domingo, outubro 04, 2009

ANTONIO CELSO RIBEIRO DA SILVA

                                                      



PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com


Sábado 26 de setembro de 2009
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
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ENTREVISTADO: ANTONIO CELSO RIBEIRO DA SILVA


O Dicionário da Comunicação de Carlos Alberto Rabaça e Gustavo Barbosa define como sonoplasta: “o profissional responsável pela sonoplastia, que por sua vez consiste na seleção e adequação de todas as sonorizações e efeitos sonoros, editados previamente, gravados ou montados ao vivo, necessários à produção de filme, peça teatral, programa radiofônico ou de TV, de acordo com as exigências do roteiro”. A grande magia do rádio que tanto encanta o ouvinte é a sua própria imaginação. Ao ouvir o locutor, os efeitos sonoros executados no momento correto e de forma adequada, a incrível e pouco conhecida atividade do cérebro humano cria um mundo imaginário indescritível e peculiar, único para cada um dos milhares de ouvintes. O número de ouvintes será sempre maior quanto maior for sua identificação com o programa apresentado. Um conceito simples, que exige uma boa produção, momentos corretos de intervenções, sincronia perfeita entre o locutor e o sonoplasta. Antonio Celso Ribeiro da Silva, o Celso Ribeiro, é uma figura lendária do rádio piracicabano. Com criatividade está sempre procurando algo de novo. Respeitada as dimensões de cada veículo de comunicação Celso Ribeiro é o Hans Donner piracicabano, que criou a marca da Rede Globo e é o responsável pelas vinhetas e peças de abertura de muitos dos programas da Rede Globo. Em um clássico programa da Rádio Difusora de Piracicaba, Celso criou para a abertura o ranger de uma porta se abrindo. Apareceram várias empresas querendo colocar seu nome “colado” ao ruído.
Celso Ribeiro você nasceu onde?
Nasci em 25 de março de 1948, aqui em Piracicaba, bem em frente a Igreja dos Frades. Tive o previlégio de ser batizado logo que nasci, pelo fato da proximidade da igreja, Frei Evaristo foi quem me batizou. A casa do meu pai ficava onde hoje é o jardim defronte a Igreja dos Frades, era uma pequena praça com algumas casas ao fundo. Meus tios cuidavam das roupas, tanto dos frades como da igreja. Eles tinham uma casa cedida pelos frades para residirem. Eu sou filho de Antonio Ribeiro e Ana Luiza Ribeiro. Meu pai era pedreiro, com o tempo passou a ser empreiteiro de obras. Em 1968 ele foi convidado para fazer uma reforma na igreja da Penha, em São Paulo. Depois passaram a construir a matriz nova da Penha, ele passou a morar em uma casa atrás da igreja com uso vitalício. Lá ele faleceu assistido pelos padres.
Você chegou a residir lá?
Não, porque eu já tinha minha vida profissional encaminhada aqui em Piracicaba. Eu ia visitá-lo regularmente.
Você tem algum apelido?
Tive quando era moleque, eu jogava “bem” bola! Me apelidaram de Pé-de-Rodo. Quando chegava aos meus pés eu chutava, e a bola saía, indo as vezes parar em um riacho próximo. Quem me colocou esse apelido foi o Ademar Lorenzi que era colega de infancia.
Você estudou onde?
Estudei no Grupo Escolar Barão do Rio Branco, juntamente com Edirley Rodrigues, famoso jornalista e radialista de Piracicaba. Estudei por um período também no Dom Bosco.
Com quantos anos você começou a trabalhar?
Com oito anos de idade eu era obrigado a sair do Grupo Barão do Rio Branco, vir para casa, coletar esterco para a horta mantida pelo meu pai na Rua Riachuelo. Depois pegava um carrinho de pipoca e ficava vendendo em frente a Catedral até umas cinco horas da tarde. Aos doze anos de idade fui trabalhar na Fábrica de Bebidas Del Nero, de propriedade do Seu Armando Del Nero, alí na Rua Boa Morte, em frente ao Lar Escola .
Fui designado para engarrafar a Caninha 21. Existia uma espécie de cone que era aberto por um mecanismo, as garrafas vinham por uma esteira. Muitas vezes o cone enroscava, eramos obrigados a submeter o cone a uma determinada pressão, isso feito com a boca!
Das sete horas da manhã até as onze horas quando minha mãe trazia o amoço, involuntáriamente eu já tinha ingerido uma boa dose de aguardente pelas vezes que tinha que intervir no sistema de engarrafar.
Em seguida você trabalhou onde?
Do Del Nero fui trabalhar em uma fábrica de beneficiar algodão, propriedade do Seu Benedito Grisotto, a fábrica ficava na Rua Alfredo Guedes, próximá Rua Riachuelo. Isso foi em 1961. Em 1963, um amigo, o Jair Lacava trabalhava como operador de som na Rádio Voz Agrícola do Brasil, que ficava na Rua XV de Novembro, bem na praça, onde hoje funciona um supermercado. Na época era uma padaria, a rádio ficava no andar superior. Eu fui visitá-lo. Ele perguntou-me se eu gostaria de trabalhar em rádio. Disse-lhe que sim. O gerente era o famoso José de Oliveira Garcia Neto. O Jair, em uma brincadeira, colocou-me ao telefone, falando com um seu amigo, da Rádio Difusora de Piracicaba, imitando a voz de Garcia Neto. O pseudo Garcia Neto disse-me: “-Você quer trabalhar comigo na Rádio Voz Agrícola, lá pelas duas e meia, tres horas da manhã, você vem e me espera que eu logo chego”.
Qual foi a sua reação?
Voltei para minha casa, muito entusiasmado, dizendo para a minha mãe: “-Vou trabalhar em rádio”. E fui dormir, Á meia noite minha mãe me acordou, deu a minha melhor roupinha, e ás duas horas da madrugada eu estava na Rua XV de Novembro, esperando o Seu Garcia, que chegou por volta das dez horas da manhã! Quando ele chegou, contei á ele, que tinha recebido a sua ligação convidando para trabalhar na rádio. Foi uma risada só! Provavelmente comovido pelo fato ele disse-me: “Pode começar a trabalhar hoje mesmo!”. O prefixo da Rádio era “ZYR 209 Rádio A Voz Agrícola do Brasil de Piracicaba uma das emissoras da Rede Piratininga”.
Qual foi a sua primeira função?
Aprendi a operar a mesa de som, e logo em seguida o Dalgo Migliori que fazia o famoso programa chamado “Manhã na Roça” me colocou fazendo a mesa e ao mesmo tempo a locução. Passei a exercer mais a locução do que a mesa. A música que fazia maior sucesso era “Banho de Lua”!
A rádio mudou de local?
Isso foi um pouco antes do Comurba cair, a rádio mudou para a Rua Moraes Barros, 1191. A Voz Agrícula era da Rede Piratininga de São Paulo, que competia na época com a Rede Panamericana de Rádio, hoje Jovem Pan, com a Rede Tupi de Rádio, 1040 e com a Rede Bandeirantes.
Quando você decidiu dedicar-se á sonoplastia?
Eu era muito jovem tinha 17 anos de idade, havia um rigoroso critério para as palavras ditas no ar. O que provavelmente hoje passaria como brincadeira, na época foi motivo de critica de alguns companheiros. Troquei as palavras “tomar sopa” por “comer sopa”.
Foi o suficiente para que eu me sentisse pouco a vontade diante do microfone. Passei então a dedicar-me a mesa de som, a ponto de ser classificado por Roberto Moraes Sarmento como o primeiro sonoplasta da cidade. Eu gostei tanto que permaneço até hoje.
Celso como eram os discos da época?
Peguei o período do acetato, do 78 rotações, compacto duplo, compacto quadruplo que eram duas músicas de cada lado.
E para achar o ponto certo, onde iniciar a música?
É onde entra a arte! Lembro-me de uma ocasião em que Roberto Moares Sarmento me chamou, assim como a Enedes Faustino e o Jean Baron. O pai do Jean Baron passava filmes aos domingos no Oratório São Mário. A proposta do Roberto Moraes Sarmento era a de fazer a primeira rádio-novela do interior do estado. Fiquei encarregado da sonoplastia, os capitulos eram feitos ao vivo. A Enedes Faustino fazia diversos papéis femininos. Isso foi em 1964. Eu fazia a sonoplastia, fundo musical, isso que hoje vemos nas novelas de televisão. Havia o improviso, por exemplo um cavalo. (Celso com muita habilidade batuca com as mãos o trote de um cavalo). No estúdio criávamos chuva com o barulho de papel celofane. Era tudo improvisado. Isso foi na Voz Agricola, onde permaneci até 1967. Depois fui trabalhar no Frigorifico Piracicaba , do Seu Altamiro Garcia doNascimento, como faturista, o Rui Fernando Coutinho que trabalhava na rádio comigo foi quem me levou para lá.
Quando você voltou para o rádio?
Waldemar Bilia era o diretor artístico da Rádio Difusora e eu fui pedir serviço para ele em 1968. Ele disse-me que eu era bem indicado, havia trabalhado com Ari Pedroso, Moraes Sarmento, Dario Correia. Em 1 de abril de 1969 entrei na Rádio Difusora de Piracicaba, onde estou até hoje. São 40 anos de Rádio Difusora. Quando entrei a diretora era Dona Maria Conceição Figueiredo, depois ela passou a rádio para o seu sobrinho José Roberto Soave, falecido em 1997 e atualmente suas filhas Daniela, Andréia e Roberta comandam a rádio.
A Difusora teve um período onde os programas de auditório ficaram famosos?
Trabalhamos juntos com Nhô Serra, Pedro Chiquito, Parafuso. A minha falecida sogra adorava ver Pedro Chiquito cantar a bíblia. Ele escolhia um trecho da bíblia e cantava. Eu o levava para a minha casa, minha sogra fazia o jantar para ele, e não o deixava sair antes das 10 a 11 horas da noite. Ele morava no Jupiá, eu o levava para a sua casa. Outros também frequentavam o auditorio da rádio, como Barbosinha, Moacir 70, que é o Moacir Siqueira.
Por que o chamavam de Moacir 70?
Ele era jovem na éoca, diziam, está ai o homem da virada da década!
Quais eram os programas de grande sucesso na época?
Eram o cururu, o programa do Waldemar Bilia “Rádio Atrações Morro Grande”, que distribuia muitos premios, havia um conjunto musical. O programa infantil que o Atinilo apresentava aos domingos pela manhã, foi onde surgiram muitos talentos, conjuntos, o Som Eco 2000 apareceu ali, assim como o The Finders.
Voce tomou lanches no Karamba`s?
Ficava embaixo do Clube Corenel Barbosa, na esquina. Era do Celsinho Elias, da Renata Elias, do Toninho Elias. Existia o Bar Nova Aurora, do Chacrinha, fechavamos a rádio a uma hora da manhã e íamos para lá. O Bola Sete que ficava na Rua São José entre a Rua Governador Pedro de Toledo e a Rua Benjamin Constant. O Bar do Tanaka, que ficava na Rua São José, em frente ao Teatro São José, foi um dos bares mais famosos, além das boas companhias, tinha o famoso: “Tanaka marca ai pra mim”. Em 1969 fui ver a descida do homem na lua no Restaurante Brasserie. Era talvez o único restaurante da cidade que tinha televisão, ainda no sistema preto e branco. Coloquei um LP para rodar na rádio e fui correndo ver.
O que você diz do gravador de rolo?
Lembro-me do gravador Akai 4000 DS. Em uma partida de futebol, cada vez qua era marcado um gol colocavamos na fita do gravador um papelzinho, para ter a noção do lugar da fita onde tinha sido narrado o gol. Depois veio o gravador com o conta giro. Zerava o conta giro e marcava, no giro 400 tem o gol do XV. Tem uma passagem curiosa, um operador de som que eu ensinei, hoje ele exerce a função de advogado, durante uma partida de basquete ele marcou com papelzinho cada cesta, voce pode imaginar a quantidade de papelzinho que havia no rolo de fita. Rádio era uma diversão, não existia rádio em FM, a televisão era em preto e branco e pegava mal, muitas antenas tinham um bombril em cima para sintonizar melhor. O profissional de rádio era bem quisto, e nós tinhamos que corresponder á esse respeito.
Hoje você continua trabalhando na Rádio Difusora?
Estou trabalhando no horário da meio dia ás seis da tarde, já uns 32 anos. Faço a mesa de som e ajudo a produzir o programa. Crio teste musical, piadas. Infelizmente muitos programas deixam muito a desejar na parte artística. O lucutor faz a locução e opera a mesa. Como pode ainda exercer a sua criatividade? Eu, Robson Valério e Dinho Morelli, fazemos horários juntos, criamos diversas formas de interagir com o ouvinte. Esse diferencial é que atrai o ouvinte e eleva o nível de audência.
Você é perfeccionista?
Sempre fui e continuo sendo até hoje. O conceito social de rádio mudou muito.
Provavelmente voce deve ter conhecido muitas pessoas em início de carreira e que tornaram-se astros?

