quinta-feira, abril 05, 2012

CTN CENTRO DE TRADIÇÕES NORDESTINA DE PIRACICABA E REGIÃO

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
Sábado 7 de abril de 2012
Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/

ENTREVISTADO: CTN CENTRO DE TRADIÇÕES NORDESTINA DE PIRACICABA E REGIÃO.
Reinaldo e Fabiola         foto by JUNassif

Há mais de meio século, São Paulo faz parte da Região Sudeste com os estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo. Anteriormente pertencia a Região Sul, que incluía Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. A expressão Sul Maravilha foi muito utilizada como forma de descrever os contrastes regionais do Brasil, um país que é um continente. Criou-se a vergonhosa expressão “Indústria da Seca”, onde grupos políticos se beneficiam pessoalmente de fortunas desviadas de projetos que deveriam beneficiar áreas que todos sabem ser altamente produtiva com tecnologia de ponta, Israel é um exemplo, com irrigação colhe alface cultivada no deserto. Com isso muitos nordestinos dirigem-se ao Sul Maravilha, em busca da sua sobrevivência e muitas vezes da família que permaneceu em seu lugar de origem. Esse fenômeno é digno de ser estudado com muita profundidade. Um exército de nordestinos faz o serviço braçal no Sul Maravilha. Pode-se afirmar que há interesses maiores tanto no Nordeste como no Sul Maravilha. São Paulo possui hoje uma população de sete milhões de nordestinos. Piracicaba tem elevada concentração de migrantes nordestinos, que aumenta de forma significativa nos períodos da safra de cana de açúcar. Como estrangeiros em seu próprio país, eles sentem saudades da cultura e dos costumes da terra natal. Em Piracicaba foi criado o CTN- Centro de Tradições Nordestinas, localizado a Rua XV de Novembro, 849, fone 30352565. Sua atual presidente é Fabiola dos Santos Moraes nasceu em Parnaíba, litoral do Piauí, a 15 de dezembro de 1981, filha do operador de Raio X, Antonio Souza Moraes e de Antonia dos Santos Moraes. O Coordenador do CTN- Centro de Tradições Nordestinas Reinaldo Pousa é nascido em Piracicaba a 30 de março de 1964, filho de Walton Pousa e Maria Aparecida Pousa. É proprietário da tradicional loja especializada em som “A Musical”.

Fabiola, como surgiu o CTN de Piracicaba e região?

Em 2006 surgiu o CTN, o Reinaldo desde 2002 através da própria loja “A Musical” foi conhecendo a cultura nordestina, muitos dos seus clientes afirmavam que não encontravam em Piracicaba músicas características de suas regiões. Reinaldo procurou preencher essa lacuna, e “A Musical” passou a ser a primeira loja de Piracicaba a ter uma grande variedade de musica de forró. Em seguida passou a trazer shows típicos daquelas regiões. Reinaldo percebeu a enorme felicidade com que os nordestinos receberam a própria cultura em uma cidade tão distante dos seus locais de origem. Muitos já estão aqui a 10,15 ou 20 anos, tem vontade de voltar a rever suas cidades mas por diversos fatores acabam permanecendo longos anos distantes da terra natal. A partir do momento em que essas pessoas passaram a ter mais contato entre si, surgiu a proposta de montar uma entidade que defendesse os interesses dos nordestinos.
Reinaldo quais sãos alguns desses interesses?

Eles vêm para cá em busca do trabalho, sem estrutura nenhuma. A entidade stá cadastrando essas pessoas, montamos uma bolsa de empregos, quando as empresas necessitam de novos trabalhadores oferecemos esses currículos. Uma grande maioria vem para realizar serviço braçal. Outra atividade que realizamos é fazer eventos em nome da entidade, em torno da cultura deles, com comidas típicas, shows. Temos uma assistente social que avalia a condição individual do candidato. Em função desse nosso trabalho visitamos muitos bairros, principalmente os de periferia. É interessante observar que é insignificante, ou quase não há nordestinos envolvidos em atos criminosos. A grande maioria vem aqui para trabalhar, não para desrespeitar as leis. Vivem na periferia, tem uma vida modesta, mas de trabalho. O que pode ocorrer é eles ter convivência com pessoas que transgridem a lei e que também moram no bairro, ocorre à convivência entre ambos. Quando o nordestino não se ajusta a vida fora da sua terra de origem é para lá que voltam. Eles sabem se divertir, eu faço eventos de forró, não sai um única briga. Fizemos um evento no Teatro São José com um grupo chamado Cintura de Mola, não aconteceu um único desentendimento.

Fabiola complementa.

Geralmente assim que chegam, vão morar na periferia da cidade porque é onde encontram maiores facilidades para se instalarem. Dificilmente conseguem preencher os requisitos exigidos para a locação de um imóvel mais central.

Reinaldo, você é casado?

Sou, com a Fabiola. Acabei a conhecendo nesse processo e como já era apaixonado pela cultura do Nordeste, acabamos nos casando.

Fabiola relata sobre o evento realizado em outubro de 2011.

Pedimos que cada estado tivesse uma faixa com no nome correspondente ao estado, com isso cada migrante ficava no setor que reunia outras pessoas que vieram do mesmo estado. Assim muitos encontraram até amigos que vieram da mesma cidade e nem sabiam que ambos moravam em Piracicaba. Ocorreu muito troca de experiências, integração. Muitas pessoas que não são nordestinas abraçaram a causa e estão sempre colaborando. Atualmente estão associadas ao CTN 840 pessoas. Qualquer pessoa que queira pode tornar-se sócia, mediante a contribuição anual de R$ 20,00 ela tem direito a uma série de benefícios: assistência social, jurídica, convênios médico e odontológico.

Quantos estados estão representados no CTN de Piracicaba e Região?

São nove estados: Bahia, Sergipe, Rio Grande do Norte, Piauí, Maranhão , Ceará, Pernambuco, Paraíba, Alagoas. No aspecto musical existem particularidades de alguns estados. O forró existe em todos esses estados. Existem vários tipos de forró: o Forró Pé de Serra que foi muito divulgado por Luiz Gonzaga, o Forró Pisadinha virou uma verdadeira febre entre os jovens principalmente, é mais agitado.

Qual é a faixa etária dos associados?

Abrange todas as idades. Um dos nossos projetos é constituir um grupo da Terceira Idade.

Fabíola o idoso dança forró?

Eu trabalhava na Prefeitura de Piauí com o Projeto Vida Nova voltado só para idosos. Eu cansava de dançar forró e eles queriam dançar mais.

Vocês fizeram algum contato com entidades que trabalham com idosos, como o SESC ou com a Estação Idoso José Nassif?

Ainda não procuramos essas entidades. O forró pode ser integrado como uma dança, ou ginástica.

Reinaldo, ao criar uma associação voltada a cultura nordestina, pode estar sendo criada uma auto-segregação?

