"O boato é um ente invisível e impalpável, que fala como um homem, está em toda a parte e em nenhuma, que ninguém vê donde surge, nem onde se esconde, que traz consigo a célebre lanterna dos contos arábicos, a favor da qual se avantaja em poder e prestígio, a tudo o que é prestigioso e poderoso."
Machado de Assis
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quinta-feira, julho 22, 2010
8 x 85 ...
Frase do Senador Cristovão Buarque
"NO FUTEBOL, O BRASIL FICOU ENTRE OS 8 MELHORES DO MUNDO E TODOS ESTÃO TRISTES.
NA EDUCAÇÃO É O 85º E NINGUÉM RECLAMA..."
by Jayme
"NO FUTEBOL, O BRASIL FICOU ENTRE OS 8 MELHORES DO MUNDO E TODOS ESTÃO TRISTES.
NA EDUCAÇÃO É O 85º E NINGUÉM RECLAMA..."
by Jayme
quarta-feira, julho 21, 2010
terça-feira, julho 20, 2010
sábado, julho 17, 2010
Irineu Laudelino Lopes
PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado, 17 de julho de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.tribunatp.com.br/
ENTREVISTADO: Irineu Laudelino Lopes
Irineu Laudelino Lopes é o comerciante mais antigo do mercado municipal de Piracicaba, está a 64 anos na ativa. Formado pela lendária “Escola do Zanin”, quando jovem atravessava o Rio Piracicaba a nado, sócio do Clube de Regatas, remava sua catraia até onde hoje existe a “Ponte do Morato” e voltava rio acima, remando. Foi atleta campeão e presidente do Jaraguá Futebol Club. O Mercado de Piracicaba teve como construtor o engenheiro Miguel Asmussen, que entregou a obra pronta em 28 de fevereiro de 1887. A inauguração e o inicio do funcionamento aconteceram no dia 5 de julho de 1888. Esse intervalo entre a construção e o início efetivo das atividades, foi em decorrência da necessidade de preparar o entorno do prédio e, sobretudo pela confecção do regulamento de uso do Mercado, tanto pelos permissionários, pelos fornecedores como pelo publico consumidor. Tratava-se de uma nova maneira de comercializar, diferente da praticada até aquela data. Uma mudança significativa de hábitos e costumes, lembrando que no dia 13 de maio de 1888 foi sancionada a Lei Áurea, abolindo a escravidão da raça negra. A comissão formada por Prudente de Moraes e Paulo Pinto foi responsável pela elaboração do Projeto de Regulamento do Mercado de Piracicaba, sendo o mesmo apresentado em sessão de 15 de maio de 1887 junto a Assembléia Legislativa Provincial. Entre as peculiaridades, o artigo 18 diz que é proibido dentro dos limites do Mercado: “1-) O ajuntamento de pessoas ociosas que não estejam comprando nem vendendo e que possam perturbar o expediente de quem compra ou vende; 2-) Fazer algazarra e praticar atos ou proferir palavras imorais; 3-) Os ébrios, turbulentos e vadios; 4-) Sujar e danificar qualquer parte do edifício, escrever suas paredes, pintar,borrar,etc. 5-)Fazer fogo dentro do edifício e quatro metros em redor do mesmo, 5-) Amarrar animais nas grades ou nas árvores plantadas para decoração dos pátios do Mercado”, conforme consta nas atas existentes na Câmara Municipal. Com o passar do tempo essas regras sofreram mudanças, ou não teríamos os quitutes fritos na hora e um delicioso cafezinho, muito procurados no Mercado Municipal de Piracicaba. Por ali desfilaram piracicabanos de diversas gerações, criando vínculos e alianças. Atualmente o comerciante mais antigo do Mercado Municipal é Irineu Laudelino Lopes, há 64 anos trabalha em sua banca no Box número 19, que já pertencia a seu pai. Filho de Miguel Lopes e Antonia Moretti nasceu no bairro rural Pau Queimado, Piracicaba, no dia 28 de maio de 1931, casado com Aparecida Costa Lopes, filha de Francisco Luis Costa e Otilia Gazziolli Costa. É neto de Isidoro Lopes e Matilde Alcarde Lopes, seus tios Isidoro Lopes e Antonio Lopes foram comerciantes muito conhecidos.
A família do senhor mudou-se do Pau Queimado para a cidade?
Mudamos para a Avenida Dona Jane Conceição, depois mudamos para a Rua Sud Mennucci. Fiz o primário no Grupo Escolar Barão do Rio Branco, Da. Zica foi a minha primeira professora, tive aulas também com Da. Mimi, Dona Otília, o diretor era o Salustiano, depois veio o Aparício. Nessa época além das minhas irmãs Inês, Maria e Celina, eu era o único neto homem, meu avô passava na minha casa e me levava para o sítio, passear. Íamos de trole, pescava lambari, a noite ia com o meu tio Antonio até um ribeirão que existia no sítio, para tirar o peixe cascudo na toca. Aprendi a nadar no Ribeirão do Enxofre, tinha quatro “poços” para nadar lá. Estudei o ginásio no Instituto Piracicabano. Fiz o Curso Técnico em Contabilidade na Escola de Comércio Cristovão Colombo, do Pedro Zanin, ficava em cima do Cinema Politeama, de vez em quando passavam uns filmes de faroeste, nós escutávamos o tiroteio, íamos assistir ao filme. O melhor recreio de escola quem possuía era a nossa, ao sairmos da sala de aula estava com todo o jardim da praça central a nossa frente. Sou formado na turma de 1959. O meu pai e o meu tio Antonio tinham comprado o box no mercado em 1946, eu fui trabalhar com eles, fazia entrega de compras com uma carrocinha manual, com rodas de madeira e aro de ferro. Os fregueses iam, compravam e eu entregava. Infelizmente quase todos já faleceram Lembro-me de entregar na casa de Antonio Kok Leme, gerente da Casas Pernambucanas, do Antonio Sallun, da Dona Eutália, e outros fregueses. A compra era feita mensalmente, com isso eu tinha que fazer força para levar o carrinho, as ruas centrais eram calçadas em paralelepípedo, mas ainda existiam muitas ruas sem calçamento nenhum. Os vendedores de verdura traziam do sítio seus produtos em carrinho de tração animal, alguns vendedores de frutas como laranjas colocavam seus caminhões no pátio em frente ao mercado, esses veículos permaneciam meses no mesmo local, com outra condução abasteciam esses caminhões, eles não queriam perder o ponto. Após algum tempo meu pai e meu tio dividiram o Box entre si, ficando cada um com 25 metros quadrados de área de venda. Um pouco mais de tempo meu tio vendeu para Domingos Rafael, meu pai acabou adquirindo. O prefeito Luciano Guidotti em seu primeiro mandato reformou o mercado, com essas mudanças o nosso Box perdeu quase metade da área original.
