PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E
MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 30 de novembro de 2013.
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 30 de novembro de 2013.
Entrevista: Publicada aos sábados
na Tribuna Piracicabana
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http://blognassif.blogspot.com/
ENTREVISTADO: PEDRO CALDARI
Pedro Caldari estará lançando em
dezembro próximo um livro em que conta a história da Igreja Imaculada
Conceição, também conhecida como Igreja da Vila Rezende. Meticuloso em suas
pesquisas faz entre outras revelações a de que o projeto da antiga matriz da
Vila Rezende foi do arquiteto Francisco de Paula Ramos de Azevedo. Pedro
Caldari nasceu em Piracicaba, mais especificamente na Vila Rezende a 5 de
setembro de 1938. Filho de Ricieri Caldari e Catarina Furlan Caldari, ambos
piracicabanos e filhos de italianos originários de Padova. Seus Avós paternos
são Pedro Caldari e Carolina Botene Caldari, os avós maternos são Tereza
Gallina Furlan e Angelo Furlan.
O seu vinculo com a Vila
Rezende sempre existiu?
Nasci e fui criado na Vila Rezende, na antiga
Avenida Salaz hoje denominada Avenida Mário Dedini. A casa em que nasci
transformou alguns anos depois em mais um galpão das Indústrias Dedini, digo
que nasci dentro da Oficina Dedini ! Minha vida toda, inclusive profissional
sempre foi vinculada com a Vila Rezende. Estudei o curso primário no Grupo
Escolar José Romão, o professor era Leontino Ferreira de Albuquerque, um
educador que tinha um amor profundo pelo ensino, contribuiu muito para a
formação de centenas de vila-rezendinos.
Após concluir o curso
primário qual foi a escola em que você foi estudar?
Fui fazer a “Universidade do Zanin” ! Era assim
que nós chamávamos na época a Escola Técnica de Comércio Cristóvão Colombo do
professor Pedro Zanuardo Zanin. Situava-se na Praça José Bonifácio, ocupava a
sobreloja e nos fundos tinha uma parte da escola que ocupava o térreo. Embaixo
de um lado havia um cartório, do outro lado era o estúdio do Cantarelli. Ao
lado do cartório existia a Bomboniére do Passarelli, ao lado dele era o Cine
Politeama. Antes de funcionar o cinema havia um restaurante que foi demolido
para dar lugar ao cinema. Na parte do fundo do cinema havia um salão de
snooker. Era o Snooker do Jacaré. Quando o cinema ampliou o Jacaré mudou o
snooker para a Rua XV de Novembro atrás da Catedral de Santo Antonio. Lá também
era um corredor onde no fundo havia um salão grande. Ali era o principal reduto
dos amantes do snooker. Era frequentadíssimo era onde se encontravam os bambas
do snooker.
Qual era o meio de
transporte utilizado por você para vir da Vila Rezende até a escola de
comércio?
Era o saudoso bonde que infelizmente desapareceu,
poderia perfeitamente estar funcionando até hoje, como existe em muitas partes
do mundo. Tinhamos três linhas de bonde em Piracicaba: do centro até a Vila
Rezende, do centro até a Escola de Agronomia e do centro até a Paulista, essas
três linhas se interligavam.
A linha de bonde que da Vila
Rezende tinha um desvio, onde exatamente era?
Esse desvio ficava na Rua do Rosário proximo a
esquina da Rua Prudente de Moraes, posteriormente passou para a Rua Campos
Salles proximo onde hoje existe o viaduto da Rua do Rosário, isso ocorreu
quando aumentou-se o número de viagens do bonde. Um bonde vinha da Vila Rezende
até a catedral, outro saia da catedral e ia até a antiga estação de trens da
Estrada de Ferro Sorocabana que ficava nos confins da Vila Rezende, na Avenida
Conceição! Hoje é o início do bairro São Luiz. Chamava-se Estação Barão de
Rezende, ficava uns 200 metros depois do Armazém do Valler. Para situar-se
melhor, nos dias atuais uns 200 metros adiante de onde hoje há um posto de
gasolina, que até ha pouco tempo era de propriedade de Alzira Valler.
Em que ano você concluiu a
escola de comércio?