Penso exatamente ao contrário, acho que está sendo criado um ponto de organização. Assim como existe uma associação dos lojistas, dos comerciantes. Isso não significa que estão se distanciando, mas sim se organizando. É procurar satisfazer parte das necessidades do nordestino que está fora da sua terra natal. O nosso projeto é fazer com que o nordestino transfiraa o seu titulo eleitoral para a região de Piracicaba. Uma grande maioria vem para cá e muitos nem sequer justificam o seu voto. Tem pessoas que estão há 20 anos em Piracicaba e nunca votou aqui. Com isso eles não têm representação política, deixam de ter direitos que lhes pertence. O projeto CTN nos bairros tem extamente essa finalidade,

Fabiola, indivíduos das mais diversas origens, estados, países, algumas vezes após adquirir determinado sucesso renegam a própria origem, isso acontece de forma isolada com algum nordestino?

Existem pessoas que tem vergonha das suas origens. Mas temos casos de indivíduos que alcançaram elevados cargos e que quando começam a falar do nordeste ficam felizes. O preconceito está na própria pessoa. Uma das coisas que chateia o nordestino é quando fazem brincadeiras grosseiras relativas ao seu sotaque.

Reinaldo complementa.

Grandes nomes da música, do humor são nordestinos. O nordestino ao invés de se envergonhar tem que valorizar suas raízes. Alguns setores da mídia criam situações de constrangimento ao migrante. Um dos graves erros cometidos pela mídia é mostrar de forma sensacionalista, em busca de audiência fácil, o lado pobre do nordeste. O Nordeste Brasileiro é muito bonito.

Fabiola, expertamente muitos países exploram imagens atrativas ao turista. A mídia brasileira parece trabalhar no sentido contrário?

Ao chegar aqui o nordestino muitas vezes escuta que morava em terra onde a seca e a fome eram constantes. Eu nunca passei fome no Nordeste. Na minha casa, na casa dos meus parentes sempre tivemos abundancia de alimentos. Aqui em Piracicaba, logo que cheguei passei por um período de adaptação, foi onde por tempo determinado conheci privações pela primeira vez na minha vida.

Reinaldo o nordeste passa muitas vezes por situações difíceis não por culpa de seus habitantes, mas sim pela irresponsabilidade e inapetência dos seus administradores políticos?

Já foi comprovada que a seca do nordeste tem solução, com metade do dinheiro que é enviado pela União para lá. A seca é a única justificativa para que continuem a mandar dinheiro e ocorram os desvios. Há uma indústria mantendo e divulgando o lado ruim para que se perpetue a corrupção. Quem está no poder permanece sem o risco de perdê-lo.

Reinaldo há alguma festa preparada para quando determinado político, que há décadas permanece mandando e desmandando deixar o poder?

Essa é uma questão que nos faz pensar, porque tantos nordestinos estiveram no poder e fizeram muito pouco no sentido de melhorar as condições do nordeste. A única conclusão a que se pode chegar é que não é do interesse deles resolver nada. Já foi comprovado que com metade dos recursos enviados ao nordeste o problema da seca estaria resolvido. O Lula criou a bolsa família, uma atitude louvável. Só que hoje tem uma empresa de curtume no nordeste que não conseguem contratar as mulheres porque a partir do momento em que a mulher é registrada ela perde a bolsa família. O governo não deve dar o peixe e sim ensinar as pessoas a pescarem. Enquanto isso não for mudado as coisas se acomodam. Temos experiência com o trabalho feito com os deficientes, brigamos muito, em Piracicaba, São Paulo. Mudaram a lei. Hoje as empresas têm que contratar certa cota de deficientes. Só que o deficiente não quer trabalhar. Porque? Porque é extremamente difícil ele atender a enorme e absurda burocracia exigida pelo INSS para que ele seja beneficiado pela sua deficiência. A partir do momento em que ele é registrado como trabalhador em alguma empresa ele perde esse benefício, o que é lógico. Só que se ele for despedido do emprego ele tem que fazer a via-crúcis novamente.

Reinaldo, pode haver interesse por parte do Sul Maravilha em manter o estado atual do nordeste visando ter mão de obra que venha de lá movida pela extrema necessidade?

Prefiro acreditar que são os políticos de lá que não querem mudanças. Não há interesse em resolver o problema. Quanto mais miserável for o povo, mais milionários eles são.

Quantos diretores compõem a CTN de Piracicaba e Região?

São 12 diretores, sendo que quatro são mulheres, inclusive uma piracicabana.
















































































sábado, março 31, 2012

ANTONIO FILOGENIO DE PAULA JÚNIOR

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 31 de março de 2012
Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: ENTREVISTADO: ANTONIO FILOGENIO DE PAULA JÚNIOR