Antes de adquirir o comércio no mercado qual era a atividade do seu pai?
Meu pai era frangueiro, sai muitas vezes com ele, na segunda feira ia para o Campestre, na terça feira ia para o Pau Queimado, na quarta ia á Dois Córregos, na quinta permanecia em casa para realizar as compras da encomendas feitas pela clientela, sexta feira ia para os Marins e no sábado para o Chicó. Com chuva ou com sol ele saia de manhã cedo. Meu pai era um homem muito calmo, nunca vi nenhuma pessoa igual. Ele tinha um burro branco chamado “Sereno”, o burro era mais calmo do que ele! Meu pai nunca usou um reio. Se tivesse uma touceira de capim ao lado da estrada, o burro ia lá e comia, meu pai esperava o burro comer para prosseguir a viagem.
O prédio do mercado mudou muito?
Olhando de frente para o mercado parte do lado esquerdo do prédio existente hoje, era descoberta, ali tinha a Arca de Noé, propriedade de Osni Massouh, o Galzerani, ficavam em barracas na área descoberta, inicialmente os produtos eram expostos sobre um pano estendido no chão, depois fizeram umas mesas de madeira. O mercado era cercado por um muro de um metro e pouco encima da qual vinha uma grade, as mercadorias ficavam a vista de quem estava do lado de fora, ninguém roubava. O cuidado maior era colocar os produtos mais sensíveis a chuva embaixo das bancas. Na esquina onde hoje há um prédio com uma farmácia na esquina, localizava-se o Hotel dos Viajantes.
Como era Da. Jane Conceição?
Era uma senhora muito fina, seu marido Dr. Jorge Pacheco Chaves era de estatura baixa. Eu era criança, nós escutávamos o cavalo que vinha batendo o sininho dependurado no pescoço, nós íamos correndo para abrir a porteira para eles passarem, sempre ganhávamos um dinheirinho. A porteira ficava nas imediações da Igreja São José, onde hoje é a Avenida Conselheiro Costa Pinto.
O senhor vendia fumo de corda?
Vendi sim, naquele tempo o fumo Bairrinho era muito famoso, era um fumo fraco, existia um fumo forte que vinha de Socorro, Bragança Paulista. Com o canivete fazia um pequeno corte e pela massa do fumo classificava suas qualidades. O fumo do Bairrinho, quando o miolo estava bem amarelinho ele era um fumo bem fraquinho, muito bom. Alguns clientes levavam por quilo, outros levavam um rolo de fumo inteiro. Um produto muito gostoso era a lingüiça de porco envolta em banha e embaladas em latas da marca Oderich. A lata de salada de frutas era uma delicia. O figo ramy, vinha em uma delicia.
Qual é o horário de funcionamento do mercado?
Para o público sempre a partir das seis horas da manhã, para os verdureiros abria às quatro horas da manhã. Fecha às cinco e meia da tarde. Se o comerciante necessitar ele pode permanecer no local fora desses horários.
Quantos Box existem hoje no mercado?
São uns setenta permissionários.
Hoje o senhor trabalha com uma linha de produtos diferenciada, como se deu essa especialização?
Inicialmente era um típico armazém de secos e molhados, atualmente trabalho com mais de 100 itens como trigo para quibe, farelo de trigo, farelo de aveia, gergelim, levedo de cerveja, linhaça, flocos de aveia, guaraná em pó. Um amigo, já falecido, o Osvaldo Bracalion sugeriu que eu deveria trabalhar com alguns desses produtos, achei a sugestão interessante e a adotei. Desenvolvi novos fornecedores.
A febre de consumo da “Ração Humana” ainda está firme?
Caiu um pouco. Algo parecido ocorreu com a aveia. A TV Globo em sua programação divulgou as qualidades da aveia, isso em uma sexta feira. Por coincidência eu tinha feito um pedido de aveia que chegou sexta feira a tarde. No sábado pela manhã começou a haver uma procura enorme por aveia. O meu estoque de aveia que deveria ser por um período maior em quatro dias terminou. Fiz mais um pedido, que rapidamente foi entregue. Em seguida começou a faltar aveia no mercado, eu consegui cobrir a demanda. Não me esqueço de uma senhora que me perguntou: “-O senhor tem aveia?”, respondi que tinha, ela então me disse que queria cinco quilos de aveia. Curioso, perguntei-lhe para o que seria toda aquela quantia toda, ela respondeu que seria para seu consumo, afirmando: Imaginei e disse-lhe que ela deveria ter uma família muito grande, ao que ela afirmou: “-É só para mim! Deu na televisão que é boa para isso, para aquilo.”. Sugeri que levasse apenas um quilo, o que já era bastante aveia para uma única pessoa.
A que horas o senhor dirige-se ao mercado para trabalhar?
Às cinco e meia da manhã. Fecho às cinco e meia da tarde. Aos sábados fecho à uma hora da tarde, e domingo ao meio dia. Quando meus pais eram vivos, as vezes eu tirava umas férias.
