponto em comum, a sensibilidade.
A psicóloga consegue entrar no universo interior do paciente?
Se ele permitir, sim. Caso ele não permita é uma intromissão.
Atualmente somos um dos países que consome antidepressivos em toneladas. A arte pode ajudar a suprir essa ansiedade?
Tudo que cria: arte culinária, violão, dança, jardinagem, joga seu lixo emocional. A arte não resolve a depressão, mas ajuda muito. Troque seu antidepressivo pela arte. Isso funciona em todas as áreas que envolvem criatividade. A atividade física como correr, dançar, fazer teatro, cantar, tudo isso ajuda e muito.



Qual é a técnica que você mais utiliza?
Comecei trabalhando com pintura a óleo. Ganhei medalhas de ouro, prata, em vários salões, em Piracicaba.  Tornei-me presidente da APAP – Associação Piracicabana dos Artistas Plásticos, foi um período em que tinha pouco tempo para pintar, e a tinta a óleo se deixar aberta ela resseca. A aquarela era mais poética, eu podia deixar montada, quando voltava era só molhar. Assim já faz uns seis anos que estou na aquarela. Com aquarela já ganhei medalha de ouro, prata. Fiz muita cerâmica com a Lúcia Portela, a minha professora ainda é a Denise Storer, que é fantástica, como professora, como amiga, como ser humano. Tive bons anjos da guarda, boas almas do meu lado na arte, se fosse pelo que eu faço para trabalhar, não daria para continuar. 
A área de psicologia a cada dia tem uma demanda maior por profissionais?
A psicologia antigamente não atuava na área jurídica, hoje temos psicólogos dentro da área jurídica, como profissão.
Você atua nessa área?
Não. Eu trabalho com crianças, adolescentes, adultos.



Qual é o fator mais trabalhoso nessa função?
São os pais! Quando você trabalha com crianças, há um fator muito relevante que são os pais. No mundo contemporâneo é difícil julgar. Tem  mãe que é mãe, pai, tem que dar conta de tudo e como ela vai ter tempo?
Os pais procuram compensar suas falhas com concessões em excesso para os filhos?
Acho que a culpa é da falta de tempo, isso faz com que aumentem os limites, tenham algumas tolerâncias, por compreenderem não estabelecem regras e aí se perdem. Nesse sentido acho que os pais estão fazendo o que podem. Talvez precisássemos de uma política em que as mães pudessem ficar mais com seus filhos.
O pai ficar mais tempo com os filhos é mais difícil do que a mãe?
Se você pensar que hoje não é necessariamente o homem o provedor, acho que as coisas funcionam para ambos.
Em especial o homem latino não se preza muito a essa função?
Eu não concordo com o Dia da Mulher, trocaria por Direito da Mulher. Quero direitos iguais. Eu trabalho igual a um homem mereço ganhar igual a ele. A mulher tem conquistado seu espaço, há mulheres dirigindo ônibus, exercendo uma série de atividades até então realizadas exclusivamente pelo homem.
Arte e psicologia têm um elo?
Têm! Através da arte consigo trabalhar a parte psicológica, principalmente com a criança. A criança não tem a elaboração do adulto às vezes através de um desenho você vê o que ela está sentindo. Quando você trabalha com a arte, você trabalha com a sua sensibilidade. Já fui júri, quando você analisa uma obra, você analisa o que está por trás daquelas cores, daqueles traços, o que foi transmitido. Na arte muitas vezes o desenho que é feito, a cor que é colocada, a posição em que é posta, não no sentido da beleza, mas no sentido do sentimento, a arte ajuda muito você conseguir ver a outra pessoa.



Como psicóloga qual é a sua opinião sobre o controle da natalidade?
