segunda-feira, outubro 14, 2013

RUBENS GERDES


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 28 de setembro de 2013
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: RUBENS GERDES

 


 

Rubens Gerdes é descendente de alemães e italianos. Nascido a 23 de junho de 1934, às seis horas da manhã, em Piracicaba na Rua Moraes Barros esquina com a Rua Bom Jesus, filho de Alberto Gerdes e de Judith Previtalli Gerdes. Seu pai teve quatro filhos no primeiro casamento, viúvo, contraiu segundas núpcias onde teve mais quatro filhos sendo Rubens o mais novo.

O pai do senhor exercia qual atividade?

Ele era sapateiro, proprietário da Sapataria Bom Gosto. O Teatro Santo Estevão exibia uma propaganda da sapataria. Lá eram fabricados sapatos e também se faziam consertos. Tanto de sapato feminino como masculinos.  Meu pai foi um homem muito conhecido, era sério, honesto, todo o mundo conhecia o Gerds.

O senhor estudou em que escola?

Fiz o curso primário no Sud Mennucci. Naquele tempo com oito, nove anos já estava trabalhando. A minha primeira profissão foi a de sapateiro. Meu pai cortava o sapato, muitas vezes eu cortava, pespontava, costurava, depois montava o sapato normal. Naquela época vendia-se muito sapatão, usava prego-torno, que é o prego de madeira. A sola era pregada com prego de madeira. Depois saiu o sapato Packard de sola grossa. Mudamos para a Rua Bernardino de Campos, entre a Rua XV de Novembro e a Rua Moraes Barros, meu pai deixou de ter a sapataria e comprou um sítio do Dr. João, vizinho a Fazenda da Dona Antonia, no atual Bairro do Matão. Lá tinha suínos, uma vaquinha. Eu tinha uns 10 a 12 anos nessa época, ajudava-o muito na alimentação dos porcos. Íamos e voltávamos todos os dias, a condução utilizada era carrinho de tração animal. morávamos na Rua Bernardino de Campos. De lá mudamos para uma chácara de nossa propriedade onde hoje é a Rua Bahia, era uma área de uns três alqueires. Havia os mais variados tipos de frutas. Nós plantamos pés de coco vindos da Bahia, agrônomos da Escola de Agronomia iam visitar nossa chácara. Com 14 anos entrei para trabalhar na Mausa na Rua Santa Cruz, que antigamente chamava-se barracão de laranjas, lá antes de entrar a Mausa havia laranjas, a Estrada de Ferro Sorocabana passava rente ao barracão. Permaneci na Mausa por quase sete anos. Naquele tempo o bom empregado era aquele que fazia de tudo. Foi no tempo de João Bottene, Dr. Carvalho, Arthemio Bottene, Fleury, Bottini. João Bottene era um homem que só com o olhar impunha respeito. Muito inteligente, fabricou as primeiras locomotivas do Monte Alegre, os vagõezinhos vinham de Santa Bárbara D`Oeste só com cana-de-açúcar. Não havia caminhão como há hoje.

Que horas o senhor ia trabalhar na Mausa?

Naquele tempo não havia horário, não havia energia a toda hora. Por exemplo, às sete horas da manhã estava lá, quando era meio dia, uma hora da tarde, vinha embora. Às nove horas, onze horas da noite tinha que voltar para trabalhar, não havia energia para trabalhar, a cidade não tinha energia. Depois a Mausa adquiriu um gerador de energia. Piracicaba toda tinha esse problema de falta de energia, principalmente o setor metalúrgico que usava a energia mais pesada. Ali eram fabricadas turbinas, filtros, tudo para usina de açúcar. Havia a fundição de peças, caldeiraria, ferraria, ajustadores, torneiros. Trabalhei mais como ajustador, mas quando ia fundir, participava todo o pessoal. Eram poucos funcionários.

O senhor saiu da Mausa e foi fazer o que?

Meu pai trabalhava no fundo de casa como sapateiro, fui ajudá-lo. Depois comprei um caminhão Ford, ano 1946, foi meu primeiro caminhão. Meu cunhado, José Menen, o Lolo, era construtor, eu transportava material para ele. A carroceria era de madeira, na hora de carregar e descarregar eu usava a pá, muitas vezes sozinho. Por 15 anos trabalhei com caminhão, em 1959 comprei um caminhão Internacional novo, na Duvema, situada na Rua Benjamin Constant. Levava ferro de construção produzido pela Dedini para Brasília, vi Juscelino Kubitschek de Oliveira andando em lombo de burro, lá em Brasília. Eu dormia como um canivete, encolhido, não dava para esticar as pernas na cabine do caminhão.

Como eram feitas as refeições no percurso?

Existiam as vendas na beira da estrada, comia ali, outras vezes tinha algum lugar que faziam comida para nós que viajávamos. Com o tempo foram formadas cidades ao longo do percurso. Ai parava em algum posto existente.

O senhor viajava quantas horas para chegar até Brasília?

Muitas vezes uns dois dias, não havia estradas como existe hoje. Era tudo estrada de terra. Não tinha postos de gasolina a vontade. O caminhão era movido à gasolina. No Internacional levava de dez a doze toneladas. Viajava sem ajudante, era eu, Deus e o caminhão. Viajava para o litoral, fazendo frete, transportei o primeiro aço utilizado na construção da Cidade Ocian. Na volta à Piracicaba trazia insumos para fertilizantes utilizados pela Cooperativa dos Plantadores de Cana de Piracicaba. Carregava na Solorico. Às vezes descia para o litoral transportando açúcar. Levei muito açúcar para Belo Horizonte.

Quantos sacos de açúcar eram transportados em cada viagem?

Conforme o pedido do cliente, variava de 150 a 200 sacos de 60 quilos cada um, totalizando 12.000 quilos. A usina tinha empregados para carregar o caminhão, para descarregar, muitas vezes eu não tinha ajudante, descarregava sozinho. Eu era um homem muito forte, carregava até dois sacos de açúcar de uma só vez. Fui muitas vezes para São Paulo quando a estrada era de terra, de Jundiaí até São Paulo começaram a fazer uns lajões, isso no tempo do Governador Adhemar de Barros. A Via Anchieta era fácil para descer, mas para subir era brava, tinha uma única pista. Eu ia para o Paraná, passava por Itapetininga, Itapeva, Itararé, Sengés, Ponta Grossa. Fui para o Mato Grosso, para Porto Velho, no Acre. Pegava carga de empresas de São Paulo e levava. Nessa época eu já tinha caminhão Mercedes-Benz. A primeira carreta que eu tive vendi para o Lubiani, Na época a empresa mais antiga de transportes de cargas era o Expresso Piracicabano. Cheguei a ter uma meia dúzia de caminhões, com motoristas trabalhando para mim.

Para dirigir caminhão tem que ter conhecimentos sobre o seu funcionamento, um dos pontos é o freio a ar, que se usado em excesso fica sem freio?

