sexta-feira, agosto 29, 2014

DENISE OTERO STORER


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 16 de agosto de 2014.

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

http://blognassif.blogspot.com/


http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADA: DENISE OTERO STORER

 



O amor de Denise Otero Storer pelas artes plásticas, pelo cinema, pela literatura, ela considera como um presente dado pelo seu pai Telmo Otero, Denise desde pequena o acompanhava aos Salões de Belas Artes. Os primeiros salões que Denise freqüentou eram realizados nas dependências da FOP- Faculdade de Odontologia de Piracicaba, a Rua D.Pedro II esquina com Rua Alferes José Caetano. Ele chegava a sua casa e dizia à Denise: “- Hoje vou levá-la a abertura do Salão de Belas Artes!” Ela era ainda muito nova, mas gravou em sua memória Levava-a ao cinema para ver Cantinflas, Sarita Montiel, Jerry Lewis, ele também adquiriu coleções de Monteiro Lobato para que Denise pudesse ler. Proprietário da Casa Triângulo – comércio de materiais para construção, fundada em 1950, Telmo Otero presidiu a ACIPI- Associação Comercial e Industrial de Piracicaba de 1977 a 1991, entre os fatos que marcaram sua gestão, um deles foi a construção da sede da entidade uma obra que começou a ser idealizada por presidentes anteriores a Telmo, mas que foi colocada em execução em sua gestão, conforme previa um projeto na década de 70. Telmo Otero sempre foi muito influente junto a sociedade piracicabana, no exercício de suas atividades na ACIPI agiu com grande dinamismo, deixando um legado de obras e princípios comerciais que até hoje estão presentes em nossa sociedade. Denise Otero Storer é nascida em Piracicaba a 19 de setembro de 1951 ela e Maria Tereza são filhas de Telmo Otero e Anesis Antonia Bragaia Otero. Denise Otero casou-se com o engenheiro civil Cesar Marcom Storer. Recebeu diversos prêmios: Aquisição (1991, 1995, 1996), Medalhas de Ouro (1996, 1998), Medalha de Prata (1991) e Menções Honrosas (1991, 1994, 1996), em Salões de Artes Plásticas de Piracicaba, Araras, São João da Boa Vista, Amparo e Franca. Fez diversas exposições individuais em diferentes locais de Piracicaba. Foi membro de comissões organizadoras, de seleção e premiação de diversos Salões de Arte além de capas de “folder” e folheto turístico.


Seus primeiros estudos foram em que escola?

O curso primário foi no Grupo Escolar Moraes Barros, Da. Neide foi a minha primeira professora. No terceiro ano minha professora era Dona Maria José. Eu tinha muita vontade de ficar sócia da Biblioteca Municipal, que na época ficava na Rua Alferes José Caetano esquina com a Rua Voluntários de Piracicaba. (Um casarão centenário, que recentemente foi demolido para dar lugar a mais um espigão no adensamento populacional). Foi uma grande alegria o dia em que me tornei sócia, houve a necessidade de ser acompanhada da minha mãe como adulto responsável. Até hoje gosto do odor característico de livros! A meu ver os novos recursos tecnológicos tablet, PC, ou simplesmente tablete não substitui o livro. Gosto de frequentar sebo (Palavra para designar livro de segunda mão).

Após concluir o primário qual foi o próximo curso que você fez?

Entrei no Jeronymo Gallo e no Instituto de Educação Sud Mennucci, onde fui classificada em segundo lugar. Optei em estudar no Sud Mennucci, na época as mães gostavam que as filhas fizessem o curso Normal, já era um diploma. Tive aula com Dona Zelina, Seu Argino, Lino Vitti, Evaristo, Benedito de Andrade, Godoy. Era no tempo em que o bonde virava na Rua José Pinto de Almeida, sentido da Rua XV de Novembro. Tínhamos os Cinemas, Polyteama, Broadway, Palácio.

Você tocava algum instrumento na famosa fanfarra do Sud Mennucci?

Eu só participava do desfile, não tocava nenhum instrumento. Eu convivi logo no comecinho do curso a existência de um muro que separava a entrada das meninas e dos meninos. Logo depois tiraram o muro.


Quem era seu professor de arte?

