segunda-feira, janeiro 03, 2011

ADILSON BENEDITO MALUF

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
Sábado 01 de janeiro de 2011
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/

ENTREVISTADO: ADILSON BENEDITO MALUF
Adilson Benedito Maluf foi prefeito de Piracicaba de 31 de janeiro de 1973 a 31 de janeiro de 1977, eleito pela segunda vez assumiu o cargo de 01 de fevereiro de 1983 até 1989. Em 7 de abril de 1993 tomou posse como deputado federal. Em 1973 fez viagem aos EUA com o objetivo de trazer investimentos para Piracicaba, nesse mesmo ano esteve em viagem oficial para intercâmbio cultural com Sung-Nan, Coréia do Sul, cidade irmã de Piracicaba. No ano de 1985 realizou viagem oficial à China, a convite do governo chinês, como representante da cidade de Piracicaba, para conhecer o regime político. Em 1993 esteve em missão oficial, como membro da Comitiva de Parlamentares Brasileiros em visita ao Líbano, a convite do Presidente da Assembléia Nacional da República do Líbano. Foi presidente do E.C. XV de Novembro de Piracicaba. No seu governo em 06 de setembro de 1973 foi instituída a Unidade Industrial Leste UNILESTE. Como prefeito Adilson Maluf criou condições para que empresas de grande porte como Caterpillar e Philips viessem a instalarem-se em Piracicaba. Um bom número de outras empresas seguiu-se a estas. Com isso Piracicaba abriu novas perspectivas de trabalho, diversificou seu parque industrial, ganhou maior estabilidade financeira. Suas inúmeras escolas formaram mão de obra especializada, a vida da provinciana cidade passou a ser oxigenada, formando uma sólida base para a próxima etapa desenvolvimentista. Foi nesse período que Piracicaba criou o seu Shopping Center, reflexo de que a sociedade estava mudando seus hábitos. Avaliar com precisão o quanto significou á Piracicaba as medidas da administração de Adilson Maluf é uma tarefa que cabe a História realizar, mas pelo curto espaço de tempo decorrido, percebe-se que a direção dada naquela época foi acertada. Adilson Benedito Maluf nasceu em Piracicaba, no dia 27 de junho de 1944, são seus pais Hide (Santo) Maluf e Olinda Issa Maluf.
Como surgiu o Benedito que compõe o seu nome?
Minha mãe era muito católica, ela teve seis filhos: Myriam, Hadir, Antonio de Pádua (Califa), Marileide, Adilson e Hide Júnior. A cada um ela deu um nome composto, sempre acompanhado do nome de um santo, quando eu estava para nascer ela dirigia-se a igreja de São Benedito para rezar, São Benedito dava risada para ela, como na época não havia meios para saber se o bebe era menino ou menina, ela determinou que fosse Benedito ou Benedita.
É possível ver o riso de São Benedito?
Eu vejo também! São sinais. (Adilson deixa transparecer sua fé robusta).
Seus pais nasceram em que localidades?
Meu pai nasceu no Líbano, fui conhecer a casa em que ele viveu, estavam demolindo quando cheguei, trouxe uma pequena pedra da parede que guardo comigo até hoje. Minha mãe nasceu no Bairro Chinês, que ficava na esquina da Rua do Rosário com a Rua Prudente de Moraes, para o tamanho de Piracicaba na época, as proximidades do Grupo Moraes Barros, da Igreja São Benedito, era um bairro, e era assim denominado.
Onde ocorreu o seu nascimento?
Foi na Rua do Rosário, 620 em parto realizado pela Dona Mariquinha, só depois que a Santa Casa abriu uma maternidade.
O seu pai tinha qual atividade?
Ele tinha a maior loja de materiais de construção que existia na época, chamava-se Depósito de Madeiras Maluf, ficava na Rua Prudente de Moraes, 1104, os prédios existem até hoje.
Em que escola foi feito os seus primeiros estudos?
Estudei no Grupo Escolar Moraes Barros, a minha primeira professora foi Dona Irene Gatti Bergamin, um fato me marcou bastante, em uma festa de comemoração ao dia Primeiro de Maio, as escolas foram conclamadas a participarem, eu representava o Trabalho, fui caracterizado como trabalhador, meu pai mandou fazer um martelo de madeira, que eu levava em uma das mãos. Brincávamos muito no Grupo Escolar Moraes Barros, em volta do mesmo, nos jardins que existem até hoje, éramos em muitos amigos, entre eles, Chiquinho Botene, Henrique, Procópio, Candinho, Candão, éramos vizinhos.
Muito popular entre as crianças de então, Bento Chulé foi seu conhecido?
Onde foi o bar do Bento Chulé foi construída a nossa casa! Na esquina formada pela Rua Voluntários de Piracicaba com a Rua do Rosário, uma casa que já foi ocupada pela CETESB e hoje abriga atividades comerciais. Foi a primeira casa em Piracicaba que teve um banheiro privativo, uma suíte, assim como o azulejo da cozinha até o teto, o projeto da residência é do renomado arquiteto Andreas Kerecz, europeu de origem judaica, refugiado de guerra. .
Qual era o encanto que o bar do Bento Chulé exercia sobre a criançada?
Eu ia comprar paçoquinha, lembro-me até hoje daquele sabor. Ele era um senhor de cabelos brancos, todos o tratavam por Bento Chulé, com a concordância dele. Na Rua Prudente de Moraes entre a Rua Tiradentes e a Rosário havia a sorveteria do Castilho, no meio dessa quadra tinha a sorveteria do Seu Zé, um sorvete muito gostoso, custava cinqüenta centavos da unidade monetária da época. Íamos á matinê do Cine São José, todos os domingos a tarde, já era uma sessão especial para a nossa idade, com os astros Tom Mix, Roy Rogers. Não existiam bermudas, os menores usavam calças curtas sempre desejando usar calças compridas o mais rápido possível. As bolas de meias eram costuradas pelas nossas mães, o nosso campo eram as ruas vizinhas as nossas casas. A Rua do Rosário era calçada até o cruzamento com a Rua Voluntários de Piracicaba, dali em diante era terra, eu vi calçando aquele trecho. Havia o “Girdão”, nome dado ao primeiro ônibus “cara chata” que Piracicaba ganhou, de propriedade do Sr. Luiz Marchiori. Fazia o ponto atrás da catedral, na esquina da Rua Boa Morte com a XV de Novembro, ele concorria com o bonde, percorria a mesma linha para a Vila Rezende. Eu ganhava “cincão” (cinco unidades monetárias da época) de semanada dada pelo meu pai, com 2,50 ia á matinê do São José, sorvete eram 50 centavos, pagava a passagem de 50 centavos e passeava de Girdão, ia até a Vila Rezende e voltava. Quando tínhamos uma bola de verdade íamos jogar na Escola Agrícola.
Como era o atleta Adilson no campo de futebol?
Eu era um jogador ruim! Meu pai dava a bola, o uniforme do primeiro e segundo times, e de vez em quando mandava os meus tios, sócios dele, levarem a garotada para jogar na Agronomia. Eu jogava no segundo time, na ponta esquerda, posição que não fazia nada, mas jogava! O técnico era o Mé. O time era o São João da Montanha Futebol Clube.
Em que escola você fez o ginásio?
Tanto o ginásio como o colégio estudei no Colégio Dom Bosco, tendo como primeiro diretor o Padre Pedro Baron. Na semana passada (segunda quinzena de dezembro de 2010) o Padre Guedes me ligou convidando para assistir a missa em comemoração aos seus 50 anos de sacerdócio, aceitei em ser o coroinha da missa, tive que recordar a seqüência em que as galhetas de água e vinho deveriam ser ofertadas, ao tocar o sino eu voltei a minha infância, as lembranças do colégio e dos meus colegas vieram nitidamente.
No período em que realizou seus estudos no Dom Bosco como era o uniforme?
A cor era caqui, tanto para a camisa como para a calça. Dependendo da idade a calça era curta ou comprida. A camisa tinha lapelas nos ombros. Quando passávamos em frente ao Sud Mennucci os alunos ao nos avistarem com aquele uniforme já gritavam: “- Correio!” pela semelhança com o uniforme dos carteiros. Não era permitido fumar nos 100 metros próximos ao colégio. As datas cívicas eram celebradas com festejos. Toquei tarola na fanfarra do Dom Bosco. O dia 24 de maio é celebrado como Dia de Nossa Senhora Auxiliadora data em que eram realizados belos desfiles do Colégio Dom Bosco pelas ruas centrais da cidade. Participei de concursos de fanfarras que havia no Vale do Anhangabaú, em São Paulo. O uniforme era composto por camisa e calça brancas, com punhos azuis.
Algum esporte despertou seu interesse?
Joguei razoavelmente basquete. Havia um time, “Água Seca Basquetebol Clube”, comandado pelo Dr. Duvilio Ometto, que tinha um filho com a nossa idade, assim como Dona Nida, Armando Dedini, tinham filhos na mesma faixa etária. Dr. Duvilio fundou o time, contratou o Paulinho, irmão do Pecente como nosso técnico. Assim aprendemos a jogar basquete. O brasão do uniforme foi desenhado por mim, no centro iam as iniciais “ASBC”, as cores eram azul, branco e vermelho. Havia diversos times de basquete na cidade que realizavam disputas: Água Seca, Dom Bosco, Moraes Barros, Colégio Piracicabano, e outros.