Antonio Filogenio de Paula Júnior é paulistano, há pouco mais de duas décadas mora em Piracicaba, nascido em 23 de setembro de 1970, filho único de Antonio Filogenio de Paula e Etelvina Lucas de Paula. Seu pai era metalúrgico e sua mãe de prendas domésticas. Morou no Bairro do Limão, depois a família mudou-se para Guarulhos, onde Antonio estudou na Escola Estadual Homero Rubens de Sá.
Em que ano você mudou-se para Piracicaba?
Foi por volta de 1989, a minha mãe é piracicabana, eu já conhecia a cidade há bastante tempo. Nós visitávamos nossos parentes sempre que podíamos na realidade a minha mãe nasceu em Saltinho, que hoje é um município, e na época pertencia ao município de Piracicaba. Os nossos parentes moraram sempre nos bairros Jaraguá, Paulista, região onde hoje eu moro.
Você sentia alguma diferença cultural entre a Grande São Paulo e Piracicaba?
Eu cresci com ambas as formações, meus pais casaram com uma idade considerada acima da média, quando eu nasci ele tinha 51 anos, e a minha mãe 42. Embora morasse em São Paulo cresci com muitas informações próprias do interior. Meu pai viveu muito em cidades do interior, ele foi tropeiro na sua juventude. Recebi muita projeção da cultura caipira. Quando vinha à Piracicaba não me sentia chocado, pelo contrário, sentia-me muito próximo disso tudo. Uma realidade que convivi ao ouvir histórias.
Não é muito comum uma mulher com 42 anos ter o seu primeiro filho.
Minha mãe não pensava em se casar, durante muito tempo ela trabalhou como empregada doméstica. Assim como meu pai também. Ele havia tido outra família, da qual os filhos não sobreviveram, depois de muito tempo é que conheceu a minha mãe.
Ambos eu acho que não tinha nenhuma expectativa de encontrar alguém. Casaram-se e foram bastante felizes, meu pai é vivo ainda, minha mãe faleceu em 1991.
Como eles se conheceram?
Foi e São Paulo, através do patrão da minha mãe que também era patrão do meu pai. Conhecendo os dois achou que seria importante apresentá-los. No primeiro momento não tiverem o mínimo interesse. Houve o encantamento e deu certo.
Quando você mudou-se para Piracicaba com seus pais em que bairro passou a morar?
Moramos até hoje no bairro Jaraguá, meu pai com 92 anos mora conosco, sou casado com Alexandra Cristina Aguiar de Paula e temos um filho de 10 anos, Cauê Aguiar de Paula.
Logo que voce chegou à Piracicaba começou a trabalhar aonde?
Trabalhei no Semae, apareceu um concurso público, peguei, fiz e fui ser leiturista de hidrômetros, aquele que tira a leitura da conta de água, por um anos aproximadamente fiz esse trabalho.
Você teve algum fato envolvendo cachorro?
Faz parte da vida do carteiro e do leiturista o contato com cães. No bairro Piracicairim levei a mordida de um cachorro, um pastor alemão me mordeu na perna, naquele dia eu estava entregando os boletos para o pessoal pagar, acho que o cachorro não aprovou a conta do consumo de água do seu proprietário. Nas ruas se vê muita coisa curiosa, conhecemos muitas pessoas, contatos que foram muito válidos para usar futuramente na minha vida. Cada bairro tem a sua peculiaridade, na Rua do Porto, não podíamos chegar muito cedo, as pessoas estavam inda dormindo por causa da vida noturna. Tínhamos que chegar as 10h30, 11h, horário em que as pessoas estavam acordando. Sai do Semae e fui trabalhar por conta própria, fiz um pouco de tudo, tive uma fábrica de blocos de cimento, voltei-me para o comércio. Principalmente voltei-me para os estudos, por muito tempo como autodidata. Sempre gostei muito dessa vida de pesquisas, fui curioso, principalmente com assuntos relacionados à história, filosofia, sociologia, teologia. Sempre fui curioso pelo comportamento humano. Nesse período trabalhei de forma informal, tive minhas dificuldades, até mesmo profissional, como adequar esse meu gosto particular com o meu gosto pelo trabalho. Em 1996 prestei novamente concurso público na prefeitura. Entrei na Secretária da Educação, trabalhei como Agente Escolar de Saúde. Existem crianças que em decorrência de alimentação inadequada, famílias desestruturadas, têm isso tudo refletido em problemas de saúde.
A questão da saúde passa antes pela educação ineficiente?
Educação é uma questão muito ampla, temos vários modelos de educação que passamos, herdamos, é uma discussão delicada que requer uma atenção especial. Tenho entendido que pelo menos na esfera da municipalidade tem-se tentado desenvolver métodos de educação que consigam atender essa demanda e dar uma expectativa mais concreta para essa pessoa. Isso esbarra em diversas problemáticas, principalmente a social. Educação está muito restrita ao universo da escola, praticamente estamos perdendo as funções dos papéis, as famílias está praticamente desestruturada. A escola tenta suprir algumas carências, que não se sabe se ela irá conseguir fazer. No entanto a escola não deve apegar-se a esse discurso e deixar de fazer a parte dela que é a parte formativa, trazer conteúdo, formar outras bases para que a criança possa ter seu desenvolvimento saudável. Dentro disso temos muito de uma utopia, de uma esperança, de uma expectativa que muitas vezes não está tão próxima da realidade como gostaríamos. Penso que há boas intenções nesse sentido, e na medida do possível têm conseguido em parte sanar ou minimizar algumas dessas problemáticas. Está muito longe de ser resolvido.
Hoje a sua formação qual é?
Tenho formação como teólogo, que é o fruto de um período em que me liguei a um seminário franciscano, dos capuchinhos. Dei continuidade no Curso de Teologia para Leigos, do Frei Augusto Giroto. Essa minha atração pela religiosidade vem da minha mãe, que era uma pessoa extremamente espiritualizada. Sempre me tocou muito esse papel do sagrado na vida da gente. Assim como uma busco de entendimento do porque de uma religião. Como se manifesta, as diferentes religiões. Como entender essa presença do divino na história dos homens. Em suas mais diferentes culturas. Venho de uma família católica, no primeiro momento aproximei-me da Igreja Católica Apostólica Romana. Isso foi se ampliando para poder entender o cristianismo em outras esferas. Não só o protestantismo, as mais recentes correntes evangélicas, mas também o cristianismo ortodoxo. Acabei me aproximando de uma comunidade copta. Ainda em São Paulo, que tem uma igreja no bairro do Jabaquara, talvez a única igreja copta da América do Sul. É uma comunidade pequena no Egito, uns dez por cento da população, e fora do Egito também é uma comunidade pequena. Tive contato com os gregos Antioquinos. Tudo para conhecer, e confesso que a espiritualidade ortodoxa também me contagiou em grande parte. Sempre achei muito bonita a mística cristã ortodoxa. Do lado católico sempre fui leitor de Teilhard de Chardin, Thomas Merton, autores que sempre me chamaram bastante a atenção, assim como Santa Teresinha de Lisieux, São Thomaz de Aquino, Santo Agostinho, esses dois últimos são os eixos basilares da teologia católica, me apropriei de um contato mais próximo com eles muito mais pela filosofia do que pela teologia. Em outro momento foi o entendimento do monoteísmo, mais clássico, de tradição cristã, judaica e islâmica. Aproximei-me muito do Islã para estudo, conhecimento. Há um aspecto interessante, quando vemos esses atos todos de terrorismo, fundamentalismo, isso assusta. É muito na contramão do que é o espírito do muçulmano, daquele que procura seguir o Alcorão, trazê-lo para a contemporaneidade. O Alcorão tem que ser lido com todo seu contexto. Isso o próprio Alcorão diz. Maomé dizia isso. Quando você pega uma leitura extremamente fundamentalista é um perigo. O fundamentalismo tende a recortar o que interessa para ele naquele momento. É bastante ideológico, no sentido de manipular as pessoas por trechinhos. Embora a própria palavra fundamentalismo seja bem antiga, ela foi retomada no século XX não dentro do Islã, mas dentro das igrejas protestantes dos Estados Unidos, por teólogos da Universidade de Princeton. Por volta de 1915 eles começam a pregar uma volta aos fundamentos basilares da fé cristã. Voltar-se a bíblia em uma leitura muito singela e muito crua, míope. Ler o texto na integra, era aquilo ali. Sem contexto, perspectiva histórica, análise sociológica, antropológica e mesmo teológica se perde radicalmente nesse conjunto.
Você fez curso superior em que área?
Sou formado em Filosofia, em Batatais, em escola dos Claretianos. Fiz com eles Pós-Graduação em Filosofia e e em ensino de filosofia. Voltei-me para a área de educação. Na Universidade Metodista faço mestrado em educação. Leciono no Centro Universitário Claretiano, no Curso de Filosofia. A missão básica do claretiano é o envio da palavra. A palavra de Deus na qual eles entendem pela bíblia.