Lamentavelmente há um percentual relativamente alto de mulheres que desejam ter um filho para criar vínculos, não só afetivos, mas principalmente financeiros. Algumas não se limitam a um único relacionamento com esse objetivo, tem filhos de vários pais, é uma fonte de renda! Percebo também que temos que trabalhar mais a dignidade. Porque uma mãe tem que trabalhar tanto e não pode criar seu filho? Acho fantástico que ninguém fique com fome porque se alimentou na escola, mas acho terrível não ter a autonomia de colocar a sua comida na mesa sem ter que ter bolsa família, bolsa isso, bolsa aquilo. Aumente o salário! Dá dignidade ao ser humano! Dá realização do que ele faz! Dá valor para ele! Sou mais da linha do Presidente Fernando Henrique Cardoso, que dá a vara e não o peixe pronto. Não acho que seja dado muito, quero deixar claro que a filosofia deveria ser a favor do ser humano. Enquanto indivíduo capaz, de uma profissão digna. Um salário digno. Se der uma bolsa família controlo o povo em cima daquilo que eu dou. Eu não sou a favor disso. Independente de partido político. Sou a favor de vamos pagar muito bem, porque você trabalha, tem uma família. Vamos fazer redução de horário para quem fica com as crianças, a família necessita disso. Quantos países têm onde a mãe fica cinco anos sem trabalhar porque olha os filhos até eles terem uma independência. Eu amo a vida. Tenho um filho de 21 anos, o Caio.
Mudando o foco do assunto, estamos no interior da Casa do Povoador, afinal o que foi essa edificação?
Para mim a Casa do Povoador é cheia de luz. A primeira exposição que fiz foi nessa casa. O primeiro “não”, “você não é artista”, recebi nesta casa, foi quando vim com uns painéis de mosaico, me disseram que era muito bonito, mas que não era arte. Fiquei muito brava, fui ver o que era arte!  Então para mim esta casa sempre foi um lugar de luz, um lugar de arte, de artista. Para mim a Casa do Povoador é o meu segundo coração. É aonde os artistas podem mostrar quem eles são. Temos aqui os bonecos do Elias, que é o guardião do nosso Rio Piracicaba. Temos a Rute o Laudir que defendem essa casa com a raiz deles. Vejo na Casa do Povoador o ponto de partida da cidade. Ponto de partida do amor, da arte. De dentro da Casa ouvimos o cantar das águas do Rio Piracicaba.
Essa é a sua visão de artista, e a sua visão histórica dela?
Já escutamos as mais diversas versões. Já escutamos que foi Casa de Sal, outras versões diziam que era um ponto de travessia do Rio Piracicaba. A única certeza que temos é de que hoje ela é comunitária. (Acredita-se que a construção do que é hoje conhecida como Casa do Povoador tenha sido feita entre 1850 e 1860. Terá sido a Casa do Povoador residência da família do Capitão Antonio Corrêa Barbosa? É a polêmica que existe entre os historiadores).


Você tem idéia do número de pessoas que visitam a Casa do Povoador?
Passam de 800 a 1600 pessoas.
Qual é a reação das pessoas que visitam a Casa?
Tenho a sensação de que eles acham que a casa é deles. Entram com a maior intimidade, sentem-se em casa, perguntam, às vezes temos que por certos limites, porque a Casa tem regras.
Há quanto tempo você é diretora da Casa do Povoador?
Faz um ano e meio, entrei em setembro de 2014. Realizamos uma exposição por mês.
Qual é o critério para convidar o artista?
Procuramos o coletâneo, dar oportunidade a todos. Algumas são com datas fixas, como as do Fórum, trazemos obras de advogados, assim como alguns funcionários. Sempre convidam um artista como a Carminha do origami, a Carmela Pereira do naif, 
Como surgiu a exposição da caixinha de fósforo?
Começou assim: olhei na internet, vi o trabalho que Oswaldo Pullen, de Brasília, estava fazendo, pensei: “Isso dá uma exposição!”.  Entrei em contato, articulei, tanto que o primeiro cartaz que nós fizemos tem a fotografia dele. Ai veio a G1, pessoal de fora do país, gente de quase todo o Brasil participou o ano passado. Neste ano teremos a 2º Exposição Nacional “Arte Sobre Caixa De Fósforos” coma curadoria de Odfair Jorge Demarchi e Margarete Zenero. A abertura será dia 20 de março de 2015, sexta-feira, às 20 horas, visitação de 21 de março a 26 de abril de 2015, de segunda a sexta-feira das 08 horas às 17:00 horas sábados, domingos e feriados das 8:00 horas às 18:00 horas. Na Casa do Povoador- Galeria “Alberto Thomazi”. Este ano há uma diversidade muito grande. No ano passado tivemos 86 inscrições, este ano são 141 inscritos. Cada inscrito pode participar com até cinco peças. Temos tido muito apoio como da Prefeitura Municipal, da Ação Cultural, Unimed, Grupo Bom Jesus, Simespi,Drogal, Acipi, essa participação valoriza o evento.