Onde o senhor conheceu a sua esposa?
Foi no meu caminho para o trabalho, meu pai saia de casa mais cedo e eu saia um pouco mais tarde, umas seis horas da manhã. Conheci a Aparecida quando ela voltava da compra que ia fazer em um açougue situado na Rua Governador, quase na esquina da Rua Riachuelo onde trabalhavam o Caneva e o Zambello.
O senhor jogou futebol na várzea?
Joguei como lateral direito e zagueiro central do Jaraguá Futebol Club, a camisa era vermelha, preta e branca. O primeiro campo ficava na esquina da Rua do Rosário com Avenida Dona Jane Conceição, onde depois foi a Angemar, hoje funciona um conjunto de lojas. O terreno ia até a Rua Campinas. Nessa época o Romeu Gomes de Oliveira, da Rodomeu, montou um açougue na Avenida Dona Jane Conceição, próximo ao campo de futebol. O Chico Pachani fez sozinho outro campo de futebol, na quadra logo abaixo. Quando o Jaraguá Futebol Club saiu desse primeiro campo foi para o local posteriormente ocupado pela Alvarco, onde hoje existe uma escola técnica.
Por muitos anos quem foi o presidente do Jaraguá Futebol Club?
Foi Abel Pereira, seu filho Jaime Pereira estava sempre presente.
Qual era o maior rival do Jaraguá?
Era o MAF, conhecido como Leão da Paulista. O nome MAF é formado pelas iniciais de Manoel Ambrósio Filho, empresário de São Paulo, proprietário da indústria de máquinas de costura Leonan, que fundou o time. Conheci muito o Olinto alfaiate, que foi presidente do MAF. Jogávamos contra os times existentes na época: Vera Cruz, Nacional, Unidos Club. Comecei a jogar em 1948 e parei em 1962, 1963.
Em que igreja foi o seu casamento?
Foi na Igreja dos Frades, no dia 22 de outubro de 1961, o celebrante foi Frei Liberato de Gries.
Dona Aparecida a senhora trabalhou muito tempo com costura fina?
Costurei por quase cinqüenta anos, a minha primeira maquina de costura comprei em 1955 na loja de propriedade do Cassano, que ficava em frente ao Mercado, onde hoje há uma agencia da Caixa Econômica Federal. Comecei a costurar com dezessete anos, parei há uns três anos. Fazia roupa de noivas, para festas de formaturas. Aos dezenove anos fiz o primeiro vestido de noiva para uma prima de Indaiatuba.
A senhora trabalhou ainda bem jovem com uma costureira famosa em Piracicaba?
Era uma costureira requisitada pelas senhoras da alta sociedade de Piracicaba, chamava-se Generosa Osoris Angeli, lá eu bordei muito para vestidos de noivas. Quando passei a exercer a profissão por conta própria mandava os bordados para serem feitos por outras pessoas. Naquele tempo usavam-se mais brocados, rendas. Meu pai Francisco Luiz Costa era cursilhista, ministro da eucaristia, ele trabalhou muitos anos como metalúrgico na Morlet, que ficava em um galpão onde hoje funciona a Calhas Pizzinatto, na Rua da Glória. Foi um tempo em que o fornecimento de água era sofria muitas interrupções, íamos buscar água na “Bica do Morlet”.
sábado, julho 10, 2010
Clélia Del Tedesco Saipp
PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 10 de julho de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
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http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: Clélia Del Tedesco Saipp
A rápida evolução tecnológica em que vivemos afeta diretamente nossos hábitos e costumes. Nas décadas de 50, 60, era comum um menino sair pelas calçadas, quando existissem, rodando com a mão um pneu velho, ou ainda um aro de metal ou borracha era conduzido por um longo arame, ou ferro fino de construção, em forma de “U” tendo às vezes até um cabo de madeira, era o famoso “arquinho” e se mostrava indispensável para que mais rapidamente a criança pudesse ir fazer os mandados da mãe Um cabo de vassoura transformava-se em um cavalinho de pau. Com caixinhas de fósforos vazias e uma linha de costura fazia-se o telefone. O papagaio que depois passou a se chamar pipa é uma brincadeira que necessita condições climáticas de ventos constantes, próprias do mês de agosto. O bodoque que passou a se chamar estilingue era feito com uma forquilha de madeira, as melhores eram de pé-de-goiaba, um par de tiras de câmara de ar de bicicleta, de 25 centímetros de comprimento e um centímetro de largura e um pedaço de couro que unia as duas tiras de borracha. Era usado para atirar pedras com muita força. O jogo da bolinha de gude aparecia num determinado período do ano e depois de alguns meses cessava a brincadeira. Havia a perna de pau, o pião de madeira. O carrinho de rolimã ou carrinho de rolamentos era feito artesanalmente usando madeira e rolamentos.
Fazer uma bola de pano era uma arte. As meninas tinham poucas variações de brinquedos, em geral brincavam de bonecas que podiam ser feitas de pano recheadas com retalhos, peteca feita de palha de milho, brincavam de fazer guisadinhos, com comidas feitas em latinhas de goiabada, marmelada, massa de tomate e sardinha, havia as cirandas ou brincadeiras de roda. Em 1961, quando o então presidente recém-empossado Jânio Quadros proibiu o lança-perfume, foram produzidas bisnagas em plástico no mesmo formato das proibidas, bastava colocar água e apertar, foi uma febre no país inteiro. Muita criança de famílias mais abastadas perdeu o sono até ganhar o pequeno projetor movido à manivela, cujos filmes eram feitos de papel-manteiga desenhados com duas imagens e duas opções de movimento. Chamava-se Cine Barlan. Carrinhos feitos de folha de lata eram importados e caros. Os brinquedos de lata prensada foram fabricados até a década de 60. Inicialmente chamada como matéria plástica, na década de 60 o brinquedo plástico tomou grande impulso. Piracicaba tinha alguns templos de consumo infantil, entre outros, a Loja da Lua, Ao Cardinali Presentes, Casa Portuguesa, Casa dos Presentes. Clélia Del Tedesco Saipp e Alcides Saipp são nomes extremamente populares no Bairro da Paulista. Foram padrinhos de muitos casamentos e batizados de clientes que se tornaram amigos, afilhados e compadres.
