PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E
MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 16 de agosto de 2014.
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 16 de agosto de 2014.
Entrevista: Publicada aos sábados
no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
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http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADA: DENISE OTERO STORER
ENTREVISTADA: DENISE OTERO STORER
O amor de Denise Otero Storer pelas artes
plásticas, pelo cinema, pela literatura, ela considera como um presente dado
pelo seu pai Telmo Otero, Denise desde pequena o acompanhava aos Salões de
Belas Artes. Os primeiros salões que Denise freqüentou eram realizados nas
dependências da FOP- Faculdade de Odontologia de Piracicaba, a Rua D.Pedro II
esquina com Rua Alferes José Caetano. Ele chegava a sua casa e dizia à Denise:
“- Hoje vou levá-la a abertura do Salão de Belas Artes!” Ela era ainda muito
nova, mas gravou em sua memória Levava-a ao cinema para ver Cantinflas, Sarita
Montiel, Jerry Lewis, ele também adquiriu coleções de Monteiro Lobato para que
Denise pudesse ler. Proprietário da Casa Triângulo – comércio
de materiais para construção, fundada em 1950, Telmo Otero presidiu a ACIPI-
Associação Comercial e Industrial de Piracicaba de 1977 a 1991, entre os fatos
que marcaram sua gestão, um deles foi a construção da sede da entidade uma obra
que começou a ser idealizada por presidentes anteriores a Telmo, mas que foi
colocada em execução em sua gestão, conforme previa um projeto na década de 70.
Telmo
Otero sempre foi muito influente junto a sociedade piracicabana, no exercício
de suas atividades na ACIPI agiu com grande dinamismo, deixando um legado de
obras e princípios comerciais que até hoje estão presentes em nossa sociedade. Denise
Otero Storer é nascida em Piracicaba a 19 de setembro de 1951 ela e Maria Tereza
são filhas de Telmo Otero e Anesis Antonia Bragaia Otero. Denise Otero casou-se
com o engenheiro civil Cesar Marcom Storer. Recebeu diversos prêmios: Aquisição
(1991, 1995, 1996), Medalhas de Ouro (1996, 1998), Medalha de Prata (1991) e
Menções Honrosas (1991, 1994, 1996), em Salões de Artes Plásticas de
Piracicaba, Araras, São João da Boa Vista, Amparo e Franca. Fez diversas
exposições individuais em diferentes locais de Piracicaba. Foi membro de
comissões organizadoras, de seleção e premiação de diversos Salões de Arte além
de capas de “folder” e folheto turístico.
Seus primeiros estudos foram em que escola?
O curso primário foi no Grupo Escolar Moraes
Barros, Da. Neide foi a minha primeira professora. No terceiro ano minha
professora era Dona Maria José. Eu tinha muita vontade de ficar sócia da
Biblioteca Municipal, que na época ficava na Rua Alferes José Caetano esquina
com a Rua Voluntários de Piracicaba. (Um casarão centenário, que recentemente
foi demolido para dar lugar a mais um espigão no adensamento populacional). Foi
uma grande alegria o dia em que me tornei sócia, houve a necessidade de ser
acompanhada da minha mãe como adulto responsável. Até hoje gosto do odor
característico de livros! A meu ver os novos recursos tecnológicos tablet, PC, ou
simplesmente tablete não substitui o
livro. Gosto de frequentar sebo (Palavra para designar livro de
segunda mão).
Após concluir o primário qual foi o próximo curso que você
fez?
Entrei no Jeronymo Gallo e no Instituto de
Educação Sud Mennucci, onde fui classificada em segundo lugar. Optei em estudar
no Sud Mennucci, na época as mães gostavam que as filhas fizessem o curso
Normal, já era um diploma. Tive aula com Dona Zelina, Seu Argino, Lino Vitti,
Evaristo, Benedito de Andrade, Godoy. Era no tempo em que o bonde virava na Rua
José Pinto de Almeida, sentido da Rua XV de Novembro. Tínhamos os Cinemas,
Polyteama, Broadway, Palácio.
Você tocava algum instrumento na famosa fanfarra do Sud
Mennucci?
Eu só participava do desfile, não tocava
nenhum instrumento. Eu convivi logo no comecinho do curso a existência de um
muro que separava a entrada das meninas e dos meninos. Logo depois tiraram o
muro.
Quem era seu professor de arte?