 
Você transita entre os claretianos e os metodistas.
John Wesley era muito preocupado com a educação, em trazer a bíblia para ser refletida, trabalhada em um conjunto formativo, em que o indivíduo aprendesse outras coisas. Foi pouco compreendido no início na Inglaterra e praticamente o metodismo se desenvolveu muito nos Estados Unidos. Os claretianos não deixam de ter uma perspectiva semelhante. O que difere é na origem. Os diálogos entre os protestantes e católicos hoje são bastante frutíferos. A igreja católica tinha uma teologia mais tradicional, oriunda ainda da contra-reforma. Os protestantes tinham a teologia da reforma, que já aprendia a lidar com os textos de Max Weber. O protestantismo no espírito capitalista, com outras regras de mercado, de sociedade, de organização social. Nisso a igreja católica demorou um pouquinho mais. A grande diferença se dá ai. O olhar para a realidade social, o papel da pessoa nesse contexto. O papel da igreja. Acho que os protestantes tiveram um desenrolar um pouco diferente nesse sentido. Não se pode dizer se melhor ou pior, apenas que são diferentes. Isso deu outros contornos para os países protestantes.
Em qual departamento você trabalha hoje na Prefeitura Municipal?
Desde 1999 trabalho mais ligado a Secretaria de Ação Cultural, e de 2006 para cá em ima interface entre Secretaria Cultural e Secretaria Municipal de Educação. Em 1999 vim convidado pelo prefeito Humberto de Campos e pela secratária Cida Abe, para assumir um centro que a prefeitura mantém até hoje, um Centro de Documentação, Cultura e Política Negra. É um espaço reivindicado pelo Movimento Negro de Piracicaba, que após muitos anos em 1991 criou forma. Entendendo na época que o negro não tinha as mesmas oportunidades, condições, o movimento negro local reivindicou esse espaço. Um espaço que viabilizasse o dialogo entre a comunidade negra e o poder público. Ter uma voz. Fundado por pessoas extremamente importantes que fazem parte dos quadros políticos, acadêmicos, intelectuais da cidade. Na fundação entre muitos tivemos Marise Monteiro, Noedy Monteiro, Reverendo Santana, Antonio Messias Galdino, José Maria, que foi presidente da Câmara Municipal, seu atual presidente João Manoel dos Santos. Tinha muita gente, ligadas as mais diversas áreas. Dr.Preto, o médico André Ferreira dos Santos dá nome ao Centro de Documentação.
No Brasil ainda existe preconceito racial?
Preconceito existe, ainda é uma marca cultural. Existem preconceitos dos mais variados tipos. Não é só em relação ao negro. Durante muito tempo no Brasil se imaginou que não tivéssemos preconceitos, que vivíamos em uma democracia racial, isso foi construído ideologicamente até para que não se percebesse isso. Já não é mais tabu se discutir isso. O preconceito existe, e a partir do momento em que assumimos que ele existe fica muito mais fácil lidar com ele. Entendemos que avançamos bastante. Tivemos o preconceito explicito, depois passamos por uma fase em que ele não era tão evidente. Era manifestado indiretamente. Na oportunidade de emprego, no acesso a um melhor salário, no acesso a educação. Havia um cerceamento, hoje isso é discutido. O racismo é crime.
O presidente dos Estados Unidos, Barack Hussein Obama influenciou a política racial no Brasil?
Obama representa para os Estados Unidos e para o movimento negro uma vitória. Nos Estados Unidos o preconceito racial é bem mais declarado e rígido. Lá ter um presidente negro historicamente é como nós termos um presidente operário. Recorrendo uma frase da famosa semana de 1922, “é como pegar um tabu e transformá-lo em um ícone”. Houve uma supervalorização achando que seria um salvador de pátria. O americano vem de uma cultura que até muito pouco tempo ele tinha a seguinte visão: “ele e os outros”, o Best of the Beast. Seja negro, latino, ele guarda um pouco desse espírito. O Obama não deixa de ser fruto de tudo isso.
Está havendo mudanças no conceito de família?
Estamos tendo conceitos de família oriundos da modernidade. Estamos vendo famílias se estruturando de modos que fogem a moral tradicional cristã, que faz parte da formação do mundo ocidental. Hoje vemos famílias com dois pais, duas mães. As que não tem a figura do pai. Dos filhos criados pelos avós. Hoje isso se dá em todas as camadas, seja pelo aspecto social, intelectual, cultural, economico, politico. Mas são mudanças. Elas estão ocorrendo, temos que lidar com elas.
Não temos como avaliar essas mudanças?
Ainda não. Estamos no meio do conflito, do jogo todo. Em alguns momentos temos que nos abstrair um pouco e olhar essse momento. Jean-Paul Sartre olhava para essas realidades, para esses fenomenos, estamos no meio do jogo, ele está sendo jogado. Estamos no meio de um quadro social, político e economico que nos impele a um posicionamento, a própria falta de posicionamento já é um posicionamento. Não dá para se omitir, de falar sobre determinadas coisas. Algumas são fáceis, evidentes, por exemplo, todos nós hoje vamos defender o meio ambiente. No entanto há outras que não temos a maturidade suficiente para nos posicionarmos com tanta certeza. É o desafio da liberdade. Para Sartre liberdade não é algo prazeiroso, implica em responsabilidade. Embora ética e moral venham de uma mesma matriz, com o tempo convencionou-se a pensar que a moral é a prática da ética. Em alguns momentos chegamos a pensar que a ética é universal e a moral é particular, se dá no sujeito. A ética é o conceito que buscamos para universalizar circunstâncias da própria sociedade. O homem sempre busca a ética. Não dá para falar que o homem não tenha ética, o que existe é um desvio do que seja a ética. O conceito amplo quando cai na situação particular, de sujeito humano, a coisa começa a pegar um pouco. Hoje o discurso ético ficou banalizado. Como posso imaginar um lugar comum onde eu vivo bem e o outro não? A construção disso que se dá na esfera politica, economica, cultural, social. E ai entra o conjunto valor ativo do homem, a sua moral, que está dentro de um conjunto de cultura também. Podemos distorcer isso por ideologias, interesses, todos nós somos frutos de perspectivas construídas lá traz, ideológicamente, mas que ajudaram a explicar o mundo em vários momentos da história e que hoje não dá mais conta dessa diversidade toda que o mundo é. Hoje temos que reconhecer o outro, com sua cultura, com sua moral própria que pode chocar com a minha perspectiva moral. Trazemos os valores da Revolução Francesa até hoje, será que são os mesmos valores das comunidades africanas, indigenas, lá dos confins da Ásia.