Quais são as técnicas utilizadas nessas caixinhas de fósforos?
Temos entalhe em madeira, mosaico, aquarela, acrílica, óleo, patchwork (trabalho com retalho), origami, fuxico. Tem peças incríveis.
Esses trabalhos são enviados de quais localidades?
Recebemos trabalhos de artistas do Rio de Janeiro, Califórnia (Estados Unidos), Curitiba, Itanhaém, São Paulo, Rio Grande do Sul, Bahia.
Tem premiação?
Daremos um certificado de participação.
Há alguma exposição similar a esta no Brasil?
Teve uma em Campinas, inclusive eu participei, com Álvaro, Robson, Paulo Branco, só que é com caixas de qualquer tamanho. Era um trabalho de auto-imagem, você colocava uma imagem sua dentro da caixa, foi feito dentro da Estação Cultural em Campinas, no interior de um vagão de trem. Ficou muito lindo, parece que vão repetir.
Piracicaba é uma cidade rica em artistas?
A meu ver é a melhor do país! Se eu pensar em criação penso em Nordeste. Se pensar em organização, penso no Sul. Dependendo do ângulo em que vejo a arte posso dizer que determinada região é melhor.
Qual é a relação do cidadão piracicabano comum, com relação a arte?
Eu tenho a sensação que em Piracicaba todo mundo tem uma “veiazinha” artística! Temos artistas fantásticos, que com recicláveis fazem arte fantástica!
Na área externa a Casa do Povoador existe uma arena, ali também são realizados eventos?
Fizemos toda festa do XV, da camiseta, a Festa do Divino foi feita lá, temos feito oficinas de origami. Recentemente fizemos uma manifestação do humor que não provoque o ódio e sim o riso, no ano passado tivemos bandas tocando o ano inteiro. São realizadas na arena apresentações de teatro por grupos da cidade. A Casa do Povoador é um dos pólos de irradiação de arte em Piracicaba. Tivemos o lançamento de dois livros aqui dos autores Irineu Volpato e outro de Nelson Rodrigues. 
Margarete, você como diretora da Casa do Povoador tem alguma mensagem ao leitor?

Convido a todos para que venham para a Casa do Povoador, é isso que nos estimula. 

ALCIDES BARBIERI


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 21 fevereiro de 2015.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO:  ALCIDES BARBIERI


Do alto dos seus 87 anos, Alcides Barbieri impressiona pela sua disposição.  Tem uma grande paixão: a música. Com voz possante e afinada, relembra e canta sucessos dos mais afamados cantores e compositores. Com um memória prodigiosa, não erra na letra nem tropeça no tom. Canta com a alma. Ainda se apresenta em shows que são realizados no Lar dos Velhinhos de Piracicaba, onde faz muito sucesso com suas músicas e interpretações.
Alcides Barbieri é filho de Antonio Barbieri e Maria Bossi, nem sempre a esposa assinava o nome do marido, era um habito difundido por alguns responsáveis pelo registro do casamento. A 26 de junho de 1927, Alcides nasceu na Vila Rezende, na primeira casa que existia logo no inicio da Avenida Rui Barbosa, á direita. Essa casa foi demolida recentemente com a construção de mais uma ponte sobre o Rio Piracicaba. Os pais de Alcides tiveram quatro filhos: Fioravante, Ernesto, Alcides e Martinho.
Os pais do senhor casaram-se em que localidade?