Em 1956 após estudar por quatro anos que
equivalia ao ginásio e três anos de curso técnico de contabilidade. Foram sete
anos de estudo na Escola de Comércio Cristóvão Colombo, que foi uma grande
formadora de contabilistas. Piracicaba tornou-se bastante conceituada por ter
bons contabilistas. Os professores que lecionavam nessa escola eram também
professores do Sud Mennucci, do Instituto Piracicabano, da própria ESALQ, não
só acadêmicos como também catedráticos dessa escola.
Em qual horário você
frequentou a Escola do Zanin?
Inicialmente estudei na parte da manhã, depois
por força da necessidade de trabalhar fiz o curso noturno. Comecei a trabalhar
em uma idade que se hoje for falar torna-se um escandalo, mas na época não era.
Entrei na CODISTIL quando ainda era a antiga Oficina Perissinoto, o fundador
foi Augusto Perissinoto, quem deu continuidade após o falecimento do pai foi
Waldomiro Perissinoto que posteriormente com o apoio de Mário Dedini passou a
constituir a CODISTIL, Construtora de Destilaria Dedini Ltda, uma marca famosa
internacionalmente no setor sucroacooleiro. Comecei a trabalhar na CODISTIL
quando eu tinha nove anos de idade. Meu chefe imediato era Palmiro Berno, chefe
do almoxarifado. Minha primeira função foi de endireitador de pregos. Na época
os aprrendizes eram admitidos quando estavam saindo praticamente do curso
primário, isso se dava tanto no comércio como na indústria.A ocupação que se
dava à quem estava iniciando eram as mais diversas. As mercadorias vinham para
as empresas em caixotes de madeira, não se desperdiçava essa madeira, o próprio
caixote as vezes era reutilizado ou era desfeito e a madeira aplicada para
reuso. Os produtos importados vinham em caixotes de pinho de riga. Naquela
época já reaproveitava-se tudo. Digo com muita propriedade que trabalhar desde
pequeno não só é salutar, como também de um benefício enorme. Nada melhor do
que o trabalho para educar, dar sentido de valor, formar a personalidade,
disciplina, despertar o civismo e patriotismo, enfim todos os aspectos do
individuo são moldados para transforma-lo em um verdadeiro membro da sociedade.
Na época eu e o Augusto Perissinoto tinhamos a mesma idade ele era sobrinho do
Waldomiro Perissinoto. Após uma breve passagem endireitando pregos a próxima
ocupação foi a de office-boy, onde começou uma iniciação à àrea administrativa,
distinguido papéis, destinatários, levar e trazer na devida ordem e cuidado. Aos
17 anos de idade me formei como Técnico em Contabilidade, embora habilitado eu
não podia assinar balanços, não tinha atingido a maioridade, mesmo sendo um dos
contadores da oficina do Perissinoto, no escritório eramos um grupo de seis
funcionários, na oficina trabalhavam de 100 a 120 funcionários, já era uma das
associadas do Grupo Dedini. Foi o meu único emprego até a minha aposentadoria,
no ano 2000. Permaneci na empresa por 52
anos. Entrei endireitando prego e saí como diretor finaceiro e administrativo
da Dedini S/A - CODISTIL. Mário Dedini
foi uma figura empresarial de grande relevância não só para a economia mas
também para a sociedade, para o desenvolvimento urbano, político de
Piracicaba.Ele teve uma atuação marcante.
A vocação sucroalcooleira de
Piracicaba tem suas origens com o Dedini?
Graças a Mário Dedini que surgiu essa vocação. A
capacitação industrial de Piracicaba deve-se quase em sua totalidade à Dedini.
Não só a Mário Dedini que esteve a testa dos negócios dessa empresa até o seu
falecimento em 1972. De 1920 a 1972 Mário Dedini teve uma atividade intensa, o
desenvolvimento industrial de Piracicaba esteve atrelado a ele. Evidentemente
ele não teve participação no ramo automobilístico. Mesmo as indústrias
mecânicas que vieram a participar do esforço automobilístico praticamente foram
tuteladas pelo Grupo Dedini. A maioria dos empresários desenvolvimentistas,
empreendedores, tiveram seu iniciao como empregados, aprendizes, na Dedini,
assim como eu. Receberam de Mário Dedini incentivo e apoio, foi uma incubadora
de empresas.
Você tinha tempo para
brincar?