Tinha um professor de desenho, o Seu Costa, mais conhecido como “Costinha”, ele foi um professor de desenho que tinha muita consideração pelo meu trabalho, ele sabia que eu tinha uma coisa especial com relação a desenho. Foi o primeiro professor de desenho a me ensinar a tirar no natural. Enquanto todo mundo estava fazendo desenho geométrico ele colocava umas caixas para que eu fizesse um pouquinho de desenho artístico. Ele me deu algumas diretrizes de desenho artístico. Quando eu era criança lembro-me que meus pais compravam cadernos de desenho feito de papel jornal e lápis de cor. Eu desenhava meu mundo ali. E até hoje é assim! O meu processo criativo está muito ligado com o que eu vivo. Por isso também tenho várias fases de trabalho, depende muito da época eu necessito transmitir algo que estou vivendo ou observando. São todos tipos de emoções que procuro transmitir. Posso dizer que não pinto “comercialmente”. Sempre contei a minha história através da minha arte.

Olhando ao acaso uma pintura sua, sente-se um convite para vivenciá-la. Como você consegue transmitir esse sentimento ou ele existe apenas nos olhos de quem vê a tela? 

Essas coisas fazem parte da minha história. A carrocinha que você vê pintada no quadro é aquela que vinha na porta da minha casa para vender verduras.

Nesse quadro em especial, a carrocinha está ambientada em um ambiente rural, na tela ela foi inserida de acordo com algum processo trabalhado por sua inspiração?

Não é algo imaginário, e sim alguma coisa que existe. Toca o meu coração. Lembra alguma coisa da minha infância.

Toda essa riqueza de detalhes como você consegue transportar para a tela?

Isso envolve técnica, saber definir planos, saber dar volume no trabalho, saber trabalhar no primeiro plano. Isso é um aprendizado, que não é adquirido instantaneamente. Demanda um tempo para dominar essas técnicas. A emoção é o último fator, quando você consegue dar emoção a um quadro é após todos esses ingredientes terem feito parte de você. A técnica é a asa que me permite voar na minha criatividade. Só que para voar eu necessito ter asas! Para criar alguma coisa eu tenho que dominar essa coisa. Existe uma diferença entre errar e distorcer. O erro eu faço mesmo sem querer. Cometo o erro porque não sei fazer. A distorção não, eu sei fazer e quero fazer diferente. É proposital.

Você formou-se como professora normalista quando concluiu o curso no Instituto Sud Mennucci?

Já sai do Sud Mennucci com aulas de desenho pedagógico, aulas de desenho geométrico. Permaneci no Sud mesmo, dando aulas. Por pouco tempo dei aulas também, no Jerônimo Gallo. Quando me formei tinha por volta de 18 anos. Sempre gostei de dar aulas, tenho facilidade de passar as informações ás pessoas, elas me entendem bem. Faço analogias para que fique mais fácil o entendimento. Eu gosto do que eu faço. E gosto de passar adiante o que sei. Assim como sempre estou aprendendo com outras pessoas.

Você prosseguiu nos estudos?

A minha paixão era fazer Belas Artes. Era um curso que só tinha em São Paulo.

Qual foi a reação do seu pai, Telmo Otero, com relação a esse desejo da filha?

Ele não permitiu de jeito nenhum! Tentei encontrar alguma faculdade que eu pudesse fazer, mas que tivesse relação com arte. Escolhi Letras. Fiz Literatura Inglesa, Americana, Portuguesa, Brasileira. Quando conclui a UNIMEP já saí com aulas. Era a primeira aluna da classe. Comecei como professora. Logo me deram tudo, laboratório de línguas, o colegial inteiro, noturno. De manhã e a tarde eu dava aulas de artes para cerca de 100 alunos, uma escolinha de crianças, adolescente, que ficava na casa da minha mãe mesmo, na Rua do Rosário, 133. Eu devia ter uns 20 anos, percebi que tinha que fazer uma opção, ou ficava com a arte ou com o inglês. Só que a arte sempre falou mais alto, e infelizmente deixei o Instituto Piracicabano. Foi um período interessante, levei minha arte para lá também, fazia teatro, interpretava William Shakespeare, levava discos do Elton John, na época traduziamos letras, eu desenhava na lousa, naquela época não tinhamos os recursos que existem hoje. Era uma aula artístitica. Acabei por optar só pela arte. Casei-me aos 24 anos, tive os filhos Cesar e Beatriz. Èramos estudantes quando eu e o meu marido Cesar Marcom Storer nos conhecemos, eu tinha 17 anos ele tinha 19 anos.