A rápida evolução tecnológica em que vivemos afeta diretamente nossos hábitos e costumes. Nas décadas de 50, 60, era comum um menino sair pelas calçadas, quando existissem, rodando com a mão um pneu velho, ou ainda um aro de metal ou borracha era conduzido por um longo arame, ou ferro fino de construção, em forma de “U” tendo às vezes até um cabo de madeira, era o famoso “arquinho” e se mostrava indispensável para que mais rapidamente a criança pudesse ir fazer os mandados da mãe Um cabo de vassoura transformava-se em um cavalinho de pau. Com caixinhas de fósforos vazias e uma linha de costura fazia-se o telefone. O papagaio que depois passou a se chamar pipa é uma brincadeira que necessita condições climáticas de ventos constantes, próprias do mês de agosto. O bodoque que passou a se chamar estilingue era feito com uma forquilha de madeira, as melhores eram de pé-de-goiaba, um par de tiras de câmara de ar de bicicleta, de 25 centímetros de comprimento e um centímetro de largura e um pedaço de couro que unia as duas tiras de borracha. Era usado para atirar pedras com muita força. O jogo da bolinha de gude aparecia num determinado período do ano e depois de alguns meses cessava a brincadeira. Havia a perna de pau, o pião de madeira. O carrinho de rolimã ou carrinho de rolamentos era feito artesanalmente usando madeira e rolamentos.
Carrinho de rolimã
Fazer uma bola de pano era uma arte. As meninas tinham poucas variações de brinquedos, em geral brincavam de bonecas que podiam ser feitas de pano recheadas com retalhos, peteca feita de palha de milho, brincavam de fazer guisadinhos, com comidas feitas em latinhas de goiabada, marmelada, massa de tomate e sardinha, havia as cirandas ou brincadeiras de roda. Em 1961, quando o então presidente recém-empossado Jânio Quadros proibiu o lança-perfume, foram produzidas bisnagas em plástico no mesmo formato das proibidas, bastava colocar água e apertar, foi uma febre no país inteiro. Muita criança de famílias mais abastadas perdeu o sono até ganhar o pequeno projetor movido à manivela, cujos filmes eram feitos de papel-manteiga desenhados com duas imagens e duas opções de movimento. Chamava-se Cine Barlan. Carrinhos feitos de folha de lata eram importados e caros. Os brinquedos de lata prensada foram fabricados até a década de 60. Inicialmente chamada como matéria plástica, na década de 60 o brinquedo plástico tomou grande impulso. Piracicaba tinha alguns templos de consumo infantil, entre outros, a Loja da Lua, Ao Cardinali Presentes, Casa Portuguesa, Casa dos Presentes. Clélia Del Tedesco Saipp e Alcides Saipp são nomes extremamente populares no Bairro da Paulista. Foram padrinhos de muitos casamentos e batizados de clientes que se tornaram amigos, afilhados e compadres.
Da. Clélia, a senhora nasceu em que dia?
Nasci em 9 de julho de 1932, meu marido as vezes brincava dizendo que pelo fato de ter nascido nessa data eu era uma “revolucionária”. Sou natural de Mococa, fiz o primário e o curso normal em Monte Santo de Minas, meus pais José Del Tedesco e Elza Di Conti Del Tedesco tinham um depósito de queijos, compravam em Minas e traziam para Mococa. De lá mudamos para Londrina, após uns dois anos mudamos para Bela Vista do Paraíso, também no Paraná, de onde viemos para Piracicaba.
A jovem Clélia
A jovem Clélia
Onde a família estabeleceu residência em Piracicaba?
Tínhamos um armazém na Rua Benjamin Constant, 2333. O Alcides tinha um bar bem em frente, onde hoje há um posto de gasolina, na esquina da Avenida João Conceição com Rua Benjamin Constant. O Alcides Saipp, meu marido, nasceu em Rio Claro, no dia 23 de dezembro de 1923, seus pais eram Lucia Saipp e Antonio Saipp. Na época a Avenida João Conceição era de terra, quase em frente a nossa casa havia uma fabrica de barcos de madeira.
A família da senhora mudou-se para a Rua do Rosário esquina com a Avenida Dr. João Conceição?
O meu pai construiu a casa existente até hoje, há inclusive um salão comercial anexo a casa. Havia poucas casas nas imediações, lembro-me dos vizinhos, Jorge Razera, Pedro Razera, João Sabino Barbosa, sua esposa Dona Vitalina, Isidoro Lopes, Rosa Canaan Nassif, muito amiga da minha mãe e com cuja filha Georgina, eu ia quadrar o jardim no centro. Descíamos a pé pela Rua Alferes José Caetano visitava a sua irmã Josefa e íamos até a praça, assistíamos a um filme no Cinema São José, no Broadway, quadrávamos o jardim e voltávamos para casa. Tudo a pé. Quando havia um filme muito concorrido o bonde ia lotado. Ao lado da nossa casa há uma rua particular que dá acesso a um conjunto de casas, ainda era fechada com cerca de arame quando aconteceu um fato que guardo na lembrança até hoje. Ainda era tudo terra, um dia vi um carro fúnebre entrando pela rua particular, comentei o fato com a minha mãe, ele disse-me que a Dona Teresa estava grávida e havia falecido. Era muito cedo, estava frio, resolvi levar um café fresco, ao chegar à casa o corpo estava na sala sendo velado na sala, os filhos dela, conforme iam acordando iam pedindo: “-Mãe! Quero leite!’ ou “-Mãe me dá o café!”. Ela tinha passado mal a noite, faleceu de madrugada, era costume naquela época velar os mortos em suas próprias casas. Nunca me esqueci desse episódio.