domingo, março 25, 2012

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 24 de março de 2012.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
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http://www.tribunatp.com.br/
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ENTREVISTADA: LUCILA MARIA CALHEIROS SILVESTRE
Nascida a 21 de novembro de 1951 na cidade de Piracicaba, filha do professor e funcionário público que também trabalhou na Secretaria de Finanças, Rinaldo Calheiros e Yvone de Oliveira Calheiros. O casal teve ainda um filho, Rinaldo Calheiros Filho.
Você morava em que região da cidade?
Morava com a minha família na Rua D. Pedro II, nas proximidades de onde hoje funciona a Casa Dom Bosco, quase esquina com a Rua Governador Pedro de Toledo.
Seus primeiros estudos foram feitos em que escola?
Foi no Grupo Escolar Alfredo Cardoso. Nossa família tinha se mudado para o Bairro Alto, nas antigas casas do Peu, o Grupo Escolar Alfredo Cardoso ficava a dois quarteirões de casa, era bem pertinho. O Ginásio e o Normal eu cursei na Escola Estadual Monsenhor Jeronymo Gallo. No início ia de bonde, ia a pé até o centro e La tomava o bonde. Com a retirada dos bondes passei a ir de ônibus.
Você chegou a lecionar?
Dei aula por um ano no MOBRAL, Movimento Brasileiro de Alfabetização, á noite, funcionava no Grupo Escolar Alfredo Cardoso. Fiz o cursinho CLQ e entrei na ESALQ, no curso de Economia Doméstica, isso foi em 1972.
Em linhas gerais o que compreende o Curso de Economia Doméstica?
Refere-se a tudo aquilo que o ser humano utiliza dentro de uma residência. Tanto a parte de alimentação e nutrição, setor em que a ESALQ é bastante forte com a tecnologia de alimentos. A parte de vestuário, com fibras têxteis, habitação. Fizemos a planta baixa de uma residência, observando tudo àquilo que uma casa necessita para oferecer boas condições de vida, número de dependências com relação aos seus habitantes. Adequando para o modo de vida de quem irá habitar. A operação com equipamentos domésticos básicos, desde o uso correto, higienização de um liquidificador, máquina de lavar, os cuidados essenciais para evitar graves acidentes. A própria postura durante as atividades domésticas. Abordamos psicologia, atividades infantis, a vida com as crianças, formal e não formal e didática. Para isso tivemos que fazer os dois primeiros anos de faculdade juntos com os agrônomos, nós cursamos matérias como: matemática, cálculo, física, química, micro e macro economia. Toda parte pesada do curso de agronomia enfrentamos. O Curso de Economia Doméstica era feito em quatro anos.
O Curso de Economia Doméstica da Esalq foi extinto?
No momento em que foi extinto, politicamente, educacionalmente não interessava mais. Esse curso tinha sido criado para que acompanhássemos os agrônomos em seu trabalho e realizar a promoção humana dentro da zona rural do Brasil.
A extinção do curso foi em função dos problemas de promoção humana no Brasil ter sido plenamente resolvidos?
Acredito que foi ao contrário, poderia haver uma exposição maior dos problemas existentes. Hoje vemos apresentadoras de televisão levando mensagens básicas, Ana Maria Braga, outros programas que divulgam o aproveitamento de alimentos. Como decorar uma casa.
A televisão comercial passa informações, só que inclui o merchandising.
Isso faz parte do processo, como você coloca no ar um programa sem um apoio financeiro. O Economista Doméstico poderia fazer uma triagem sobre as reais necessidades primárias da população. Fizemos dentro do curso a Educação do Consumidor. Em química e bioquímica é informada a composição de um produto, o qual pode ser substituído por substâncias caseiras. Hoje se ensina mito o uso de produtos alternativos, de baixo custo, como vinagre, bicarbonato de sódio, produtos utilizados na limpeza. Materiais mais simples podem substituir com eficiência produtos de custos mais elevados. Isso faz parte do trabalho do profissional em Economia Doméstica.
Que não cria nenhum interesse ao meio comercial!
Hoje ainda se fala, são dadas várias dicas sobre esses produtos de custo mais acessíveis. Inclusive há um programa na Net que dá as dicas sobre como utilizá-los. Isso era para ser difundido para toda a população, pelo Economista Doméstico, e que infelizmente não foi possível fazer.
O curso de Economia Doméstica poderá algum dia voltar a existir?
Acho meio difícil. Todos os cursos de Economia Doméstica sempre foram ministrados em faculdades Estaduais e Federais. Esse curso foi trazido para Piracicaba por uma professora americana.
No curso foram abordados aspectos sobre a psicologia infantil, qual é sua opinião a respeito?
Tivemos esse curso, inclusive com laboratório de comportamento humano, Dona Iracema, uma professora cearense, falava-se muito em Jean Piaget e falava-se muito de Summerhill, “não dizer não à criança”. Eu fui educada de maneira diferente, minha mãe estabelecia limites, mas de uma forma consciente, onde eu entendia o porque do “não”. No caso de se falar um palavrão, minha mãe sentava, explicava o significado daquela palavra, os problemas que essa palavra poderia causar. Acho que a consciencia da criança é importante. Infelizmente hoje em alguns casos há uma negociação, para um ato bom ela negocia algo en troca. A criança não realiza algo pelo simples fato de ser uma boa ação. Quando adulta ela só fará as coisas com segundas intenções. Torna-se uma pessoa egoista, infeliz. Há uma grande felicidade em fazer algo por alguém sem esperar absolutamente nada em troca. É uma alegria interna indiscutível.
Você é religiosa?
Nasci na religião católica, mas sou da doutrina espírita.
A humanidade passou por períodos evolutivos, você acredita que hoje vivenciamos um período de intensas mudanças e nem todos tem essa consciência plena?
É o caos que antecede a ordem. Sempre há o conflito entre o positivo e o negativo para encontrar o caminho do bem. Hoje estamos tendo possibilidade de expormos tudo que há no interior do ser humano. Não há limites: moral, ético. Não há a necessidade de esconder mais nada, ela mostra aquilo que ela é. A sociedade de hoje aceita tudo.
Isso é bom ou ruim?
Eu acho ótimo que não se esconda nada.
Isso significa que o não há manipulação do ser humano?
Não é nesse sentido que digo, mas sim na tendência natural que se manifesta de forma explicita: ela irá praticar violência, roubo se for essa a sua natureza. Quantas pessoas nós encontramos, se manifestam de forma muito agradável, mas que na realidade estão interpretando o que julgam ser um modelo ideal, eticamente, moralmente. A realidade elas é outra, bem diferente. Às vezes são pessoas que convivem conosco. A mídia proporcionou uma grande transparência, não se esconde mais nada. Isso é um dos motivos que vemos tantas coisas ruins acontecendo, hoje o volume de informações que nos chegam é muito grande. O ser humano atualmente pode se manifestar da forma que ele é. Sempre existiu o mal e o bem, o que acontecia era que muita coisa era oculta. As pessoas não se importam com a repercussão de determinados fatos. Ela passa por cima.
Quando você se formou foi lecionar em uma colônia de holandeses?
Fui trabalhar em uma colônia de holandeses em Paranapanema, perto de Avaré. Lecionei no Colégio Técnico de Economia Doméstica que tinha lá. A colônia participava de atividades dentro do colégio, dentro da pré-escola, e seus filhos eram levados ao curso de economia doméstica, eu tinha uns 45 a 50 alunos, o curso era noturno. Havia acomodações próprias para os professores. Durante o dia eu dava aula em uma pré-escola. Lá permaneci por dois anos e meio, depois vim para o Colégio Trajano Camargo, em Limeira, onde ensinei alimentação, nutrição, decoração. Vim para Piracicaba na época em que o então prefeito João Herrmann Neto estava fazendo os Centros Polivalentes de Educação e Cultura (Cepecs). Vim para montar os berçários, treinamento e capacitação do pessoal dos berçários. Os primeiro foram no Piracicamirim, Santa Terezinha e Matão, hoje Jardim São Paulo. Cada Cepec tinha mais de 100 crianças. Os berçários tinham cozinhas separadas, lactaristas. Naquela época Piracicaba tinha muita desnutrição infantil, não por falta de alimentos, mas por erros de alimentação, falta de cuidados da família. Nas segundas-feiras era uma tristeza, as crianças tinham diarréias, vomito. As mães não tinham a alimentação adequada para a criança. A macarronada, feijoada, que ela comia era também servida para a criança. Trabalhamos coma as crianças e com a as mães, orientando a educação alimentar. Trabalhei muito na periferia.