Algum outro esporte despertou a sua atenção?
Conquistei a “Taça Severino Galdi” de futebol de botão! Foi uma época de ouro desse esporte, naquela época os botões eram de celulóide, de paletós, havia o botão de dois chutes, eram botões de dois planos. O meu time era o quadro do Vasco da Gama, melhor time carioca na época. Havia muito cuidado no armazenamento e transporte das peças do jogo. Hoje garotos da mesma faixa etária estão divertindo-se com Jet Ski e outras modernidades.
Em sua juventude você participava de outras formas de lazer?
Freqüentava as brincadeiras dançantes do Clube Coronel Barbosa, que foi onde conheci a minha esposa Rosa Maria Bologna Maluf, começamos a namorar em 1968, casamos em 1972.
A sua decisão em estudar engenharia civil surgiu como?
O meu pai costumava ir á Santos, acompanhado da família toda, ficávamos hospedados no Hotel Avenida Palace de propriedade de Eugenio Rigatto mais conhecido como “Seu Tola”, piracicabano. Um dos automóveis que usamos nessas viagens foi um Kaiser. Quando eu tinha seis ou sete anos de idade construía na areia da praia castelos, caminho com palitos de sorvetes fazia pontes, tudo isso nas areias da Praia do Gonzaga. Aos 10 anos de idade eu andava muito a pé pela cidade, quando via alguma obra gostava de entrar, conhecer. Acompanhei a construção da enorme casa situada na esquina da Rua São José com Rua do Rosário, que mais tarde funcionou como meu gabinete na função de prefeito municipal. Atualmente ela é ocupada pela Uniodonto.
Em que escola o senhor formou-se em engenharia?
Cursei na Escola de Engenharia de Taubaté, em 1964 quando eu estava indo fazer a minha matricula os tanques do exército estavam ao longo da estrada, eu não sabia bem o que estava acontecendo. Montamos uma república a RAU, República Árabe Unida, só tinha descendente de árabes, além de mim, morava lá meu irmão Hadir, Juca Abdalla, Ferez Kairalla, tinha um judeu também Moisés Resemberg. Na época quase ninguém tinha automóvel, no pátio da minha escola entre alunos e professores não passava de 10 o número de carros estacionados. Eu tinha um fusca bege, zero quilômetro que o meu pai tinha me dado.
Em que ano o senhor formou-se?
Foi em 1969, voltei a Piracicaba conhecendo engenharia civil, fiz estágio por três anos com um grande arquiteto, Manoel Carlos Carvalho.
O senhor já tinha planos para o futuro?
Eu sabia que após me formar iria voltar a Piracicaba, o meu pai me ajudaria a montar uma construtora, iria ser prefeito de Piracicaba, um sonho de infância, do tempo em que ainda usava calças curtas. Eu falava para todo mundo que iria ser prefeito da nossa cidade. Desde a infância, em todas as campanhas políticas que apareciam a minha família participava e eu estava entre eles. Minha família era ademarista.
O senhor chegou a conhecer Adhemar de Barros?
Conheci! Era um homem bem gordo, mas muito simpático. Meu tio Abrahão era o presidente do PSP local, quando ele vinha hospedava-se na casa dele.
Após montar a sua construtora qual foi a primeira obra executada por ela?
O meu foco era executar projetos, lembro-me que a prefeitura de Piracicaba abriu uma concorrência para construir umas pontes, grupos escolares, o prefeito era Cássio Padovani, entrei nessa concorrência, havia a necessidade de um currículo de obras realizadas, contratei um engenheiro que havia se formado dois anos antes, ganhei a concorrência para construir três pontes e duas escolas, superando uma conhecida empresa local. A demora em homologar o resultado acabou fazendo com que junto com o meu pai fossemos até o gabinete do prefeito em busca de uma noticia sobre o andamento do processo. Recebidos pelo Cássio Paschoal Padovani, sentado em uma cadeira com forro de palhinha, ainda no prédio que já foi derrubado, o Dr. Pedro Negri era chefe de gabinete, ao sentar diante do Cássio disse-lhe: “-Senhor Prefeito, daqui a dois anos o senhor irá passar essa cadeira para mim!”. Fizemos a reunião, sai com a incumbência de construir duas pontes e uma escola.
O senhor tinha tecnologia para construir pontes?
De posse do contrato e do projeto fui procurar Estevan Madaraz, que havia sido meu professor de pontes na faculdade. Por duas horas ele explicou o que deveria ser feito, após realizar parte da obra, consultei o Dr. Carlos Moraes de Toledo, o Carlão da Equipav, que aprovou a qualidade do trabalho que eu estava fazendo. A partir daí, junto com meus irmãos, realizamos muitas obras, dentro e fora de Piracicaba.
A sua eleição para prefeito como ocorreu?
Piracicaba estava passando por um período de sucessivas mudanças de prefeitos, por questões políticas ou motivo de saúde, até mesmo de morte, dos ocupantes do cargo. Foi feita uma reunião no Clube Ítalo Brasileiro, onde foi formado o chamado “Grupo dos 100” eram pessoas bem intencionadas, alguns colegas me incentivaram a participar dessa reunião. Lá me coloquei a disposição para ser candidato a prefeito, fui votado, mas perdi a indicação para João Fleury. O deputado Francisco Antonio Coelho era do MDB, ele me procurou para que eu me filiasse ao seu partido, até então eu desconhecia a necessidade de ser filiado a algum partido político. Cada partido tinha que apresentar três candidatos pelo MDB era Bentão, Jorge Angeli, o terceiro fui eu. A ARENA tinha o João Guidotti que acumulou o lugar de dois candidatos e o João Fleury. A soma dos votos dos candidatos do MDB foi superior, e a minha votação entre os três foi a maior, com isso fui eleito prefeito de Piracicaba. Em 7 de outubro de 1972 eu me casei na capela do Colégio Dom Bosco, no dia 1 de fevereiro de 1973 tomei posse como prefeito.
A mudança da sede administrativa da prefeitura foi realização do seu governo?
O projeto e a construção do Centro Cívico, do Parque da Rua do Porto, são de minha autoria, dei expediente dois dias no prédio novo e passei o mandato para o prefeito que me sucedeu.
Como o senhor analisa a sua atuação na prefeitura de Piracicaba?
Mudei um pouco a economia de Piracicaba, de totalmente agrícola, com suas indústrias de base totalmente voltadas á agricultura, particularmente para o setor sucroalcooleiro, diversifiquei o parque industrial, trouxe as indústrias Caterpillar, Philips, sendo que esta empresa por contencioso com o governo federal mudou-se para Manaus, e em seu lugar veio a General Motors. Em seguida muitas empresas estabeleceram-se em Piracicaba. Com isso chegaram muitas pessoas com novas idéias. Piracicaba passou a ser menos provinciana, embora eu ainda a considere como provinciana. Tivemos a oportunidade de mudar um pouco, e deu certo, com isso Piracicaba tornou-se mais rica. Os metalúrgicos da nossa cidade foram os maiores agraciados, essas empresas estrangeiras trouxeram benefícios que as empresas brasileiras não proporcionavam, por falta de conhecimento, por conservadorismo ou ainda por falta de exigência da parte dos sindicatos. Atualmente Piracicaba é uma cidade agradável, que oferece boa qualidade de vida, com abastecimento de água em todos os domicílios. Ela tem seus problemas, como existe no mundo todo.
Como foi a reação das indústrias locais com relação a vinda de outras indústrias?
Até eu assumir a prefeitura havia um mito de que em Piracicaba só existiam as Indústrias Dedini e que outras empresas não se estabeleciam aqui por que o Dedini não deixava. Dr. Duvilio Ometto, presidente das Indústrias Dedini me ajudou a trazer a Caterpillar para a nossa cidade. Ofereci um almoço para Bill Norman, presidente internacional da Caterpillar, realizado na casa da minha mãe. Entre os convidados estava o Dr. Duvilio Ometto que atestou as boas condições que Piracicaba oferecia para a implantação de uma indústria do porte da Caterpillar. A área onde está situada a Caterpillar foi negociada com o então proprietário, José Adolpho da Silva Gordo, em uma reunião ocorrida na casa do Dr. Nelson Meirelles. Inicialmente a área escolhida era entre as estradas de Limeira e Rio Claro, próxima onde esta sendo instalada a Hyundai.
Como surgiu a idéia de trazer a Caterpillar a Piracicaba?
Ouvi alguém dizer que ela estava estudando a região para transferir-se de Santo Amaro para o interior, tanto Americana como Limeira eram duas cidades bem cotadas, com a idéia fixa de seus diretores de origem norte americana residirem em Campinas. Marquei uma reunião com o presidente da Caterpillar e fui até São Paulo onde expus os recursos que Piracicaba oferecia inclusive a escola que eles desejavam para os filhos, mantida pelo Instituto Educacional Piracicabano, seu diretor, Richard Senn teve importante participação na decisão da Caterpillar vir á Piracicaba, sem demérito para todos aqueles que se empenharam nessa tarefa.