As ruas do bairro já eram pavimentadas?
A Rua do Rosário era mão dupla, terra vermelha, o movimento dos caminhões que subiam e desciam por ela, levantavam uma poeira triste. Minha mãe cultivava uma horta no quintal da sua casa.
Alcides Saipp
Quando a senhora casou-se?
Casamos em 24 de maio 1953, o Alcides trabalhava como serralheiro com seus irmãos Hélio e José. Uma loja de utilidades domésticas e presentes que existia na Rua Governador, próxima a Avenida Dr. Paulo de Moraes havia sido fechada. Foi quando eu disse ao Alcides que podíamos tentar estabelecer uma loja nesse ramo, já que não havia nas proximidades uma loja que substituísse a que havia sido mudada para o Largo São Benedito. O Alcides passou a procurar um local para abrir a loja, foi quando meus pais ofereceram o salão anexo a casa deles, que estava vazio. Assim começamos ali o nosso estabelecimento comercial. Por volta de 1962 construímos o prédio onde até hoje funciona a nossa loja. Foi o segundo sobrado construído no Bairro da Paulista. A Casa Portuguesa, que ficava no centro, era umas das grandes lojas do ramo, muito conhecida, que infelizmente encerrou suas atividades em conseqüência da queda do Edifício Luiz de Queiroz, o Comurba, quando vários membros da família do proprietário, o Seu Francisco, foram fatalmente atingidos. A loja Ao Cardinali, outra grande expressão do comércio piracicabano, sofreu um incêndio.
A clientela da sua loja é muito fiel?
Às vezes vou até lá, só para me distrair, de vez em quando chega e pergunta se a loja ainda pertence a nossa família. A pessoa então relata que vinha quando era criança ainda, vinha para comprar brinquedo, e que agora está comprando brinquedo para seus filhos.
Seu Alcides tinha algum hobby?
Ele gostava muito de assistir uma partida de futebol do XV de Novembro, ia também até um campo de bocha muito famoso que existia na Avenida Edgar Conceição, entre a Rua da Palma e a Rua Campinas.
A senhora tem quantos filhos?
São três filhos, Wilney, Marilney, Adilney. Sendo que o Adilney embora também tenha feito curso superior decidiu dar continuidade ao comércio que nós fundamos. O sobrenome Saipp é de origem alemã.
A loja tinha muitos clientes que moravam na zona rural?
Tinha muitos, quando havia casamento eles vinham de caminhão, os noivos vinham na cabine e os padrinhos e demais convidados na carroceria do caminhão, que vinha bem cheia. Iam até a Igreja dos Frades, onde a cerimônia era celebrada, na volta paravam em frente à loja, desciam e compravam os presentes para os noivos. Os convidados pediam: “-Pare na Casa dos Presentes para comprar presente para a noiva!”. Era aquele alvoroço! Embrulhar os presentes que era o detalhe, nós comprávamos folhas de papel pardo e papel de seda, como o papel de seda era muito caro, era colocada apenas a metade da folha, ou seja, o presente era embrulhando com o papel pardo, ficando apenas uma dobrinha de papel de seda. Na época fazia muito sucesso o licoreiro, que era composto por uma garrafinha, uma bandejinha e seis cálices pequenos. Um convidado da festa vinha e comprava, depois vinha outro, mais outro, com isso a noiva ganhava muitos licoreiros, eles achavam bonito, compravam o que gostavam, para dar aos noivos. Embrulhávamos os presentes e eles seguiam para a festa, convidados e presentes iam embora, no caminhão. Os padrinhos davam jogo de panelas em alumínio, pratos, jogo de jantar, ou um faqueirinho. Era comum que os padrinhos pagassem as bebidas.
A senhora e Seu Alcides foram padrinhos de muitos casamentos?
Fomos sim, de muitos casamentos e de alguns de batizados. Na Semana Santa e no mês de agosto não havia casamentos. Havia certa superstição com relação ao mês de agosto, diziam “agosto mês do desgosto”, com isso não se casava nesse mês. Era comum a venda de manteigueiras, a manteiga vinha embalada em papel ou caixinha de papelão. Bem mais tarde surgiram as travessas da marca Pyrex, vendia-se muito esses produtos. Hoje já vem em embalagem própria para consumo e armazenamento. Nós vendíamos bacias enormes, próprias para banho, não havia água encanada no bairro. Nós tínhamos um poço, com uma bomba, a água era armazenada em um reservatório e de lá distribuída para a casa. Poucos tinham esse recurso, a maioria tomava banho de bacia. O maior sacrifício quando vendíamos uma bacia dessas, era embrulhar. O cliente tinha vergonha de sair com ela sem embrulhar. Usávamos jornais para embrulhar as bacias. Mesmo outras mercadorias eram embrulhadas em jornais, não havia sacolas plásticas. As pessoas traziam de casa sua própria sacola. Uma panela de alumínio, meia dúzia de pratos, era tudo embrulhado em jornal. Os brinquedos eram levados em sua própria caixa, não havia nada de sacola não.
O que as crianças gostavam de ganhar?
Gostavam de ganhar bolas, carrinhos, bonecas. Chegamos a vender bonecas e cavalinhos de papelão.
Cine Barlan, projetor de imagens movido a manivela
A senhora viajava de trem?
Nós íamos á São Paulo de trem para fazer compras na Rua 25 de Março. Levantávamos de madrugada, embarcávamos no trem logo cedo, o Alcides ia com uma mala e eu ia com outra. Levávamos um lanche de casa, não se consumia em restaurantes, água mineral não era comum consumir-se, se estivesse com sede pedia um copo de água no local onde estávamos fazendo compras. Abria-se a torneira e tomava um copo de água. Era isso que existia. Fazíamos as compras, no final da tarde íamos a pé até a Estação da Luz, tomávamos o trem de volta á Piracicaba e aqui chegávamos ás 10 horas da noite. Da estação até a nossa casa também vínhamos a pé, com as malas. Foi assim que começamos, a vida era dura naquela época. Até hoje, algumas vezes quando meu filho vai fazer compras em São Paulo eu o acompanho, ando bastante a pé percorrendo diversos fornecedores. Qualquer lugar para onde você for para conhecer tem que ir a pé, isso se aplica até em viagens turísticas.