A sapata do freio tem que estar sempre sendo regulada, ficar encostada, para não usar muito o ar, ao pisar no freio ele já parar. Hoje se acabar o ar o caminhão trava.

Hoje é mais fácil dirigir um caminhão do que um automóvel?

Eu prefiro o caminhão, ele oferece mais segurança. Se precisar dirijo caminhão, mas atualmente só ando com o meu automóvel.

Porque a carreta faz o famoso “L”, que é quando a carroceria gira em torno do cavalo (onde está o motor)?

Isso depende do motorista. Não pode pisar no freio com toda a força do pé. Precisa travar no manequim, que freia a carreta lá traz, ai segura o cavalo pisando no freio. Se frear só a frente a carreta faz o “L”. Tem que ter habilidade para dirigir uma carreta. 

Como era viajar para o Acre nessa época?

Havia cargas perecíveis que tinham prioridade, não ficavam nas filas de balsas para transpor diversos rios, os demais caminhões obedecia a fila. Para ir e voltar levava até 60 dias de viagem. Quando o tempo estava bom demorava menos, uns trinta dias. Naquela época não existia seguro para veículos. Tive dois caminhões roubados, decidi parar de trabalhar no setor de transportes. Montei uma laminação de ferro, onde foi o chamado “Vidrão”, que era uma fábrica de garrafas que não progrediu. Eu fazia ferro de construção, adquiria refugo de ferro para relaminar. Após algum tempo encerrei as atividades dessa laminação.

Nessa época o senhor já era casado?

Já tinha me casado com Aparecida Pagotto Gerdes, ela faleceu há treze anos. Nosso casamento foi realizado na Igreja São Judas Tadeu, na época a Avenida Independência era uma pista só da Santa Casa até a Igreja São Judas Tadeu, sem asfalto. Tivemos quatro filhos: Reinaldo, Rose, Rogéria e Ricardo.

O senhor e seus filhos passaram a trabalhar na área de construção civil, e nessa atividade realizaram remoções de monumentos de um local para outro da cidade?

Eu estava ainda trabalhando, quando pegamos um serviço, que era relativo ao monumento aos combatentes da Revolução Constitucionalista de 1932. Esse monumento estava na Praça José Bonifácio, tinha sido removido para a praça em frente ao Cemitério da Saudade. Nosso trabalho era levar esse monumento na Praça José Bonifácio, de onde tinha sido tirado. Foi um trabalho muito difícil. São peças pesadas. Dr. João Correia vinha lá e recomendava que tomássemos cuidado para não danificar o monumento nesse trabalho de remoção. A estrutura para montar uma parte é de pedra, depois vem as bases em granito, são peças de 300, 500 quilos. A escultura é em bronze. Outro monumento que removemos foi o dedicado a Luiz de Queiroz, estava em frente a ESALQ, fora do campus, e foi levada para a Praça José Bonifácio. Fizemos a base, é um monumento alto, e colocamos no topo a escultura da figura de Luiz de Queiroz. É muito pesado, tivemos que usar guindaste para levantá-la. 

O senhor foi um dos responsáveis em colocar o busto do seresteiro Cobrinha em frente ao cemitério?

Sempre gostei muito de seresta, acompanhava os seresteiros até pouco tempo. Todo fim de semana estava com meus amigos seresteiros, cantava com eles. Pensei em ajeitar o terreno onde tinha o monumento aos combatentes de 1932 e colocar ali um monumento ao Cobrinha (Victorio Ângelo Cobra), vi muitas vezes ele cantar, ia com ele onde se apresentava, inclusive fui com ele à Sorocaba. Era uma pessoa muito boa, foi um dos homens que representou Piracicaba até fora do Estado de São Paulo. Sempre cantou muito bem. Lutei muito tempo, consegui com os amigos que ajudaram, e assim foi feito o monumento ao Cobrinha que permanece lá. A fundição do busto foi feita por um amigo, Euclides Libardi. O projeto é de Marco Antonio Cavallari. Colocamos o busto, fizemos uma festa de inauguração do mesmo, a parte inferior é uma estrutura em alvenaria, e o busto é em bronze.

Do alto da sua experiência como o senhor vê os acontecimentos atuais?

Gostaria que os investimentos feitos em futebol fossem canalizados para a saúde. Enquanto a saúde está em situação precária o futebol recebe grandes recursos.

A responsabilidade maior dessa inversão de valores é do povo ou do governo?

A maior parte é responsabilidade do povo. Outra parte é do governo, sua função é administrar os recursos. Em minha opinião a pessoa já começa a assumir uma responsabilidade quando entra em uma escola. Lá ela irá aprender a ler e a escrever. Com 14 anos se não quiser seguir os estudos vá aprender um ofício. Educação quem dá não é a escola, é o pai, a mãe, a família. No meu tempo as crianças brincavam com bola de meia, era o tempo do rec-rec, (uma espátula de ferro que era utilizada para tirar o mato que crescia nos vãos entre paralelepípedos das vias públicas).

O senhor conheceu Brasília desde quando foi construída?

Conheço Brasilia desde quando estava sendo construída, vi Juscelino Kubitschek e Oscar Niemeyer andando em lombo de burro, inspecionando as obras. Juscelino era um homem simples.

O senhor andou muito dentro da cidade de São Paulo?

Andei com meu caminhão, hoje mudou muito. Ia para a Rua Paes de Barros, Mooca, Mercadão, Rua Bresser, Rua Oriente, Rua Maria Marcolina, não havia esse transito intenso. Nós tínhamos em Piracicaba a Guarda Municipal, andavam a pé. Quando prendia alguém iam a pé para a cadeia. Naquele tempo alguém da família tinha que levar a comida para o preso, senão ninguém dava.

O senhor lembra-se dos cavalarianos?

Antes dos cavalarianos existia a Mula Preta. Era um furgão grande, negro, quando prendia alguém era colocado nesse furgão. A pessoa que andasse pelas ruas sem nenhuma ocupação ou emprego era detido por vadiagem. No Bairro Monte Alegre havia bailes, para ir ao baile era a jardineira que levava, seu proprietário chamava-se Pavão. Na volta as mulheres vinham caminhando, ninguém mexia com elas. Todo o mundo as respeitava. Prova disso é que a Fábrica Boyes tinha três turnos, uma turma entrava às cinco horas da manhã, saia às duas horas da tarde, outra entrava às duas horas da tarde e saia às dez horas da noite, outra entrava às dez horas da noite e saia às cinco horas da manhã.  Todo mundo ia a pé, da Paulista, do Piracicamirim, ninguém mexia, hoje dentro do ônibus estão matando. Naquele tempo quadrava-se o jardim, os negros faziam o trajeto quadrando a Rua Moraes Barros, Rua Governador Pedro de Toledo, voltando à Praça José Bonifácio, o banheiro utilizado pelo pessoal que quadrava o jardim era o da Brasserie, do Lider Bar, para passarmos e irmos ao banheiro falávamos: “ -Dá licença?”. Eles paravam, a pessoa passava pela fila deles. Existia um grande respeito.