Eles casaram-se em um bairro próximo a Artemis que na época era conhecido como Porto João Alfredo. De lá vieram morar em Santa Terezinha, que naquele tempo era chamada de Corumbataí. Depois é que mudaram o nome para Santa Terezinha. De lá mudaram para o bairro Piracicamirim. Mais tarde mudou-se para a Vila Rezende. Meus pais e os pais do meu pai, meus tios, todos moravam em uma mesma residência.
Qual era a atividade profissional deles?
Meu pai era lavrador, passou a trabalhar no Engenho Central, onde se aposentou. Exercia a função que era denominada de feitor, tomava conta de uma turma de trabalhadores.
A linha de trem da Estrada de Ferro Sorocabana passava nos fundos da casa onde o senhor nasceu?
Passava! Quando nós mudamos dessa casa eu era uma criança muito pequena ainda. Mas, da linha da Estrada de Ferro Sorocabana lembro-me muito bem.  Quantas vezes eu embarquei nela. Ia até o bairro Recreio. Quando tinha uma festa em Santa Terezinha, festa da igreja tomava o trem na Vila Rezende, na Estação Barão de Rezende e ia até o Corumbataí. Essa estação ficava próxima aonde funciona hoje um posto de gasolina, no final da Avenida Rui Barbosa. Nessa época morávamos mais abaixo, próximo onde é atualmente o Bairro Nhô Quim que na época não existia ainda. Ali era um brejo. Mudamos para lá, foi onde me criei, onde é a Escola Estadual Monsenhor Jeronymo Gallo era tudo pasto, quanto coelho do mato existia ali! No ano de 1950 mudamos para uma casa que construimos na Avenida Dona Francisca. Na época a rua era de terra.
Onde ficava a Estação Montana?
Pertencia ao Corumbatai, era para cá do Rio Corumbatai. Eu descia do trem ali quando ia à Corumbatai (Hoje Santa Terezinha). Dali ia a pé. Nós brincávamos que a Estação Montana era grande, tinha muito movimento, tem a estação e um pé de mamona na frente!
Tem uuma história, que alguns dizem ser lenda, de que um maquinista morava junto a linha do trem e desceu do trem em movimento sofrendo grave acidente. O senhor ouviu falar a respeito?
Lembro-me desse caso. Aconteceu na linha da Sorocabana. Nós os conheciamos por Zé Magro. Ao que consta a esposa dele estava gravida, ele foi pular, ele deixou o ajudante, foi pular e sofreu um acidente grave. Ele morava um pouco antes da Estação Barão de Serra Negra. Isso foi a noite. Conheci o Valler, que tinha armazém e máquina de beneficiar arroz. O pai dele chamava-se Angelo Valler. Ali na linha do trem do Engenho Central, antes de chegar na Estação de trem da Sorocabana, ele cortava a Avenida Rui Barbosa, a gazolina era tranpostarda em tambores, em um caminhão, ele foi atravessar ali e bateu na máquina do trem do Engenho Central. Pegou fogo. De onde eu morava escutava o barulho da explosão dos tambores de gasolina. O maquinista tentou salvar a locomotiva, perdeu a vida, o nome dele era Vicente Capaldi. Hoje na saída para Limeira tem um viaduto com esse nome.
O engenho tinha locomotivas próprias para trazer a cana-de-açucar para moer no Engenho Central?
Tinha vários trens, eles puxavam cana das fazendas Santa Rosa, São José, Capim Fino, eles usavam a linha da Sorocabana também, que era da mesma bitola, tinham fornecedores de cana proximos ao Porto João Alfredo, Santa Olímpia.
O senhor lembra-se do bonde?
Lembro-me, o ponto final dele era na Estação Barão de Rezende, que nós chamávamos de Sorocabana. A Avenida Rui Barbosa era de terra ainda, pedregulhada. O bonde percorria a Avenida Rui Barbosa nos dois sentidos, assim como o trânsito. O pessoal de sítio passava por ali, com cavalo, carrinho de tração animal. Tinha um carrinho, com um tanque de água que molhava a Avenida Rui Barbosa, para não levantar poeira. Era da Prefeitura.  Lá no bairro São Luiz, que tem a Capela São Luiz, ali nós chamávamos de Bimboca. Tinha um senhor que era funcionário da prefeitura, ele pegava água, com um tanque pequeno sobre uma carroça, para distribuir água. Não tinha luz, não tinha água encanada. Essa água era para beber ou usar em alimentos. A maioria das mulheres trazia as roupas para ser lavada na beira do Rio Piracicaba.