quarta-feira, dezembro 29, 2010

BENEDITO ONOFRE SIVIÉRO

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
Produção e apresentação Jornalista e Radialista JOÃO UMBERTO NASSIF
Transmitido pela RÁDIO EDUCADORA DE PIRACICABA AM 1060KHERTZ
aos sábados das 10:00 às 11:00 horas da manhã.
Contato com João Umberto Nassif
Entrevistado: Benedito Onofre Siviéro
(Entrevista realizada em 2005)
Com absoluta exclusividade Benedito Seviéro concedeu essa entrevista á Rádio Educadora de Piracicaba e aos Jornais Tribuna Piracicabana, Tribuna de Rio das Pedras e Tribuna de São Pedro. Extremamente reservado, apesar de ser muito assediado pela chamada “grande imprensa”, tanto escrita, falada e televisionada, Benedito mantém-se longe dos holofotes, ao contrário dos inúmeros ídolos que interpretam suas composições. Cantores como João Paulo e Daniel, Chitãozinho e Chororó, Cristian e Ralf, Gian e Giovani, Joaquim e Manoel, Teodoro e Sampaio, Milionário e José Rico, Mato Grosso e Matias, Duduca e Dalvan, Gilberto e Gilmar, César e Paulinho, Tibagi e Miltinho, Belmonte e Amarai, Lourenço e Lourival, Pedro Bento e Zé da Estrada, Trio Parada Dura, Peão Carreiro e Zé Paulo, Zico e Zéca, Zilo e Zalo, Rudy e Roney, Wellinton e Willian, Jad e Jefferson, Preferido e Predileto. Esses são alguns dos interpretes de suas mais de mil músicas compostas por Benedito Siviéro. Sem nenhum exagero podemos dizer uma grande parte da população brasileira um dia ouviu pelo menos um trecho de uma de suas composições. Afável, simples, Benedito fala com a naturalidade do seu trabalho: traduzir as emoções dos corações apaixonados, algo que faz com a maestria própria dos grandes gênios. Sua fala direta, carregada de emoções traduz os sentimentos que só os apaixonados entendem! Benedito Seviéro é com absoluta certeza a razão de sucesso de muitos artistas brasileiros! Algumas das suas obras: A mancha do pecado (c/ Biguá) • A marca da traição (c/ Zalo) • A volta do seresteiro (c/ Zalo) • Abandono (c/ Paiolzinho) • Abismo da dor (c/ Nízio) • Abismo da vida (c/ Palmito e Jaime Marques) • Abismo de ilusões (c/ Sulino e Marrueiro) • Aliança (c/ Pedro Bento) • Aliança abençoada (c/ Zalo) • Alma aventureira (c/ Luiz de Castro) • Alma de boêmio (c/ Tião Carreiro) • Alma inocente (c/ Zalo) • Amarga confissão (c/ Zalo) • Amargura (c/ Miltinho Rodrigues e Zeza Dias) • Amor em segredo (c/ Basílio) • Aproveita Minha Gente (c/ Ronaldo Adriano) • Cachorro amigo (c/ Luiz de Castro) • Canção da madrugada (c/ Sebastião Aurélio) • Confissão (c/ Miltinho) • Confissão de boêmio (c/ Sereno) • Desengano (c/ Tião Carreiro) • Desse jeito não vai dá (c/ Corumba) • Deusa da madrugada (c/ Sebastião Victor) • Drama da vida (c/ Flor da Serra) • Escuta minha canção (c/ José Vito) • Espelho da vida (c/ Paiolzinho) • Esperança perdida (c/ Osvaldo Galhardi) • Espuma de cerveja (c/ Toni Gomide) • Falsos carinhos (c/ Pirassununga) • Flor da boêmia (c/ Zalo) • Flor da lama (c/ Paiolzinho) • Flor proibida (c/ Miltinho Rodrigues) • Foi um sonho (c/ Benedito da Silva) • Homem de bem (c/ Luiz de Castro e Sulino) • Ingratidão (c/ Luiz de Castro) • Luz vermelha • Mágoa cruel (c/ Zé do Carro) • Meu crescimento (c/ Sebastião Aurélio) • Meu regresso (c/ Antonio Mariani) • Minha mágoa, minha dor • Mula granfina (c/ Pirassununga) • Mulher de ninguém (c/ Paiolzinho) • Mulher dos meus sonhos (c/ Joel da Costa Leite) • Mulher inocente (c/ Zilo) • Negócio de sócio (c/ José Felipe) • O destino não quis o nosso matrimônio (c/ Miltinho Rodrigues) • O dinheiro compra tudo (c/ Luiz de Castro) • O mesmo amigo (c/ Rocha de Menezes) • O silêncio do seresteiro (c/ Zalo) • Palavra de honra (c/ Ronaldo Adriano e Rosa Quadros) • Pião vira-mundo (c/ Campanha) • Pranto amargo (c/ Miltinho) • Preço da traição (c/ Zalo) • Primeira ilusão (c/ Vicente de Oliveira) • Queixumes de amor (c/ Zé da Estrada) • Rainha da traição (c/ Sebastião Victor) • Rainha do meu coração (c/ Barrinha) • Recado mortal (c/ Goiá) • Regresso de boêmio (c/ Paiolzinho) • Rei da capa (c/ Pirassununga) • Remorso (c/ Jeca Mineiro) • Rescisão de contrato (c/ Sulino) • São João Batista (c/ Vieirinha) • Sentenciado (c/ Nízio) • Serenata do adeus (c/ Nascimento Filho) • Seresteiro do amor (c/ Leôncio/Leonel) • Sistema antigo (c/ Teddy Vieira) • Sombra do passado (c/ Zilo) • Sonho de amor (c/ Teddy Vieira) • Taça da dor (c/ Nízio) • Taça da saudade (c/ Miltinho) • Taça vazia (c/ Miltinho) • Tango da meia-noite (c/ Zilo) • Tango da traição (c/ Zalo) • Toalha de mesa (c/ Luiz de Castro) • Triste caminho (c/ Miltinho) • Última noite (c/ Zalo) • Vestido branco (c/ Ronaldo Adriano e Mangabinha) • Violão amigo (c/ Zilo) Em seu repertório predominam as canções rancheiras, tangos e guarânias. Suas composições foram gravadas por diversos intérpretes, entre os quais Tião Carreiro e Pardinho, Zilo e Zalo, Zico e Zeca, Campanha e Cuiabano, Tibagi e Miltinho, Sulino e Marroeiro, Chitãozinho e Xororó, Chico Rey e Paraná e Sérgio Reis, entre outros.Teve sua primeira composição gravada em 1953, "Pião vira-mundo", moda campeira composta com Campanha e gravada pela dupla Campanha e Cuiabano. Em 1958 compôs com Zalo o cateretê "A volta do seresteiro", gravado pela dupla Zilo e Zalo no primeiro disco gravado por essa dupla. Em 1959, compôs com Paiolzinho a guarânia "Flor da lama", gravada por Zé Tapera e Paiolzinho, e com Nízio compôs a rancheira "Abismo da dor" gravada por Pedro Bento e Zé da Estrada.Em 1960, compôs com Zalo o tango "Alma inocente" e a canção rancheira "Última noite", gravadas por Zilo e Zalo. No mesmo ano, compôs com Tião Carreiro o tango "Alma de boêmio", gravado por Tião Carreiro e Pardinho, e com Teddy Vieira a guarânia "Sonhos de amor", gravada por Tibagi e Miltinho. Em 1961, teve gravadas, entre outras, as composições "Amargura", canção rancheira, em parceria com Miltinho e Zeza Dias e gravada por Tibagi e Miltinho, "Sentenciado", corrido em parceria com Nízio e gravado por Leôncio e Leonel e "Confissão de boêmio", corrido feito em parceria com Sereno e gravado pelo Trio Aliança. Ainda nesse ano, fez sucesso com o tango "Taça da saudade", com Miltinho gravado pela dupla Tibagi e Miltinho.
Em 1962, teve diversas composições gravadas pela dupla Zilo e Zalo, entre as quais "Remorso", canção rancheira feita com Jeca Mineiro, "Meu regresso", tango com Antônio Mariani e "Serenata do adeus", toada com Nascim Filho. Em 1963, Caçula e Marinheiro gravaram a canção rancheira "Meu crescimento", de parceria com Sebastião Aurélio, e Zilo e Zalo gravaram o "Tango da traição", de parceria com Zalo. Em 1964, Silveira e Barrinha lançaram a valsa "Rainha do meu coração", de parceria com Barrinha e Zilo e Zalo gravaram de sua parceria com Zalo o carrilhão "Aliança abençoada".
Em 1986, Chitãozinho e Xororó gravaram dele e Luiz de Castro, "O dinheiro compra tudo". Em 1988, Lourenço e Lourival gravaram dele e Luiz de Castro, "Cachorro amigo" e "Toalha de mesa". No mesmo ano, Gian e Giovani gravaram dele e Toni Gomide "Espuma de cerveja". Em 1991, o Trio Parada Dura lançou "Palavra de honra", dele, Ronaldo Adriano e Rosa Quadros, e "Vestido branco", dele, Ronaldo Adriano e Mangabinha. Em 1993, teve a música "Negócio de sócio", com José Felipe gravada por Sérgio Reis na BMG.
Em 1999, teve as músicas "A marca da traição", com Zalo; "Violão amigo", "O silêncio do seresteiro" e "Mulher inocente", com Zilo; "O mesmo amigo", com Rocha Menezes; "Meu regresso", com Antonio Marani, e "Sombra do passado", relançadas no CD "Raízes sertanejas" com os sucesso da dupla Zilo e Zalo, da gravadora EMI. Em 2001, sua composição "Aproveita Minha Gente", com Ronaldo Adriano foi destaque na voz da dupla Chico Rey e Paraná.
Senhor Benedito Onofre dos Santos qual é a sua idade?
Dia 20 de outubro eu fiz 74 anos, nasci em 1931. Sou nascido em uma cidade próxima a Araraquara chamada Boa Esperança do Sul. Eu tenho o privilégio de ir mudando de ares conforme desejo. Moro em São Paulo, em Santo André, fico uns tempos em Boa Esperança, fico uns tempos na casa de Moisés Augusto aqui na cidade de Rio das Pedras, fico uns tempos também em Itapetininga na casa de outros amigos. Meu pai e minha mãe morreram, eu fiquei sozinho, não tenho família, gosto mais de andar, não ficar parado em um lugar só! Sou solteiro, nunca me casei! Fico em Londrina, Campo Grande, Goiânia, a maior parte do tempo tenho permanecido em Piracicaba. Conheci a família do Moisés Augusto, sua esposa Dona Isabel, Garcia, Cezar e Paulinho. O Craveiro e o Cravinho eu já conheço há muito tempo! O Evaldo Augusto da imprensa é um grande amigo. São pessoas com quem estabeleci um laço de amizade e respeito que são muito importantes em minha vida.
O senhor toca algum instrumento?
Não toco nenhum instrumento. Só escrevo as letras das músicas. Comecei a trabalhar na música em 1950 com 19 anos de idade. Meus pais sempre trabalharam na roça. Em 1956 eu já tinha desenvolvido um bom trabalho na música, trouxe-os então para São Paulo. Na época eu tinha 27 anos de idade.
Como o senhor descobriu a música?
Quando eu morava na roça, em Boa Esperança, eu já escrevia na escola. Gostava de escrever poesias, sempre me interessei por isso! Aos 16 anos de idade comecei a escrever alguma coisa! Mas na época não conseguir gravar porque morava na roça.. Só em 1950, quando fui para São Paulo é que consegui gravar. Eu fazia as letras, e mandava para um amigo chamado Teddy Vieira, um compositor muito famoso que infelizmente faleceu, ele gravava com as duplas e punha o meu nome e o dele como compositores. O Teddy gostava muito das minhas composições.
O tema principal das suas letras qual era?
Sempre o romantismo. A rotina do casal não feliz. Se você escrever uma musica do casal feliz que vive nas mil maravilhas não tem comércio! Para a música ser comercial tem que ser do casal infeliz que vive entre tapas e beijos!