Tinha um professor de desenho, o Seu Costa,
mais conhecido como “Costinha”, ele foi um professor de desenho que tinha muita
consideração pelo meu trabalho, ele sabia que eu tinha uma coisa especial com
relação a desenho. Foi o primeiro professor de desenho a me ensinar a tirar no
natural. Enquanto todo mundo estava fazendo desenho geométrico ele colocava
umas caixas para que eu fizesse um pouquinho de desenho artístico. Ele me deu
algumas diretrizes de desenho artístico. Quando eu era criança lembro-me que
meus pais compravam cadernos de desenho feito de papel jornal e lápis de cor.
Eu desenhava meu mundo ali. E até hoje é assim! O meu processo criativo está
muito ligado com o que eu vivo. Por isso também tenho várias fases de trabalho,
depende muito da época eu necessito transmitir algo que estou vivendo ou
observando. São todos tipos de emoções que procuro transmitir. Posso dizer que
não pinto “comercialmente”. Sempre contei a minha história através da minha
arte.
Olhando ao acaso uma pintura sua, sente-se um convite para
vivenciá-la. Como você consegue transmitir esse sentimento ou ele existe apenas
nos olhos de quem vê a tela?
Essas coisas fazem parte da minha história. A
carrocinha que você vê pintada no quadro é aquela que vinha na porta da minha
casa para vender verduras.
Nesse quadro em especial, a carrocinha está ambientada em
um ambiente rural, na tela ela foi inserida de acordo com algum processo
trabalhado por sua inspiração?
Não é algo imaginário, e sim alguma coisa que
existe. Toca o meu coração. Lembra alguma coisa da minha infância.
Toda essa riqueza de detalhes como você consegue
transportar para a tela?
Isso envolve técnica, saber definir planos,
saber dar volume no trabalho, saber trabalhar no primeiro plano. Isso é um
aprendizado, que não é adquirido instantaneamente. Demanda um tempo para
dominar essas técnicas. A emoção é o último fator, quando você consegue dar
emoção a um quadro é após todos esses ingredientes terem feito parte de você. A
técnica é a asa que me permite voar na minha criatividade. Só que para voar eu
necessito ter asas! Para criar alguma coisa eu tenho que dominar essa coisa.
Existe uma diferença entre errar e distorcer. O erro eu faço mesmo sem querer.
Cometo o erro porque não sei fazer. A distorção não, eu sei fazer e quero fazer
diferente. É proposital.
Você formou-se como professora normalista
quando concluiu o curso no Instituto Sud Mennucci?
Já sai do Sud Mennucci com aulas de desenho
pedagógico, aulas de desenho geométrico. Permaneci no Sud mesmo, dando aulas. Por
pouco tempo dei aulas também, no Jerônimo Gallo. Quando me formei tinha por
volta de 18 anos. Sempre gostei de dar aulas, tenho facilidade de passar as
informações ás pessoas, elas me entendem bem. Faço analogias para que fique
mais fácil o entendimento. Eu gosto do que eu faço. E gosto de passar adiante o
que sei. Assim como sempre estou aprendendo com outras pessoas.
Você prosseguiu nos estudos?
A minha paixão era fazer Belas Artes. Era um
curso que só tinha em São Paulo.
Qual foi a reação do seu pai, Telmo Otero, com relação a
esse desejo da filha?
Ele não permitiu de jeito nenhum! Tentei
encontrar alguma faculdade que eu pudesse fazer, mas que tivesse relação com
arte. Escolhi Letras. Fiz Literatura Inglesa, Americana, Portuguesa,
Brasileira. Quando conclui a UNIMEP já saí com aulas. Era a primeira aluna da
classe. Comecei como professora. Logo me deram tudo, laboratório de línguas, o
colegial inteiro, noturno. De manhã e a tarde eu dava aulas de artes para cerca
de 100 alunos, uma escolinha de crianças, adolescente, que ficava na casa da
minha mãe mesmo, na Rua do Rosário, 133. Eu devia ter uns 20 anos, percebi que
tinha que fazer uma opção, ou ficava com a arte ou com o inglês. Só que a arte
sempre falou mais alto, e infelizmente deixei o Instituto Piracicabano. Foi um
período interessante, levei minha arte para lá também, fazia teatro,
interpretava William
Shakespeare,
levava discos do Elton John,
na época traduziamos letras, eu desenhava na lousa, naquela época não
tinhamos os recursos que existem hoje. Era uma aula artístitica. Acabei por
optar só pela arte. Casei-me aos 24 anos, tive os filhos Cesar e Beatriz. Èramos
estudantes quando eu e o meu marido Cesar Marcom Storer nos
conhecemos, eu tinha 17 anos ele tinha 19 anos.