Controlar a qualidade oferecida pela merenda escolar envolve complexidade?
É muito difícil trabalhar com alimentação escolar. Infelizmente alguns fornecedores, sem muita lisura, na hora da concorrência apresentavam produtos de excelente qualidade. A Rede escolar compra toneladas de alimentos. Quando elas chegavam, no meio ou até mesmo o lote inteiro era de qualidade inferior. Tínhamos o trabalho de abrir e analisar os lotes. Isso causava sérios problemas, muitas vezes precisávamos do produto, entregavam quando nossos estoques estavam quase sem nada, eram retidos os produtos fora das especificações. Tínhamos problemas dentro da escola, com os vereadores porque o produto não tinha sido entregue, e com o fornecedor.
Isso é crime?
É crime, você está comprando produto de qualidade, higienicamente seguro, pagando e recebendo um produto de qualidade inferior, com o custo bem menor.
Faltam leis mais rígidas?
Leis já existem, o que falta são profissionais capacitados e que tenham o comportamento de verificar e sejam sérios no seu serviço. Na minha época trabalhávamos em quatro economistas domésticas, hoje duas são professoras da ESALQ, éramos linha dura. Até então não tinha profissionais que trabalhavam com serviço de alimentação escolar. Saímos de uma escola chamada ESALQ, que tem seus laboratórios, as especificações dos produtos eram bem feitas. Exigíamos aquele tipo de alimento. As pessoas que recebem esses alimentos devem ser profissionais e sérios. O poder público pode capacitar com qualidade se houver deficiências. Muitas vezes o profissional quer fazer um mestrado, um doutorado, e onde ele está trabalhando não se permite que ele faça, e é exatamente esse o diferencial que depois ele retribui no serviço. Na Biblioteca Municipal eu não fiz o mestrado nem o doutorado, mas considero importante. Fiquei mais na parte administrativa. Tenho um funcionário que fez o curso de graduação, está fazendo o mestrado, o que ele aprende lá ele trás para a biblioteca. Isso melhorou muito o nosso trabalho aqui. Ele desenvolve projetos pensando de uma forma acadêmica mais elevada.
Como você veio para a Biblioteca Pública Municipal?
Sai da merenda escolar e fui trabalhar na Secretaria de Planejamento, cujo secretário era Barjas Negri. Após trabalhar em diversos projetos, ele pediu que organizasse a biblioteca existente. Funcionava apenas em um andar. Com suporte de dois arquitetos desenvolveu a biblioteca infantil, e me envolveu na realização desse projeto. Tinha muitas coisas na biblioteca que tinham que ser organizada de melhor forma. Fui ficando, ajudando a equipe a organizar essa biblioteca. Em 1997 vim como coordenadora, continuei na biblioteca, acabei optando por ficar aqui, assumindo como diretora.
Atualmente você exerce uma função importante, na Biblioteca Municipal.
Sou Ex-Diretora. Em dezembro último deixei a direção da Biblioteca Municipal. Continuo na área de Programação Cultural. Estamos trabalhando em um sistema diferenciado, as bibliotecárias são as responsáveis pelo acervo, Antonio Luiz Bragatto é o responsável pela manutenção do prédio.
Quantas obras existem na Biblioteca Municipal?
Por volta de 68.000 a 70.000 volumes. Estamos sempre renovando, recebemos doações de livros, substituímos livros com o mesmo título pelo que está em melhor estado de conservação.
Ocorre algumas vezes da pessoa fazer uma faxina em casa e mandar até mesmo objetos inservíveis como doação?
Já ocorreu, já recebemos atestado de óbito, holerith, óculos. Os livros que não temos e estão em bom estado conservamos. Existem outros que o único recurso é o descarte.
A biblioteca tem algum ambiente especial para tratar livros com fungos, mofo?
Não temos, é um tratamento muito especial, tem um alto custo e a biblioteca ainda não comporta. Principalmente porque esse trabalho é feito com obras mais raras. Realizamos a limpeza mais habitual, mecânica. Não temos sistemas com tecnologia avançada com tratamento através de gases especiais. Temos uma lei, que graças a Deus a Câmara Municipal aceitou, de descarte dessas obras que não serve para a Biblioteca Municipal e nem para as bibliotecas ramais. Nem para doação. Serve só para descarte. São obras didáticas, obras com ortografia antiga, hoje as bibliotecas estão saturadas desse tipo de material. Isso é um fato comum em todas as bibliotecas. A nossa biblioteca não possui livros raros, mas tem livros antigos. Há obras que um pesquisador pode consultá-las, usando os cuidados necessários, como máscara, luvas. Recebemos muitas apostilas de cursinho, livros rasurados, obras de escritores populares, que já não temos mais onde colocar.
Você já teve a curiosidade em saber quantos exemplares de “O Mago” de Paulo Coelho existiam na biblioteca?
Deve ter dois ou três, não deixamos mais do que isso, temos que deixar espaço para outros livros também. Temos uma lei que permite a reciclagem de obras inservíveis, esse dinheiro entra para o fundo de apoio à cultura, e reverte em novos livros e materiais.
Quais são as outras bibliotecas sob a responsabilidade do município?
Temos a do Parque Orlanda, Vila Industrial e Ônibus Biblioteca.
O brasileiro lê?
Lê! Ele não tem acesso, custa caro para ele. A Biblioteca Municipal de Piracicaba tem uma freqüência de mais de 150 pessoas por dia. O empréstimo de livros é bastante grande.
Eles procuram periódicos como jornais e revistas ou livros?
Buscam muitos livros, romances, de auto-ajuda.
O auditório da biblioteca comporta quantas pessoas?
É para 110 pessoas. É utilizado para atividades educativas e culturais.
Os jornais diários são mantidos encadernados?
Eram encadernados, temos até 1995 micro-filmados. O processo de micro filmagem é muito caro, a digitalização é mais acessível. Só que para efeitos legais a digitalização não é considerada valida enquanto a micro-filmagem é. Estamos colocando em discussão a relação custo benefício. São poucas pessoas que usam micro-filmagens para apresentarem em cartórios. O uso maior da micro-filmagem é feito por pesquisadores que irão utilizar a informação em alguma obra ou trabalho acadêmico. Estamos analisando se vale à pena investir em micro-filmagem ou digitalizamos esses jornais por um custo bem menor. Nós não temos espaço para guardar mais jornais. A encadernação é cara.
Você é política?
Considero-me um agente político, se não formos um agente político dentro de uma prefeitura não sobrevivemos. Temos que ter a consciência de que temos que trabalhar politicamente para a população. Não sou filiada a nenhum partido político. Tem pessoas dentro de alguns partidos que não levam isso a ferro e a fogo, tanto faz você pertencer e um ou outro partido político. Ele vê a capacidade do profissional. Outros pensam de forma diferente, se não pertencer ao partido é excluído. Como sou funcionária pública e preciso do meu emprego, não assumo nenhum partido, trabalho para aquele que vier, desde que tenha um trabalho decente e com um programa. Eu tive a felicidade de todos os prefeitos que entraram respeitarem isso. Respeitaram o projeto de trabalho. Consegui trabalhar com todos harmoniosamente sem que estivesse filiada a partido nenhum. Pensando só no trabalho. A prefeitura é uma empresa. Só que nem todos os políticos quando assumem olham a prefeitura como uma empresa. Uma empresa precisa de bons profissionais, projetos de trabalho, para que isso caminhe independente de partido ou de política. O ser humano, aos poucos, a duras penas, está evoluindo.