O Senhor foi namorador?
Nunca fui! Exagerado não! Fui normal.
Para ter inspiração tem que ter um pouco de desilusão?
Eu faço as músicas observando as desilusões alheias! Desde a primeira musica que eu fiz, “Seresteiro da Lua”, “Taça da Dor”, “Flor da Lama”, “A Mulher de Ninguém” “Alma de Boêmio” todas essas músicas eu fazia das desventuras alheias, baseando na vida de alguém. Quando você faz uma música, ela pode ser sua, intima, mas ela bate uma grande parcela da sociedade!
O senhor morava aonde nessa época?
Morava em Santo André.
O senhor gostava de freqüentar a noite?
Não freqüentava não! Ás vezes devido ao trabalho, eu trabalhava em circo, levava as duplas, ás vezes ficávamos uma parte da noite em atividade, mas a noite toda não! Eu levava as duplas para se apresentarem no circo, naquele tempo não tinha esses cachês que existem hoje, essas festas do peão, essas festas de exposição, então naquele tempo era só circo. O artista era muito bem tratado. Só que não tinha quase nenhum lucro! Você ia para um circo trabalhar na base de cinqüenta por cento da renda, da bilheteria, se chovesse você perdia tudo! Hoje o Zezé de Camargo e Luciano, Chitãozinho e Chororó, Daniel, Leonardo, Bruno e Marrone que trabalham comigo até hoje, ele já vão cantar com o dinheiro no bolso!
Quais são os artistas mais conhecidos do grande público que o senhor trabalha diretamente?
Eu tenho aqui um CD que comemora 50 anos de música, é uma homenagem que a gravadora fez para mim. Aqui têm os artistas que gravaram as minhas músicas, não todos porque eu gravei mais de 1000 músicas! Benedito passa a relatar alguns dos grandes nomes da música brasileira. Não consta neste CD nomes de cantores como Tibagi e Miltinho, Belmonte e Amarai, Lourenço e Lourival, Pedro Bento e Zé da Estrada, Trio Parada Dura, Tião Carreiro e Zé Paulo, Zico e Zéca, Zilo e Zalo, Silveira e Barrinha, Cascatinha e Inhana, Tonico e Tinoco, Tião Carreiro e Pardinho. Gravei com todos eles!
Qual foi a primeira música que “estourou” no mercado?
Foi o “Seresteiro da Lua” com Pedro Bento e Zé da Estrada no ano de 1950.
O senhor lembra um pedacinho dela?
Lembro-me sim! Abre janela! Oh! Querida /Venha ver o luar cor de prata/Venha ouvir o som deste meu pinho/Na canção de uma serenata.Coisinha antiga!
De onde saiu essa inspiração?
Um cara estava fazendo uma serenata no interior eu era moleque, e fui assistir a serenata, ele foi cantar para a moça na janela mais ela não saiu então eu fiz essa música!
O senhor se lembra de um pedacinho da música Taça da Dor?
Muitas mulheres me querem/ Mas não adianta, há somente uma que eu amo na vida... são coisinhas românticas. Depois gravei com Tião Carreiro e Pardinho “Alma de Boêmio”.
Quando vinha o pagamento do direito autoral, de três em três meses, hoje é diferente, você recebe todos os meses. Vinha um dinheiro grande de três em três meses.
Naquele tempo vinha mais dinheiro para o compositor?
Dez vezes mais! Não existia pirataria! Hoje a pirataria tomou conta de tudo!
A sua composição “Boate Azul” é um sucesso muito grande?
Ela está re-gravada em 70 países, tem na França, na Espanha, Portugal, Alemanha, Itália, na Dinamarca, vem dinheiro para mim do mundo inteiro! Não Um dinheirão, os brasileiros que vivem lá pedem pela internet, agora mesmo me telefonaram dizendo que estava tocando em Londres! Eu tenho ela gravada com uns 80 artistas!
O senhor pode relembrar um pedacinho dela?
Doente de amor procurei remédio na vida noturna com a/Flor da noite em uma boate aqui na zona sul, a dor do/Amor e com outro amor que a gente cura, vim curar a/Dor nesse mal de amor na boate azul e quando a
Noite/Vai se agonizando no clarão da aurora os Integrantes da/Vida noturna se foram dormir e a dama da noite que estava/Comigo também foi embora , fecharam se as portas/Sozinho de novo tive que sair, sair de que jeito, se nem/Sei o rumo para onde vou muito vagamente me lembro/Que estou em uma boate aqui na zona sul eu bebi Demais/E não consigo me lembrar se quer qual é o nome/Daquela mulher a flor da noite na boate azul.
Aonde o senhor buscou inspiração para realizar essas composições?
Foi na situação dos outros. Eu tinha um amigo que amanhecia bêbado na porta da boate. Ele era apaixonado por uma mulher dessa boate. Ele ficava lá esperando ela sair. Só que ia bebendo, ia bebendo, na hora de sair não agüentava mais, então na hora de ir embora ele ficava lá caído na porta da boate. É ai que ele fala: “sair de que jeito, se nem/Sei o rumo para onde vou muito vagamente me lembro/Que estou em uma boate aqui na zona sul eu bebi Demais/E não consigo me lembrar se quer qual é o nome/Daquela mulher a flor da noite na boate azul”.
Todas essas composições que o senhor fez são baseadas em fatos reais?
Cada composição é um caso que aconteceu com alguém, não comigo! (risos).
Fazer amizade com o senhor é meio perigoso?
Não. Porque? Se você tiver um passado limpo, não farei musica sua! Eu faço musica só de quem tem um passado de muitas paixões incontrolados.
O senhor acha que o homem vive em função das paixões?
A maioria vive em função das paixões! Se você contar, dos 6 bilhões de habitantes da Terra, mais da metade é apaixonado!
O homem o senhor acha que vive por dois motivos: pela paixão e pelo dinheiro?
Exatamente! Por mulher e dinheiro! Não tem nem dúvida. Alimentação é uma coisa necessária, isso ninguém vive sem. Mas o dinheiro e a mulher são as molas mestras do mundo!
Em todos esses casos que o senhor descreve o senhor se considera um relator das histórias?
De fato eu sou um mensageiro da paixão alheia. Seja de homem ou de mulher! Contando uma história sem por o nome de ninguém! É uma história que pode ser a da metade da população do mundo!
Alguma vez alguns dessas personagens disse ao senhor:- Como é que você fez uma música desse jeito?
Tem muitos casos! Só o Som de Cristal que eu gravei com o Joaquim Manoel. E m São Paulo tem uma Boate chamada Som de Cristal, mas eu não fiz a letra pensando nela! Fiz pensando na orquestra que tocava musica estridente como se fosse um som de cristal. O dono da boate me processou dizendo que eu estava usando nome da boate dele para fazer sucesso. A letra dizia: “a casa noturna, boate falada, lugar de má fama”, e ele achou ruim porque ele queria que eu dissesse: “a casa noturna, boate afamada, boate de fama”. (Letra: A casa noturna/se mantém a noite/em clima de festa/De longe e ouve/vários instrumentos/de cordas e metal/Boêmios bebendo/cantando e dançando /ao som da orquestra/Um som estridente/que lhe deu o nome /de Som de Cristal/A casa noturna/boate falada/lugar de má fama/Com as portas abertas/durante a noite/entra quem quiser/Porém essa noite/Sem que eu esperasse/Entrou uma dama/Fiquei abismado/Porque se tratava da minha mulher/(refrão)/Ela se cansou/de dormir sozinha/esperando por mim/E nessa noite/resolveu dar fim/A sua longa e maldita espera/Ela não quis mais/levar a vida de mulher honrada/Se na verdade/não lhe adiantou nada/ser mulher direita/conforme ela era/Ela decidiu/abandonar o papel de esposa/para viver entre as mariposas/Que fazem ponto /naquele local/E a minha vida/muito mais errante/agora continua/Transformei a esposa/em mulher da rua/A mais nova dama /do Som de Cristal.
O senhor para fazer suas composições chegou a fazer um trabalho de pesquisa?
Não. Eu conhecia histórias nos ônibus, nas emissoras de rádio, ouvindo os colegas cantando, ás vezes por uma música você tira outras duas ou três. Pelo assunto de uma musica você inventa outro assunto! Cria um novo assunto! Pela Boate Azul eu fiz Som de Cristal, que é uma seqüência mais que ninguém sabe que é uma seqüência!
O senhor chegou a fazer letra de música em guardanapo?
Em guardanapo não! Na cabeça eu faço, depois passo a limpo em casa. Nos ônibus, de São Paulo para Piracicaba, ou de São Paulo para Araraquara, no caminho encontro muitos temas para fazer musicas.
Qual é o melhor lugar, qual é a melhor hora para criar?
Eu não tenho! Se você me pedir para fazer uma musica ali agora eu sento ali e faço! Também não tenho mais esse negócio de inspiração, eu faço pela pratica! É só achar um tema e faço pela prática. Sou como um profissional de qualquer área. No começo era tudo por intermédio de inspiração, de fazer aquela concentração como se fosse uma meditação. Agora faço na base de industrialização! Industrializou-se a música! O artista sempre gosta de por no estilo dele. Com o César e Paulinho eu gravei umas oito músicas, mas eu deixei eles fazerem a vontade, o que fica bem para eles, porque são eles que irão cantar. A música tem a cara do artista. Daniel canta o romântico. Teodoro Sampaio cantam mais musica dançante. Milionário e Zé Rico são românticos a bessa. Duduca e Dalvam também eram românticos. Cezar e Paulinho são criadores de tudo, são versáteis a bessa.
O Senhor se lembra de uma música chamada “Jorginho do Sertão”?
Jorginho do Sertão é de Cornélio Pires. Rubens da Silva, o Caçula e Mariano da Silva - Piracicaba, SP eram Irmãos, trabalhavam na roça quando foram descobertos por Cornélio Pires e convidados a integrar a Turma Caipira formada por ele. Foram responsáveis pela primeira moda de viola gravada, "Jorginho do sertão", em 1929 pela Columbia, recolhida por Cornélio Pires:
“O Jorginho do SertãoRapazinho de talento Numa carpa de café/Enjeitô treis casamento/Logo veio o seu patrão/Cheio de contentamento/(tenho treis filhas "sorteira que/ofereço em casamento)/Logo veio a mais nova/vestidinho cheio de fita/Jorginho case comigo/que das treis/sô a mais bonita/logo veio a do meio/vestidinho cor de prata/Jorginho case comigo/ou então você me mata/logo veio a mais veia/por ser mais interesseira/Jorginho case comigo/sou a mais trabaiadeira/Jorginho pegou o cavalo/ensilhô na mesma hora/foi dizê pra morenada/adeus que eu já vou me/embora/Na hora da despedida,/AiAiAi/é que a morenada chora/AiAiAi/O Jorginho arresorveu/é melhor que eu mesmo suma/não posso casá cum as treis, aieu num caso cum nenhuma”. Cornélio Pires foi o pioneiro. Quando eu cheguei em São Paulo só tinha 4 duplas de nome: Torres e Florêncio; Serrinha e Caboclinho, Palmeira e Luizinho e Tonico e Tinoco. Depois tinha outras duplas menos famosas, como o Brinquinho e Brioso, Leonardo e Cunha Junior. Eu cheguei em São Paulo em 1950, a vida inteira eu fui compositor. Fui morar em Santo André. Foi ai que fiquei conhecendo o Ariowaldo Pires, que era o Capitão Furtado! Ele me disse que tinha um tio que deu o ponta-pé inicial na musica! Aí então fiquei conhecendo Cornélio Pires! Tiete, Piracicaba , Sorocaba e Botucatu são os berços da musica sertaneja. Com vários artistas daqui como Mariano e Caçula, Serra, Parafuso, Mandi e Sorocabinha. Issso começou em 1929. Cornélio Pires era alegre, expansivo, companheirão, ele era uma patente, juntava as duplas todas da região e levava para gravar. Naquele tempo só tinha duas gravadoras! A Continental e a RCA Victor. Ele levava 10 a 12 pessoas para gravar. Não tinha gravadora em São Paulo, era só no Rio de Janeiro, então ele pegava o trem no Brás ia para o Rio de Janeiro, gravava, aquele tempo era só duas musicas por disco. Ia bem ensaiadinho, chegava lá, gravava e voltava. Na podia errar! Se errasse estragava o disco. Hoje em dia está muito mais fácil, até eu sou capaz de chegar lá e gravar! Eu não me lembro muito do Parafuso, porque ele morreu faz 32 anos, mas ele era espetacular. Aqui em Piracicaba tinha uma seleção de repentistas bons! Nhô Serra, Pedro Chiquito. Em Piracicaba eu só gravei com Garcia e Zé Matão e Cesar e Paulinho. O Craveiro e Cravinho antes formavam a dupla Manico e Maneco! (risos)
O compositor brasileiro diz que compor no Brasil não dá dinheiro, isso é verdade?
O compositor de uma música, de duas, três ou até de dez ganha pouco. Eu tenho muitas músicas. Tenho mais de 1000 musicas compostas, sendo que umas 300 estão em atividade.Rendendo um pouquinho cada uma.
O senhor é o maior compositor brasileiro atualmente?
Eu me considero entre os 10 maiores compositores brasileiros. Tiro chapéu para José Fortuna, Teddy Vieira, Anacleto Rosa Junior, Lourival dos Santos, Moacir dos Santos, Goiá, foram os novos, como César Augusto, Zezé de Camargo, Elias Muniz, Joel Marques, Randall. No estilo de musica antiga, que tinha aqueles dramalhões eu fui um dos pioneiros, eu, o Teddy, o José Fortuna, o Goiá (Gerson Coutinho da Silva)
O senhor acha que a qualidade da música melhorou ou piorou?
Eu acho que melhorou. Não a qualidade em si da letra. A qualidade da melodia melhorou. A qualidade da letra você tem que acompanhar. Hoje em dia você não pode mais fazer a letra de uma história que o pessoal não grava mais. Então você tem que acompanhar.
Tem muita gente que faz sucesso com a música apelativa? O senhor já fez alguma música com letra mais maliciosa?
Já fiz. Contra a minha vontade, mas comercialmente fui obrigado a fazer. Mulher Boa de Teodoro e Sampaio. Têm várias músicas assim. “Essa noite eu pinto aí” é uma música apelativa, não fala palavrão, ela é maliciosa, induz. Normalmente é tocada em baile. É mais em bailão.
O senhor tem algum hobby, além da música?
Gosto muito de pescar. Mas não sou bom pescador.
Pescando o senhor se inspira? Tem alguma música que fale de peixe?
Pescando a gente se inspira. Mas não tenho nenhuma música que fale de peixe. Já pesquei no Rio Piracicaba. Mas não fiz nenhuma musica para o Rio Piracicaba. Para bater aquela musica do Lourival dos Santos e Piraci é muito difícil! O rio de Piracicaba Vai jogar água prá fora! O que é isso! O Craveiro e Cravinho têm outra também muito bonita. Não tem jeito de fazer musica melhor que a deles e para fazer pior eu não faço!
Quanto tempo o senhor leva para compor uma música?
Ás vezes eu faço uma musica em duas horas, as vezes demora uma semana! Depende! Tem que se achara as palavras adequadas, primeiro eu faço o rascunho, depois vou procurando a substituição de uma frase até chegar a um ponto em que ela esteja comercial.
O senhor já fez composição até em fila de banco?
(risos) Ah! Já! Mas já fiz diversas músicas!
O senhor pretende fazer uma música para Rio das Pedras?
Preciso ir á prefeitura, pegar os dados da cidade, vamos estudar o assunto!
O senhor toca algum instrumento?
Não. Só faço a letra da música mesmo! O Romantismo não está acabando, antigamente existia muito mais sentimentalismo! A modernidade tomou conta. A paixão é uma coisa eterna. Eu escrevo música para crianças, jovens, terceira idade, quarta idade!
O senhor gosta de dançar?
Não. Mas gosto de escrever musica de dança! Musica de bailão eu escrevo muito!
Qual é a sensação do senhor ver o pessoal dançar uma música escrita pelo senhor, ou ouvir uma música de sua autoria?
Isso se torna um caso até meio chato! Quantas vezes eu estou andando no ônibus e escuto o cara cantando minha musica! Você acha que eu vou chegar nele e dizer essa musica é minha! Não tem cabimento! Em todas as casas noturnas que eu chego eles cantam Boate Azul! Eu vou chegar lá e falar que essa música é minha! É chato não é? O pessoal quando descobre que sou o autor fica curioso demais! Principalmente quem esta assistindo! Quem está cantando não é tanto.
Quem está assistindo vem perguntar porque o senhor fez aquela musica?
Ai é que está o meu problema! Eu chego em Boa Esperança o povo está cantando a minha música. Vou para Araraquara estão cantando, chego aqui estão cantando. Se eu chegar lá chega aquele monte de perguntas. Você sabe que eu tenho problema auditivo, operei agra melhorei um pouco.
O senhor é uma pessoa extremamente reservada, está sempre sendo assediado para comparecer em programas em rede nacional. Qual o motivo dessa sua reserva?
Eu sou uma pessoa de uma certa idade, a minha imagem não tem mais interesse para a televisão. Eu acho que não. Esse é o meu problema de achar. Acho que se chegar na televisão o povo irá dizer: - O que esse velho ta enchendo o saco ai! Eu tenho medo do ridículo. O Ratinho cansou de me chamar. A artista Inesita Barroso, quantas vezes ela quis me homenagear como compositor, e eu não fui. Eu gosto dela barbaridade, gosto do Ratinho Barbaridade! O Fustão mandou um recado por intermédio do Bruno e Marrone, para que eu vá lá. Não fui ao Gugu. Não fui ao Raul Gil. Gostaria de ir, mas se tivesse uma imagem condizente!
A sua formação musical é natural?
É natural. Não estive estudo nenhum, só o quarto primário. Tudo o que eu sei foi através da escola do mundo. Da vivência.
Qual foi a música que lhe deu mais satisfação?
É difícil numerar uma só porque eu tive mais de 50 musicas que me deram prestigio. A mais famosa é Boate Azul.
Existe alguma música que o senhor fez e não gostaria de ter feito?
A maioria! (muitos risos). Tem uma que se eu pudesse apagar eu apagava, foi Alma de Boêmio. Tem uma palavra que eu não uso mais. Tirei do vocabulário. Naquele tempo era comum isso ai. É a palavra desgraça!Escrevi isso ai nos anos 50.
“A minha sorte foi tirana e deslinda estou sofrendo por amar quem não me quer/Isto acontece para/um homem que acredita que existe amor no coração duma mulher/Por mais que eu queira esquecer o meu passado meu sofrimento e viver pensando nela/E os amigos só para me ver magoados quando me encontra vem me dar noticias dela/Só tenho as ruas e a bebida como herança essa mulher me deu esse maldito prémio/E hoje dela só me resta uma lembrança a torturar a minha alma de boêmio/Embriagado passo as noites pelas ruas ninguém tem pena deste meu triste viver/Olhando ao céu quanto contemplando a luz da lua me representa a sua imagem aparecer/Foi o desgosto que atirou-me nesta vida abandonado e renegado pelo mundo/Eu vivo sempre naufragado na bebida tornei-me apenas um boêmio vagabundo/Perdi amigos perdi tudo que já tive em altas noites só o sereno me abraça/Essa mulher na mesma rua ainda vive bebe com outro a brindar minha desgraça/Declamado voz mulher/Se hoje vive mal trapilho pela rua/A culpa é toda tua não soubeste me conservar/E por vingança hoje eu bebo nesta taça/A brindar tua/desgraça na mesa deste bar/Declamado voz homem/Segue, segue bebendo que eu continuo vivendo assim/E quando chegar meu fim que eu partir deste mundo/Ais de lembrar com saudade que já foi para eternidade/Eu boêmio vagabundo/Foi o desgosto que atirou-me nesta vida abandonado e renegado pelo mundo/Eu vivo sempre naufragado na bebida tornei-me apenas um boêmio vagabundo/Perdi amigos perdi tudo que já tive em altas noites só o sereno me abraça/Essa mulher na mesma rua ainda vive bebe com outro a brindar minha desgraça”
O senhor conviveu com muita gente famosa, como Inesita Barroso, Airton e Lolita Rodrigues, Adoniran Barbosa, Caçulinha. Demônios da Garoa. O que você acha desse pessoal?
Conheci Inesita Barroso quando ainda era cantora, é um amor de pessoa! Um ser humano espetacular!. O Airton e a Lolita tinham o programa Almoço com as Estrelas. O Caçulinha é filho do Caçula, conheço ele há muito tempo.Eu gostava muito do Arnaldo do grupo Demônios da Garoa.Adoniran Barbosa, o Charutinho, a gente se encontrava na Sociedade dos Autores e tínhamos bastante amizade, sempre foi sarrista. Waldilk Soriano é muito bom.
Francisco Alves, o Chico Viola o senhor conheceu?
Ele morreu no ano de 1952, eu tinha 21 anos. Foi uma tristeza muito grande.
E Nelson Gonçalves?
Nelsão era gente fina, ele era romântico, mas morava no Rio de Janeiro. Eu não tinha muito contato com ele. A gente se encontrava na gravadora. Era terrível falar com ele, ele era gago para falar! Cantando não!