Conheci sim, entre eles Francisco Milani , Fiori Giglioti que chegou a transmitir vários jogos para a Difusora, Gil Gomes que morava em uma pensão na Rua Boa Morte, foi embora de trem para São Paulo. Ari Pedroso, Waldemar Bilia, Antonio Sérgio Piton, Idalício Castellani, Ulisses Michi, Roberto Cabrini, Julio Galvão, o famoso Trio Itujuval.. O Atinilo José tinha o Show das Três, em uma época o programa passou a premiar quem cumprisse uma tarefa. A disputa foi tomando tal proporção que se formaram até escuderias para participar, criando equipes com a EkypéXato, Zoom-Zoom, EkyPeralta e Ekypelanka, que passaram a disputar a Gincana Difusora.. De escuderias passaram a formar escolas de samba. A Banda do Bule foi criada embaixo da Rádio Difusora, tanto que se chamava Banda do Bule porque o Balassini, que era um dos sócios da Agencia Gianetti, tinha também uma lanchonete chamada Café “O Bule”. O falecido Alceu Righetto, o Fagundinho, João Sachs, criaram ali a Banda do Bule.
Na Praça José Bonifácio, na esquina com a Rua Prudente de Moraes havia a Sorveteria Paris?
Era do Keiji e do Show, são nomes de origem japonesa, mas que pronunciavamos assim por ser mais próximos da nossa lingua. Era sorveteria e pastelaria. Onde hoje é o Edifício Canadá havia a Padaria Vosso Pão.
Você conheceu Roberto Carlos?
Ele adquiriu um rancho em Artemis, era muito amigo da família Rossi de Piracicaba, Seu Narciso Rossi e Dona Semiramis Rossi eram proprietários do Bar e Café Seleto, na Rua Prudente de Moraes entre a Praça José Bonifácio e a Rua Governador Pedro de Toledo. Eles eram tios da Eunice Rossi que foi a primeira esposa de Roberto Carlos. Na época ele chegava em Piracicaba, parava na Agencia Gianetti, isso por volta das oito a nove horas da noite, comprava as revistas que falavam dos artistas. Ele vinha de Cadilac. Muitas vezes trazia a Wandeléia, a Martinha, Erasmo Carlos que é uma pessoa muito atenciosa. O Gato que era o baterista do conjunto RC-7. Eu apresentei uma tarde de autografos do Don da dupla Don e Ravel no Clube Regatas.

