Como foi a infância do senhor no Egito?
Minha infância foi boa. Tive muita dedicação aos estudos. Absorvi muitos hábitos das atividades do meu pai, que exerceu a militância política como líder da oposição ao então presidente do Egito Gama Abdel Nasser. Cresci em um ambiente que proporcionou uma visão mais ampla, politicamente e socialmente. Por isso sempre pensei que a minha pesquisa tem que ser ligada a um objetivo social.
Como o senhor resolveu vir ao Brasil?
Vim para o Brasil já com a missão planejada. Para melhorar a mandioca para a África eu tinha que vir realizar minhas pesquisas onde a planta tem uma grande expressão. Após uns quatros anos manipulei híbridos da mandioca e de acordo com as regras estabelecidas por regulamentos internacionais, mandei estes híbridos para a África. Passados quatro anos esses híbridos estavam plantados em quatro milhões de hectares em solo africano.
Assim como pesquisadores brasileiros foram buscar abelhas africanas para melhorar o mel, o senhor veio para aprimorar a mandioca no Brasil, aplicar essa tecnologia aqui e enviar também para a África?
Eu ouvi essas histórias sobre as abelhas africanas. Mas estão bem distantes da minha mandioca! O senhor veio para o Brasil com a sua família?
Viemos juntos, descemos no Aeroporto de Congonhas. Cheguei no dia 24 de setembro de 1974, em um vôo da Varig. O avião veio quase vazio, porque a Varig tinha tido um acidente alguns meses antes. Achei interessante o fato de avião estar vazio, era um avião quase só meu!
Qual foi a sua primeira impressão sobre o Brasil ao descer do avião?
Fascinante! Extremamente fascinante. Piracicaba foi muito especial. Agora, quando voltei a Piracicaba quis rever os lugares que tinha freqüentado na época. Um dos locais foi o chamado Restaurante Arapuca. A cidade cresceu muito. Dizem que triplicou no período em que a deixei até agora. Piracicaba continua fascinante. O povo é muito hospitaleiro. Eu tive a melhor impressão do Brasil no período em que estive em Piracicaba. Fiquei em Piracicaba de setembro até o final de março de 1974.
Hoje o senhor é brasileiro e egípcio?
Tenho duas cidadanias.
Como é o ambiente rural no Egito?
O Egito tem uma alta densidade populacional. Chega a ser de três a quatro vezes superiores a densidade populacional do Brasil. A distribuição geográfica é concentrada no Vale do Nilo. Ao contrário do Brasil onde a distribuição é ampla. Essa densidade do Egito cria várias conseqüências no comportamento, na cultura.
Qual é o significado das pirâmides para o povo egípcio?
O egípcio sente orgulho das pirâmides.
O senhor visitou as pirâmides?
A minha residência fica ao lado das pirâmides! Até não construírem alguns edifícios, era possível do meu prédio ver as pirâmides.
O que o senhor pode comentar sobre o Deserto do Sahara?
Representa 95% do território egípcio. O Vale do Nilo representa 5%.
O senhor como cientista, pesquisador, algum dia teve algum pensamento científico para aproveitar essa grande área?
Existe sempre o pensamento. De aumentar a área cultivada, resolver o problema da explosão demográfica de 70 milhões de habitantes.
Existe algum controle de natalidade?
Existe. Mas aspectos culturais interferem. O governo quer uma coisa, mas hábitos culturais querem outra coisa.
Existe violência?
Havia violência política, agora já acalmou. Não existe criminalidade. O controle policial é muito grande. Existe a pena de morte através de enforcamento. Ela é usada em crimes hediondos.
O que motivou o senhor a dedicar-se tanto na pesquisa sobre mandioca?
Faz parte da minha profissão, como professor de cultura da África, lecionar a cultura de mandioca.A terra, para a mandioca ser cultivada, tem que ser uma terra rica?Pode ser um solo muito pobre, é uma planta de solos marginais. Está plantada em locais onde outras culturas não prosperam. Ela exige água, mas agüenta a seca. O tempo de cultura da mandioca é de um ano. Existem formas de conservar a mandioca na forma de farinha, ou então fazer chips (rodelas). A raiz da mandioca estraga rapidamente. Fermentada ela produz bebidas com teor alcoólico de 20% aproximadamente.
O senhor ministrou um curso a respeito da cultura da mandioca na Flórida?
Permaneci na Florida por um semestre, onde participei ativamente em um projeto deles. A única mandioca que existe lá fui eu que introduzi.
O senhor acredita que nessa corrida para fabricar o álcool a mandioca pode participar?
Sim, teoricamente pode. Eu sou contrário a utilização da mandioca como fonte para obtenção de álcool. Baseio-me no princípio de que há muita gente passando fome. Como vamos privilegiar a produção de álcool e deixar as pessoas com fome.
Existe um só tipo de mandioca?
Existe uma variedade muito grande. Inclusive tipos que se não forem devidamente processadas podem matar.
Existe semente de mandioca?
Eu criei uma linhagem para que a mandioca cresça a partir da semente.
Como o senhor vê a posição das universidades brasileiras com relação a universidades de outros países?
Há um progresso muito grande. Nos últimos cinco anos o progresso foi muito acentuado. Há um investimento muito grande, tanto de verbas vindas do exterior como verbas do próprio país. Acho que existe um futuro muito bom para as universidades brasileiras.
Como o senhor conseguiu dobrar a quantidade de proteína na mandioca?
Realizei pesquisas, fiz avaliação de espécies silvestres que tem uma quantidade de proteínas muito maior do que a mandioca comum. Uma das espécies tem quatro vezes mais proteínas do que a mandioca normal, é 8% de proteínas. Consegui um produto híbrido com 4,5% de proteínas.
Há uma lei que deve ser acrescentada farinha de mandioca à do trigo?
Existe uma lei tramitando no congresso para adicionar 20% de farinha de mandioca à farinha de trigo para fabricar o pão.
Como o senhor se sente em ser responsável pela plantação de quatro milhões de hectares de mandioca na África?
Eu contribuí para a plantação desses quatro milhões de hectares. Sinto-me muito orgulhoso. Realizei-me muito, cumpri uma parte importante da minha missão científica.
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