O senhor freqüentava o cinema?

Eu ia lá no “puleiro” do Cinema São José. Assistia Tom Mix, Buck Jones, Tarzan. A freqüência no “puleiro” era predominantemente masculina. Guardo até hoje dois cofrinhos com moedas, que eu guardava para dar para minhas filhas, há pouco tempo abri os cofrinhos e vi as moedas: centavos, tostões, duzentos réis, trezentos réis, quinhentos réis, ninguém sabe o que é isso. Com um tostão, com duzentos réis, ia ao cinema, comprava balas do Passarella, assim nos divertíamos. Hoje tudo é mais fácil, basta apertar um botão. Meus filhos têm obra no Maranhão, de lá eles estão me vendo em casa através de câmeras.

O senhor nunca imaginou que um dia iria ver isso?

Nunca. Só acho que o país precisa melhorar sua produtividade. A educação é muito importante, tem que ficar claro que ela é dada em casa, professor não educa, ensina, dá conhecimentos. O pai que tem dois filhos verá que cada um deles pensa de forma própria. Como uma única pessoa pode tomar conta de uma centena de crianças? Considero um erro o país ter creches, acho errada a mulher não cuidar dos seus próprios filhos. Tive um funcionário, excelente, que um dia me comunicou que no dia seguinte iria deixar de ir ao trabalho para cuidar dos papéis do filho que nascera. Dei-lhe os parabéns, perguntei-lhe se era o seu primeiro filho. Ele disse-me que era o seu primeiro filho, mas que a sua mulher já tinha oito filhos. Perguntei-lhe como iria tratar dos oito filhos mais o que nascera ele disse-me: “-Levo na creche, a creche que trate!”. Pode se afirmar que isso é educação, exemplo de vida? Por isso nunca vai acertar esse país.

O senhor tem alguma religião?

Sou católico, apostólico, romano. Não desfaço das demais religiões. Vou à missa na Igreja Santa Catarina, quando posso, assisto muitas missas pela televisão, faço diariamente minhas orações ao acordar e ao me deitar. Agradeço a Deus, e peço pelos meus entes querido, para aqueles que necessitam de saúde.

O senhor acha necessário o homem ter uma religião?

A pessoa tem que acreditar em Deus. O resto da vida é uma ilusão. A primeira coisa que a pessoa deve pedir a Deus é a saúde, é a coisa mais importante que temos. O resto são ilusões que vamos vivendo.

O ser humano é um pouco infantil?

Exatamente. Hoje é, antigamente não. A tecnologia trouxe benefícios, mas na maior parte das vezes é mal utilizada, isso acontece com o computador, com a televisão.

O senhor gostava de pescar?

Gostava muito. No Bairro Ondinhas, meu sogro, o Pagotto, tinha uma propriedade, era o maior pesqueiro que existia no Rio Piracicaba. Hoje o pessoal vai pescar leva lingüiça, algum tipo de carne, cerveja. Nós íamos ao rancho na beira do rio e pegávamos a “mistura”, (acompanhamento da refeição), no rio. Levava café, um garrafão de pinga, limão, banha, era aquele quadradão de banha, panelão de ferro. Fritava lambarizinho no fogão a lenha, fazia uma polenta, pescava de barco. Uma vez veio um parente meu de Sorocaba, fomos pescar. Armei o tarrafão, passei a corda de espinhel, é uma corda com bastantes anzóis pequenos, pegava principalmente mandi, passei a rede de lance, que é de barranco a barranco, enchi o barco de peixe: dourado, piracanjuba, corumbatá. Isso tudo no Rio Piracicaba, esse rio é milagroso. Eu tinha uma caminhonete ano 1951, lotei de peixes, coloquei umas folhas de bananeira em cima, passei uma cordinha e fui para Sorocaba, dei todos os peixes para os meus parentes. Tudo isso peguei aqui. No Mato Grosso uma vez peguei um jaú, de oitenta e poucos quilos, só a cabeça pesava trinta quilos. De ilusão se vive o homem.



segunda-feira, setembro 23, 2013

PAULISTENSES













MÁRCIO MONTEIRO TERRA


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 19 de setembro de 2013
Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/



 