domingo, setembro 20, 2009

"Não é o tempo que nos falta - é a serenidade para pensar noutra coisa além do alarmante assunto de todos os dias."
Euclides da Cunha
Comentários:
Oi, passei pra conhecer seu blog, e desejar bom fds
bjs
aguardo sua visita :)
# postado por Dri Viaro : 10:07 AM
ORIVALDO TRIMER




PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS


JOÃO UMBERTO NASSIF

Jornalista e Radialista

joaonassif@gmail.com



Sábado 19 de setembro de 2009

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana

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ENTREVISTADO: ORIVALDO TRIMER





Orivaldo Trimer é descendente de russos que imigraram para o Brasil, mantém características físicas típicas, com um metro e oitenta centímetros de altura, conserva o corpo em forma, dono de uma grande força física. Os imigrantes da Letônia, considerados russos eram bons agricultores. A vinda dos primeiros contingentes de Letos para Nova Odessa foi em 24 de junho de 1906, abrangia terras que hoje compõem Nova Odessa e municípios vizinhos. A saga da família Trimer se assemelha a de muitos imigrantes que lutaram contra muitos obstáculos: língua, costumes, clima e a luta infindável pela sobrevivência. Orivaldo é filho de Alfredo Trimer e Paschoa Grivol Trimer. Nascido em Tupi, em 22 de julho de 1939 é casado com a piracicabana Neusa Helena do Amaral Trimer desde 1968, casamento realizado na Matriz da Vila Rezende pelo Monsenhor Jorge.

Seu pai Alfredo Trimer foi proprietário de um estabelecimento em Caiubi?

Meu pai tinha um armazém em Caiubi, Foi lá que ele se tornou um grande amigo de José Nassif. O Seu José transportava açúcar da Usina Furlan e passava diariamente pelo armazém do meu pai. Eu saí de Caiubi com 11 anos de idade e fui para a Fazenda Cachoeira em Artemis. A nossa família toda se mudou para lá, fomos plantar cana de açúcar, a propriedade era do Dr. Freitas. Em 1956 fui campeão de ciclismo em Artemis, com uma bicicleta suíça, marca Nata, acho que foi a única que existiu no Brasil! Nós vínhamos de Artemis até Piracicaba de trem, descíamos na Vila Rezende e apanhávamos o bonde para economizarmos. O preço do trem da Vila Rezende até o centro era mais caro do que o bonde. Essa economia era importante para nós naquela época.

O armazém em Caiubí não prosperou?

No início era um bar, ia indo bem, vendia-se muito bem pão, “frangava” (negociava com os famosos “frangueiros”, comerciantes que percorriam as localidades rurais levando principalmente armarinhos, pães doces, muitas vezes até cortes de tecidos. Uma característica peculiar é que o carrinho de tração animal tinha abaixo do seu piso uma gaiola, onde eram transportados os frangos vivos. As negociações eram feitas por permutas com frangos, ovos, queijos, produtos da roça Seu Alfredo abastecia esses frangueiros). O que definiu o fim do armazém foi quando meu pai decidiu ampliar as instalações e infelizmente o investimento não deu o retorno esperado. Outro fator que pesou muito foi o excesso de confiança que ele tinha na honestidade das pessoas que compravam a crédito. Muitos não corresponderam a essa confiança.

Tem uma passagem pitoresca, que mostra a determinação do seu pai para o trabalho?

Meu pai era muito trabalhador. A lavoura dele era equivalente a lavoura cultivada por uma família com maior número de pessoas. Ela plantava algodão, na época o serviço na terra era feito com a utilização de burros, até ao meio dia ele trabalhava com uma parelha de burros, minha mãe levava o almoço e outra parelha de burros descansada, e quando era tempo de lua cheia ele ia até mais tarde. Meu pai levantava sempre ás quatro horas da madrugada, era ele quem fazia o café e tirava leite. Minha mãe tinha o costume de por uma pitada de sal no leite. Quem bebia dizia: “-Que leite gostoso!”.

Como a família Trimer passou a tomar conta da Chácara Morato?

Meu estava procurando um lugar para morar. Encontrou um conhecido que morou na Fazenda Cachoeira, e que lhe disse: “Estou morando em tal lugar, lá está muito bom, vamos lá você vai ver”. Meu pai veio, encontrou o administrador Antonio Massoca. Ele então disse ao meu pai: “Estou saindo Alfredo, aqui é bom para você que é trabalhador”.

Na época que idade você tinha?

Eu tinha uns 18 anos de idade, mudamos para lá no final da década de 50 e saímos em 1978.

Quem era o proprietário da Chácara Morato?

Era do Dr. Celso Leme, ele era casado com Dona Cenira Leitão, filha do Dr. Francisco Morato.

Qual era a área da Chácara Morato?

Eram 50 alqueires paulistas. (Cada alqueire paulista mede 24.200 metros quadrados). Hoje é cidade! Está ali o Carrefour, o condomínio Terras de Piracicaba.

A Chácara Morato abrangia que região?

Em uma extremidade ficava a uns 100 metros abaixo do Castelinho (Propriedade em forma de castelo, projetada pelo arquiteto Dr. João Chadad, que deu origem ao nome do Bairro Castelinho). Pela antiga Estrada Boiadeira ia até o café da Chácara Nazareth.

Uma das características próprias da Chácara Morato, eram suas frutas, em especial a variedade de tipos de mangas?