Denise, você transmite sentimentos especiais com sua arte e as pessoas se manifestam a respeito. Algumas de suas obras quando postadas na rede social é motivo de muitos elogios.

Embora não sejam explicitos as pessoas percebem os nossos sentimentos. Quando faço uma obra é essa emoção que carrego dentro de mim que coloco ali. Eu trabalho com a verdade, não me importo com o que os outros pensem a respeito. Essa arte é a minha vida, eu escrevo através dela.

Quais são as técnicas de pintura que você mais utiliza?

A principio comecei com o óleo, era a técnica mais conhecida, com mais facilidade de encontrar material. Por volta de 1990 a prefeitura patrocinou um curso na Pinacoteca Municipal, com um professor, Norberto Stori, da FAAP - Fundação Armando Álvares Penteado. Ele veio para dar um curso de aquarela, por um período de dois anos. No final, dos aproximadamente 60 alunos que iniciaram o curso apenas sete alunos concluíram e formaram um grupo “7+2”.

Por  que esse grupo se chamava “7+2” ?

Éramos sete alunos que tinhamos concluido o curso e convidamos mais dois amigos para fazer parte: o Arair Ferrari e Natal Gonçalves. Durante aproximadamente uma década fizemos bastante exposições.

Quem pode matricular-se na sua escola de arte?

Qualquer pessoa que tenha interesse pela arte, desde principiantes. A partir dos doze a treze anos até sem limite de idade máxima. Tenho um aluno que entrou com dez anos, hoje tem dezesseis anos e ganhou menção honrosa no Belas Artes.

Temos grandes artistas em todas as áreas, o que falta para serem devidamente valorizados no Brasil?

É uma questão cultural. As vezes estou pintando no meu ateliê, como da rua é  possivel ver a obra que está sendo realizada, algumas pessoas passam, param, admiram, dizem que imaginam o quanto deve ser bom pintar. Geralmente acabam perguntando: “-E você não trabalha?”. Na concepção dessa pessoa pintar, desenvolver uma arte já a quarenta anos não é trabalho! Minhas obras são vendidas a um preço acessivel, só que por questões culturais gasta-se muitas vezes mais em uma bolsa do que em um quadro. 


Quantas obras você já realizou?

Quando meu marido aposentou-se, propô-se a catalogar todas as obras. Só que eu já tinha vendido muitas. Quando ele catalogou existiam cerca de 3.000 obras. Portanto deve ser um número maior.

Seus trabalhos estão em diversos países?

Tenho trabalhos que realizei espalhados pelo mundo afora. Tenho várias histórias a respeito. Um americano veio até o meu ateliê e encomendou especialmente para ele uma aquarela com o salto do Rio Piracicaba. Ele levou, enquadrou, colocou sobre a sua lareira, tirou uma fotografia e me enviou por e-mail para que eu visse. Em 2013 quando uma turma de engenheiros da Esalq comemorou 40 anos de formatura da turma fiz a capa do livro, a contra-capa e todos os trabalhos que foram presenteados aos alunos-colaboradores, fiz 23 aquarelas só sobre o prédio principal da Esalq, em angulos diferentes, nenhum repetido. A Unimep tinha um convênio com o Instituto Metodista Bennett do Rio de Janeiro, fui convidada para fazer uma exposição lá. Além de levarem a exposição, fizeram um coquetel de abertura, e deram-me a passagem de ida e volta de avião. O curioso é que essa foi a primeira vez em que andei de avião! (Denise após isso viajou para Europa, recentemete esteve na América do Norte).

Como o nosso jovem vê a arte?

Me parece que está havendo um pouco mais de atenção nesse ponto. Vejo salões, pinacotecas, escolas, excursões levando alunos com monitores explicando, isso antigamente era raro. Talvez essa nova geração se interessse mais pela arte. Em diversas cidades de outros paises, vi crianças em museus, salões de arte, discutindo cores, percebe-se claramente que em determinados locais há um grande incentivo à arte. E o Brasil parece estar caminhando nesse sentido, de educar a pessoa.