A senhora acha que hoje a população se alimenta melhor?
Há sem dúvida uma maior quantidade de alimentos disponíveis, porém a qualidade é inferior á de algumas décadas. Muito pior. Naquela época obtinha-se o necessário com muito sacrifício, mas era tudo natural. Na horta que a minha mãe plantava, em seu quintal, não se usava adubo ou veneno. Plantava-se tomate, milho, criava-se galinha, porcos. A criação de porcos em fundo de quintal deixou de ser permitida, até então quase todo mundo criava um porquinho, que era tratado com restos de comida e milho, não havia ração e a enorme quantidade de produtos químicos utilizados para a sua fabricação. Atualmente as frutas têm um visual mais bonito, porém são menos saudáveis.
O comerciante tem sua parcela de psicólogo?
Eu via e ouvia muita coisa. Opinião diferente entre algumas noras e sogras era muito comum existir. A sogra vinha e falava a respeito de um objeto, suas utilidades e propriedades. A nora em outra ocasião vinha com outra opinião a respeito. Eu escutava apenas, eles tinham que viverem a própria vida e eu a minha. Quem está no comércio não pode tomar partido em opiniões diferentes dentro de uma família. O Alcides gostava muito de conversar com os vizinhos, ele não ficava muito na loja, era mais eu que permanecia. Quando chegava a noite, nós dois sentávamos e ele então comentava: “-Soube que fulano está doente!” ou “Fiquei sabendo que cicrano mudou para tal lugar!”. Hoje sinto falta dessas nossas conversas. Dia 15 de setembro fará 10 anos que ele faleceu.
Como foi ter que abrir a loja no meio da noite para atender ao pedido de um pai?
Naquela época meia-noite já era tarde, tocou a campainha de casa, Alcides saiu no terraço de casa, era o guarda noturno dizendo que estava com um pai, cujo filho estava com febre, durante o dia ele tinha passado com a mãe e visto um carrinho de folha de lata, era um jipinho. Meu marido abriu a loja para eles entrarem, foi quando o homem disse que estava sem dinheiro. O Alcides deu-lhe o carrinho para que pagasse quando pudesse. Não faz muito tempo veio à criança da época, hoje um senhor, dizendo que seu pai sempre lhe contava a história do carrinho.
sábado, julho 03, 2010
MONSENHOR LUIZ GONZAGA JULIANI
PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
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Sábado 03 de julho de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
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JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
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Sábado 03 de julho de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
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Monsenhor Luiz Gonzaga Giuliani além de ser um pescador de almas é um tocador de obras. Administrou a construção do Seminário Diocesano localizado no bairro rural Nova Suíça, para onde seguia dirigindo uma velha caminhonete Ford fabricada no ano de 1946. O caminho de terra era semelhante à pista para prática de esportes radicais. Por determinação superior, assumiu a Paróquia São José, que na ocasião resumia-se em uma igreja em construção e um terreno com uma construção rústica e acanhada, onde eram realizados os festejos com a finalidade de arrecadar fundos para as obras da igreja. O limite da paróquia abrangia uma imensa região rural e grande extensão de terras urbanas, habitados em sua maior parte por pessoas extremamente carentes, muitos migrantes. Onde hoje existem bairros importantes como Jaraguá, Vila Cristina, Jardim Monte Cristo, não passava de um amontoado de casas precárias. Altos da Paulista era a definição dada para a localização da Igreja São José. Monsenhor Luiz encontrou pouco mais do que as paredes levantadas e a cobertura do telhado realizada. As portas eram tabuas de construção fechadas a cadeados, nas paredes os furos por onde se encaixavam madeiras dos andaimes, no madeiramento do telhado, eram os locais ideais para os ninhos de pássaros. Durante as cerimônias religiosas, alguns fiéis concentrados no ato, poderiam ser vitimas de alguma das aves que faziam seu vôo rasante. Além dos pássaros comuns, corujas, morcegos, sentiam atração pelo santo espaço. O enorme descampado que se avizinhava da igreja favorecia a existência de espécimes da fauna. Com muito talento e dedicação, Monsenhor Luiz reuniu em torno da igreja as forças vivas do bairro, despertou vocações, realizou um enorme trabalho social junto às comunidades carentes, inovou com a criação do Cesac - Centro Social de Assistência e Cultura, um baluarte de formação moral e educacional. A imponente igreja e as grandes construções voltadas ás atividades paroquiais hoje é um orgulho para o bairro e sua comunidade, e motivo de realização para monsenhor Luiz. Além de suas pregações paroquiais, por décadas ocupou o microfone da Rádio Difusora de Piracicaba, a famosa PRD-6, de onde transmitiu preces e orações. È um dos poucos padres brasileiros que teve a oportunidade de concelebrar a santa missa junto com o Papa João Paulo II, no Vaticano. Nascido em Capivari em 02 de junho de 1927, filho de Thomaz Juliani e Maria Maschietto Juliani. Monsenhor Luiz faz um depoimento humano, realista e bem humorado, com o tempero de quem é vitorioso em sua missão.
Seus primeiros estudos foram realizados em Capivari?
studei no Grupo Escolar Augusto Castanho, cursei o ginásio e o colegial no Seminário Diocesano Nossa Senhora da Conceição Aparecida. O padre diocesano é uma ordem distinta, diferente das ordens dos religiosos que vivem em comunidade, em conventos. Prossegui meus estudos no Seminário Central do Ipiranga, no bairro do mesmo nome, em São Paulo. Fui ordenado padre na catedral de Piracicaba, em 8 de dezembro de 1952, pelo primeiro bispo diocesano de Piracicaba, Dom Ernesto de Paula.
