PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E
MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 10 de junho de 2017.
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 10 de junho de 2017.
Entrevista: Publicada aos sábados
no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
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http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: ARLETE MARIA RODRIGUES NEGRI
ENTREVISTADO: ARLETE MARIA RODRIGUES NEGRI
Arlet Maria Rodrigues Negri
nasceu a 27 de outubro no bairro rural Guamium, em uma fazenda, ali havia um
casarão onde moravam, de portas e janelas azuis, junto a Estrada dos Godinhos.
Atualmente a região já está urbanizada. Seus pais, Antenor Rodrigues e Angelina
Castelucci Rodrigues tiverem três filhos: Arlete Maria, José Adalberto e
Antonio Wilson.
Seu pai trabalhava em qual atividade?
Meu pai trabalhava na empresa
Tema Terra em Sumaré, ele foi trabalhar nessa empresa que naquele tempo ainda
chamava-se Tratores do Brasil quando eu tinha sete anos, Lá ele trabalhou até
aposentar-se. Morei em Sumaré por dois anos. Meus avós paternos eram Jorge
Rodrigues e Ida Carletti Rodrigues. De Sumaré por dois anos morei na cidade de
Três Pontas em Minas Gerais. Depois voltei para Piracicaba, fui morar com meus
avós maternos Ephigênia Basso Zambon e Antonio Castelucci , com o meu tio Antonio José Castelucci que
morava com seus pais, ou seja, morávamos todos nós meu tio, meus avós e eu, na
mesma casa.
Em que bairro de Piracicaba você passou a
residir?
Na Avenida Dom João Nery, na Vila
Rezende. Eu tinha estudado em Sumaré, em Três Pontas, e aqui fui estudar na
Escola Imaculada Conceição (Na época conhecido como “Carequinha”). Era comum
dizer que estudava no Carequinha! Fiz o curso de auxiliar de escritório, em
seguida o Curso Técnico em Contabilidade., depois fui fazer a faculdade em
Tatuí.
Você começou a trabalhar a partir de quantos
anos?
Meu avô Antonio Castelucci tinha
um açougue, inicialmente situado na Avenida Dona Francisca depois passou a ser
na Avenida Dom João Nery. Eu tinha de catorze para quinze anos, ajudava no
açougue. Gostava de trabalhar, desossar, picar, fazia lingüiça, codeguim (o
cudiguim (ou codeguim ou cotechino) é uma lingüiça fresca elaborada com carne
suína, couro cozido e gordura, com boa quantidade de temperos como alho, cheiro
verde, noz moscada, pimenta).
A que horas abria o açougue?
As cinco horas manhã abria, lá pelas onze horas fechava,
depois do almoço, das duas horas até as cinco abria de novo. O meu tio Antonio
José Castelucci fazia faculdade de matemática em Rio Claro. Ele ajudava no
açougue na parte da manhã, levantava bem cedinho, deixava todas as encomendas
prontas e depois ele ia para a faculdade. Aos sábados um outro tio, Miguel
Biscalchim ajudava também. O meu tio
Antonio José Castellucci formou-se em matemática, fez carreira como professor
acadêmico e é um dos pioneiros da implantação de cursos da UNIMEP no Campus de
Santa Bárbara D`Oeste.
Você concluiu o curso de contabilidade e foi fazer a
faculdade?
Fui fazer educação artística em
Tatuí, na Faculdade de Ciências e Letras de Tatuí, que era o que eu gostava,
aos doze anos, eu morava em Três Pontas, pintava telas com pinturas a óleo, eu
tinha muita habilidade com trabalhos manuais. A Faculdade de Tatuí já era
famosa, quem estudava lá: João Pedro Godinho, Cecília Neves, Isabel Guardia,
Mércia Angeleli, a Cica. O João
Chiarini dava aula para mim. Era bem incentivador.
JOÃO CHIARINI
Como vocês iam para Tatuí?
Íamos de ônibus, saíamos de Piracicaba às seis horas da
tarde, o ônibus saía de frente da catedral, e voltava à meia-noite. Na
época eu era solteira. Era um pessoal muito animado, valia a viagem. Foram três
anos.
Nessa época você já estava
namorando seu futuro marido?