ENTREVISTADO: MÁRCIO MONTEIRO TERRA


 
Márcio Monteiro Terra nasceu no dia 17 de novembro de 1943 na cidade de Itaí, na região de Avaré, Estado de São Paulo. Filho do professor Aracy de Moraes Terra e Zoraide Monteiro Terra que tiveram os filhos: Magnus Monteiro Terra, Mário Monteiro Terra, Márcio Monteiro Terra, Maurilo Monteiro Terra e Milton Aguiar Terra este último filho das segundas núpcias do seu pai. Marcio tem um grande amigo, que considera como um irmão: Daniel Libardi.
Até que idade você permaneceu em Itaí?
Posso afirmar que não conheço Itaí, meu pai era inspetor escolar, era removido constantemente de uma cidade para outra. Em Itaí ele permaneceu em torno de um ano, foi quando eu nasci, sou itaiense por força das circunstâncias. Logo em seguida meu pai foi removido para Tietê onde permanecemos por alguns anos, ele foi diretor do grupo escolar de Tietê que existe até hoje. A minha mãe era formada professora, mas não exercia a profissão.
Qual era a forma de lazer muito praticada na época?
Sempre gostei de jogar tênis de mesa, que na época era denominado de “ping-pong”. Lembro-me das famosas goiabadas feitas em Tietê, a “Curuçá” era a mais conhecida.
De Tietê meu pai foi promovido de diretor de grupo para inspetor escolar e transferido para Santos.
Quantos anos você tinha quando ocorreu a transferência do seu pai para Santos?
Eu deveria ter mais ou menos uns dez anos de idade. Fomos residir no bairro Gonzaga, na Avenida General Francisco Glicério, travessa da Avenida Ana Costa, próximo onde havia a linha de trem, não muito distante da praia. Meu pai inspecionava os grupos escolares estaduais de toda a região de Santos. Permanecemos residindo em Santos por cinco anos. Um concunhado dele era delegado de ensino de Piracicaba, hoje o cargo recebe o nome de dirigente de ensino. A sede era na antiga casa do Preté, onde chegou a ser o gabinete do prefeito de Piracicaba, na Rua São José esquina com a Rua do Rosário. O concunhado dele, Mário de Almeida Mello, estava se aposentando. Meu pai não queria permanecer em Santos.
Tinha algum motivo para que o seu pai não permenecesse em Santos?
Nas visitas de inspeção ele tinha que ir a lugares inóspitos, algumas vezes usava canoas para atravessar pequenos rios, e em uma dessas vezes ele caiu, o barco virou e ele quase morreu afogado, ele não sabia nadar. Estava só ele e o condutor do barco. Ele ficou traumatizado. Sólon Borges dos Reis era muito amigo do meu pai. Meu pai foi nomeado delegado de ensino em Piracicaba, imediatamente ele veio para cá.
Você passou uma fase muito interessante da vida, dos 10 aos 15 anos em Santos.
Lá estudei no Instituto Canadá, na região do Gonzaga, na Rua Mato Grosso, 163. Lembro-me que eu freqüentava muito a praia. Jogava tênis de mesa no Clube Sírio Libanês que ficava na Avenida Ana Costa. Meu irmão Maurilo jogava muito bem, eu era razoável. Formávamos uma dupla e disputávamos o Campeonato Santista de Tênis de Mesa. Naquele tempo o melhor jogador de tênis de mesa do Brasil morava em Santos, o famoso “Biribinha” cujo nome é Ubiraci Rodrigues da Costa, isso em 1954, 1955. Na época, Santos ainda tinha bonde.
Aproximadamente em que ano a sua família mudou-se para Piracicaba?
Foi em torno de 1957, viemos morar no centro da cidade, no Edifício Gianetti, no décimo andar, bem ao lado do relógio da catedral. Eu era moço, não me importava com as batidas do relógio marcando as horas. Talvez se fosse hoje me sentiria incomodado. Meu pai adquiriu uma casa, fomos morar na Rua São João, quase esquina coma Rua Regente Feijó. Eu tinha 18 anos e estava fazendo o Tiro de Guerra, quem comandava era o sargento Guatura. Nessa época minha mãe faleceu, ela pediu para que eu viesse até o centro comprar a revista Coquetel, ela gostava de fazer palavras cruzadas. Quando voltei, vi a vizinhança toda em torno de casa, ela tinha sido conduzida ao Hospital Gimenes, que mais tarde passou a ser o Hospital Unimed, e hoje está desativado. O falecimento dela abalou a família toda. Meu pai sofreu um golpe violento, viviam muito bem, era um casal fantástico. Meu pai sempre foi um homem muito sério, respeitoso, integro e honesto. Morei com o meu pai até meus 35 anos, via que ele era corretíssimo ao extremo.
Nessa época fazia o Tiro de Guerra e estudava onde?
Estudava no Sud Mennucci, depois fui estudar no Colégio Dom Bosco, onde conclui o científico. Sou do tempo do Padre Pedro Baron, primeiro diretor do Colégio Salesiano Dom Bosco. Foram colegas de colégio Adilson Maluf, Celsinho Silveira Mello. Nesse ínterim fui participar de um curso de oratória promovido pelo SESI, que ficava no último andar do prédio onde se situava o Cine Politeama, prédio que foi demolido e deu lugar ao estacionamento do Banco Bradesco, na Praça José Bonifácio, no centro. Osvaldo Sobeck, jornalista, trabalhou na Folha de Piracicaba de propriedade de Cecílio Elias Neto, como funcionário do SESI ele deu um curso de oratória, participei desse curso. Alguém me falou: “- Você tem jeito para trabalhar em rádio!”. Nessa época fui trabalhar no Jornal de Piracicaba, onde permaneci por três anos como revisor. Entrava as onze horas da noite e saia as cinco ou seis horas da manhã. Trabalhei com Losso Netto, Nene Ferraz, Acary de Oliveira Mendes, Luiz De Francisco. Eu tinha uma atenção especial com o editorial feito pelo Dr. Losso Netto. Isso no tempo do linotipo. Eu saia do Jornal as seis horas da manhã e ia para o Tiro de Guerra. As vezes ia trabalhar já com a farda. Era um tempo em que para encerrar o jornal eram levadas horas e horas. O jornal fechava as matérias as onze horas da noite, até fazer todo o jornal era um trabalho desgastante para o pessoal da oficina. E para o revisor também, tinha que ficar acompanhando, eles traziam a prova para ser revisada.
Quando você começou a trabalhar em rádio?
Comecei a trabalhar na Rádio “A Voz Agricola do Brasil” da Rede Piratininga, situada na Rua XV de Novembro, onde atualmente é o Supermercado Jaú Serv,  havia uma padaria da família Maranhão, existiam poucas padarias na cidade na época, na parte superior era a rádio. Pela Rua XV tinha uma escada, que dava acesso a  parte superior.
 
 

 
 