segunda-feira, dezembro 27, 2010

Bruno Fernandes Chamochumbi (Papai Noel)

JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 25 de dezembro de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: Bruno Fernandes Chamochumbi (Papai Noel)
Segundo Luís da Câmara Cascudo, folclorista brasileiro, Papai Noel chegou ao Brasil na década de 1920, importado junto com o cinema e o rádio. O Natal é comemorado em todo o mundo, é uma festa tão popular, que já atingiu países como o Japão e a China. Pode-se dizer que Natal é uma festa globalizada a data de 25 de dezembro é sem dúvida a maior manifestação vivida pelos habitantes do planeta. As inúmeras facetas dessa data fascinam qualquer pesquisador, uma gigantesca catarse, quando a humanidade torna-se mais fraterna, embalados por uma mídia envolvente muitos despertam o sentimento de solidariedade, o amor ao próximo pregado pelas diversas correntes religiosas. Para um grande número de pessoas o Natal é um momento de reflexão e de grande alegria. Em Piracicaba há cerca de uma década e meia, um garoto foi contagiado pelo espírito natalino, a sua vocação latente para tornar-se um ator foi despertada pela oportunidade de representar o seu primeiro papel, o do bom velhinho que povoa a imaginação de crianças e adultos. Bruno Chamochumbi incorporou e personalizou a figura de Papai Noel, o ator evoluiu, profissionalizou-se. O tradicional trenó deu lugar a um reluzente helicóptero, cruzando os ares e levando ás alturas as fantasias e sonhos de Natal. Bruno Fernandes Chamochumbi é piracicabano, nascido em 30 de setembro de 1982, filho de Juan Alberto Vera Chamochumbi e Maria Isabel Silveira Fernandes Chamochumbi.
Seu pai é natural de qual país?
Ele veio do Peru para estudar na ESALQ, onde se formou como agrônomo. A minha mãe nasceu em Piracicaba, o seu pai é Eduardo Fernandes Filho, que teve grande participação na vida social de Piracicaba, é um dos fundadores do Lions Clube em Piracicaba, participou da fundação do Clube de Campo de Piracicaba, da Acipi, do Clube de Regatas de Piracicaba, foi contador da Escola de Musica de Piracicaba, além de suas ligações com o comércio e indústria local.
Você estudou em quais escolas?
Fiz o primário no Grupo Escolar Moraes Barros e no Grupo Escolar Prudente de Moraes. Junto com a minha família morei dois anos em Santos, freqüentando escola daquela cidade. Fiz o ginásio e o colegial no COC Piracicaba. Sou graduado em publicidade pela UNIMEP.
A sua vocação para ator manifestou-se quando?
Na escola eu já participava do teatro, sempre fui muito extrovertido, tenho uma veia humorística, minha família teve diversas atividades artísticas, meu avô cantava tangos e boleros com o seresteiro Cobrinha, temos pessoas da família que são produtores culturais, gosto muito de musica, de teatro, cinema.
Qual foi o seu primeiro papel de relevo em uma peça de teatro?
Aos 11 anos atuei como o Grilo Falante em Pinóquio, na cidade de Santos, eu gostava muito de desenhar, pintar e nessa apresentação me descobri como ator.
O que é necessário para ser publicitário?
Amor, paixão, paciência, criatividade, uma boa formação cultural, há a necessidade de conhecer cores, formas, histórias, pessoas. Temos que ter menos preconceito, quando digo um preconceito menor é porque vejo a necessidade de desvencilhar todo dia de uma pré determinação, de um pré conceito. O publicitário tem que estar sempre pronto para o novo, conhecer novas pessoas, linguagens, trabalhos, novas cores, formas. O publicitário tem que estar disposto a fazer a diferença.
Há opiniões sobre o fato de o publicitário vender produtos e serviços sem que o consumidor tenha a necessidade dos mesmos?
Não acredito nisso, como publicitários temos um papel social, que começa a ser exercido a partir do momento em que vendo somente aquilo em que acredito. Somos figuras fundamentais para que um projeto possa dar certo. Não posso vender mensagens que desarmonizem o mundo, que traga preocupação ás pessoas ou que façam mal ao próximo. Alguns de fato praticam esse tipo de ação, eu não consigo. Necessito “comprar” a idéia daquilo que vou vender, acredito até que possa ser reflexo do meu trabalho com a Casa de Noel.
Quando surgiu a oportunidade de atuar como Papai Noel?
Aos 14 anos recebi uma tarefa dada pelo Luiz André Filho, diretor da escola Poli Brasil onde eu era aluno. Eu entrava em sua sala para bater papo, sempre tive muitas idéias, como todos nós temos só que eu externava meus pensamentos. Um determinado dia ele me mostrou uma roupa de Papai Noel e perguntou-me se eu queria usar para entregar folhetos da sua escola, na época chamada de Data Brasil. Adorei aquilo! Imediatamente despertou em mim um sentimento artístico. Passei a observar que as pessoas estavam gostando do meu trabalho, respondiam de forma positiva. Permaneci na Rua Governador Pedro de Toledo quase na esquina com a Rua XV de Novembro, em frente à Alfaiataria Excelsior, divertia-me muito com aquilo tudo, ria bastante. No primeiro dia coloquei uma barba importada da China, bem simples, no segundo dia falei com a Tereza, que trabalhava em nossa casa, com uma almofada da sala criamos uma barriga para o Papai Noel. Arrumei outra barba para colocar sobre o meu cabelo, a cada dia percebi que poderia melhorar o visual do Papai Noel, com pasta d`água tornei minhas sobrancelhas brancas. Tenho a pele muito morena, passei a pintá-la, afinal sou descendente de peruano e o Papai Noel é caracterizado como natural do Pólo Norte. Eu estava tão envolvido naquilo que a cada dia inventava alguma coisa. Fui convidado pelo Bingo Broadway para descer de um helicóptero no estádio do XV de Novembro, o Barão de Serra Negra. Achei aquilo o máximo! Até os doze anos eu acreditava em Papai Noel, minha mãe fazia questão de levar uma cartinha que endereçávamos á ele.
Atualmente algum jovem com 12 anos acredita em Papai Noel?
Não! Na minha época poderiam existir muitas crianças que com essa idade acreditava em Papai Noel. Não deixei de acreditar na existência dele, eu entendi que Papai Noel é uma figura que traz uma serie de situações que não são as comerciais. Papai Noel não traz presente físico, ele traz presentes afetivos. As crianças de hoje não realizam essa descoberta somente aos 12 anos, elas descobrem antes. A mídia de forma velada fica em cima delas afirmando que Papai Noel não existe. Há uma vulgarização da figura de Papai Noel ocupando desde capas de revistas masculinas até os mais diversos produtos que se possa pensar. Com isso sua imagem se banaliza. As crianças percebem mais cedo que o Papai Noel não é apenas aquele que traz os brinquedos que elas estão pedindo, e sim quem dará lugar para o sonho de um mundo melhor. É nisso que o Projeto Casa de Noel acredita, após 14 anos de trabalho.
Qual foi o passo seguinte na trajetória do ator Bruno apresentando o Papai Noel?
Após a descida de helicóptero ocorreu minha participação em evento no Edifício Canadá, no ano em que o prédio foi inteiramente decorado com luzes de natal. Eu me divertia, ria muito, cantava a música que era o tema de uma novela da época, o refrão era: “Cadê zazá, zazá, zazá?” Eu apresentava um Papai Noel diferente, que cantava, interagia com as pessoas, tinha brincadeiras, tinha atitude. Fui convidado a estudar em uma escola particular com bolsa de estudos. Os proprietários do Colégio COC de Piracicaba moravam no Edifício Canadá. No ano seguinte o Waldir, proprietário da loja Farrawi me convidou para ficar em sua loja vestido de Papai Noel, passei a fazer a animação do estabelecimento por duas a três horas, todas as noites. Aquilo me divertia muito. Eu queria decorar a entrada da loja com motivos alusivos ao Papai Noel, falei com a proprietária de uma indústria de móveis, uma amiga da nossa família, Dona Maria Helena Corazza e pedi emprestada uma poltrona vermelha, para que o Papai Noel se apresentasse melhor caracterizado. Ao mesmo tempo em que eu estava adorando, sentia-me incomodado por Papai Noel não ter um lugar totalmente seu, com árvores, tapetes, mais peças com conotação natalina. As crianças iam diariamente tirar fotos, formava uma fila para estar com Papai Noel. Levei o coral do Colégio COC para apresentar-se na loja. Eu queria a Casa de Papai Noel de Piracicaba.
Existe Casa de Papai Noel em outras localidades?
Tem em Gramado, em São Paulo. Hoje represento um Papai Noel que canta musicas de MPB, internacional, musica italiana (Nesse momento Bruno dá uma palhinha cantando um trecho da música Champagne, lembrando os tenores italianos). Apresento um Papai Noel que dança, é participativo. Essa é a grande diferença.
Você ensaia?
Ensaio com a maestrina Malu Canto e com o maestro Hermes Petrini. No ano 2000 eu já tinha 18 anos, estava no terceiro colegial, sonhava com a Casa de Papai Noel, para que cantasse, passeasse pela casa. Escrevi o projeto com a ajuda de uma tia residente no Rio de Janeiro, a Rê Fernandes, especialista em redação de projeto, especialista em cor. Após redigir o projeto me animei em desenvolvê-lo, comecei a fazer reuniões com os meus colegas de classe para convidá-los a trabalhar comigo. No meio do caminho fui apresentando o projeto a diversas pessoas. Um amigo viu o projeto, gostou, ele era proprietário de uma casa na Rua Governador, 619, que estava necessitando de uma reforma, a proposta do projeto era de que cada cantinho da casa tivesse a participação de um decorador, de um arquiteto. Alguém montando a casa como se fosse o lugar onde Papai Noel escolheu para morar, com a sala, sala de brinquedos, o quarto dele, o banheiro, a banheira, a jabuticabeira. Enfim uma casa completa, um lugar mágico que eu tinha imaginado. Começamos a trabalhar em 8 de setembro, no dia 2 de dezembro a Casa de Noel estava inaugurada, totalmente reformada por 54 profissionais de arquitetura, decoração e artes plásticas.
Como você conseguiu disponibilizar esse pessoal todo?
Não sei até hoje! Juntos eu e a Cristiane que estávamos mais disponíveis, além do Mauricio e o Juliano que colaboravam muito. Ficávamos o tempo todo ligando, fazendo os contatos, convidando, conseguimos trocar o piso da casa, reformar o jardim, instalar uma cozinha planejada, fizemos um milagre na casa. Comecei a me exercitar, a me vestir como Papai Noel, passeava pela casa, Papai Noel poderia estar com os mais diversos trajes, até mesmo um roupão.
Pode-se dizer que era um “Big Brother” ao vivo com Papai Noel?
Isso! Tanto que naquele ano já havia uma chamada para o Big Brother apresentado pela TV Globo, o mundo inteiro estava alerta com o Big Brother, só depois é que fomos descobrir a proposta do espetáculo apresentado pela televisão, parecida com a nossa, apresentar o Papai Noel de tal forma que em qualquer canto da casa saísse uma foto bonita.
Para você foi um empreendimento com bons resultados financeiros?
Não apenas deixamos de ganhar, como também investimos muito dinheiro. Como divulgação o evento foi um sucesso, com cobertura da TV Globo, mídia dos mais diversos locais, o Senac como parceiro contratou uma agencia de propaganda com assessoria de imprensa, houve uma grande aceitação por parte do público. Em 2001 decidimos mudar de endereço, fomos para a Società Italiana di Mutuo Soccorso. A idéia é de que os arquitetos executassem um trabalho dentro de um espaço de utilidade pública. Ao sair de lá, confesso que achei que não ser possível fazer nada, não iria dar tempo, era o mês de julho, a arquiteta Cristina Anselmo estava comigo, disse-lhe: “-Cristina, não vai dar não, é muita coisa!”. A diretoria da Societá estava reformando muitas coisas, portas e janelas, tinha refeito toda a hidráulica, uma parte da elétrica, tinha sido feita uma laje no palco, o piso anterior era de madeira, comprometido pelo cupim. Passei a noite toda sem dormir, no dia seguinte liguei para a arquiteta e disse-lhe: “- Cristina! Decidi! Vamos fazer!” Começamos a trabalhar, o marketing era intuitivo, simultaneamente tinha profissionais trabalhando em conjunto, quando vi estava coordenando um mega projeto, juntamente com o presidente da Societá Italiana que era o Marcos Guidotti. Passei muitas noites sem dormir, fiquei muito tempo dormindo na casa de uns amigos que moram ainda no Edifício São Francisco, ao lado da Societá. Fui movido pela pressão de executar um projeto de muito sucesso. Até a tinta com que foi pintada a fachada da Societá Italiana foi feita de maneira especial. Conseguimos cozinha, jardim, piso, fachada, iluminação, a Societá Italiana estava revitalizada. Nesse ano tivemos 12.000 pessoas visitando a Casa de Noel. Corais apresentando-se todas as noites. O evento começou a deslanchar, a imprensa regional passou a nos procurar. Em 2003 tivemos o patrocínio de duas empresas nacionais, a Claro e a Del Valle. O projeto passou a ser conhecido no Brasil todo. A Telefônica nos convidou para fazer um cartão telefônico.
A partir de 2003 houve um redirecionamento das atividades da Casa de Noel?
Percebemos que o foco passou a ser muito mais nas musicas que Papai Noel apresentava, nos shows, a partir de 2003 passamos a contratar profissionais que cuidassem mais da musica, do teatro, da parte cênica do nosso projeto. Começou a ser um sucesso, passamos a fazer shows em que Papai Noel cantava, seguindo um roteiro. A arquitetura e decoração deram a prioridade para dar espaço a uma parte cênica. Foi um sucesso, conseguimos muitas coisas boas, passamos a investir nos shows. Até 2005 os shows aconteciam exclusivamente na Societá. A partir de 2006 os shows passaram a sair da Societá, o SESC nos contratou, em 2007 começou o projeto “Canta Noel”, que é a chegada do Papai Noel de helicóptero na Rua do Porto. Surgiram outras manifestações, hoje a Casa de Noel não é mais um local, é um grupo de artistas que desenvolvem shows itinerantes de natal. A Casa de Noel é o coração de quem assiste. Desde o ano passado Papai Noel faz shows sobre as águas do Rio Piracicaba, em um barco iluminado. Estamos indo aos bairros, como Santa Terezinha, Vila Rezende. Abrimos o projeto.
Como é a relação do Bruno com o Papai Noel?
O Bruno hoje está com maior visibilidade, anteriormente havia a preocupação em não aparecer quem representava o papel do Papai Noel. Valorizei e continuo valorizando a imagem do Papai Noel como embaixador do nascimento de Jesus. Fortalecemos a idéia de que o projeto é organizado por um grupo de profissionais. A Mamãe Noel é uma atriz contratada.
O seu presente de natal é interpretar o Papai Noel?
Acho que o meu presente de natal até o fim da minha vida é o Papai Noel.
Como você vê a comemoração do nascimento de Jesus e a importância dada ao Papai Noel em uma mesma data?
Há quem diga que Papai Noel toma o lugar de importância que pertence a Jesus. A primeira coisa que o nosso projeto define é de que o valor do Natal fuja do aspecto comercial. A imagem da Casa de Noel é uma imagem não comercial. Ele não vem para trazer balas e pirulitos, sua função é trazer mensagens de paz, amor, alegria, renovação, vem para trazer a boa nova: “-Nasce Jesus Cristo!”, que é o símbolo máximo do natal. A Casa de Noel reconhece isso e acredita que essa divulgação seja importante, aumentar o número de pessoas que se lembrem de que o natal é o nascimento de Jesus. A origem do Papai Noel é de natureza cristã, originou do bispo São Nicolau. A imagem do Papai Noel é lúdica, é uma imagem que “cola” facilmente.
Você realizou um trabalho de pesquisa sobre a figura de Papai Noel?
Em 2000 quando abri a Casa de Noel estudei muito para estar habilitado a responder as perguntas que poderiam ocorrer principalmente às questões mais complexas que poderiam partir, sobretudo das crianças.