Também brincava! Morando na Vila Resende, desde
que aprendi a andar nas ruas do bairro e adjacências do Rio Piracicaba aquilo
tudo era nosso quintal! Não havia preocupação, a qualquer hora do dia ou da
noite estávamos ali, com jogos infantis, brincadeiras inocentes, correndo atrás
dos vagões de cana-de-açucar na época de safra, tudo isso era o nosso parque de
diversões. As ruas eram de terra, não tinham calçamento, a Avenida Rui Barbosa
era de terra assim como as ruas adjacentes. Não havia a distinção de direção de
ruas, era caminho de veiculos, pessoas e animais. Quando chovia era o lamaçal
de sempre.
Onde era a chacara do Dr.
Kok?
Em frente a Igreja da Imaculada Conceição, onde
hoje há um jardim, aquele quarteirão todo era murado e pertencia à Chacara do
Dr. Kok, administrador do Engenho Central, uma figura exponencial. Ele era
dinamarquês. A entrada ficava em frente
a Igreja Matriz da Vila Rezende, era um portão de ferro, vazado.
Quando foi construída a
Igreja Imaculada Conceição?
Começou a ser construida em 1904, agora em 2014
iremos comemorar 100 anos de inauguração da Paróquia da Imaculada Conceição que
se deu em 1914. A igreja nasceu da vontade de Dona Lidia de Rezende, filha do
Barão de Rezende, Estevam Ribeiro de Souza. Ela construiu a igreja para honrar
a memória dos irmãos Luis e Estevam de Rezende que faleceram prematuramente. O
Barão de Rezende custeou a construção da
igreja, doando as terras e recursos financeiros. Praticamente toda a Vila
Rezende fazia parte da então Fazenda São Pedro, pertencente ao Barão de
Rezende, natural do Rio de Janeiro e que tinha se casado com Ana Conceição,
filha do Barão de Serra Negra. O Barão de Rezende contratou o projeto
arquitetônico e de engenharia à Ramos de Azevedo, que projetou e assumiu a
responsabilidade da construção. Foi um dos poucos projetos, senão o único, de
templo religioso, católico, que o Ramos de Azevedo assinou. Uma preciosidade
arquitetônica e histórica sem precedente.
Que infelizmente se perdeu. Meus
pais casaram-se nessa igreja, eu fui batizado nela, casei-me nela, parte dos
meus filhos ali foram batizados.
Pedro. você foi da primeira
turma formada pela UNIMEP?
Tive esse previlégio. Em 1964 com um grupo de
aproximadamente 248 ingressantes no curso da famosa ECA – Economia, Ciencias
Contábeis e Administração, nascedouro do ensino superior no Instituto
Piracicabano. Me formei em 1967 era ainda no prédio central da Rua Boa Morte.
Além das suas atividades
profssionais, você participa de atividades sociais e filantrópicas de
Piracicaba.
Fui um dos primeiros a ser admitido pelo Rotary
Club Piracicaba - Vila Rezende, onde permaneci por mais de 20 anos e por duas
vezes fui presidente. A reunião dava-se
no Restaurante Grisoto. Fui diretor do Clube de Campo de Piracicaba. Fui
diretor do Lar dos Velhinhos de Piracicaba, onde tive a satisfação de colaborar
na administração. Tenho um carinho muito grande por essa instituição.
Você é um artista plástico
com diversas exposições realizadas.
Tenho algumas centenas de quadros que pintei. Fiz
muitas pinturas de natureza morta, aves, em especial pássaros. Usei muito óleo
sobre tela, gostei muito do crayon, grafite e do pastel seco, que é uma
técnica que se pinta com os dedos.
Quando está pintando uma obra qual é a
sensação do artista?
Confesso que as vezes não penso em nada e outras
vezes penso em tudo. Acho que o espírito nesse momento se despreende e vaga por
muitas dimensões. O artista plastico, assim como o escritor, o musico, quando
mergulha em sua arte passa a viver em outra dimensão.
Quando você escreveu sua
primeira obra?
É dificil dizer quando comecei a escrever. A
partir do momento em que se é alfabezido começa-se a escrever. Tive excelentes
professores de português e literatura: Benedito de Andrade, Benedito Cotrin e
outros que me incutiram o hábito da
leitura. A pessoa começa a se realizar a partir do momento que começa a transmitir
conhecimentos que ela adquiriu, aprimorou e passa adiante. Transmite para outra
pessoa o desejo de aprender e de também ensinar. O aprendizado nunca termina. Fora as muitas
peças contábeis, pareceres, justificativas, requerimentos, ofícios e cartas, escrevi
dezenas de artigos publicados em jornais. Meu primeiro livro foi Memória da
Vila, nessa época eu escrevia para mim mesmo, muitos desses escritos acabaram
perdidos. Como colaborador,escrevia para os jornais de Piracicaba. Em uma das
reuniões do Rotary, Fortunato Losso Netto, do Jornal de Piracicaba, disse-me:
“- Pedro, vamos ter a semana da Pátria, o Rotary irá dar algumas contribuições,
patriótica, idelaista. Faça-me um artigo sobre Semana da Pátria”. Nisso um
rotariano nato, vila-rezendino, Professor da ESALQ, Ernesto Paterniani,
disse-me: “- Pedro, estou aqui reunindo uma colaboração para a Vila Rezende!”.