 
Como se deu o seu ingresso na rádio?
Falei com Ary Pedroso, Hugo Pedro Carradore, este último tinha um programa do meio dia a uma hora da manhã, eu participava um pouco do programa.Trabalhei com Duarte Filho que era o nome artistico de Miguel Célio Hyppolito, ele tinha um programa de esportes sobre o futebol amador. Naquele tempo era comum , esse habito permanece até hoje, a pessoa ter um nome civil e outro artístico.
Na rádio você fazia o que?
Locução. Fiz um teste e passei. Iniciei trabalhando nos setores de jornalismo e esportes. “Piracicaba em 60 minutos” era um programa comandado pelo Hugo Pedro Carradore, fazia uma participação a tarde com Duarte Filho e depois passei a ser reporter volante da equipe de esportes que era comandada pelo Ary Pedroso, um dos melhores locutores da história de Piracicaba. Ary era muito bom narrador de futebol.
O que é reporter volante?
É o locutor que fica dentro do campo, fazendo entrevistas com jogadores, com técnicos, é o reporter de campo, com cabo (fio) até o microfone. O cabo que liga o microfone a central até hoje é insubistituivel, mantém a fidelidade do som. Existe os aparelhos sem fio, só que perdem um pouco a qualidade, principalmente onde sofrem interferências. Eu entrava em campo e ia entrevistar os jogadores de futebol, técnicos, e passando as informações. Muitas vezes o locutor não via alguma coisa que havia acontecido embaixo. Entrevistava o juiz, presidente do clube.
Você tinha acesso aos bastidores?
Após o jogo os vestiários eram abertos, hoje já não é mais assim, há uma sala só para entrevistas. Naquele tempo entravamos no vestiário, entrevistando jogador por jogador, alguns tomando banho.
Ali você ouvia os comentários dos jogadores entre si sobre a partida?
Nós tinhamos bastante afinidade. Como repórter de campo, sem falsa modéstia, eu era muito bom. Eu tinha umas tiradas boas. No então Estádio Roberto Gomes Pedrosa, que deu lugar ao Extra-Hipermercado, na Rua Governador Pedro de Toledo, para chegar até o vestiário tinha um túnel e os degraus, eu narrava, “Ary, estou no primeiro degrau, segundo degrau, terceiro degrau.” Batia na porta e dizia: “ -Estou batendo na porta, vamos ver se alguém abre para me atender!”. Na época isso era novidade.
Era no tempo em que o torcedor ia ao campo levando seu rádio de pilha?
De cada dez torcedores, oito levavam seus rádios. A audiência era muito grande dentro e fora do campo. Fiquei nessa função por pouco tempo, o Ary transferiu-se para a Rádio Difusora e passei a ser narrador. O programa chamava-se “Papo de Bola”, era das 11:30 às 12:00 horas. A tarde fazia outro programa chamado “Panorama Esportivo”, das 18:00 às 19:00 horas. Meu redator era Luiz Carlos Quartarollo, Rubens de Oliveira Bisson era meu comentarista. Ai que apareceu Júlio Galvão. A rádio “ Voz Agricola” peguei o final dela na Rua XV de Novembro, depois ela passou para a Rua Moraes Barros, 1191. Depois passou para a Rua Moraes Barros, bem em frente ao portão da Companhia Paulista de Força e Luz, o prédio foi demolido e deu lugar a uma agência do Banco Itaú. Ficou alguns anos ali quando Francisco Silva Caldeira comprou a rádio que era da Rede Piratininga. Ele mudou o nome para Voz de Piracicaba, depois passou a ser Rádio Alvorada, Foi Rádio Antena 1, Rádio Globo, hoje é a Rádio Onda Livre. Trabalhei um ano com Ulisses Micchi e Raul Hellu na Rádio Difusora.
Qual foi o primeiro jogo que você narrou?
Foi XV de Novembro e Palmeiras jogo disputado no Estádio Roberto Gomes Pedrosa, em Piracicaba.
Você ficava na cabine de transmissão, tinha que ter um grau de visão muito bom para distinguir os jogadores a distância.
Naquele tempo ao qual estamos nos referindo, começo da decada de 60, tinha ponta direita, ponta esquerda, centro avante, zagueiro central, lateral esquerda eles guardavam mais as posições do que hoje. Após uns 10 minutos você pegava mais ou menos a fisinomia e a localização do jogador em campo. Quem narra jogo de futebol, não pode corrigir um erro seu ao relatar um passe de bola, apesar de que muito jogo de futebol que hoje é transmitido pelo rádio a televisão também o transmite. Quem transmite não pode perder a sequencia. Voce marca a escalação de 1 a 11, põe em um papael duas fileiras de números e nomes, dos dois times, o juiz, e aí você comanda a transmissão.
Qual era o seu bordão na época?
O meu bordão, que ficou famoso era: “ Enquanto a bola dança, o tempo avança!”. De cinco em cinco minutos eu falava isso para anunciar o tempo e o placar do jogo. Eu sempre falei: “ O XV é o time mais importante do mundo!”. Isso para ressaltar a importância que o XV representava para a cidade de Piracicaba. Como representa até hoje, se bem que o XV naquele tempo teve uma fase bem melhor do que a fase atual. O XV passou por várias fases, muitas alternativas, teve uma fase bem próspera com o Comendador Humberto D `Abronzo. Montou um grande time, em 1967 estavamos na segunda divisão.  Em 1948 o XV foi o campeão da Lei de Acesso. Foi o primeiro time do interior que ganhou a Lei de Acesso, passsou a participar da Divisão Especial do Futebol de São Paulo. Foi o primeiro ganhador em 1948 e 1949. Se manteve até cair em 1965. O presidente era José Luiz Guidotti. Ai entrou o D`Abronzo, o XV quase subiu em 1966, em 1967 acabou ficando campeão. Seu maior rival era o Paulista de Jundiaí. Lembro-me perfeitamente que através de nossas rádios lotávamos dezenas de onibus levando torcedores para assistirem jogos decisivos no Pacaembu,  no Estádio Jaime Cintra em Jundiaí onde saia muitas brigas. Os torcedores esperavam na estrada, sobre os pequenos viadutos e ficavam jogando pedras nos onibus. Tivemos jogos violentos, tanto em Jundiai como em Campinas.
O que está acontecendo com o futebol nos campos, que não levam mais o mesmo perfil de público?
Atualmente há muitas transmissões por televisão, canal aberto, canal fechado. O público vê pela tevisão grandes classicos, e em times menores irá ver jogos de menor expressão. Há um grupo de torcedores do XV que são aficcionados, são no máximo 10.000 pesoas, a média do XV nesse torneio deve ser em torno de 500 pessoas pagantes. Quando vem Corinthians, Palmeiras, até dividem o estádio, metade da torcidaa do Palmeiras, outra metade é para a torcida do XV. A média de público chega a 6.000 pessoas. O Estádio Municipal Barão de Serra Negra comporta 18.500 pessoas. Eu acompanhei o XV durante 42 anos. Segundo o saudoso Rocha Netto, eu fui a pessoa que assistiu mais jogos do XV. Devo ter assistido a uns 2.000 jogos do XV em minha carreira.