Seus primeiros estudos foram feitos em que escola?
Estudei até o quarto ano primário no Grupo José Romão. Minha primeira professora foi Dona Carmem. O professor do quarto ano era o marido da Dona Carmem, Seu Jarbas de Oliveira Joas. Entrei no grupo escolar em 1935 e sai em 1939.
O pai do senhor nessa época exercia qual atividade?
Ele já trabalhava no Engenho Central,
O senhor começou a trabalhar com quantos anos?
Aos doze anos conclui o grupo escolar. Já arrumaram um serviçinho para mim, tinha uma fábrica de vassouras, na Avenida Rui Barbosa, de propriedade de Giovanni (Joane) Ferrazzo, fabricava as vassouras marca “Elefante”. Quando ele mudou a fábrica para o bairro da Paulista é que passaram as ser vassouras da marca “Canta Galo”.
Em que local da Avenida Rui Barbosa ficava a Fábrica de Vassouras “Elefante”?
A fábrica ficava no lado direito de que ia no sentido centro bairro, ficava após o local onde mais tarde foi a Fábrica Tatuzinho. O Joane morava na casa situada na frente, e nos fundos tinha um barracãozinho, com uma entrada pela lateral da casa. A palha utilizada para fazer vassoura ele adquiria na Argentina.
O senhor fazia o que na fábrica?
Comecei como ajudante, pegar o material para o vassoureiro. No fim aprendia fazer a vassoura, fazia umas cem vassouras por dia, era um moleque ainda.
A vassoura era costurada com arame ou barbante?
Fazíamos a vassoura no arame, em uma máquina. Depois vinha o trabalho do costurador. Vassoura cinco fios. Vassoura de veludo, de latinha, de cinco fios.
Como era uma vassoura de veludo?
A vassoura de veludo, na cabecinha dela era enrolado um paninho de veludo! Só que era uma vassoura maios do que as outras. Era mais luxuosa. Havia uma prensa, onde a palha era prensada, o costurador fazia tudo na mão. Depois co o temo adquiriram uma máquina elétrica. Era uma máquina americana. Permaneci trabalhando nessa fábrica até completar dezoito anos. Com dezessete anos e meio eu fiz o Tiro de Guerra.
Onde ficava o Tiro de Guerra?
Era na Rua do Rosário, onde hoje me parece que é a Escola Industrial. O prédio onde era o quartel do Tiro de Guerra está lá ainda. Após seis meses, tivemos que sair de lá, o Tiro de Guerra passou para junto a Estação Sorocabana, onde permanecemos servindo mais seis meses.
Faziam exercícios, marchas?
Fazíamos marcha de vinte e quatro quilômetros. Fizemos dois acampamentos. Um deles foi adiante de Santa Terezinha, fomos a pé. Permanecemos por duas noites acampados  naquele local. Tínhamos que colocar estacas e ficarmos cobertos com toalha que lavávamos de casa eram amarradas nas estacas. Tínhamos que deitar no chão mesmo. Dormíamos de farda, foi o último ano em que o Tiro de Guerra usou perneira. Não era coturno. Nosso calçado era um sapatão. Era época de guerra, a Segunda Guerra terminou em 1945. Eu servi o Tiro de Guerra de 1944 a 1945.
Havia a preocupação de fossem mandados para combater na guerra?
Havia muito comentário, mas era pouco provável que isso acontecesse, o governo tinha muita gente no Exército.
Quem era o comandante do Tiro de Guerra de Piracicaba naquela época?
O sargento comandante nós chamávamos de Sargento Ayres. O sargento da minha companhia era Júlio Cesar Huffenbaecher.
Como eram as aulas de tiro?