Denise,
você transmite sentimentos especiais com sua arte e as pessoas se manifestam a
respeito. Algumas de suas obras quando postadas na rede social é motivo de
muitos elogios.
Embora
não sejam explicitos as pessoas percebem os nossos sentimentos. Quando faço uma
obra é essa emoção que carrego dentro de mim que coloco ali. Eu trabalho com a verdade,
não me importo com o que os outros pensem a respeito. Essa arte é a minha vida,
eu escrevo através dela.
Quais
são as técnicas de pintura que você mais utiliza?
A principio comecei com o óleo, era a técnica mais conhecida, com mais
facilidade de encontrar material. Por volta de 1990 a prefeitura patrocinou um
curso na Pinacoteca Municipal, com um professor, Norberto Stori, da FAAP - Fundação Armando Álvares Penteado. Ele veio para dar um curso de
aquarela, por um período de dois anos. No final, dos aproximadamente 60 alunos
que iniciaram o curso apenas sete alunos concluíram e formaram um grupo “7+2”.
Por que esse grupo
se chamava “7+2” ?
Éramos sete alunos que tinhamos concluido o curso e convidamos mais dois
amigos para fazer parte: o Arair Ferrari e Natal Gonçalves. Durante
aproximadamente uma década fizemos bastante exposições.
Quem pode matricular-se na sua escola de arte?
Qualquer pessoa que tenha interesse
pela arte, desde principiantes. A partir dos doze a treze anos até sem limite
de idade máxima. Tenho um aluno que entrou com dez anos, hoje tem dezesseis
anos e ganhou menção honrosa no Belas Artes.
Temos grandes artistas em todas as
áreas, o que falta para serem devidamente valorizados no Brasil?
É uma questão cultural. As vezes
estou pintando no meu ateliê, como da rua é
possivel ver a obra que está sendo realizada, algumas pessoas passam,
param, admiram, dizem que imaginam o quanto deve ser bom pintar. Geralmente
acabam perguntando: “-E você não trabalha?”. Na concepção dessa pessoa pintar,
desenvolver uma arte já a quarenta anos não é trabalho! Minhas obras são
vendidas a um preço acessivel, só que por questões culturais gasta-se muitas
vezes mais em uma bolsa do que em um quadro.
Quantas obras você já realizou?
Quando meu marido aposentou-se,
propô-se a catalogar todas as obras. Só que eu já tinha vendido muitas. Quando
ele catalogou existiam cerca de 3.000 obras. Portanto deve ser um número maior.
Seus trabalhos estão em diversos
países?
Tenho trabalhos que realizei
espalhados pelo mundo afora. Tenho várias histórias a respeito. Um americano
veio até o meu ateliê e encomendou especialmente para ele uma aquarela com o
salto do Rio Piracicaba. Ele levou, enquadrou, colocou sobre a sua lareira,
tirou uma fotografia e me enviou por e-mail para que eu visse. Em 2013 quando
uma turma de engenheiros da Esalq comemorou 40 anos de formatura da turma fiz a
capa do livro, a contra-capa e todos os trabalhos que foram presenteados aos
alunos-colaboradores, fiz 23 aquarelas só sobre o prédio principal da Esalq, em
angulos diferentes, nenhum repetido. A Unimep tinha um convênio com o Instituto Metodista Bennett do Rio de Janeiro,
fui convidada para fazer uma exposição lá. Além de levarem a exposição, fizeram
um coquetel de abertura, e deram-me a passagem de ida e volta de avião. O
curioso é que essa foi a primeira vez em que andei de avião! (Denise após isso
viajou para Europa, recentemete esteve na América do Norte).
Como o nosso jovem vê a
arte?
Me
parece que está havendo um pouco mais de atenção nesse ponto. Vejo salões,
pinacotecas, escolas, excursões levando alunos com monitores explicando, isso
antigamente era raro. Talvez essa nova geração se interessse mais pela arte. Em
diversas cidades de outros paises, vi crianças em museus, salões de arte,
discutindo cores, percebe-se claramente que em determinados locais há um grande
incentivo à arte. E o Brasil parece estar caminhando nesse sentido, de educar a
pessoa.