Tinha muitas espécies de mangas, não sei dizer quantas, mas chegamos a estimar em trinta espécies diferentes. Tinha pé de manga enorme, que precisava de três a quatro homens para abraçar. Havia uns pinheiros que tinham sido plantados e que naquela época (1970) os registros dos mesmos marcavam 105 anos de existência.

Para chegar á “cidade” qual era o caminho percorrido?

O lugar mais próximo era a Paulista, passávamos pelo pasto, pela invernada, iamos até a Igreja dos Frades. Minhas irmãs e eu íamos assistir a missa bem cedo. Era um trilho, só se passava a pé, Lá em cima havia uma porteira fechada com cadeado, nós passávamos entre os fios de arame da cerca e saíamos no aterro da Estrada de Ferro Paulista, onde hoje existe uma empresa de terraplanagem, próxima a rotatória da Avenida Dr. Paulo de Moraes com Avenida Nove de Julho.

Foram feitos bailes no tempo em que a família Trimer trabalhou na Chácara Morato?

Eram realizados bailes no terreirão, fazíamos o palizado. A Cerâmica tinha uma colônia de trabalhadores cujas casas ficavam onde hoje há uma padaria em frente ao Condomínio Colinas, próximo ao Carrefour.

Quem cuidava do casarão da Chácara Morato?

Era uma funcionária, Dona Nerina. A família do Dr. Celso vinha passar as férias no casarão.

Havia construções remanescentes de uma senzala que existiu no passado?

Nós morávamos na casa que foi habitada pelos escravos. Era uma casa em forma de “Z”, muito comprida mais de cem metros de comprimento, paredes feitas com pedras com a espessura das paredes de quase um metro de largura, os caibros do telhado feitos com coqueiros, telhas feitas nas “coxas” (Telhas fabricadas com barro moldado nas coxas dos escravos). Algumas vezes minhas irmãs iam ver uma novela na televisão do casarão, era preciso que uma pessoa as acompanhasse, quando voltavam, no escuro da noite era muito fácil imaginar vultos ou ruídos assustadores.

Você chegou usar que tipo de condução para entregar algodão que era plantado pela família?

Meu pai, Alfredo, tinha muita experiência no plantio de algodão. Existia uma terra vermelha, em um pedaço da chácara, lá pelos lados da Paulista, o terreno era bem plano. Deu um algodão muito bom, foi à primeira planta que “endireitou a costela nossa”. Foi vendida para o Seu José Nassif, na primeira vez que fiz a entrega, engatei dois burros na carroça e subi para a Paulista, era o trilho da invernada, o administrador da chácara me deu a chave do cadeado e passei pela porteira do Jaraguá. Ali havia uma estrada que chegava até a Rua do Rosário, levei nessa viagem umas 50 arrobas (Cada arroba pesa 15 quilos).

Vocês plantaram cana de açúcar na Chácara Morato, como era carregada essa cana?

O carregamento era manual. A terra sempre foi muito boa, resultando em uma cana bem desenvolvida. Chegamos a colher até 2.000 toneladas de cana que eram entregues no Engenho Central.

Quantos feixes de cana você cortava por dia?

Eu cheguei a cortar e amarrar 411 feixes. Em uma cana boa, a “77-Brasil”, até o meio dia eu tinha 300 feixes amarrados. Depois do meio dia eu ia para 500 feixes. Ninguém nunca conseguiu cortar essa quantidade. O meu podão de cana eu amolava dos dois lados. O administrador Luiz Trevisan dizia que não conhecia alguém que cortasse aquela quantidade. Comia e já ia mastigando trabalhar. Naquele tempo o Engenho Central não aceitava que a cana fosse queimada.



Onde era o local chamado Matão?

Iniciava nas Glebas Califórnia e ia até a Pedreira Equipav.

Você atravessava a estrada em frente á Chácara Morato e já estava no Rio Piracicaba?

Meu pai gostava de pescar. Quando moramos em Artemis não saia do rio. Era bom nadador e mergulhador. Quando o Rio Piracicaba enchia, subia no então trampolim do Clube de Regatas, pulava, e ia até a Barra do Rio Corumbataí nadando, sem bóia, sem nada. O corpo acostumado a trabalhar no pesado desenvolveu uma disposição física impressionante.

Quando a família comprou o primeiro veículo automotor?

Foi uma Kombi. Fomos para Santos, a família toda, oito pessoas, que alegria! Isso foi na década de 62 a 63. Era de segunda mão. O teto era branco, e o resto da pintura na cor café com leite. Deu problema na volta, o relê não funcionou mais, e de Americana á Piracicaba viemos sem luz! Na época o movimento nas estradas era pequeno.

Quando encerrou o período de trabalho na Chácara Morato qual atividade você passou a exercer?

Com meu primo montamos uma pequena empresa de terraplanagem. Fomos para a cidade de Itapeva, aqui havia muita concorrência. Na época o então proprietário da Padaria Jacareí tinha uma fazenda em Itapeva, fomos realizar um serviço para ele, começaram a aparecer serviços bons.

Você tem muita habilidade para o conserto e manutenção de máquinas pesadas?

Ainda aqui na Chácara Morato, trator, caminhão eu mesmo consertava. Em Itapeva eu tinha uma oficina onde eu recondicionava do motor até a parte rodante dos tratores de esteira. Quando descobríamos defeitos de fabricação em uma máquina escrevíamos ao fabricante sobre o assunto. Na máquina Fiat a bomba de embreagem fundia muito pela sua localização. O modelo seguinte já veio com a bomba melhor localizada. Esse é um exemplo, muitos outros aconteceram, inclusive com outros fabricantes de máquinas pesadas. Chegamos a retificar motores em pleno mato fechado. Isso foi uma grande vantagem para a nossa empresa, que ganhava muita agilidade. Tínhamos um veículo que era praticamente uma oficina completa, e sempre mantivemos prontas para o uso reservas de partes e peças mais estratégicas para o funcionamento das máquinas.

No início da cultura de cana na Chácara Morato você transportava a cana de açúcar com qual veículo?

Era um caminhão “toco” á gasolina, F-600 ano 1958.

Os caminheiros ficavam esperando em uma fila, a vez de descarregar a cana na usina. Era comum tomarem um aperitivo antes do almoço?

Existia esse hábito na época. O caminhão F-600, tinha um espaço atrás do banco onde podíamos levar nossos pertences pessoais. Eu costumava levar dois vasilhames. Em um deles tinha o aperitivo para meu consumo. O outro era para aqueles caminhoneiros que vinham “serrar”. No trajeto que fazíamos para ir até o Engenho Central havia um local onde era habito serem feitos os chamados “despachos” com diversas oferendas para as entidades, entre elas aguardente. Eu e meu ajudante abastecíamos com a pinga deixada ali o vasilhame destinado aos colegas que gostavam de filar um aperitivo. Por muitos anos eles se deliciaram com essa cachaça, até que acabei contando á eles a origem do que eles consideravam um produto de sabor excepcional! Na época a fila era enorme, as últimas viagens iam até de madrugada. Cheguei a ficar esperando por oito horas na usina para descarregar a cana de açúcar. Isso no Engenho Central. O caminho que eu fazia seguia pela Rua do Porto, era estrada de terra. Onde foi o Clube Regatas o caminhão não passava, era obrigado a ir por cima, pela Rua do Sabão.