O Wilson estudava o curso
científico com o meu tio Antonio
José Castellucci, em função dessa amizade com o meu tio ele freqüentava a nossa
casa. A minha avó era comadre da mãe dele Ângela Alleoni Negri casada com
Carlos Negri, meu sogro. Estávamos sempre juntos. Depois de muito tempo
começamos a namorar. Ele foi fazer Engenharia Civil na Escola de Engenharia de
Piracicaba. Ele gostava muito de eletrônica. Foi um dos pioneiros da
informática em Piracicaba. Ele informatizou o SEMAE – Serviço Municipal de
Águas e Esgotos; informatizou a Prefeitura Municipal de Piracicaba, o SEMUTRAN -
Secretaria Municipal de Trânsito e Transporte; foi um dos fundadores do CIAGRI - Centro de Informática da
ESALQ, ele trabalhava na Escola de Agronomia Luiz de Queiroz. Ele fez Mestrado
em drenagem e irrigação. Quando nos casamos ele dava aulas na UNIMEP, em
Piracicaba e em Santa Bárbara D Oeste. Ultimamente lecionava na Escola de
Engenharia de Piracicaba.
Em que ano vocês se casaram?
Foi a 19 de julho de 1978, na Matriz da Vila Rezende, o
Padre Jorge foi o celebrante. Tivemos duas filhas: Patrícia e Mariana.
CENTENÁRIO PARÓQUIA IMACULADA CONCEIÇÃO
Quando vocês vieram morar na casa onde permanece por 37
anos o bairro era bem diferente?
Havia poucas casas, estavam começando, a nossa rua era a
que mais tinha casas, mas o bairro em si era composto por poucas casas.
ARLETE AO LADO DO PÉ DE MAMÃO NA CALÇADA DA SUA CASA.
ELA AFIRMOU TER APENAS JOGADO AS SEMENTES.
VISTA PARCIAL DA PRAÇA EM FRENTE A SUA CASA, ONDE PLANTOU MUITAS ÀRVORES FRUTIFERAS. ENTRE AS DUAS ÀRVORES AO FUNDO, SEU MARIDO WILSON ESTIVACAVA UMA REDE PRESA ÀS DUAS ARVORES E FICAVA OLHANDO AS CRIANÇAS BRINCAREM NA PRAÇA.
Além de arte, que você gosta muito, há outras coisas que
a atrai?
Gosto muito de móveis antigos. Tenho uma coleção de
xícaras, as pessoas sabem e quando vão se desfazer de alguma coisa antiga me
consultam se quero. Sabem que eu irei cuidar com carinho. Algumas vezes até
restauro. As coisas antigas que possuo são presentes de diversas pessoas,
vizinhas, amigas, parentes. Tenho uma peça que ganhei de uma amiga chamada Dona
Vilma, ele ganhou da sogra dela. A Dona Vilma faleceu com 85 anos. Imagino que
essa peça deve ter mais de cem anos! Tudo que tenho de antigo foi alguém que me
deu. Muitas coisas eu restaurei. Uma pessoa de muita cultura, da nossa família,
sugeriu que eu fizesse um curso de restauração na Europa, eu tenho uma mão
considerada apropriada para a pintura e restauração. É o que chamam na arte de
ter a mão “suave ou leve”. Tenho muitas pinturas em porcelana que eu mesma fiz,
assim como vitral. Pintura em tecido, bordar, aprendi a fazer tudo isso.
CAIXA COM MACHETARIA FEITA POR ARLETE
CRIADO MUDO ANTIGO, SENDO QUE A CAIXINHA DE MADEIRA EM CIMA DELE DEVE TER MAIS DE 100 ANOS !
PEÇAS EM PORCELANA (UMA DAS QUALIDADES DE ARLETE É PINTURA EM PORCELANA)
Você nunca pensou em fazer disso uma profissão?
Gosto muito de fazer, já trabalhei por cinco anos na Casa
Campos, hoje loja Além da Lua, minhas filhas estavam estudando fora, meu marido
trabalhando, eu para não ficar muito só em casa fui ajudar a minha amiga e no
fim acabei ficando o período integral. É uma loja de artesanato. Na faculdade
aprendemos a entalhar, fiz machetaria com a Isabel Guardia. (Machetaria é a arte ou técnica de ornamentar as superfícies planas de móveis, painéis,
pisos, tetos, através da aplicação de materiais diversos, tais como: madeira,
metais, madrepérola, pedras, plásticos, marfim e chifres de animais, tendo como
principal suporte a madeira).
Ainda
adolescente você trabalhou no açougue mas já estava tentando encontrar outra
atividade profissional?