Você após ser por muito tempo narrador dos jogos ocupou outra atividade no rádio esportivo?
Após narrar por uns 15 anos fui ser comentarista. Conheci Chico de Assis, quando ele passou a narrar bem uma partida disse-lhe “- Você narra a partida que eu comento!” Diversos comunicadores iniciaram sua carreira comigo, entre os mais famosos: Roberto Cabrini, Luiz Carrlos Quartarollo que está na Rádio Jovem Pan ha uns 30 anos, ele era meu redator, depois o passei a reporter de campo, Rogério Achiles, Tony José, Tarcisio Chiarinelli que fazia o plantão esportivo, informações sobre jogos da rodada.
Márcio você fez algum curso de nível superior?
Sou bacharel em Direito, pela Faculdade de Direito de São Carlos, sou da segunda turma, me formei em 1973. O meu pai não admitia que tivesse na família um filho que não fosse diplomado. No Jornal de Piracicaba, quando eu era revisor escrevia também uma coluna sobre basquete, chamava-se “Basquete Bolando”. Naquele tempo em que mudei para Piracicaba o forte do XV era o basquete masculino. OXV foi campeão Sul-Americano, tempo do Vlamir, Filetti, Pecente, Zé Boquinha, Valdemar Blatkauskas que faleceu em um acidente na Rodovia Anhanguera. Os melhores times de basquete do interior eram o XV e Franca. Em São Paulo eram o Palmeiras e o Sírio.
Essas coisas foram acabando por quê?
Nessa época o basquete era esssencialmente amador. Hoje é profissional, o XV tem um time de basquete, uma luta insana do Caprânico que é o presidente e mais alguns colaboradores. A diferença de receita do basquete do XV com relação ao Pinheiros por exemlo é muito grande. Além do apoio oficial há também patrocinadores.
Quando encerraram as atividades da Rádio Alvorada, você ficou parado?
A Rádio Alvorada foi arrendada para uma instituição religiosa. Fui convidado pelo Evaldo Vicente para escrever na Tribuna Piracicabana, logo depois o Jairinho Mattos me convidou para vir trabalhar na Rádio Educadora. Ele queria lançar um programa jornalístico, e estava encontrando dificuldades, segundo ele me falou, em encontrar um ancora. Assim surgiu o programa “Comentaristas da Educadora”, que já está no ar a quase oito anos, das 12:00 às 13:30, todos os dias de segunda a sexta feira, é o programa jornalístico de maior audiência de Piracicaba. Esse programa inicialmente começou comigo, com Waldir Guimarães, Jairinho Mattos participava de alguns programas, e a Eliana Teixeira. Eu era o produtor e o ancora. De três anos para cá foi contratado Mauricio Furlan, que tem muita experiencia em rádio, hoje ele produz o programa e eu continuo sendo o ancora, junto com Waldir Guimarães, Jairinho Mattos tem uma participação maior agora, o Beto Godoy que está de férias, e o Paulo Eduardo Carlin, mais o Rogério Leme que faz o noticiário policial. Essa é a equipe que comanda atualmente o programa “Comentaristas da Educadora”. O programa começa com o meu comentário que se chama “ A Força da Opinião”.
Marcio você casou-se?
Fui casado com Maria de Fátima Pachani, dessa união que durou quinze anos nasceu uma filha, Maria do Carmo, residente em Los Angeles nos Estados Unidos, tenho uma neta, Victoria, nascida lá. Uma vez por ano minha filha vem à Piracicaba.
Você chegou a viajar pelo mundo?
Devo conhecer pelo menos uns 30 países, em 1983 foi realizado o Prêmio Sanyo de Radialismo, fui eleito o melhor radialista de Piracicaba, do Interior do Estado de São Paulo, na festa de encerramento relizada no Maksoud Plaza, envolvendo os radialistas do interior e os grandes nomes da capital, foi feito um sorteio entre 60 agraciados, fui sorteado com uma viagem de 30 dias para o Japão, com tudo pago pela Sanyo. Conheci o Japão inteiro.
Você recebeu convites para trabalhar na capital?
Tive bastante convites para trabalhar em São Paulo, nunca fui, apenas em 1978 quando teve a Copa do Mundo na Argentina, eu tinha muita amizade com Osmar Santos e com a equipe dele, fui convidado e participei pela Rádio Globo de São Paulo, das transmissões, da Argentina mandava os flashs para Piracicaba e participava das transmissões da Rádio Globo. Conheço bem Osmar Santos, estive em seu casamento, ele veio diversas vezes me visitar em Piracicaba. Osmar Santos criou um novo modelo nas transmissões esportivas.
Você já transmitiu algum jogo sem ver a partida?
Cheguei a transmitir um jogo inteirinho, quando cheguei a Piracicaba a transmissão não tinha ido ao ar. Isso aconteceu umas quatro ou cinco vezes, hoje é linha dupla, naquele tempo era uma linha só, não havia o retorno do estúdio para quem estava transmitindo.
Você acha que o rádio melhorou ou piorou?
Acho que os mais antigos radialistas ainda continuam sendo os melhores de Piracicaba, a renovação não acompanha a mesma capacidade de antigamente. Com raríssimas exceções a renovação no rádio não alcança a qualidade dos antigos. O locutor de rádio precisa vender propaganda para sobreviver, antigamente não era tanto assim. Sempre vendi propaganda, já tivemos em Piracicaba um caso em que um gago fazia um programa, ele só não era gago ao falar no microfone, era um bom locutor. Trabalhou comigo muitos anos.
Márcio você participou da política?
Fui vereador durante 10 anos, por duas legislaturas. Estive na Câmara de primeiro de janeiro de 1983 a 31 de dezembro de 1992, sendo prefeitos Adilson Maluf e José Machado. Naquele tempo o rádio elegia, hoje não elege mais, tanto que não temos nenhum radialista na Câmara. Outras profissões ocuparam espaço na política.
Você realizou entrevistas com personalidades políticas de expressão nacional?
Entrevistei Laudo Natel, Mário Covas, Fernando Henrique Cardoso, Paulo Maluf entrevistei dezenas de vezes, tive amizade com ele por muito tempo, frequentei a casa dele na Rua Costa Rica, 146. Conheci sua esposa, Dona Sylvia. Almocei na casa dele diversas vezes. Isso quando eu era vereador. Ele era prefeito de São Paulo.
Você acha que o fato de ser um comunicador ao se envolver com política pode se comprometer?
Se o tempo voltasse eu nunca teria saido candidato a vereador. Apenas entrei porque quem me convidou foi Jairo Mattos, que é uma pessoa integra, honesta, tanto como pessoa como político.
Você já transmitiu algo inusitado?
Transmiti velório e sepultamento do ex-prefeito Luciano Guidotti, fiz a cobetura total. A queda do Edificio Luiz de Queiroz (Comurba) eu e Hugo Pedro Carradore ficamos instalados na farmácia do Kalil, localizada na Rua Prudente de Moraes, durante 15 dias fizemos a cobertura de todos os acontecimentos.