Onde se iniciou o seu trabalho como padre?
Comecei ajudando Monsenhor Rosa (Manoel Francisco Rosa) em seu trabalho na catedral de Piracicaba, logo depois o padre de Santa Barbara D`Oeste adoeceu, fui mandado para ser operador na única paróquia existente em Santa Barbara D`Oeste, a Paróquia de Santa Barabara, onde permaneci por quase um ano. No inicio éramos dois padres, mas o bispo chamou o outro para cuidar do seminário e eu permaneci sozinho lá. No final de 1953 vim para ser coadjutor da paróquia da Imaculada Conceição de Vila Rezende.
Dom Ernesto de Paula
Dom Ernesto de Paula
O Padre Jorge já estava lá?
Ainda não! Ele ordenou-se três anos após a minha ordenação. O vigário era o Padre Romário Pazzianotto, eu vim para ajudá-lo, ele estava muito cansado. O Seminário da Imaculada Conceição tinha sido fundado, fiz parte da primeira equipe, trabalhando como diretor espiritual, professor e diretor de disciplina. Em 1958 tornei-me reitor do seminário, cargo que ocupei por quase seis anos, chegamos a ter 83 seminaristas estudando lá.
Prédio que abrigou o primeiro Seminário Diocesano de Piracicaba
Prédio que abrigou o primeiro Seminário Diocesano de Piracicaba
E o Seminário da Nova Suíça?
Fui designado pelo senhor bispo para uma administração um tanto quanto pesada, que foi a construção do Seminário da Nova Suíça. A construção mais antiga era a casa de campo, a parte mais recente é constituída por três pavimentos.
Qual condução o senhor utilizava para ir diariamente até as obras do seminário?
Em 1961 eu dirigia uma caminhonete Ford 1946, “queixo-duro” (direção que não é hidráulica), andava mais no céu do que na terra, não havia asfalto, sentia que o veículo voava. As conseqüências dessas viagens até hoje se manifestam em minha coluna vertebral, mesmo assim dirijo até hoje. Eu tinha que administrar a construção, providenciar os materiais necessários, além de cuidar dos animais, criações, Dalí sai muita coisa para a cozinha do seminário, que continuava funcionando no prédio da Vila Rezende. A construção de um seminário é muito mais difícil do que construir uma paróquia. No dia 15 de julho de 1963 os seminaristas passaram a utilizar o novo prédio do seminário.
Em que ano o senhor assumiu a paróquia de São José?
Acatando as ordens do senhor bispo em primeiro de janeiro de 1964, no período da manhã, vim para cá, sendo que eu já tinha 12 anos de atuação como padre. Encontrei a igreja apenas coberta com o telhado. Dom Ernesto de Paula era muito devoto de São José, foi ele quem deu inicio a construção em março de 1957, o terreno onde se localiza a igreja foi comprado. O decreto que criou a paróquia é do dia 29 de outubro de 1959, sendo que só passou a funcionar em 1963.
Quem projetou a igreja?
Foi o arquiteto Menotti Luchesi, muito conhecido em Piracicaba, o arquiteto Israel Nobre Gil acompanhou a obra, o engenheiro Francisco Salgot Castillon também deu sua contribuição técnica.
Depois de assumir a paróquia de São José o senhor por seis meses ainda morou na Vila Rezende?
Eu ia e voltava todos os dias, com o “piquá” (sacola simples, rudimentar) nas costas! Não era possível guardar nada aqui, as portas eram de tábuas de construção. Na época eu tinha uma Kombi velha que mais me deixava na mão do que andava. Depois que arrumei um fusquinha 1951. Aluguei uma casa na Rua Sud Menucci esquina com Avenida Edgar Conceição, onde permaneci por quatros anos e meio. Naquele tempo a maior parte da paróquia era rural. Havia umas duas mil pessoas morando em condições precárias na Vila Cristina, cujo apelido era “Risca-Faca”. O bairro Jaraguá era um loteamento ocupado com casas improvisadas, bem rudes. Era comum a existência de favelas nesses bairros. Em frente a igreja havias as casinhas que permanece até hoje, há um documento do prefeito municipal Luciano Guidotti servindo como alerta de que essa área será desapropriada com a finalidade de construir uma praça defronte a igreja. Isso paralisou qualquer negociação com esses imóveis. Ao lado da igreja havia algumas casas, na baixada do Jaraguá não havia nada além de buracos e mais buracos. A Chácara Nazareth de propriedade do Dr. Jorge Pacheco Chaves mantinha ainda uma boa área intacta com pés de café plantados, nas baixadas havia cana de açúcar plantada.
Ao chegar ao bairro e deparar com esse quadro foi difícil?
No começo foi puxado, nem as acomodações para a minha permanência existiam. Eu celebrava missa pela manhã e á noite, isso todos os dias. Durante o dia permanecia se não estivesse atendo alguém permanecia sentado em uma mesinha. Não me arriscava em permanecer muito na igreja, havia o risco de receber um “cartão de visita” dos inúmeros pardais que circulavam pela área, havia de tudo dentro da igreja, além dos inúmeros ninhos de pardais, à noite voavam morcegos, corujas. As aves “caiavam” os bancos, eles tinham foram adquiridos de segunda mão da igreja de Capivari, já vieram com cupins. Era o que tínhamos no começo. Muitas noites ao terminar o ofício religioso a única refeição possível era um sanduíche, algum coroinha ia buscar no lugar mais próximo que era no Bar Serenata, na esquina da Avenida Da. Jane Conceição com Rua do Rosário, onde hoje existe a farmácia Drogal. Era comum ter acabado tudo! Na área ocupada um pouco a frente da igreja era como se fosse roça, havia criação de porcos, cabras, gado. Em volta da igreja não havia calçada, a rua era de terra nua, de vez em quando subiam algumas cabras que vinham pastar o capim que brotava fácil na terra vermelha. Algumas vacas faziam o mesmo percurso. De vez em quando tínhamos que tocar algumas cabras que invadiam a igreja, naquele tempo usava-se toalha de linho, e até hoje não entendi porque elas tinham tanta predileção pela toalha do altar. Tínhamos que cobrir tudo com plástico, buscar o máximo de proteção com relação aos animais. Um dia tivemos que tirar uma vaca de dentro da igreja.