Um patrimonio mundial da cultura artística que existe no Museu de Arte Moderna de São Paulo, MASP, porque não é usufruido mais?

Muitas pessoas nem conhecem, nunca foram. Não sabem o que é uma Pinacoteca do Estado.  Vale a pena visitar só para ver o prédio maravilhoso. Eu acredito que isso vai se invertendo. As pessoas estão tendo mais acesso a cultura, a própria internet facilita.

Para quem conhece apenas um pote de tinta e um pincel, ao iniciar um curso de pintura com você, quanto tempo essa pessoa levará para ter alguma noção de arte?

Depende da pessoa, da bagagem que ela traz, tem pesssoas que já tem um certo talento. Nesse caso é só lapidar um pouco e logo estará desenvolvendo. Outras não, tem que começar do nada, mas eu acredito, não daria aula para principiante se não acreditasse nisso, na possibilidade do seu sucesso. Penso que todo mundo tem todos os ingredientes em seu interior, basta querer desenvolve-los.

Há pessoas que desenham intuitivamente , com relativa perfeição, até em cantinho de jornal, qual é o caminho que esse futuro artista pode seguir?

Sou uma professora bem abrangente, dou aula de pastel seco, pastel oleoso, aquerela, óleo, moderno, classico, acrílica. Dou aulas de artes, a colagem dentro do contexto de arte também. Tem quem goste de fazer o moderno, o abstrato.

O conceito de que arte é coisa de elite existe ainda?

Isso está errado. O artista tem que estar onde o povo está. O artista não pode ser elitizado. No meu entender, o artista não é um intelectual. Ele é um artista! Sou apaixonada por desenho, é minha arte primeira, desde criança eu desenho.

Você tem alguns quadros com paissagens européias?

Tenho! Eu fui para lá! Não pinto coisas que não vivo! Preciso sentir o cheiro,saber a cor, viver o momento. Tenho que vivenciar para transportar aquilo para a tela. Meu processso criativo é esse. Pode ser uma situação que eu esteja presenciando. Acho que a arte não pode ter barreiras, fronteiras ou limites. Cada individuo é único.

A Bienal é um evento marcante e algumas vezes saimos do recinto com a duvida se algo exposto tem o valor de arte ou foi apenas a intenção de arrumar uma bela confusão?

A Bienal tem coisas maravilhosas, tem coisas que vi lá e nunca mais me esqueci. Lembro-me de uma em que tinha um espaço, tudo em construção, vamos dizer assim, inacabada. Um monte de tijolos. Uma pá. A impressão é de que não tinha dado tempo para fazer a obra. Era a obra! Mais tarde tinha um monitor explicando a obra! Mais parecia um espaço em reforma. É uma arte conceitual, tem toda uma filosofia envolvendo aquele trabalho. Precisa conhecer um pouco a trajetória do artista para poder avaliar, por isso não se deve colocar tudo no mesmo patamar.

Além da arte, o que você gosta de fazer?

Gosto muito de ler, de ir ao cinema, musica, prefiro mais musica clássica. Toco violão.

Como é a dona de casa Denise?

Normal! Cozinho, tem dias que acho que está muito bom, outros dias acho que não.

Qual prato que você cozinha e ninguém resiste?

É o puchero, receita que herdei da minha avó!

As mudanças ocorridas com o crescimento de Piracicaba reflete nas obras do artista?

Acredito que sim, o volume de informações é maior.

O aumento da violência influencia?

Acho que já temos tanta violência na mídia, não vejo a necessidade de que eu mostre isso na arte. Tem artista que gosta do motivo social, de alertar as pessoas. É valido. Mas eu prefiro ter um olhar diferente, passar isso para as pessoas para que os olhos delas fiquem contentes. Minha filosofia de vida já prega isso. Que temos que ser positivos. Para mim é uma missão, fazer com que as pessoas fiquem felizes. Temos que puxar as coisas boas que as pessoas tem dentro de si. Quando um aluno ganha um prêmio, participa de uma exposição, sinto uma realização pessoal muito grande.

A arte de Denise Storer está ao alcance de quem desejar adquirir?

Os preços são bem acessíveis. Desde uma pequena aquarela até um quadro maior. Basta a pessoa querer e gostar.

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