A subida que há na Rua do Porto atrás do Palacete Boyes não existia?

Não havia, era tudo propriedade da Fabrica Boyes. Onde hoje é a Nova Piracicaba era plantação de cana. No bairro Nhô Quim, hoje existe a Avenida Manoel Conceição, foi propriedade do Mário Áreas Witier, conhecido como Mário da Baronesa, por ter sido criado por ela.

Você chegou a transportar cana com o bonde ainda funcionando em Piracicaba?

O caminho para levar a cana para o Engenho Central obrigatoriamente tinha que ser pela Ponte do Mirante, hoje Ponte Irmãos Rebouças. Quando o bonde ia, nós íamos atrás do bonde. Quando ele vinha da Vila Rezende para o centro, na cabeceira da ponte havia um funcionário em cima de um poste, sentado em uma cadeirinha com uma manivela ele apagava o farol de um lado e acendia de outro lado. Tínhamos que esperar, não havia porteira, entravamos pela Avenida Maurice Allain. Descíamos até o local próprio para descarregar e lá o guincho descarregava. O pai da minha esposa, Seu Osvaldo do Amaral, trabalhou muitos anos lá como cosedor de vácuo, que é uma etapa onde passa a garapa para ser processada. Um dos balanceiros era o Seu Joaquim.

No hoje Bairro Jaraguá como era?

A Chácara Nazareth era toda formada por invernada, existia só gado praticamente. Havia muita codorna. O plantio de café era feito só mais para cima, e dava serviço para muita gente, eles apanhavam o café escolhido, selecionado, eu até acredito que era para servir como semente. As mulheres e as crianças quando passavam para fazer a colheita era um número muito grande de pessoas, duzentas a trezentas pessoas. Quando voltavam do trabalho apanhavam do nosso canavial, uma ou duas canas, isso todos os dias, você pode imaginar ao final de um mês quantas toneladas eram apanhadas para consumo deles.

Havia roubo de gado na época?

Existia sim, perdemos um cavalo e uma parelha de mula.

Alguns ciganos eram negociantes de animais?

Houve uma época em que apareceram uns ciganos, com tropa de animal. Meu pai trocou uma égua velha e Seu Clemente que era da Gleba Califórnia, ele tinha um barzinho lá, com jogo de boche, era muito conhecido, também fez uma troca de animal com os ciganos. Os dois foram para a Paulista. Meu pai disse: “Clemente, essa aqui eu comprei do cigano.” O Clemente disse: ”Eu também comprei essa”. Na outra semana deu uma chuva e lavou os animais. Os ciganos passavam algum produto, talvez cinza de fogão nos pontos estratégicos das montarias. Isso porque quando é velho o queixo dos animais fica branco. Eles tinham maquiado os animais! Meu pai e o Clemente deram boas risadas.




sexta-feira, setembro 11, 2009

GASOGÊNIO,


um quebra-galho do tempo da guerra para a falta de gasolina
Muitos ainda se lembram do trabalho exercido pelos automobilistas do tempo da guerra, misto de carvoeiros e mecânicos; às voltas com sacos de carvão, grelhas, filtros, ventoinhas, tudo sob uma densa poeira negra.
Havia gasogênios de todos os tipos: traseiros, tipo reboque; dianteiros, à lá Cirano de Bergerac; enormes, como caldeiras; compactos, tipo apartamento; escondidos no porta-malas. Alguns bons. Outros, deficientes. Demonstrando que seus construtores desconheciam por completo os princípios de seu funcionamento.
A LENHA
O produtor do gás pobre era o carvão vegetal. Sua fabricação era feita primitivamente. A lenha, cortada em pedaços de 50cm de comprimento, aproximadamente, após ter sido amontoada na forma de cupim, é coberta com grossa camada de terra ou barro úmido. O fogo é ateado pelo furo “A” (veja a figura 1) onde foi deixado um espaço vazio.
A Arte do fabricante de carvão reside em deixar queimar somente a quantidade de lenha suficiente para a produção do calor necessário para que a “matéria-prima” carbonize. Obtém-se isto, regulando a tiragem através dos furos “B”, que permitem a entrada de ar. Este processo é uma verdadeira destilação a seco da lenha, durante a qual a quase totalidade da umidade, bem como de ácidos e resinas, evapora. Perdem-se assim grande quantidade de “gases” que não podem ser aproveitados no processo.
Para que se tenha uma idéia do que representa a parte perdida, é bom que se conheça o que um metro cúbico de boa lenha, destilada por um processo mais perfeito pode produzir: 120kg de carvão de primeira; 150 kg de ácidos diluídos; 20 kg de produtos alcatroados e uns 90 metros cúbicos de gases, à pressão atmosférica.
para cima, para baixo e transversal (veja a fig.2). Examinaremos apenas o primeiro (2A), por ser de mais fácil compreensão.

A preliminar é enche-lo de pedacinhos de carvão, de dimensões as mais uniformes possíveis, bem “socados”. Em seguida fecha-se a tampa da grelha pela qual as cinzas serão eliminadas. É necessário, de início, provocar a tiragem com a ventoinha “V”.
Forma-se assim uma zona de queima onda o oxigênio do ar e o carbono do carvão reagem, formando dois gases: o bióxido e o monóxido de carbono. Este último, insaturado, queima facilmente numa bela chama azul, igualzinha à do gás engarrafado ou de rua, que são seus primos ricos.
O bióxido de carbono, por se encontrar próximo ao fogo e em contato com mais carvão, é reduzido, isto é, transforma-se novamente em monóxido. Este fato permite melhorar o rendimento da produção do gás pobre e deve ser levando em conta no projeto dos geradores.
Um dos principais problemas do sistema é a presença do oxigênio, um sujeitinho muito ativo. A única maneira de evitar que faça estrepolias é agir como o fabricante de carvão: regular o fluxo do ar que ativa a zona do fogo. Nos motores de regime constante, como os estacionários, isto é um pouco menos difícil, se bem que as cargas a que estão sujeitos também variam. Nos automóveis, porém, a coisa é bem mais difícil pois além da variação das cargas, varia também, e enormemente, o regime de rotações.
Daí se conclui que, nos motores estacionários, o controle de ar deveria ser feito por um dispositivo automático, ao passo que nos motores de automóveis tal controle somente poderia ser efetuado a “ouvidômetro”.
Os dispositivos que geram o gás pobre, basicamente, podem ser de três tipos: tiragem para cima, para baixo e transversal (veja a fig.2). Examinaremos apenas o primeiro (2A), por ser de mais fácil compreensão
Quando alguém vai descer de um ônibus muito cheio, costuma levar consigo outros passageiros. Assim, o nosso gás pobre, ao sair do gerador, carrega pó de carvão, cinzas e destilados ácidos, além de vapor d’água. Sua temperatura, inclusive, é de cerca de 800º C nessa situação, sendo mister esfria-lo.