A igreja comporta quantas pessoas?
Em pé e sentadas cabem umas mil pessoas.
O sino da igreja é uma criação do senhor?
O som do sino é uma gravação, não há sino na torre da igreja, isso é tecnicamente impossível, infelizmente a execução do projeto estrutural da igreja não contemplou a existência de uma torre elevada, com um sino. Esse fato foi fonte de inúmeras dores de cabeça. Tivemos que fazer um grande esforço de engenharia para construir a cúpula da torre. Coloquei algumas cornetas no alto da torre para chamar os fiéis.
O senhor teve sérias dificuldades técnicas para tocar as obras da igreja?
Surgiram problemas bastante complexos, de natureza técnica, alguns engenheiros recusavam-se a dar andamento á obra. O forro da igreja foi motivo de solução muito criativa, não poderia ter sobrecarga no teto, a busca por materiais alternativos foi muito intensa, tivemos que trazer de São Paulo engenheiros especializados em construções de igrejas. O saudoso Neno Nardim que já havia me ajudado muito na construção do seminário, me ajudou muito na parte artística da igreja. Como agravante havia acontecido à queda do Comurba, alguns engenheiros da cidade nem cogitavam de tocar as obras da nossa igreja, com receio em assumir uma solução pouco trivial. Após inúmeros estudos, resolvemos adotar o gesso como material para o forro. Em Piracicaba não havia ninguém trabalhando com esse matérial, em Campinas só trabalhavam com obras de pequeno porte, adereços em gesso, capitéis, colunas, imagens. Fomos descobrir em São Paulo dois artistas espanhóis que trabalhavam com gesso. O problema surgido era como pagar pelo trabalho, caríssimo, só residências de pessoas abastadas faziam trabalhos em gesso. O projeto original da igreja continha ogivas em estilo gótico, nas condições técnicas oferecidas não poderia se pensar em nada, a não ser em terminar o forro A técnica utilizada para aplicar o gesso implicava em uma camada bem grossa, diferente do gesso mais fino que encontramos hoje no mercado. Os dois irmãos utilizaram um salão onde seria erguida a torre para fundir as placas de gesso, um espaço bem acanhado para essa atividade. Tudo foi minuciosamente estudado, o material a ser utilizado para sustentar as placas deveria ser leve e resistente, cada detalhe foi objeto de estudo. Esse trabalho durou uns dois anos.
Qual a altura do teto em seu ponto mais alto?
São 14 metros, aproximadamente. Tivemos que comprar alguns caminhões de madeira para fazer os andaimes, não só para fazer o forro como também para rebocar as paredes, a grande altura e o tamanho da igreja criou a necessidade de muita madeira. Por necessidade técnica foi utilizado muito cimento nesse trabalho.
Quanto tempo levou para o senhor dar a construção de igreja por concluída?
Uns vinte anos mais ou menos.
No tempo em que durou a construção, a segurança da igreja era frágil?
Só havia uma porta de correr, em madeira rústica, na lateral da igreja, a porta central era em tábuas de construção, permanecia o tempo todo trancada a cadeado. Com isso eu era obrigado a carregar no carro todos os objetos passiveis de roubo. Um dia adquiri um cofre de uns 500 quilos, para colocar ali o que eu vivia transportando de um lado para outro. Imaginei que meia tonelada do cofre não seria carregada por ninguém. Os trens de carga ainda circulavam pela Estação da Paulista, em uma noite chuvosa, roubaram um carrinho de carga da estação, arrombaram a porta da igreja e carregaram em um jipe o cofre da igreja. As marcas dos pneus do veiculo foram deixadas na rua de terra. Dentro do cofre havia cálices, que embora dourados era de latão, não havia um tostão em dinheiro, não dava para guardar nada! Recebi um telefonema do bairro rural do serrote, alguns meninos da cruzada eucarística estavam brincando quando viram em um ribeirão os cálices boiando. Fui com a polícia até o local e descobrimos que os ladrões haviam arrombado o cofre com picareta e não encontrando nenhum dinheiro atiraram o mesmo no ribeirão. Um desses cálices existe até hoje
Em que ano o senhor começou a apresentar um programa na rádio?
Foi em 1957, na época eu era reitor do seminário. Cada dia um padre apresentava o programa, com o passar do tempo foram assumindo outros compromissos e permaneci sozinho apresentando o programa no final do dia, a radio transmissora era a Difusora. Isso foi por quase trinta anos. Os diretores da rádio eram Aristides e Maria Figueiredo. Mandei muito material para o radialista Atinilo José apresentar, isso foi por muito tempo, até ele falecer. Ainda apresento 10 minutos de programa todas as sexta feiras.
O Cesac é fruto da iniciativa do senhor?
O motivo da fundação do Cesac era atender ás necessidades do bairro, onde a carência era muito grande, o Dispensário dos Pobres, das Irmãs Missionárias de Jesus Crucificado tinha perto de duzentas famílias para assistir, sendo um grande número do nosso bairro. Embora a paróquia fosse pobre repartimos o número de assistidos. Os vicentinos tinham na paróquia umas cinco conferencias de São Vicente, eles assumiram umas trinta famílias, o Cesac assumiu as demais. Não havia nenhum curso no bairro, onde hoje está o Cesac já existia uma área que DomErnesto havia adquirido, com a finalidade de promover festas em beneficio da paróquia. Tinha sido construído um rancho com eucaliptos.
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