Um patrimonio mundial da
cultura artística que existe no Museu de Arte Moderna de São Paulo, MASP,
porque não é usufruido mais?
Muitas
pessoas nem conhecem, nunca foram. Não sabem o que é uma Pinacoteca do
Estado. Vale a pena visitar só para ver
o prédio maravilhoso. Eu acredito que isso vai se invertendo. As pessoas estão
tendo mais acesso a cultura, a própria internet facilita.
Para quem conhece apenas um
pote de tinta e um pincel, ao iniciar um curso de pintura com você, quanto
tempo essa pessoa levará para ter alguma noção de arte?
Depende
da pessoa, da bagagem que ela traz, tem pesssoas que já tem um certo talento. Nesse
caso é só lapidar um pouco e logo estará desenvolvendo. Outras não, tem que
começar do nada, mas eu acredito, não daria aula para principiante se não
acreditasse nisso, na possibilidade do seu sucesso. Penso que todo mundo tem
todos os ingredientes em seu interior, basta querer desenvolve-los.
Há pessoas que desenham
intuitivamente , com relativa perfeição, até em cantinho de jornal, qual é o
caminho que esse futuro artista pode seguir?
Sou
uma professora bem abrangente, dou aula de pastel seco, pastel oleoso,
aquerela, óleo, moderno, classico, acrílica. Dou aulas de artes, a colagem
dentro do contexto de arte também. Tem quem goste de fazer o moderno, o
abstrato.
O conceito de que arte é
coisa de elite existe ainda?
Isso
está errado. O artista tem que estar onde o povo está. O artista não pode ser
elitizado. No meu entender, o artista não é um intelectual. Ele é um artista!
Sou apaixonada por desenho, é minha arte primeira, desde criança eu desenho.
Você tem alguns quadros com
paissagens européias?
Tenho! Eu fui para lá! Não pinto
coisas que não vivo! Preciso sentir o cheiro,saber a cor, viver o momento.
Tenho que vivenciar para transportar aquilo para a tela. Meu processso criativo
é esse. Pode ser uma situação que eu esteja presenciando. Acho que a arte não
pode ter barreiras, fronteiras ou limites. Cada individuo é único.
A Bienal é um evento marcante e
algumas vezes saimos do recinto com a duvida se algo exposto tem o valor de
arte ou foi apenas a intenção de arrumar uma bela confusão?
A Bienal tem coisas maravilhosas,
tem coisas que vi lá e nunca mais me esqueci. Lembro-me de uma em que tinha um
espaço, tudo em construção, vamos dizer assim, inacabada. Um monte de tijolos.
Uma pá. A impressão é de que não tinha dado tempo para fazer a obra. Era a
obra! Mais tarde tinha um monitor explicando a obra! Mais parecia um espaço em
reforma. É uma arte conceitual, tem toda uma filosofia envolvendo aquele
trabalho. Precisa conhecer um pouco a trajetória do artista para poder avaliar,
por isso não se deve colocar tudo no mesmo patamar.
Além da arte, o que você gosta de
fazer?
Gosto muito de ler, de ir ao cinema,
musica, prefiro mais musica clássica. Toco violão.
Como é a dona de casa Denise?
Normal! Cozinho, tem dias que acho
que está muito bom, outros dias acho que não.
Qual prato que você cozinha e
ninguém resiste?
É o puchero, receita que herdei da
minha avó!
As mudanças ocorridas com o
crescimento de Piracicaba reflete nas obras do artista?
Acredito que sim, o volume de
informações é maior.
O aumento da violência influencia?
Acho que já temos tanta violência na
mídia, não vejo a necessidade de que eu mostre isso na arte. Tem artista que
gosta do motivo social, de alertar as pessoas. É valido. Mas eu prefiro ter um
olhar diferente, passar isso para as pessoas para que os olhos delas fiquem
contentes. Minha filosofia de vida já prega isso. Que temos que ser positivos.
Para mim é uma missão, fazer com que as pessoas fiquem felizes. Temos que puxar
as coisas boas que as pessoas tem dentro de si. Quando um aluno ganha um
prêmio, participa de uma exposição, sinto uma realização pessoal muito grande.
A arte de Denise Storer está ao
alcance de quem desejar adquirir?
Os preços são bem acessíveis. Desde
uma pequena aquarela até um quadro maior. Basta a pessoa querer e gostar.