ENTREVISTADO: LUIZ NASCIMENTO

JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 17 de dezembro de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: LUIZ NASCIMENTO
Sem qualquer parentesco com algum japonês ou descendente, Luiz Nascimento dedicou-se por cinco anos ao aprendizado da língua japonesa, até receber o certificado emitido no Japão, atestando a sua fluência no idioma da terra do sol nascente. Atualmente Luiz Nascimento dedica-se ao estudo do árabe. Autodidata, esse piracicabano é movido por desafios, entre seus feitos está o livro “Memórias Do Bairro Alto”, uma obra onde o autor relata muito do que viu e viveu no tradicional bairro piracicabano. O livro foi lançado em 2009 com grande sucesso. De fala mansa, jeito simples, funcionário público federal aposentado, prefere deixar seu automóvel na garagem e caminhar pela cidade, por alguns pontos onde passa a sua lembrança traz parte de sua história. Dos tempos em que ainda muito jovem trabalhou no Cine São José e no Cine Broadway. Lembranças do Clube Cristóvão Colombo que em seu inicio funcionou em acanhadas instalações no andar superior de um prédio existente até hoje, na esquina da Rua Governador Pedro de Toledo com Rua São José. Filho de Francisco Nascimento e Lucila Nascimento nasceu em 29 de março de 1932 Com o falecimento do seu pai, quando ele era ainda menino, deixou de ter uma vida de muito conforto e teve que trabalhar para colaborar nas despesas domésticas.
Qual era a profissão do seu pai?
Era viajante da Companhia de Cigarros Souza Cruz, ele nasceu no Estado do Rio de Janeiro, viajava por muitos estados brasileiros, sendo que em alguns mais afastados ele se fazia acompanhar de um segurança, seu trabalho era apenas realizar a venda, a entrega era feita por caminhão. Naquele tempo seu traje habitual era terno de linho branco, tínhamos um padrão de vida bastante elevado, meu pai e minha mãe saiam de Piracicaba e iam passear em São Paulo, entre outras diversões iam patinar no Parque da Aclimação. Estudei alguns anos na Escola Normal, hoje Sud Mennucci, fui transferido para o Grupo Alfredo Cardoso que na época localizava-se na esquina formada pela Rua Alfredo Guedes com a Rua São José.
Com que idade o senhor começou a trabalhar?
Aos 13 anos fui trabalhar na Casa Guidotti que vendia eletros domésticos, situada na Rua Governador Pedro de Toledo, entre a Rua Moraes Barros e a São José, seu proprietário era Luiz Guidotti, popularmente conhecido como Rei do Gatilho, pelas suas habilidades de exímio atirador com revólver.
Qual era o seu trabalho nessa empresa?
Fazia a limpeza, colocava acumuladores automotivos para receber novas cargas elétricas, havia um aparelho para recarregar as baterias, chamava-se “Tunga”. Carregava-se simultaneamente até oito acumuladores, era comum a loja receber muitas baterias de pessoas da zona rural, onde a energia elétrica não existia. Muitas vezes fui despachar baterias na Estação da Paulista, eram levadas por trem até seus proprietários que aguardavam a encomenda nas estações situadas junto à linha do trem. Eu saia da loja na Rua Governador, ia pela Rua Moraes Barros até o ponto do bonde da Paulista, levava a bateria ao lado do banco do bonde, descia no ponto em frente à Estação Paulista e a despachava, era muito comum essas baterias serem destinadas á pessoas residentes em Tupi, Caiubi, que retiravam as mesmas nas respectivas estações.
Qual foi o seu próximo emprego?
Fui trabalhar em uma loja situada na Rua Governador Pedro de Toledo, nas proximidades de onde hoje é a Ótica do Flavinho, chamava-se Casa Guerra, o proprietário era José Guerra, um senhor de origem portuguesa, de baixa estatura, sua esposa era uma senhora muito amável, eles eram proprietários de diversas casas que rendiam aluguel. Era uma loja de tecidos, armarinhos, ponchos que ficavam expostos nas portas de madeira. Dalí eu fui trabalhar na empresa J.B. Andrade, proprietária dos cines São José e Broadway, trabalhava no escritório, os ingressos eram selados sendo os selos adquiridos na coletoria federal que ficava na Rua Prudente de Moraes, onde hoje existem umas lojas de artigos esportivos o responsável pela venda dos selos chamava-se Batista Rigo Ao lado do Cine São José existia uma porta com uma escada que nos levava até o andar superior onde eram as acomodações da “geral” do cinema, caminhando por um longo corredor íamos até o local onde existiam três ou quatro salas. Eu pegava essas folhas de selos, prendia com tachinhas sobre um caixão de madeira, derretia a goma arábica, com um pincel espalhava a goma sobre a folha e deixava secar. Esse processo fazia com que o selo pudesse ser colado no ingresso. Passava uma esponja umedecida sobre a goma arábica que tinha sido aplicada no verso do selo e ia colando sobre os ingressos. A entrada adquirida era dada ao porteiro no acesso ao cinema, ele rasgava o ingresso e depositava em uma urna ao seu lado, após encerrar o movimento da bilheteria o gerente do cinema, o Pedro Sacconi, dirigia-se a um corredor externo onde incinerava as entradas contidas na urna. Outra tarefa que eu fazia era levar a programação do cinema para ser publicada no Jornal de Piracicaba e no “O Diário”. Os filmes a serem exibidos eram declarados em um documento que tinha que ser levado á delegacia de polícia para o delegado autorizar a exibição.
Existiam filmes proibidos?
Sim! Principalmente quando surgiram os filmes italianos. Hoje temos consciência de que não havia motivo para que proibissem esses filmes. As cenas tidas como apimentadas hoje são vistas sem que atraiam a menor atenção.
O senhor lembra-se de algum filme que foi motivo de clamor público?
Um filme proibido para menores de 18 anos gerou um alvoroço em frente ao cinema. Chamava-se “Veneno Lento”, em preto e branco, abordava doenças venéreas, assemelhava-se a um documentário. O filme “Feitiço da Cigana”, que passou na mesma época, seguia uma linha mais ousada, deu muito que falar em Piracicaba. Ao classificar um filme proibido para menores de 18 anos era o mesmo que provocar uma corrida ao cinema. Todo mundo queria assistir!
Quem eram os proprietários da empresa J.B Andrade?
Dois sócios vinham a Piracicaba, o Seu Cantidio, que era negro, vinha trajando um capote, descia do trem na Estação da Paulista, onde apanhava um taxi indo até o cinema, descia usando chapéu, fumando um charuto, tudo muito chique. O outro sócio quando vinha fazia o mesmo roteiro de visitas, indo até a cidade de Limeira, lá também eram proprietários de um cinema. Mais tarde a J. B. Andrade passou a ser denominada como Cinemas do Interior de São Paulo. Às vezes o filme que estava passando em Rio Claro deveria ser trazido para ser projetado em Piracicaba, pelas vias normais isso iria demorar muito, o cinema alugava um taxi e alguém ia até Rio Claro, Limeira para buscar o filme.
Como eram acondicionados os filmes?
Era seis ou sete rolos, cada um dentro de uma lata, no formato de uma lata de goiabada, porém maior, essas latas eram acondicionadas dentro de uma lata maior. Lázaro José Gorga, o Zinho, era um radio técnico muito competente, no cinema tinha o cargo de operador, que era quem projetava o filme no cinema, todos os dias, geralmente a partir das 14 horas, ele ia até o cinema, abria a cabine onde havia duas máquinas de projeção, tirava os filmes das embalagens, examinava, deixando tudo em ordem para á noite projetar o filme. Seu auxiliar era José Stengler. No Broadway José Mafezzoli era o operador, seu auxiliar era o Romeu.
O público que freqüentava o Broadway era diferente do público que freqüentava o São José?
O São José era um cinema mais popular, tinha a galeria que era chamada de “geral”. O Broadway era freqüentado mais pela elite da cidade. Ainda menino eu subi no forro do São José, onde pegava pombas, coruja.
O senhor permanecia quanto tempo trabalhando no cinema?
Entrava às oito horas, almoçava em casa, e às quatro horas o escritório era fechado, os funcionários tinham que ir até suas casas, se arrumarem para voltarem á noite. O gerente do Broadway era Max Graner. Durante o dia os gerentes trabalhavam juntos no escritório onde eu trabalhava. Eram preparadas as caixinhas para os bilheteiros, já com as moedas para voltar o troco, havia o controle no número de ingressos a ser vendido, para não ocorrer o excesso de lotação.
Como era a divulgação do filme no cinema?
As fotografias dos filmes eram expostas no saguão do cinema, tanto do filme em cartaz como os que viriam a ser projetados. Ás quinta-feira tinha a “sessão das moças” onde eram projetados dois filmes. Na quarta ou na sexta feira eram projetados três filmes: um romântico, o seriado e o terceiro era um filme de ação ou terror.
O cinema tinha a famosa figura do lanterninha.
Também fui lanterninha! No dia em que faltava o funcionário que tinha essa função eu desempenhava esse papel. Só faltava eu levar a minha cama ao cinema! Eu estava o tempo todo lá. Com o farolete eu indicava o lugar onde a pessoa poderia sentar-se. Ao entrar na sala de projeção a pessoa fica cega, só enxerga a tela. As matinês do Cine São José eram famosas, quando eram apagadas as luzes as crianças batiam o pé no chão, parecia que o cinema iria vir abaixo. Os vendedores de balas circulavam oferecendo bala de café, bala de coco, e um pequeno cone de papel com amendoim dentro.
E quando quebrava a fita do filme?
As luzes eram acesas de uma forma quase instantânea. O operador raspava as duas pontas do filme, passava acetona e juntava-as, estava feita a emenda, às vezes nesse processo eram pulados alguns quadros. A projeção de um filme era feita sempre com duas máquinas de projeção, para cada uma delas havia uma pequena janela, através da qual se projetava o filme. Uma porta deslizante de ferro permitia que ao abrir uma das janelas a outra era simultaneamente fechada. Isso proporcionava que os seis ou sete rolos de filme fossem projetados sem intervalos, ao terminar o rolo de filme de uma máquina era dado o inicio no rolo de filme de outra, movimentando-se essa janela na troca de máquinas, essa movimentação tornava-se imperceptível á quem estava assistindo o filme.
Ocorria às vezes a troca da seqüência de filmes?
Quando isso acontecia era uma tremenda gritaria no cinema.
Qual foi o seu próximo emprego?
Fui trabalhar na Agencia Municipal de Estatística que pertencia ao IBGE, o agente era o Walter Geraldi. Funcionava no prédio que foi a antiga casa do Barão de Serra Negra, derrubada deu lugar ao estacionamento da Câmara Municipal, na esquina da Rua Alferes José Caetano com Rua São José. Nesse palacete havia um enorme porão, com um pé direito alto, podia-se entrar sem ter que se curvar. Foi lá que encontramos um livro de ata da Prefeitura Municipal, fato mencionado em meu livro. Lembro-me que no fim do recenseamento de 1950 após passar a noite toda trabalhando, às seis horas da manhã fomos comemorar o fim dos trabalhos no Bar do Banhara, situado próximo á Igreja São Benedito. Foi nessa época que fui fazer o serviço militar no Tiro de Guerra, as instruções era no Largo da Sorocabana, às vezes o sargento nos conduzia a um descampado onde foi edificado o Colégio Dom Bosco. Em uma madrugada escura acabei caindo em um enorme buraco, era uma das muitas fundações que estavam sendo feitas para ser erguido o prédio do Dom Bosco.
Onde o senhor trabalhou depois de deixar a agencia de estatística?
Fui trabalhar no IAPETEC, Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Empregados no Transporte de Cargas, naquele tempo cada ramo de atividade tinha o seu instituto de previdência. Entrei no IAPETEC em 13 de dezembro de 1951 permanecendo até 31 de maio de 1954, desempenhei as mais diversas funções dentro da instituição, afirmo sem falsa modéstia, com bom desempenho. O agente chamava-se José de Moraes. Eu tinha prestado concurso para ingressar no IAPI, Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Industriários, ele situava-se na Rua Governador quase esquina com Prudente de Moraes. Logo depois foi construído o prédio na Rua XV de Novembro, entre a Rua Boa Morte e a Governador Pedro de Toledo. Passei no concurso como escriturário datilógrafo, ingressei no dia 1 de junho de 1954 permanecendo até 24 de maio de 1982, quando me aposentei. Por 11 anos atendi ao público, era muito bem quisto pelos associados.
Como o senhor conheceu a sua esposa?
A minha esposa Madeleine Furlan Nascimento é bairro altense também! Morávamos próximos um do outro, ela trabalhava em uma oficina de alta costura, de certa forma já tínhamos notado um ao outro. A sua família era sócia do Clube Cristóvão Colombo, eu não era sócio, o Odilon Olivetto era meu amigo e conseguiu com que eu entrasse em um baile de carnaval, isso foi em 1952. A partir da segunda noite passamos a dançar. Em 8 de dezembro de 1955 o Monsenhor Martinho Salgot celebrou o nosso casamento realizado na Igreja Bom Jesus. Permanecemos casados até hoje.
Como surgiu o seu livro?
Há muito tempo senti o desejo de escrever sobre o bairro onde nasci, fui coletando e acumulando informações, fotos. Posso afirmar que 90% do conteúdo do livro é fruto da minha própria memória. A redação final do livro foi feita em dois anos e meio e menos seis quilos de peso que perdi nesse período.
Onde o senhor estudou a língua japonesa?
Foi no Clube Cultural e Recreativo Nipo-Brasileiro de Piracicaba, tive três professoras, sendo que recebi da professora Yeokiko Maeda o maior número de aulas.
Como surgiu a intenção de estudar japonês?
Sou uma pessoa que gosta de desafios!