sexta-feira, março 16, 2012

ARNALDO LEITE, A MEMÓRIA DO CINEMA PIRACICABANO

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 17 de março de 2012
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.tribunatp.com.br/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: ARNALDO LEITE

Por décadas ir ao cinema significava muito mais do que ir assistir um filme. Envolvia um processo de preparação, a preocupação com que roupa ir, quem seriam as companhias, se fosse um casal de namorados a adrenalina aumentava, pois em uma época em que os costumes sociais eram muito rígidos, aquele era o momento em que podiam estar mais próximos, conversarem sem a severa vigilância doméstica. Existia em alguns casos a famosa figura da “vela”, era uma criança que acompanhava os namorados, podia ser um irmão mais novo, sobrinho ou até mesmo uma amiga da namorada. Funcionava como uma espécie de fiscal do comportamento de ambos, cujo “relatório” era dado à zelosa mãe. Por décadas, qualquer casal de namorados jamais retornava à casa da namorada após 22h. Só mesmo em ocasiões especialíssimas, como um baile, geralmente de carnaval, onde pais e parentes estavam o tempo todo presente. Com isso ir ao cinema além de assistir a apresentação de um filme, envolvia a oportunidade de proximidade da pessoa amada.

O cinema tinha uma importância marcante, desde a programação veiculada através dos jornais, quando determinado filme ganhava o título de imperdível. Artistas famosos eram avaliados pelo seu desempenho, idolatrados, com seus hábitos impunham costumes aos jovens da época. Penteados, roupas, comportamentos, tudo era imitado de seus ídolos. Um mundo de sonhos e imaginação.

Arnaldo Leite participou ativamente de grande parte da história do cinema em Piracicaba. Lembra-se de cada detalhe vivido naquela época. Nascido à 19 de agosto de 1932, no distrito de Piracicaba, entre os bairros rurais de Anhumas e Ibitiruna, uns 40 quilômetros distantes do centro de Piracicaba. Filho de Antonio Leite da Silva e Catarina Penha Bernal.

O pai do senhor tinha uma propriedade rural?

Tinha um sítio de 12 alqueires paulistas, cada alqueire mede 24.200 metros quadrados, onde criava boi, porcos, frangos. Permaneci lá até completar 15 anos, estudei até o terceiro ano escolar na escola em Anhumas, situada a uns seis ou sete quilômetros, ia a pé e descalço, tinha um amigo que residia nas proximidades, íamos juntos à escola. Quando voltava para casa isso em torno de meio dia à 1h, ia ajudar meu pai na plantação. Conforme podia pegar no cabo da enxada já passava a ajudar.

A que horas o senhor acordava?

Às seis horas da manhã. Socava dois litros de arroz no pilão, pegava o arroz em casca, socava para tirar a casca, peneirava, ficava uma espécie de arroz integral, a minha mãe fazia o almoço com ele. Saia de casa às sete horas da manhã e ia para a escola.

E o café da manhã como era?

Café com leite, logo cedo minha mãe tirava o leite, eu tomava quase um litro de café com leite, pão feito em casa, feito com leite. Chegava 8h em ponto na escola. Isso foi de 1941 até 1943. Meus avós moravam em Santa Maria da Serra, foi lá que fiz a quarta série, em Anhumas ainda não existia. Eles tinham um monjolo.

O que é um monjolo?

Era um equipamento rústico, movido a água, destinado ao beneficiamento do milho para fazer fubá, e depois fazer a farinha de milho. O milho fica curtindo na água por uns quatro ou cinco dias, depois vai em em uma espécie de pilão, a própria água tem uma espécie de bica que acumula em uma peça e a levanta, à semelhança de uma gangorra, ao transbordar o líquido ele é despejado, dando um golpe forte na outra ponta, socando o milho. Depois de socado vai em um tacho quente, onde é quebrada aquela massa fazendo a farinha de milho.

Como o cliente pagava pelo serviço de moer o milho e fazer a farinha?

Existia uma regra pré-estabelecida, onde tantos quilos de milho em natura são permutados por determinada quantidade de farinha. Eu ia à escola e na volta dava uma mãozinha também. Quando conclui o quarto ano escolar voltei para a casa dos meus pais.

Por que o pai do senhor vendeu a propriedade da família?

A 31 de janeiro de 1947 deu uma chuva de pedra que acabou com os cinco alqueires de algodão que o meu pai tinha plantado. Não ficou um pé de algodão. Naquela época era comum comprar no armazém por ano, então a produção que iria ser colhida e vendida é que fornecia o dinheiro para pagar as contas, feitas ao correr do ano. Ficamos na mais absoluta falta de dinheiro, viemos para a cidade para carpir cana. O armazém onde comprávamos passou por vários donos, o Righetto, o Moraes, o Moral.

Esses comerciantes tiveram um prejuízo significativo também?