Em primeira instância, o gás pobre atravessa um “ciclone”, (veja fig. 3) no qual as impurezas mais pesadas depositam-se pelo efeito da força centrífuga, sofrendo, inclusive, abaixamento de temperatura.
Em seguida, passa por um ou dois filtros, que retêm as impurezas menores, resfriando-o ainda mais.
Na figura 4 vemos o esquema de um filtro, grande saco de algodão ou flanela, que deve ser facilmente acessível para limpeza. Outros tipos existiam, como os de banho de óleo, análogos aos filtros de ar.

Finalmente, o gás pobre, limpo, está pronto para ser aspirado pelo motor, estando a aproximadamente uns 20º C acima da da temperatura ambiente.
peso de ar, para formar a mistura combustível e isto é feito pelos “misturador”, de funcionamento análogo ao carburador. Deve, porém, receber de 1 a 1,5 partes em peso de ar, para formar a mistura combustível e isto é feito pelos “misturador”, de funcionamento análogo ao carburador.


Existiam vários tipos de misturadores, sendo o que aparece na fig. 5, de mistura anular, bastante eficiente. Observemos que o motor a gasolina ao ser adaptado para gasogênio, devia ter seu avanço aumentado, porque o gás pobre queima mais devagar. Inclusive, a taxa de compressão devia ser acrescida. Mesmo assim, o motor a gasogênio produz até pouco mais de 60% de sua potência original.



                                            Veículo andando com gasogênio (São Paulo, década de 40)


                                         Ônibus (Chevrolet Tigre) com gasogênio (Rio, 1944)


Ônibus da Empresa Viação Garcia, utilizando gasogênio (Londrina-PR, década de 40)






quinta-feira, setembro 10, 2009

Banco Central adota medida para elevar a oferta de troco


A distribuição de notas de baixa denominação e de moedas será ampliada para melhorar a qualidade do meio circulante e a disponibilidade de troco
Brasília – Com o objetivo de ampliar o volume e melhorar a qualidade das notas de R$ 2 e R$ 5 em circulação e também facilitar a distribuição de moedas metálicas, o Banco Central, durante o mês de setembro, vai fornecer às instituições financeiras cédulas e moedas por meio de trocas diretamente em suas dependências. Os bancos terão acesso a esse serviço, excepcionalmente sem custo, durante esse mês. As cédulas de R$ 2 e de R$ 5 são as que mais se desgastam, em função da intensa circulação. Em relação às moedas, o hábito de entesouramento da população faz com que, em algumas regiões brasileiras, os comerciantes reclamem da dificuldade para fornecer troco.
Aos comerciantes também será disponibilizado atendimento especial. A partir do dia 14/09, haverá, em todas as capitais do país, guichê de fornecimento de moedas e de notas de R$ 2 e R$ 5 em kits de R$ 100, de modo a facilitar e agilizar o atendimento. Os endereços serão divulgados no site do Banco Central. Essa medida visa a dar acesso a troco aos pequenos comerciantes. Os grandes comerciantes devem recorrer aos bancos comerciais que os atendem.

As solicitações de troca, por parte dos bancos, ao Banco Central devem ser feitas por telefone com, no mínimo, 48 horas de antecedência, quando serão informadas as quantidades de cédulas ou moedas demandadas. Em Porto Alegre e Salvador, onde não é possível realizar as operações diretamente no BC, as trocas serão efetivadas pelo Banco do Brasil. Para os bancos, a unidade mínima para fornecimento de cédulas será o maço, constituído por cem unidades de cédulas de R$ 2 e/ou R$ 5. No caso das moedas, a unidade mínima é o saco, com quinhentas ou mil unidades, dependendo da denominação, de R$ 0,05 a R$ 1,00.

O BC possui estoque suficiente de moedas para esses atendimentos, já que encomendou dois bilhões de moedas a mais para 2009, volume 56% maior que em 2008. O volume de cédulas também é superior ao do ano passado. Em 2009, houve um aumento de 67% na produção de cédulas de R$ 2, passando de 420 milhões para 700 milhões. A produção de cédulas de R$ 5 saltou de 255 milhões em 2008 para 400 milhões em 2009, um aumento de 57%. Mais da metade dessa produção já foi entregue pela Casa da Moeda e se encontra pronta para fornecimento ao público mediante troca.

As medidas adotadas visam não somente aumentar a oferta de troco mas também melhorar a qualidade do meio circulante, em especial das notas de baixa denominação que circulam muito e têm vida útil mais curta. O desgaste nas notas também torna mais difícil o reconhecimento das marcas de segurança.








quarta-feira, setembro 09, 2009

VEÍCULO DIFERENTE


ESTE "VEÍCULO" FOI DE UM PROPRIETÁRIO DE PIRACICABA.

É UM DOS RAROS, SE NÃO FOR O ÚNICO EXEMPLAR QUE CIRCULOU NO BRASIL.

ALGUÉM  SABE  O 

NOME DO "VEÍCULO"  ?