Nós íamos de bonde até a Esalq. Depois descíamos até a beira do rio, onde havia um stand, onde praticávamos tiros com fuzil. Quem não acertasse o alvo tinha que retornar outro dia para repetir a posição. Comigo nunca aconteceu isso, nunca precisei retornar para repetir o tiro. No inicio o alvo ficava a uns 20 metros de distância, gradativamente íamos aumentando a distância entre o atirador e o alvo, até chegar a uma distância de 150 metros, com a arma apoiada. Quando conclui o Tiro de Guerra, sai da fabrica de vassouras e fui trabalhar no Dedini. Entrei no Dedini a 2 de janeiro de 1946. Sai do Dedini aposentado em 1977. Quando fui trabalhar no Dedini já se pagava o INSS, que era denominado na época de IAPI.
Qual era a função do senhor assim que entrou no Dedini?
Entrei como ajudante. Mas depois me tornei mecânico ajustador na seção de moendas. Comecei a ajudar a montar moendas, depois me colocaram na banca para fazer um serviço mais delicado, existia uma bombinha hidráulica que a moenda tinha que ter, trabalhei com embreagem de moenda, enchia os mancais de metal patente ( uma liga metálica que vem em barras).
O senhor conheceu o Comendador Mário Dedini?
Conheci! Assim como seu filho Armando Dedini. Conheci  Leopoldo Dedini.irmão do Comendador Mário.
Quando o senhor entrou na Dedini ela já era uma empresa de grande porte?
Era uma empresa grande. O Dedini depois adquiriu um terreno na saída para São Pedro, local próximo ao hoje Jardim Primavera, ele transferiu a fundição para lá e montou uma laminação. Quando foi instituído o décimo terceiro salário, sendo obrigatório o seu pagamento, o Dedini já fazia isso há muito tempo!
O senhor freqüentava a igreja?
Ia sim! Na época existia a Igreja da Imaculada Conceição, que após muitos anos passou a matriz. Freqüentei muito a igreja que depois foi demolida. Ali eu fiz a minha primeira comunhão. Casei-me com Maria Schiavinatto. Tivemos três filhos: Valter, Lucrécio e a Iria.
O senhor morava na Vila Rezende quando trabalhou no Dedini?
Morava perto, onde hoje é a Travessa Dom Luiz de Bragança.
O senhor chegou a conhecer a plantação de sisal feita por Virgilio Lopes Fagundes?
Não me lembro dos donos, mas me lembro da empresa. Ali onde é o bairro Algodoal, foi feita uma plantação de algodão que deu origem ao nome do bairro. Depois é que foi montada essa indústria de corda de sisal, ali foi planta a pita, tanto que as vezes alguém perguntava para outro: “Aonde você vai?” recebia a resposta: “ Vou lá no pitá!” já usando o sotaque piracicabano!. Quando começaram a construir no Nhô Quim o bairro recebeu esse nome por causa do Esporte Clube XV de Novembro, o dono do terreno insistia em dizer que era Vila Ducatti, mas a população adotou o Nhô Quim.
O senhor conheceu bem o Engenho Central em funcionamento?
Conheci! Quando estava de férias no grupo escolar, eu ia levar almoço para o meu pai lá no Engenho.
O Engenho Central teve uma divisão de bebidas fabricadas por eles, o senhor sabe onde ficava?
A bebida veio depois, mas não era feita dentro Engenho Central, eram feitas nas proximidades de onde está instalado o Shopping Piracicaba.
A Chácara do Dr. Kok ainda existia?
Nós chamávamos de Jardim do Kok. Ficava bem em frente a Igreja Imaculada Conceição e era uma área fechada. Atualmente é a Praça Imaculada Conceição. O Dr. Kok morava mais para baixo, eu não cheguei a conhecê-lo. Ele tinha uma pessoa que tomava conta daquela área. Ele era dinamarquês.
O senhor conheceu o Mário Arias Vitiel, popularmente conhecido como “Mário da Baronesa”?
Conheci muito! Tanto ele como seu filho, seu genro. O Mário era uma pessoa muito boa. Foi dono de praticamente toda aquela região, Jardim Monumento, e imediações, era uma enorme extensão de terras. A Baronesa de Rezende eu não cheguei a conhecer.