Fiz meu artigo, estava temeroso, sem pretensão. Encabeçando as comemorações da
Semana da Pátria, vi meu artigo, logo abaixo do título da matéria. Um belo dia
esatava proxima alguma data festiva, alguém do jornal me pediu para fazer um
artigo sobre a Vila Rezende, escrevi. Teve uma repercussão excelente. A noite
em casa, fiz a primeira crônica sobre a Vila Rezende. Lí, minha esposa leu e
disse-me: “-Você esqueceu de fulano.” Nessa história de ter esquecido, trinta
dias depois eu tinha um calhamaço de folhas. Em trinta dias tinha escrito o
primeirto volume! Isso foi em 1988. Datilografei, me atrevi a ir até Cecílio
Elias Neto. Eramos companheiros da ECA. Ele começou a ler. Disse-me: “-Pedro,
não sabia que você escrevia!”. Ele me incentivou a publicar. Publiquei pela
Edições Paulinas, de São Paulo. O lançamento foi feito no salão paroquial da
Vila Rezende. Com prefácio de Cecílio Elias Neto. Em 1991 fiz o segundo volume.
Publiquei o terceiro livro, “O Cantar do Passarinho”. Sempre gostei do
papacapim, o piracicabano é um fervoroso apreciador do canto do papacapim.
Quando surgiu a idéia do vereador Capitão Gomes em criar a ave simbolo de
Piracicaba eu o procurei e disse-lhe que para o piracicabano o papacapim é o
pássaro simbolo da cidade. O livro seguinte que publiquei foi; “50 Anos do
Clube de Campo”. Foi um trabalho que me deu uma enorme satisfação por resgatar
o passado do Clube de Campo, isso foi em 2004.
Após esse livro, você lançou
algum outro?
Fiz o terceiro volume de Memória da Vila, que
deverá ser lançado no inicio de 2014. Outro que já está saindo da gráfica e
deverá ser lançado ainda este ano, é “100 Anos da Paróquia Imaculada
Conceição”, tive a satisfação de ser convidado para escrever esse livro. Além
dos relatos que eu guardo em minha memória, busquei os livros tombos da
paróquia.
Como o interessado pode
adquirir um livro desses?
Deve procurar a Paróquia Imaculada Conceição! O
escritor que não faz literatura de consumo de massa, que não é
industrializado, encontra dificuldades
para publicar.
Você foi presidente do
Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba em que períodos?
Meu primeiro mandato foi em 1994, após um ano
poderia ser reeleito, mas fiz questão de transferir a presidência para o
Professor Frederico Pimentel Gomes. Em 2008 assumi a presidência do IHGP, após
dois anos fui reeleito em 2010, exerci a função até 2012.
Como você vê o mundo que o
cerca?
Eu me caracterizo como “O Inconformado”, fiquei felicissimo quando
da vinda do Papa Francisco ao Rio de Janeiro, não perdi uma fala dele. No dia
em que ouvi sua expressão dirigindo-se aos jovens, dizendo: “ -Seja um
inconformado, sempre! É do inconformismo que encaminhamos para a perfeição e
para a maior aproximação com o nosso Criador!”.
O Papa em sua suma sabedoria
manifesta-se dessa maneira, clara e simples, fácil de ser entendida. O dia em
que deixarmos de sermos inconformados veremos que a nossa liberdade sob todos
os aspectos começou a se findar. Um artista plástico, por exemplo, é um
trnsformador. Ele pega uma tela em branco, ou uma folha de papel, ao começar a
borra-la, ele estará colocando ali imagens, simbolos, com origem nas
profundezas do seu subconsciente. Estará reproduzindo conhecimentos que
aprendeu e adicionando seu inconformismo. Se concordar com tudo de nada adianta
ler jornal todos os dias.
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