Fui fazer o curso de cabeleireira na Escola de
Cabeleireiros Calazans, do Gilson Calazans. Trabalhei uns 20 anos nessa
atividade, ainda trabalhando no açougue já fazia um pouco de cabelo. Depois que
meu avô fechou o açougue passei a trabalhar como cabeleireira em tempo integral
Naquela época não havia muitos cabeleireiros em Piracicaba. Eu era bem famosa
aqui na Vila Rezende. Comecei trabalhando sozinha, depois passei a ter alguém
que ajudava a fazer unhas. Trabalhava no fundo do quintal da minha avó. Fiz um
quartinho, um banheiro, e fazia lá. Comprei o secador, lavatório era muito
caro, não tinha. Coloquei duas colunas de concreto que adquiri na Artefatos de
Cimento Coimbra, em cima coloquei uma pedra de granito, um espelho, que
conservo até hoje, assim passei a trabalhar.
SECADOR DE CABELO ANTIGO COM PEDESTAL
BOBES NO CABELO
O secador era aquele em que a mulher enfiava a cabeça
dentro?
Era esse mesmo! Tinha um babyliss, que era um modelador
para ficar enrolado, ao contrário da conhecida “chapinha” que alisa o cabelo.
Essa moda de enrolar o cabelo está na moda de novo.
Naquela época era muito comum, as moças enrolarem o
cabelo com bob de plástico, passar boa parte do dia com os bobs e um lenço
sobre a cabeça para depois irem terminar o penteado?
Às sextas e sábados eu começava a atender às cinco horas
da manhã, enrolar os cabelos das meninas. Elas colocavam um lenço cobrindo a
cabeça e iam trabalhar. Quando saiam do serviço voltavam para arrumar o cabelo.
A moça com bob na cabeça com certeza já sabia que a noite iria passear. Era
chique até! Eu tinha clientes que moravam nas proximidades da Santa Casa de
Piracicaba, a Neide Krahenbhul fazia unha comigo. As meninas que trabalhavam
nas lojas do centro vinham bem cedinho para enrolar o cabelo, tinham que tomar
o ônibus e chegar ao local de trabalho às sete horas.
O famoso cabeleireiro Nandi era seu vizinho?
Era meu vizinho! Na Vila Rezende era eu, o Nandi e a Alzira
(Zaíra) Papini e a Marli Zurck.
Os produtos utilizados para “fazer a cabeça” das moças
eram improvisados?
O laquê era fundamental! O cabelo era enrolado com
cerveja! Passava cerveja no cabelo para ficar duro!
Não ficava o odor da cerveja?
Ele secava, ficava duro apenas. Tempo de produtos da
marca Anaconda.
O salão de cabeleireiro é um local com alguma semelhança
a uma sala de psicólogo, onde as pessoas desabafam seus males?
De certa forma sim. É essencial que o profissional
mantenha o sigilo de tudo que ouve ou sabe, ou poderá naufragar o seu
empreendimento. Há momentos em que a pessoa sente-se a vontade para revelar
confidências, suas ou de uma terceira pessoa, e isso não deve virar a chamada
fofoca.
Para ir para o centro você utilizava o bonde?
Quanto pegar o bonde! Um pouco antes da cabeceira da
ponte sobre o Rio Piracicaba, havia uma porteira que era fechada para dar
passagem ao trem particular do Engenho Central.
O local que por muitos anos foi denominado de “Bimboca”
situa-se aonde de fato?
Se você for pela Avenida Dona Santina, irá passar por um
posto de saúde, descendo a atual Rua Francisco de Souza, tem uma bica de água,
ali é que era a Bimboca. Mais adiante tínhamos o famoso bairro do Pitá, assim
denominado por ter a plantação de pita ou agave, material que o industrial
Virgilio Lopes Fagundes utilizava em sua indústria de cordas. Atualmente essa
área está toda urbanizada. Essa descida que temos na Avenida Manoel Conceição é
denominada como pertencente ao Bairro São Luiz.
Você freqüentava os cinemas de Piracicaba?