sábado, dezembro 11, 2010

RICARDO ABE

JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 11 de dezembro de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
ENTREVISTADO: RICARDO ABE
Os poetas que aclamam Piracicaba em prosa e verso inúmeras vezes citam a elevada cultura do seu povo. Quem não conhece a cidade em toda a sua abrangência pode até imaginar que a verve do artista é simpática a Noiva da Colina. O imenso manancial de cultura e conhecimento que Piracicaba acumula há muitas décadas fazem dela uma cidade muito especial, de capital importância no cenário brasileiro e mesmo mundial. Quem tiver curiosidade a respeito pode colecionar os inúmeros fatos relatados diariamente pela nossa mídia. Muitos desses elementos nós conhecemos pela constante exposição nos mais diversos meios de comunicação, outros preferem colocar a sua obra acima da imagem pessoal, para quem os conhece, e pode avaliar a sua importância, eles são verdadeiros gurus. Temos inúmeras pessoas nessas condições em Piracicaba, estão influenciando a história da humanidade aqui mesmo da nossa cidade. Ricardo Abe é uma dessas pessoas, que em sua simplicidade, como matemático têm realizado proezas, é consultado por mestres e doutores, não só do Brasil como do exterior. Seu pai foi oficial da marinha japonesa, Ricardo é um dos primeiros filhos de imigrantes japoneses a formar-se em curso superior, parece ter apontado a direção á milhares de outros jovens descendentes de japoneses que encontraram na carreira universitária a chave para o sucesso. Nascido em 15 de fevereiro de 1939, tem mais quatro irmãos: Antonio, Marisa, Fernando e Claudio. Casado com a professora Cecília é pai de três filhos: Marcelo, Verônica e Veridiana.
Qual motivo trouxe o seu pai ao Brasil?
Ele era de uma família de posses, em 1935 achou que o Japão poderia entrar em algum tipo de conflito, decidiu então imigrar para o nosso país. Trabalhou em São Paulo a principio no consulado do Japão, depois montou uma lavanderia na Rua Tabatinguera,
Em 1938 ele estabeleceu-se em Piracicaba, montou uma tinturaria na Rua Prudente de Moraes, onde hoje é a Câmara Municipal. Na esquina da Rua Prudente de Moraes com a Rua Alferes José Caetano morava o Santos Bueloni, que foi padrinho de batismo do meu irmão Antonio e da minha irmã Marisa, meu pai era xintoísta, minha mãe era budista, havia uma movimentação de religiosos, padres e freiras que procuravam incentivar o batismo do meu irmão, meu e da minha irmã. O meu padrinho de batismo foi o José Francêz. Nós três fomos registrados no consulado japonês, pelo meu pai, com o nome japonês: eu como Kionobo, o meu irmão Antonio como Kiotomo e a minha irmã Marisa como Kimico, os padrinhos de batismo se empenharam para que recebêssemos nomes próprios usuais no Brasil. Só depois de adulto é que fiquei sabendo que tinha sido registrado como Kionobo no consulado do Japão. Fomos fotografados pelo Lacorte, que deixou exposta á vista do público a fotografia de dois japonesinhos, a curiosidade do povo era em saber quem eram as duas crianças, não era comum fotos de crianças japonesas na cidade. Watanabe era casado com uma descendente de árabe, tinha um restaurante no centro, ao lado do Teatro Santo Estevão. Na época os japoneses estavam fixados na zona rural, eram raros os que moravam na zona urbana.
Onde o senhor iniciou seus estudos?
Fiz o primário no Grupo Escolar Barão do Rio Branco, o ginásio eu estudei no Colégio Dom Bosco, quando ele começou as suas atividades, funcionava no prédio situado na Rua Alferes José Caetano, ao lado da Igreja dos Frades, onde depois funcionou o Colégio Dr. Jorge Coury. Após certo tempo o primeiro pavimento do Colégio Dom Bosco foi construído no local onde até hoje funciona. Fui aluno da primeira turma do Dom Bosco, isso foi no ano de 1955. O diretor era o Padre Pietro Baron os padres Afonso, Brás, lecionavam, assim como os professores Cotrin, Monteiro. Fui estudar no Sud Mennucci, onde conclui o científico. Eu queria estudar matemática ou física, prestei vestibular na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Rio Claro, entrei e fui aluno da primeira turma, isso em 1959. Os professores do curso de matemática eram todos professores vindos do ITA. Existiam 20 vagas, apenas sete alunos entraram, tínhamos sete professores para sete alunos. Fiquei morando em Rio Claro, nessa época meu pai era proprietário de uma pastelaria, localizava-se na Praça da Catedral, ao lado da igreja, vizinho ao prédio onde atualmente funciona o Bistecão, havia o Bar Santa Terezinha, meu pai ocupava um pequeno espaço e com esse espaço ele me sustentou em Rio Claro, e o meu irmão na Faculdade de Odontologia. Até hoje o pastel do Abe é lembrado por quem os consumia.
O senhor sabe fazer pastel?
Sei! Outro dia fiz 400 pastéis em uma festa de confraternização que houve no edifício onde moro. Para fazer pastel é necessário apenas água, farinha e óleo. Só!
O senhor destacou-se em seus estudos na faculdade?
Fui monitor de um professor de física, chamava-se Heitor Gurgulino de Souza, que foi o primeiro reitor da Universidade Federal de São Carlos, reitor da Faculdade da UNESCO em Tóquio, Ele foi presidente do Conselho Federal de Educação. A faculdade pagava ao monitor um salário, eu morava em um apartamento no único prédio existente em Rio Claro, em frente ao Cine Variedades. Alugaram para nós pelo fato de sermos os primeiros estudantes universitários da cidade de Rio Claro. Éramos muito estimados pela população!
Quem mais morava nesse apartamento?
De Piracicaba eram cinco: Alceu Marozzi Righetto, Canarinho que veio a ser goleiro do XV de Piracicaba, Paulo Adão Monteiro, Rubens Ferreira de Amaral Mello. O Natalino Molfetta era de São Carlos. A estrada para Rio Claro era de terra, terrível, a viagem durava uma hora e meia, quando chovia era difícil, a viagem durava duas horas, duas horas e meia. O curso teve quatro anos de duração. Embora tenha feito o curso de matemática eu gostava muito do estudo da física. Um dia o Professor Heitor Gurgolino telefonou dizendo: “-Quero que você venha para os Estados Unidos, com a melhor bolsa deste país!”. Eu não podia ir, tinha perdido meu pai recentemente.
Como foi a sua relação com o estudo de física nuclear na USP?
Na época éramos poucos alunos, quem se destacava era imediatamente empregado. Quando me formei recebi sete empregos na mão, inclusive para lecionar no Instituto Tecnológico de Aeronáutica, o ITA. Escolhi o pior: pesquisador em física, eu tomava conta do laboratório de física e trabalhava com radioisótipos, nas férias íamos à Cidade Universitária, em São Paulo, utilizar o gerador de Van de Graaff (Máquina empregada em física nuclear para produzir as tensões muito elevadas necessárias em aceleradores de partículas). Além do Van de Graaff havia o Bétatron (Primeiro acelerador de partículas do Brasil) e o Reator Atômico. Isso foi entre 1961 a 1962, era um estudo avançadíssimo, só existia em São Paulo, eu ia fazer doutorado em Física Atômica Nuclear. Eles nos chamavam de Rio Claro porque em São Paulo não havia alunos de física. Eles queriam criar uma nova mentalidade na área de física. Permaneci nessa atividade até a morte do meu pai, quando tive que voltar á Piracicaba, retornando a estaca zero. Eu formado como professor e meu irmão formado como dentista, voltamos a trabalhar na pastelaria. Meu pai faleceu em março de 1963. Ainda estudante em Rio Claro todos os fins de semana eu permanecia trabalhando na pastelaria para o meu pai descansar.
A partir de quando o senhor passou a lecionar matemática?
Eu trabalhava na pastelaria, não sei como as escolas descobriram que eu era licenciado em matemática, os colégios começaram a insistir para que eu desse aula, em agosto de 1963 comecei a lecionar física e matemática no Colégio Piracicabano. No ano seguinte dei aula no Jorge Coury, Jerônimo Gallo, Piracicabano, Sud Mennucci e Dom Bosco. A Faculdade de Ciências Econômica, Contábeis e Administração de Empresas foi a primeira faculdade aberta pela UNIMEP, fui o primeiro professor a ser contratado para lecionar matemática. O diretor na época era Gustavo Jacques Dias Alvim, dei aula na UNIMEP por 43 anos. Na UNIMEP fui diretor da Faculdade de Ciências Exatas, em 1979 fui convidado a assumir temporariamente a administração da Faculdade de Engenharia no campus de Santa Barbara D`Oeste, permanecendo inicialmente por três anos como diretor, consegui montar um laboratório perfeito e uma biblioteca técnica de alto nível, sempre trabalhei muito com o apoio dos alunos..
Quando o senhor iniciou suas aulas na Escola de Engenharia de Piracicaba, a EEP?
O curso de engenharia foi iniciado em 1968, em 1969 entrei para dar aulas de Cálculo II, matéria que permaneci lecionando até 2001. Fui diretor da Escola de Engenharia de Piracicaba de 1986 a 1989. O Secretario da Educação era José Aristodemo Pinotti, consegui que ele transferisse os equipamentos que estavam na Escola Industrial, cerca de quarenta tornos, que foram colocados aos cuidados da EEP. Estabeleci regras para estágios dos estudantes com excelente aproveitamento prático junto a grandes indústrias. Um aluno de engenharia civil e um aluno de engenharia mecânica eram levados pela Petrobras para estagio. Visitava com os alunos e tinha convênios com empresas como Volkswagen, Ford, Philips, Embraer, Bosch. Sempre fui um diretor participativo, não era diretor de gabinete. Empresas que só recebiam alunos da Politécnica abriram as portas para os alunos da EEP.
O que significa a matemática para o senhor?
O grande problema da matemática é que se diz para decorar as suas fórmulas. Sempre falo, não é para decorar nenhuma fórmula! A matemática não é fórmula você tem que saber o que está fazendo. Não é preciso decorar a fórmula para resolver um problema. No antigo primário estudava-se matemática com aritmética, é uma escola francesa. Para estudar matemática tinha que raciocinar. Com a revolução de 1964 começou a entrar os americanos, que são práticos, No Brasil dispensou-se a escola francesa e permaneceu a escola americana. Esse foi o grande erro cometido no ensino da matemática. Estudar matemática era gostoso porque se pensava. Atualmente as faculdades não preparam os alunos em matemática. O matemático clássico conhece tudo a respeito de matemática, mas, se perguntar onde poderá ser aplicada, ele não saberá responder. A matemática serve para quantificar qualquer tipo de fenômeno físico, químico, biológico, consegue-se determinar uma fórmula para cada situação.
O senhor tem um profundo conhecimento de matemática!
Na matemática não se descobre mais nada! O teorema de Fermat faz 350 anos que foi formulado por ele e ninguém conseguiu provar até agora, ninguém consegue, ficam 40 a 50 anos trabalhando para demonstrar o teorema e ninguém conseguiu. A única coisa que pode ocorrer é quando surge um ramo de uma ciencia, a função da matemática é estudar e quantificar, reduzir a uma fórmula; se for um fenomeno fisico de astronomia tem que se conhecer astronomia.
A informatica ajudou muito o estudo da matemática?
Qualquer coisa que você necessitar da matemática está na internet. De vez em quando surge algum problema, um ex-aluno meu dá aulas particulares, esses dias ele me procurou, um dos seus alunos trouxe um problema de matemática para o qual ele não está encontrando solução. Resolvi na hora geométricamente, não preciso de fórmula matemática.
O senhor recebe consultas do Brasil todo?
Tem muita gente que me consulta, são problemas classicos que não estão no livro. Uma empresa de engenharia de Minas Gerais me consultou a respeito do cálculo de uma ponte. Há professores de universidades de São Paulo que foram meus alunos muitas vezes me consultam. As vezes um professor de concreto afirma que determinada fórmula ditada pela norma técnica deve ser aplicada, se um aluno pergunta como se deduz aquela fórmula ele não saberá responder, ele a recebeu já pronta. Nessa hora esse professor me telefona perguntando como se deduz aquela fórmula. Mando a resposta por e-mail.É natural fazer isso na matemática. As normas tecnicas de engenhria mudaram, antigamente vinham muitas normas prontas, agora as normas tem dedução de tudo. Recebi uma consulta de uma empresa que estava vendendo casas financiadas, de acordo com uma tabela apresentada os compradores teriam suas casas após determinado tempo, fiz os cálculos, cheguei a conclusão de que usando aquela tabela nunca ninguém iria receber nenhuma casa mediante as parcelas que estavam pagando.
Foi desconhecimento ou proposital?
Foi proposital. A empresa encerrou suas atividades. Toda tabela tem uma lógica, se contrariar a lógica está errada. Quando o homem quer manipular ele manipula. Contabilidade é matemática.
O senhor tem alguma relação com a Nasa?
Eu não, quem tinha era o meu professor Nelson Onuchic que dava acessoria para a NASA, eu trabalhava com ele,era seu aluno, aprendi com ele em pós graduação sobre a estabilidade das soluções das equações diferenciais.
Tanto o senhor como seu irmão foram os primeiros descendes de japoneses de Piracicaba que seguiram a carreira universitária?
O fato do meu pai ter sido oficial da marinha japonesa influenciou bastante na sua maneira de pensar, ele dizia que todos os seus filhos deveriam estudar, escolher a profissão que desejassem. O Komatsu que tinha pastelaria em frente a estação de trem, queria que todos os filhos fizessem medicina, três formaram-se médicos. O Natálio Komatsu foi o primeiro descendente de japonês de Piracicaba a diplomar-se em um curso superior, em seguida fomos meu irmão e eu, e depois o Francisco Komatsu. Na época havia uma tendência na colônia japonesa do jovem trabalhar duro na lavoura, nós como estudantes universitários éramos vistos com alguma reserva, uma espécie de bon vivant! Com o passar dos anos reconheceu-se a importância de uma profissão com solida formação universitária.
O seu irmão Antonio jogou no Unidos Futebol Club, de Piracicaba, o senhor jogava futebol?
Eu não jogava futebol, de vez em quando jogava no gol, aos nove anos de idade pesava 80 quilos! Hoje peso 62 quilos!
O senhor pratica algum esporte?
Gosto muito de caminhar, perdi oito quilos nos últimos meses caminhando e diminuindo o sal e o açúcar da alimentação.
Qual assunto aborda o livro que o senhor está escrevendo?
É um livro de matemática aplicada, estou com 1.200 páginas já escritas. Há duas editoras com interesse nele.

Postagem em destaque

  Curitiba é a capital do Paraná, um dos três Estados que compõem a Região Sul do Brasil. Sua fundação oficial data de 29 de março de 1693, ...