domingo, setembro 22, 2013

EURIDES GIMENES CASAGRANDE


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 12 de setembro de 2013.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/

 


ENTREVISTADA: EURIDES GIMENES CASAGRANDE


 
Eurides Gimenes Casagrande nasceu a 12 de agosto de 1935, no município de Piracicaba. Filha de João Domingues Gimenes Filho e Isabel Alonso Gimenes que tiveram quatro filhos: João, Diogo,Eurides e Aparecida. Seus avós maternos e paternos imigraram da Espanha, os paternos adquiriram uma área com mais de 100 alqueires de terra, a uns trinta quilômetros de Piracicaba. Ela tem paixão por animais, pela vida rural, embora resida na cidade, com sua picape Pampa vai sozinha toda semana até o sítio de sua propriedade. Lá é recepcionada com muita alegria pelo seu cão de estimação que sem nenhuma cerimônia cumprimenta ao seu modo a sua amiga, entra na picape e a acompanha até a abertura da casa da sede do sítio. Patos, pavões, galináceos, desfilam pelo terreno. Eurides e sua família sempre levaram uma vida de muito trabalho. Aos 11 anos ela já montava em sua égua e conduzia as vacas que estavam mais afastadas para serem ordenhadas pela sua mãe.
Conheceu seu marido quadrando jardim, um bom hábito cultivado pela juventude da época. Os rapazes circulavam a praça central em um sentido enquanto as moças andavam no sentido contrário. Foi assim que surgiram muitos namoros e casamentos. Eurides foi funcionária da famosa Fábrica de Bolachas Cacique.  
Qual era a atividade principal desenvolvida no sítio?
Era a criação de gado leiteiro. Criavamos também animais de médio e pequeno porte, como porcos, galinhas. As plantações eram feitas principalmente para alimentar os animais. A renda familiar vinha da comercialização de leite, meu tio trazia os latões de leite para a cidade com uma caminhonete velha de sua propriedade.
Com que idade a senhora começou a trabalhar no sítio?
Eu tinha onze anos quando comecei a ajudar a minha mãe na leiteria. Eu montava na Baia, uma égua marrom,  muito mansa, para subir tinha que encostá-la em um barranco. Ia com ela ao encontro das vacas que estavam mais distantes, elas já sabiam que era para virem em direção a mangueira onde minha mãe as ordenhava. Ela já era viúva, meu pai faleceu quando eu ia completar nove anos. As vacas eram muito mansas, vaca brava minha mãe vendia. Quando minha mãe ficou viúva tínhamos mais de trinta vacas. Às cinco horas da manhã ela já se levantava para tirar leite.
Mesmo trabalhando a senhora ia à escola?
Estudava, a escola se chamava Escola Mista da Fazenda Figueira. Lá só estudava-se até o terceiro ano. Minha primeira professora foi Dona Angélica, a segunda professora foi  Dona Lavínia, a terceira Maria de Lurdes Frota Escobar, que mais tarde tornou-se minha tia ao se casar com meu tio. Nós entravamos na classe, ninguém falava nada, a primeira coisa que fazíamos era cantar o Hino Nacional, em pé, com a mão sobre o coração. Na parede havia um quadro enorme com a fotografia de Getúlio Vargas.
A mãe da senhora fazia o pão que a família consumia?
Boa parte da nossa alimentação provinha do próprio sítio, o pão era feito em casa, a lingüiça era caseira.
Com que idade a senhora veio junto com sua família, residir na cidade de Piracicaba?
Quando mudamos para cá eu tinha catorze anos. Nós alugamos o sítio para um tio e viemos para a cidade, fomos morar em uma casa alugada por nós e situada na Rua Dr. Otávio Teixeira Mendes, no Bairro Alto. Ali eu a minha mãe fazíamos marmitas, antigamente era uma atividade chamada “dar pensão”. A comida era separada em cinco ou seis marmitas presas a um varal com uma alça para transportar. Muitas famílias iam buscar, ou então eu ia levar até a casa delas. Da Rua Dr. Otávio eu ia com dois jogos de marmitas pesadas lá perto da Igreja Bom Jesus, a pé. Com essa atividade minha mãe ia nos mantendo. Quando ela parou com o fornecimento de marmitas eu fui trabalhar na Fábrica de Bolachas Cacique, lá trabalharam também meu irmão e minha irmã. A Cacique ficava na Rua Santa Cruz, sua proprietária era Dona Augusta, que foi dona também da Padaria Vosso Pão, onde hoje se situa o Edifício Canadá, na esquina da Rua Santo Antonio com a Rua Prudente de Moraes.
Que tipos de bolachas eram fabricadas na Cacique?
Fazíamos as bolachas: maisena, Maria e a água e sal. Eu ligava a máquina, a estampa ia cortando a massa, iam à assadeira, outras duas moças colocava-as no forno que tinha de 12 a 15 metros de comprimento, as bolachas saiam assadas na outra extremidade. Lá existiam dois batedores, batiam em uma caixa, havia as mesas do lado onde eram empacotadas. Trabalhei na Cacique por uns dois anos, uma semana eu trabalhava das cinco horas da manhã até uma e meia da tarde. Na semana seguinte da uma e meia da tarde até as dez horas da noite. Minha mãe me colocou em uma escola de costura situada próxima ao Líder Bar, na Rua Governador Pedro de Toledo. As aulas eram após o almoço, começava a uma hora da tarde, existiam mesas grandes, as professoras ensinavam a fazer o molde, cortar, tirar as medidas.
A senhora costurava qualquer tipo de roupa?
Só costurava roupas femininas. Eu tirava a medida, pegava o pano, fazia o molde, cortava e costurava. Usava-se muito tecido de algodão, tafetá (Tafetá é um tecido fino e acetinado feito de seda). Comecei a trabalhar em casa, minha mãe tinha uma máquina de costura Singer, para funcionar tinha um pedal que transmitia a força dos pés para uma correia e movimentava a máquina. Costurei mais para as pessoas de casa, parentes, amigas.