O estagiário justiceiro

Mauro Tavares Cerdeira*
Conhecido como Ricão, era um dos milhares, talvez milhões de estagiários dos cursos de Direito deste Brasil que já se disse varonil. Carreira que serviu a galgar pessoas ilustres à história desse País e do mundo todo, como o célebre Rui Barbosa, o fato é que Ricão, hoje em dia, não se sentia lá com a bola toda, nem com ela pela metade.
Saído do interior para a Capital de São Paulo, tinha em seu peito até então era um bastião de saudades, algumas misérias, umas raivas ou outras, umas pernas já engrossadas de tanto andar de cartório em cartório pra ver e pegar processos, quando não pra tomar broncas e nãos de respostas, e bem na sua lida profissional ficava sempre em dúvida quando lhe perguntavam o que é que fazia lá no escritório e onde iria chegar nessa vida.
A esperança remoçou, no entanto, quando Ricão encontrou uma oportunidade em uma grande empresa, do setor de telefonia móvel, destas que saem a toda hora na televisão e no mundo. Coisa grande, muita gente, salário para mais de duzentos maior; agora a coisa vai que vai!
Contratação imediata, pois que os negócios nestas empresas grandes andam como anda mesmo o mundo todo. Não há tempo para nada. Faz um ano a vida nova começou. Parece que foi mesmo ontem. E não deu tempo de nada. Ao Ricão não apresentaram nem o pessoal da empresa. Aliás, não tinha empresa. Era um escritório mesmo, mais ou menos igual àquele em que trabalhara antes, pois disseram que o jurídico funcionava ali mesmo, e a empresa, lá dentro, ele nunca viu, nem ninguém viu também.
E chegavam pilhas de processos, todos iguais, ou muito parecidos. Parecia que os demandantes combinavam entre si as demandas. E não havia tempo para nada. O Ricão fazia contestações, que eram iguais as outras contestações, e recebia "da central" propostas para acordos, que eram iguais a outras propostas para acordos, e corria para audiências, que eram iguais a outras audiências. E algumas vezes "era preposto", e outras vezes "era advogado", e corria por tribunais de bagatela por toda São Paulo, conhecia cada vagão de metrô e cada ônibus.
Passava o tempo e vez em quando chegavam regras novas. Agora Ricão não era mais preposto ou advogado, mas "preposto e advogado", tudo isso concentrado em um "estagiário", já que a lei agora isso permitia. E o Ricão, vez em quando, passava o dia rodando cartórios na lida de retirar e devolver processos. E vez em quando o dia passava mas parecia que não tinha passado, e por vezes o Ricão chegava à faculdade, à noite, e ficava em dúvida se tinha mesmo ido trabalhar durante o dia. E outro dia, na quinta, se dava conta de que estava no escritório desde segunda sem ter ido para casa ainda, mas não sabia mesmo muito bem se isso era verdade ou não, mas não confiava em ninguém para perguntar se realmente estava acontecendo.
E foi em fevereiro que uma coisa começou a mudar. Não eram só os juízes e cartorários que começaram a repetir. Nem as causas todas. Parecia que os demandantes, irritadiços, cansados, sempre olhando para ele com cara de "saco cheio", começaram a se repetir. Eram sempre os mesmos, todos os dias. E isso era ruim demais, pois passara a ter receio de encontrá-los. Era como se estivessem a cobrar-lhe uma mesma conta todos os dias. A conta do leite ou do pão, ou do telefone, no caso.
Em uma madrugada de março, já bastante esgotado, e depois de assistir umas palestras sobre contabilidade e balanço e economia das empresas, teve a nítida impressão de que todo mundo estava sendo enganado. Ele estava sendo enganado, o judiciário estava sendo enganado, incluindo a cartorária bonitinha que um dia lhe ofereceu um chocolate, o cara do estacionamento em frente ao fórum, o consumidor, os próprios autos, todo mundo! Na verdade, todo aquele seu mundo profissional talvez sequer existisse e fosse apenas a representação de um drama mesquinho para ocupar o cotidiano!
Na realidade, pensara, aquele teatro é apenas uma farsa, como qualquer outra! E sua razão não poderia ser facilmente descartada. A sua cabeça girava com a seguinte equação:
1) a empresa tem como certo, em um País com instituições falhas, a lesão recorrente de consumidores;
2) a empresa tem como certo também, em um País como o Brasil, com excesso de tarifação, mão de obra barata e baixa concorrência – alto grau de monopólio – alto grau de corrupção, uma elevada rentabilidade;
3) as indenizações no País, oriundas do Judiciário, por tradição e jurisprudência, e dada a média de renda da população, e considerando que em geral são oriundas dos tribunais de pequenas causas, são de nível muito baixo, ou muito inferior às de países democráticos desenvolvidos;
4) as despesas com o setor jurídico de massa, defesa – acompanhamento de audiência etc, são baixas e controladas
5) conclusão: a prestação e manutenção, pelas empresas, de um serviço de péssima qualidade, nestas circunstâncias, é altamente compensatório, mesmo com um elevado índice de resultados negativos nos processos de reclamação judicial, bastando para isso manter uma pequena (em relação ao passivo total) provisão de risco no passivo.
E a conclusão final do Ricão : para a companhia em questão, não interessa e nunca interessou o que o juiz vai decidir ou o que eu vou fazer ou se alguém vai reclamar ou se vai processar ou se o prédio da justiça vai terminar de cair. Está tudo contabilizado em uma pequena nota de passivo. Nós, de fato, não existimos. O que existe é um "numerinho" insignificante dentro do passivo. Eu, se existir, sou um pedaço microscópico da perna de um número do passivo escrito no balanço daquela empresa que está me matando.
E foi nessa madrugada que tocou o telefone da casa do Miltão, o único filósofo que o Ricão conhecia, apesar do Miltão ser meio beberrão e meio "amaconhado", e ainda estar, há uns quatro ou cinco anos, no primeiro ou segundo do curso da Unicamp; mas falar o que é, o Miltão sabe um tanto das coisas da vida, e serve a dar uns conselhos, daqueles de se ficar pensando.
O Miltão ainda estava acordado, que de fato dormia melhor durante o dia. E foi escutando toda a história do amigo, não deixando de se impressionar com aquela revolução que se passava na cabeça do Rico. Como é que nunca havia percebido a existência de vida inteligente dentro daquele projeto de engravatado? E o Ricão narrava suas conclusões e se indignava cada vez mais até que, num inesperado, narrou seu plano para o amigo, o plano para o qual precisava da opinião do Miltão, do seu aval, para o qual não sabia muito bem se tinha coragem ou se poderia fazer ou se era certo ou errado. Aquele negócio de linha ética que aprendera na faculdade, ou medo mesmo de ser preso ou coisa parecida, justo neste país que todo mundo faz bem o que quer, e uma raiva danada do danado do Renan, e do Palocci, enfim.
O Miltão ouviu o interlocutor, que amigo que não faz nada é mesmo para estas coisas, localizou a situação no tempo e no espaço, se permitiu uma pergunta, sobre se o amigo estava seguro das consequências do que faria, e sem resposta disse o seguinte :
"Sócrates tomou cicuta sem medo, pois em sua consciência, sabia o que encontraria após sua morte ! Caso você esteja em paz com sua consciência, siga o caminho traçado e você será feliz."
E o porra do Miltão desligou o telefone.
"Grande merda esse Miltão! Deu na mesma e ainda atrapalhou um pouco. E quem é que quer morrer ! Mas quer saber; se tem alguém que tem de resolver a vida da gente é a gente mesmo, e eu tô nessa !"
A partir dali, o plano foi seguido meticulosamente. Ricão esperou o dia em que teria seis audiências no mesmo dia, no Fórum Vergueiro, na mesma Vara, e em que estava escalado para fazer as seis sozinho, e mais, nenhuma audiência mais haveria naquele Fórum naquele dia, ou seja, somente ele, da sua companhia ou escritório, estaria lá. Esse dia demorou uns 40 dias e mais umas quarenta noites para chegar.