O senhor gosta de música desde jovem, como surgiu esse gosto pela música?
Eu escutava uma música pelo rádio, era uma época em que nem rádio as pessoas tinham facilidade em adquirir. Eram feitas festas de igreja por oito dias. Tinha o serviço de alto-falantes que tocavam aquelas músicas, um moço oferecia uma musica a uma moça, uma moça oferecia música a um moço. Havia o “Correio Elegante”, onde se escrevia um bilhetinho e mandava entregar a pessoa que despertava interesse. A diversão nossa era essa.
Quando o senhor começou a cantar?
Eu era um moleque, via alguém tocando violão, chegava lá e como eu tinha uma voz bem elevada, com o tempo fui pegando o tom das músicas. Naquele tempo quem fazia um enorme sucesso eram: Vicente Celestino, Carlos Galhardo, Francisco Alves, Gilberto Alves, Dalva de Oliveira, Linda Batista, Emilinha Borba, Aracy de Almeida.
O senhor fazia serenatas?
Fiz muitas! Eu só cantava.  Às vezes íamos três; outras vezes o violonista Vicente Munhoz e eu. Fazíamos serenata para uma moça, para uma família.
A partir de que hora eram feitas as serenatas?
Depois da meia noite. Estava tudo quietinho. Geralmente na passagem do ano tinha um bandolinista que era vizinho meu, ia junto com o Vicente Munhoz, e eles me convidavam para cantar, na passagem do ano. As famílias abriam-nos a porta, ofereciam algo para beber ou comer. Éramos muito bem recebidos. Havia muito respeito.
Se a moça gostasse da musica ela acendia a luz e abria a janela do quarto. Isso acontecia?
Olha....eu fiz abrir muitas janelas! Algumas vezes eu vinha passear na Praça José Bonifácio, na volta, ao passar pelo Instituto Baronesa de Resende, tinha umas internas do colégio. É um prédio assobradado. Como não tinha acompanhamento, parava ali, cantava uma música sem acompanhamento, sem nada. As internas vinham na janela lá em cima.
As freiras não reclamavam?
Em uma festa na casa de uma pessoa amiga estavam presentes uma freira e a minha mãe. A freira disse à minha mãe: “- Eu soube que tem um filho da senhora que canta. Ele canta sempre embaixo da minha janela!”. Minha mãe disse-lhe: “-È o meu filho que canta!”. Quando parava ali no Colégio Baronesa de Rezende cantava umas duas músicas apenas. E ia embora.
O senhor freqüentava o Mirante?
O passeio da gente era no Mirante, geralmente domingo a tarde, após o meio-dia.
O senhor chegou a nadara no Rio Piracicaba?
Nadei muito ali na Rua do Porto onde havia um trampolim. Lembro-me das Festas do Divino.
E o Restaurante Papini, o senhor conheceu?
Quantas vezes eu fui cantar no Papini! Além do restaurante tinha jogo de boche. Erotides de Campos, dizem que ia sempre no Papini. Eu não o conheci.
E o Seresteiro Victório Ângelo Cobra (COBRINHA)?
Fiz o programa do Cobrinha diversas vezes na PRD-6! Estive na casa dele, cantando com ele, com o filho dele. Ele ia viajar, ou queria descansar um pouco, perguntava se eu podia fazer o programa para ele. Eu ia, era aos domingos. Uma meia dúzia de vezes eu fiz o programa dele. Eu cantava, tinha o acompanhamento do regional com Orlandinho no acordeom, Crispim no violão, Zé Moreno no violão, o Tampinha no bongô, era o chamado Regional D-6. Aos sábados tinha um programa com o patrocínio do Café Morro Grande, a gente cantava também. Era com um auditório. Cheguei a cantar no Clube Coronel Barbosa.
Se alguém o convidar para fazer uma serenata o senhor aceita?
Se vierem me convidar, ainda sou capaz de atender ao pedido.
A música tem  muito a ver com a sua disposição, sua saúde?
Acho que se não fosse a música eu já estava morto!






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