Freqüentava o Politeama, comprava balas, chocolates, na “bombonière”
situada entre os bancos Itaú e Bradesco, na Praça José Bonifácio nº 13 de
propriedade de José Passarela. Ia a outros cinemas também, na época existiam o
Broadway, o São José o Palácio e o Colonial na Rua Benjamim Constant. Eu
gostava de ir ao Politeama, é onde a juventude reunia-se. Dizíamos de vez em
quando que “íamos fazer a praça”. Tinha uma grande amiga Leila Pizelli,
advogada, trabalhava na prefeitura. Íamos até o centro, o seu pai tinha uma
caminhonete, dávamos uma volta de caminhonete no centro. Às vezes quadrávamos o
jardim da Vila Rezende, era freqüentado mais pelos jovens da Vila Rezende, eles
não se misturavam com o pessoal da “cidade”. Na época a Caninha Tatuzinho e a
Caninha Cavalinho estavam em atividades intensas. Eu tinha bastante amigas que
trabalhavam na Tatuzinho.
Quais
eram os cortes e penteados de cabelo femininos mais na moda da época?
Eram
“Joãozinho”, Chanel, Coque, Banana, que era um penteado que ficava na parte
posterior um formato parecido com uma banana.
PENTEADO FEMININO CONHECIDO COMO "BANANA" MUITO USADO NA ÉPOCA
Você
teve a oportunidade de conhecer diversos artistas de repercussão nacional, no
auge da carreira?
Na década de
60, anos da Jovem Guarda, quando muitos artistas estavam no auge, houve um
almoço em Sumaré, do qual eu participei, era composto basicamente por artistas
de expressão: Jorge Bem, George Freedman, Martinha, Pedro Paulo Rangel.
E Milton Nascimento?
Ele era
de Três Pontas, no período em que morei lá o conheci, na época eu era criança,
tinha uns doze anos, ele estava começando a fazer sua carreira. Era
praticamente um anônimo. Depois que ele fez sucesso e estourou. Gosto muito de
teatro, quando vinham peças com artistas muito famosos, íamos meu marido e eu
até o camarim, para conhecê-los, cumprimentá-los. Assisti um show de Roberto
Carlos e André Rieu.no Chile.
De maneira geral nós não valorizamos muito a nossa
história?
Nada!
Vejo o que sobrou, edificações que a especulação imobiliaria ainda não
derrubou. Sou conservadora. Em frente a minha casa nasceu um pé de mamão, está
carregado. Do outro lado da rua tem uma praça, ali já plantei diversas mudas de
àrvores frutiferas, Inclusive duas mangueiras, quando o bairro não era tão
habitado, meu marido colocava uma rede entre as duas mangueiras e ali ficava,
olhando as crianças que brincavam. Até hoje cuido dessas plantas, faço
compostagem, coloco adubo natural, corto grama.
Você gosta de ler?
Devoro
livros, prefiro os livros de leitura leve, também chamados de àgua-com-açúcar.
Embora as vezes também leio livros utilizados pela minha filha que atua
profissionalmente na área de psicologia. Leio jornais, do começo ao fim. Tenho
o habito de recortar aquilo que me interessa e às minhas filhas.
Você participa de alguma instituição como
voluntária?
Já estou
ha 20 anos como voluntária da instituição Associação
Viva a Vida - Mulheres
Mastectomizadas, mais conhecida como “Viva a Vida” situada a Rua José Pinto de
Almeida, 824. A Dona Vilma Almeida de Godoi, foi a primeira pessoa a se
preocupar em dar suporte à mulheres com cancer de mama, iniciei fazendo
pinturas em tecido e fazendo perucas para as pacientes. Sou a primeira pessoa
não acometida pelo mal a ajudar. Um dia Dona Vilma aceitou que eu ajudasse a
instituição. Passei a fazer de tudo um pouco. Ajudar a fazer a primeira
prótese, para as pessoas que não tem condições de comprar. Fazemos uma de
paninho, com os pesos certos, é colocado dentro do sutiam. Fazemos esse trabalho, faço artesanato
com as pessoas. Temos psicólogos, fisioterapeutas, contribuímos com cestas
básicas, tentamos elevar a auto-estima da pessoa. Ali é freqüentado por
mulheres de todos os níveis. Temos o brechó que abre de segunda a quinta do meio
dia e meia até as três e meia, às quintas feiras é das duas horas da tarde até
as quatro horas. O primeiro bingo feito pela Associação foi organizado por mim,
pelo meu marido Wilson e pelo saudoso Didi Cardinalli. Foi lá no Lar dos
Velhinhos. Depois o Capitão Gomes passou a nos ajudar, fizemos reuniões
beneficentes com jantares. Assim levantamos a Associação. O volume maior de
pessoas assistidas por nós é de pessoas carentes.
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