Chegou cedo, com seu melhor terno, e também o único, e um bolo no estômago. Ficou lá em pé, pois lugar para sentar pra variar não tinha. Esperou ser chamado. Entrou. Sentaram do outro lado uma moça e seu advogado. A Juíza se virou para ele e perguntou, como sempre: "Tem proposta doutor?" E ele disse: "Sim, Excelência, hoje as propostas são boas, e são por minha conta!". Ela sorriu, mas sem entusiasmo, logicamente pensando que era só uma brincadeira. Ela disse: "De quanto é?" E o Ricão:
"A proposta é de R$ 15.000,00 para a Requerente, e caso aceita, a Companhia estará também doando R$ 15.000,00 à Casa da Criança Feliz, R$ 15.000,00 ao Juizado para aquisição de novos equipamentos de informática, e R$ 15.000,00 para que o Juizado direcione a uma instituição de beneficência de sua preferência."
O susto foi mesmo grande e a Juíza perguntou se o estagiário tinha certeza daquilo antes de confirmar o aceite da requerente, que foi imediato. A ata foi feita e assinada rapidamente, e o estagiário requereu se seria possível adiantar a sua próxima audiência, fazendo todas em sequência, o que foi deferido. A escrevente foi ao toalete e a Juíza somente pediu licença para dar um telefonema. O advogado presente pediu para cumprimentar um colega lá fora antes mesmo da ata ter ficado pronta, tendo voltado após alguns minutos, e a autora da ação passou a fazer algumas ligações no celular, sem que ninguém se importasse. O Ricão ficou lá, conferindo se cortara mesmo as unhas naquela manhã. Naquele momento lhe passou pela cabeça um pensamento engraçado: era a primeira vez que realmente sentia, por alguns momentos, fazer jus ao seu apelido, ainda que com o dinheiro dos outros, sabe-se lá de quem.
A segunda audiência foi apregoada, antes mesmo da escrevente retornar do toalete. Lá fora o movimento já parecia bastante anormal. Pessoas agora se aglomeravam e se acotovelavam. Funcionários de outras varas conversavam em frente aos elevadores e muitas pessoas chegavam a todo momento pelas escadas. Outros demandantes e advogados que teriam audiências naquele dia contra a mesma companhia falavam alto e animados ao celular.
A Juíza, uma jovem de nem trinta anos, bastante simpática, deu sequência à sessão, iniciando a audiência seguinte, indagando animada ao estagiário se havia proposta no caso e se seria tal e qual ousada. O Ricão disse que sim, que aquele era um bom dia na companhia, que passara a rever alguns dos seus conceitos:
"Neste caso estamos sugerindo R$ 25.000,00 para a cliente da companhia, que mesmo em face da demanda não nos abandonou até hoje, continuando fiel, e caso haja concordância mais R$ 20.000,00 para o Lar de Idosos sediado aqui no bairro; R$20.000,00 para uma confraternização dos servidores deste Fórum, e R$ 35.000,00 para "a" ou "as" instituições indicadas pelo Juízo."
A escrevente engasgou com uma barra de cereais que comia, passou a tossir, encheu os olhos de lágrimas, e saiu correndo da sala se desculpando com a Juíza com uma expressão de "não tem outro jeito" e abanando as mãos. A Juíza confirmou o aceite com uma requerente boba-alegre e um advogado nas nuvens, uma funcionária da secretaria entrou para conferir a informação; a Juíza então disse que agora ela que precisaria usar o banheiro, antes pedindo para a mesma funcionária presente indicar outra instituição beneficente diferente da anterior, e umas onze ou doze pessoas que estavam na sala assistindo a audiência saíram e abriram seus celulares. Quem passou a fazer ligações animadas foi também a cliente do advogado, que ganhou um beijo desse e deu também uma beijoca no Ricão.
Nessa altura, em que a Escrevente voltava para fazer a ata, com muita dificuldade para entrar na sala, e a Juíza falava ao celular no meio das escadarias entre os andares, já havia um congestionamento em uma das vias da Av. Vergueiro e uma movimentação incomum de pedestres na calçada, e acabara de chegar um carro de uma TV local. A terceira audiência então foi chamada.
Terminada a quinta audiência, o Ricão já havia gasto da empresa R$ 720.000,00, afora custas e despesas processuais. Não havia mais condições de continuidade das audiências. O tumulto era geral. Os funcionários da companhia enviados para barrar ou matar o Ricão, a qualquer custo, não tinham conseguido chegar até o oitavo andar, onde ele estava. A parte e o advogado da sexta audiência estavam, juntos, para ter um ataque cardíaco. A Av. Vergueiro estava intransitável. Toda a imprensa de São Paulo estava lá. O Ricão pediu para a Juíza para constar, pelo menos, a proposta de acordo da sexta audiência em pauta, mas o corpo de bombeiros ordenou o início da evacuação do prédio, e então nada feito. Três advogados dos que haviam sentado à mesa com o Ricão momentos antes fizeram questão de escoltá-lo na saída, cuidando assim da sua segurança.
Até sair finalmente do Fórum, devidamente escoltado juridicamente, o Ricão demorou mais cerca de 50 minutos. Lá embaixo, a TV, Rádios e Jornais diversos. Ao sair, o herói foi reconhecido e rodeado por repórteres. Queriam saber o que tinha ocorrido, a razão de sua atitude, logicamente não autorizada pela empresa. O que levara um estagiário a agir daquela forma? E até isso o Ricão já tinha em seu plano!
Para cerca de trinta ou quarenta microfones postados em seu redor, naquele final de tarde de quarta feira, o Ricão prestou as seguintes declarações:
"Pessoal, peço sua compreensão e vou ser rápido, pois o dia tem me sido um pouco pesado. Vou falar e depois infelizmente não poderei responder a perguntas no dia de hoje. Simplesmente cansei de tudo isso. Cansei de ver as mesmas pessoas com os mesmos problemas que deveriam ser tratados de forma sistêmica, com uma atitude séria e coordenada, terem de vir aqui individualmente, repetir um a um o drama de todos. Cansei de ver a movimentação diária de todo um sistema por causa de um aparelhinho celular, em uma atitude egoísta, coisa que poderia ser resolvida apenas com um pouco mais de respeito. Cansei de fazer tudo igual todo dia, de nunca criar, de só repetir. Cansei de só pensar, todos os dias, no Charles Chaplin dizendo "não sois máquina, homens é o que sois", e no entanto não poder fazer nada com minha inteligência, além de transformá-la em algo maquinal. Cansei de não ser gente, de viver pelas contas, pelos cálculos, de advogar pelos cartórios, de contar processos. Sou muito novo para tudo isso. Meu mundo ainda é novo. Eu ainda tenho um amanhã. Obrigado por toda atenção e por seu precioso tempo !"
E o estagiário foi andando sozinho ! No caminho foi pensando em quem mesmo teria tomado cicuta, se era o Sócrates ou o Sófocles, ou até o Tales, aquele de Mileto. Não importava mais ! A sua escolta ficou parada meio pensativa, olhando; e depois foi tomar um chope, que ninguém é de ferro.
Não se sabe ao certo do destino do estagiário da nossa história. Uns dizem que andou pela Ana Maria Braga e Hebe Camargo, passando pelo Jô Soares. Outros que teve ele com o Delegado Protógenes dando palestras por aí. Há ainda os que dizem que por trás dele havia interesses transnacionais, da concorrência voraz e até terroristas. Há comentários de que trabalha para escritórios de advocacia do consumidor, nos USA. Alguns dizem que o nosso estagiário nunca existiu, que de fato não existem estagiários famosos. Outros ainda dizem que os processos não existem, são instrumentos de resolução de lides não materializados.
O que eu sei e posso dizer com certeza, é que pelo menos em algum lugar da minha mente, no subconsciente ou inconsciente, ou seja lá onde for, o estagiário justiceiro existe, e talvez eu tenha um pouco dele, ou tenha me parecido um pouco com ele um dia, só um dia, ou todos nós tenhamos.
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*Advogado do escritório Cerdeira Chohfi Advogados e Consultores Legais




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