Foi nessa época que a senhora conheceu seu futuro marido?
Aos 16 anos conheci José Erasmo Casagrande. Antes de completar 19 anos nos casamos, foi no dia 25 de julho de 1953. O casamento foi realizado na Igreja Bom Jesus pelo Padre Martinho Salgot. No tempo em que eu namorava às 10 horas da noite tinha que estar dentro de casa, a cavalaria (soldados montados a cavalo) andava pelo bairro inteiro. Eles davam “um pega”,  ficavam bravos, com quem estivesse na rua depois de 10 horas da noite. A cidade parava, tinha muitos cavalarianos, e impunham respeito. Quando eu morava no Bairro Alto na Rua Moraes Barros esquina com a Rua Visconde do Rio Branco havia a sorveteria do Seu Florindo, era só lá que pegávamos sorvetes.
Qual era a profissão do seu marido?
Era pedreiro. Casamos e fomos morar na Rua XV de Novembro, um pouco acima do Cemitério da Saudade. Na época não havia muitas casas naquela região, havia muitas chácaras. Residimos ali por uns três anos, nessa casa nasceu a minha filha Sonia. Continuamos morando na mesma rua, mas mais abaixo, onde nasceu o nosso filho Celso, voltei a morar na Rua São José, próximo a Igreja Bom Jesus, passado uns tempos, meu sogro nos deu um casarão situado na Rua Moraes Barros, após passar o cemitério. Era conhecido como Bairro Casagrande, tinha muitas famílias com o sobrenome Casagrande. Lá eu tive minha filha Sandra. Para nos locomovermos usávamos o ônibus que passava em frente ao cemitério.
A senhora trabalhava na época?
Por três anos fui proprietária do Bar Furlan, situado na Rua XV de Novembro, tinha boche, as bolas eram feitas de madeira, mais tarde que vieram as bolas de massa. ( Ou bocha, consiste em lançar bochas (bolas) e situá-las o mais perto possível de um bolim (bola pequena), previamente lançado. O adversário por sua vez, tentará situar as suas bolas mais perto ainda do bolim, ou "remover" as bolas dos seus oponentes). Esse bar existe até hoje. Eu fazia polenta com frango para a turma de boche quando faziam torneio. Também fazia os salgados que eram vendidos no bar. A noite era meu marido quem tomava conta do bar. A nossa casa era junto ao bar. Em 1969 vendi o bar e fui morar na Avenida Dona Jane Conceição esquina com a Rua da Palma, na Paulista. Eu ia de ônibus até São Pedro, pegava malas de tecido com o bordado riscado, bordava, levava de volta para São Pedro. Bordava só o Ponto Rococó. Por uns cinco anos eu exerci essa atividade.
Qual foi a sua próxima atividade?
Fui limpar casa, fui ser faxineira. Limpava para a minha tia Araci Gimenes, irmã do meu pai, casada com Otávio Sturion, ele e seus irmãos Ermelindo e Mário eram os proprietários da Casa Três Irmãos. Permaneci nesse trabalho por um ano aproximadamente.  Meu filho Celso começou a trabalhar com onze anos. Eu comprava leite, e ele ia vender até a Escola Nossa Senhora da Assunção. Comprei um carrinho de mão, verdinho, guardo até hoje no sítio os engradados aonde iam os litros com a tampa de plástico. Eu enchia os litros de leite, tampava e ele ia vender. Meu irmão trazia o leite, eu comprava dele. Depois a fiscalização não permitiu mais a venda de leite em via pública. Só podia ser vendido leite pasteurizado.
O que a senhora fez?
Fui até uma horta de propriedade do Seu Inácio, situada no Bairro Jaraguá,  eu comprava canteiro de verduras, Seu Inácio cortava, fazia os maços de verdura e o meu filho Celso ia, enchia o carrinho de verdura, e fazia o mesmo percurso, até a Escola Assunção. Tenho até hoje uma cadernetinha que o Celso marcava o nome do freguês para quem ele vendia fiado, quanto era o lucro, quanto eu tinha que pagar para o Seu Inácio no dia seguinte, ele fazia essa contabilidade na rua, chegava e dizia: “Está aqui mãe, o dinheiro. Este daqui é da senhora, esse outro é para pagar o Seu Inácio”.  A noite ele estudava na Escola Estadual Professor Alcides Guidetti Zagatto. Minha filha Sonia foi trabalhar na Padaria Suiça do meu tio Francisco Castilho, vivo até hoje, com 104 anos. A minha outra filha, alguns anos depois, aos 14 anos foi trabalhar em um pequeno escritório, em seguida foi trabalhar na famosa Casa Raya, de material esportivo. Meus três filhos sempre estudaram em escola pública, e os três concluiram o curso superior de Administração de Empresas.
Atualmente a senhora é proprietária de um sítio?
Herdei um sítio do meu pai. Quando meu avô Gimenes repartiu a fazenda com os filhos, a parte do meu pai ficou com a minha mãe. Ela dividiu para os quatro filhos.
Quando a senhora era mocinha qual era a sua forma de lazer?
Na época era habito das moças e rapazes quadrar o jardim. Frequentava muito pouco o cinema.
A senhora segue alguma religião?
Sou Católica Apostólica Romana. Frequentava as Igrejas Bom Jesus, Catedral, dos Frades, São José.
A senhora chegou a usar véu durante a missa?
Para comungar se fosse solteira usava véu branco na cabeça, e se fosse casada usava véu preto.
A senhora gostava de ouvir rádio?
Gostava muito do Atinilo José. Lembro-me até hoje quando o radialista Ary Pedroso terminava o seu programa dizia: “- Obrigado Senhor! Para todos que tem um lar para voltar!”.
No ponto de vista da senhora as mudanças de comportamento ocorridas nesses anos foram melhores ou piores?
Acho que as mudanças ocorridas no relacionamento humano pioraram muito. Hoje temos muito mais ofertas de bens materiais do que naquela época, Tudo era meio esticado, para tomar um refrigerante só em ocasiões muito especiais, como casamentos, batizados, Natal. Não existia geladeira. Minha mãe matava um porco, passava o dia inteiro picando. Fritava todos os pedaços no fogão a lenha, pegava latas de 20 litros que tinham sido usadas para o transporte de querosene, lavava-as muito bem, conforme ia fritando com toda a gordura despejava, enchia de duas a três latas com carne, torresmo, gordura. Elas tinham um aro, eram tampadas as bocas das  latas com um pano preso pelo aro. Amarrava uma tira de pano, na madeira do telhado havia um gancho, as latas ficavam dependuradas lá, livres de insetos ou roedores. Cada vez que ia almoçar ou jantar, ela pegava a lata, esquentava aquela carne, aquilo era a “mistura” (acompanhamento) da refeição. A outra opção era fritar um ovo. Meus filhos Sonia e Celso iam assistir televisão no vizinho, o famoso “televizinho”, eles iam a um bar de propriedade da Dona Helena e do Seu Pedro, isso no Bairro Alto. Eles perguntavam-me: “- Mãe! Posso ir na Dona Helena assistir televisão?”. Eu os deixava irem.
O marido da senhora chegou a ter automóvel?
O primeiro carro ele adquiriu de um cunhado que morava em São Caetano, era um Buick, depois ele teve um DKW, mais tarde um Fusca (Volkswagen sedã). Eu tinha quase quarenta anos quando tirei carta (habilitação) de motorista. Meu marido comprou uma Belina I, mais tarde uma caminhonete, vendemos o sítio e adquirimos outro mais próximo da cidade, a uns 15 quilômetros, são nove alqueires de terras no bairro rural da Água Bonita. Compramos já faz 20 anos. Nessa época adquirimos uma caminhonete Pampa. Quando meu marido era vivo nós tínhamos gado, tratava no cocho. Depois que ele faleceu a 19 de agosto de 2005. vendi tudo. Gado, cavalos.
A senhora dirige até hoje?
Dirijo, vou sozinha, eu e Deus.
E se furar um pneu?
Levo meu celular, ligo para meus filhos. Se eu me esquecer de ligar dizendo que já cheguei, meus filhos já ligam para saber. Eles cuidam muito de mim. Essa educação, esse carinho, reflete na formação dos meus sete netos, que me chamam de mãe-avó. O que me ajudou a vencer todas as dificuldades foi a minha fé e os meus filhos.
Seus filhos nasceram em hospital?
A Sonia e o Celso nasceram em casa, com auxilio de parteira, a Sandra nasceu na Santa Casa de Misericórdia de Piracicaba, o médico foi o Dr. Matheus. Na época era costume ter os filhos em casa. Havia o resguardo de 40 dias após o parto. Não usei fralda descartável para nenhum dos meus filhos. Eu comprava o tecido e fazia as fraldas, fazia a bainha a maquina em todas. Existia a calça plástica. Até os netos mais velhos não usaram fraldas descartáveis.
O que a senhora vê no sítio que acha tão bom?
Gosto de ir lá ver, tenho um cachorro no sítio, o Tufão, toda vez que chego ele quer me abraçar, abro a porta da caminhonete ele sobe, me cheira, morde devagarzinho a minha mão. Enquanto não vou abrir a minha casa ele não para de pular e chamar a atenção. Depois do almoço, deito no sofá ele deita no tapete,dorme, chega a roncar. No sitio tenho galinha, pavão, ganso, pato, peru, cordeira, carneiro. Arco-Íris é o nome de um dos pavões, é um pavão raro, tem penas de todas as cores, inclusive brancas. Outro pavão é o Pitu.
A senhora abate os animais?
No meu sítio eles morrem de morte natural.

 
 

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