Não receberam de imediato, mas o meu pai vendeu o sítio para poder pagar as dívidas. Meu pai passou a trabalhar na Escola de Agronomia, na época o governador era o Dr. Adhemar de Barros, e por algum desencontro administrativo o salário do meu pai atrasou muito. Foi mais um motivo que o levou a vender o sítio, nessa época ele já estava devendo no armazém do Vitório Fornazier, na Paulista, onde atualmente situa-se o Supermercado Balan. Quando nós mudamos para a cidade passamos a ser fregueses a prazo de Vitório Fornazier. Lembro-me do Armazém do Aliberti, situado na esquina da Rua do Rosário com a Avenida Madre Maria Teodora, inclusive aos domingos eu ia ajudá-lo a rastear o boche, eu não tinha quase força para puxar o rodo e nivelar a cancha. A bola de boche era de madeira.

O senhor passou a trabalhar em que local?

A 27 de abril de 1947 passei a trabalhar na Casa Coury, situada na esquina da Rua XV de Novembro com a Rua Governador Pedro de Toledo, onde hoje é a loja Charm Cosméticos. Os proprietários eram os três irmãos Coury: Alexandre, Michel e Raja. Era um estabelecimento que trabalhava só com tecidos.

Como saindo do sítio o senhor foi trabalhar com tecidos?
Eu comecei a fazer a documentação para trabalhar na fábrica de tecidos Boyes, que naquele tempo era o ganha pão do piracicabano. Nós morávamos na Rua João Crisóstomo, 67, na Paulista, viemos para o centro, meu pai e eu, com o intuito de arrumar um emprego para mim. Ele foi a Casa Guerra, onde era freguês desde moço, o proprietário era o Sr. José Guerra. De lá fomos a Casa Coury, o Raja pediu que eu deixasse o meu nome e endereço, isso foi em uma terça-feira, quando foi no domingo o Raja apareceu em casa, não sei como ele achou, naquele tempo nem ônibus tinha. Ele foi a pé. Conversou com meu pai, acertando para na segunda-feira eu começar a trabalhar. O serviço era varrer, espanar, fazer entregas. Em 1954 eles construíram e inauguraram o Cinema Palácio, na Rua Benjamin Constant entre a Rua XV de Novembro e a Rua Rangel Pestana, onde atualmente funciona uma igreja. Eu até ajudei a puxar massa para a obra. Era um quarteirão já todo construído, não tinha terreno vazio. O cinema foi construído para comportar 1.100 cadeiras. Foi feita uma reforma e diminuíram a capacidade de cadeiras.
Quantos cinemas havia em Piracicaba nessa época?

Havia o São José, Colonial, Broadway e o Palácio. O Politeama foi construído mais tarde pelo Stolf.

Quando terminaram as obras do Cine Palácio o senhor trabalhou lá?

Fui trabalhar de porteiro. Trabalhava durante o dia na Casa Coury, saia um pouquinho antes das 18: h. ia para casa, tomava banho, colocava uma calça preta, um paletó cinza, e gravata borboleta, com camisa branca. Chegava ao cinema ás 19h. A sessão começava às 20:h. Eu que abria o cinema, o maquinista chegava na última hora, era o Lázaro Gorga, seu apelido era Zinho. Havia outro que era seu ajudante, eu o conhecia por Tito. Eram os dois que trabalhavam.

Entrando no cinema, do lado esquerdo havia uma bomboniere, quem era o proprietário?

Era terceirizada, pertencia ao Brancalion.

Acabada a obra de construção do Cinema Palácio houve a sessão de inauguração.

Foi em maio de 1954. O primeiro filme projetado chamava-se Lili. Era um musical, a primeira sessão foi às 20h, a segunda sessão foi às 22h. Na sessão de inauguração o cinema lotou, ficaram pessoas fora do cinema, não havia mais lugares. Quando era um filme de primeira linha sempre ficavam pessoas fora do cinema, não conseguiam ingresso para entrar.

A sessão inaugural foi normal ou foi franqueada gratuitamente ao público?

Não teve nada de graça, comprava o ingresso e entrava, normalmente. Naquele tempo não existia nada de especial para atrair convidados especiais, imprensa.

Com isso o senhor passou a ser uma pessoa mais importante?

Eu era porteiro e lanterninha também. Nós trabalhávamos em dois porteiros, o outro era o Durval Santana.

O senhor tinha dois salários, um na loja e outro no cinema?

De fato, não era lá essas coisas, mas era bom para mim que era solteiro.

Já havia a meia-entrada para estudantes?

Havia sim. Havia duas moças que eram da bilheteria, duas irmãs, Áurea Rodrigues e Célia Rodrigues. Havia uma entrada só no cinema, ficava um porteiro de cada lado, recebíamos em média 550 ingressos cada um. Ao pegar os ingressos, éramos obrigados a rasgá-los, porque tinha o fiscal do filme, que era uma pessoa determinada pela distribuidora dos filmes. Ele ficava ao lado, com um pequeno aparelho que contava o número de pessoas que entravam. Os filmes vinham até o Cine São José de onde eram trazidos até o Cine Palácio. Às vezes o filme passava primeiro no Cine São José. Quem levava as latas com os rolos de filme dentro era o Odilom.

Acontecia durante a projeção do filme de quebrar a fita?

Acontecia! Naquele tempo eram filmes de celulóide, Quando o filme arrebentava durante a sessão tinha que emendar. Acendia a luz do cinema.

Era obrigatório o uso de paletó e gravata para ir assistir a um filme no cinema?

Não, era um habito quase obrigatório o uso de camisa de mangas compridas.

Para que idades existiam filmes proibidos?

Para 14 anos e 18 anos. Filmes proibidos para 18 anos geravam problemas, tinha que ter psicologia para avaliar pela fisionomia da pessoa a sua idade. Na dúvida tinha que pedir um documento que provasse ter 18 anos ou mais. Se não mostrasse documento não entrava. Ao meu lado tinha o comissário de menores, isso quando o filme era proibido para menores de 18 anos. Se não tivesse os 18 anos o menor era convidado a deixar o cinema e recebia o dinheiro do ingresso de volta.

Em que dias funcionavam as sessões?

De segunda-feira a sexta-feira era uma sessão só, as 20h., sábado e domingo eram duas sessões, das 20h e das 22h, à tarde tinha a matinê. Teve um período em que eram projetados filmes domingos às 10h da manhã, o público era formado por criançada. Passava praticamente só projetavam desenho animado.

Qual era a função do senhor como lanterninha?

Se fosse no comecinho do filme a pessoa não achava uma poltrona vaga, eu corria a lanterna procurando alguma vaga. Se houvesse vaga indicava e a pessoa sentava-se.

Havia lugares reservados para autoridades?

Não, algumas autoridades tinham a entrada permanente franqueada.

Cinema sempre carregou a fama de ser um local preferido dos namorados. Alguma vez o senhor teve que ser mais enérgico?

Não cheguei a ter problemas por estar sempre atento e sendo visto andando pelo cinema durante as sessões. Com o passar do tempo, adquire-se experiência, com certa facilidade controla o ambiente. Qualquer situação piscava-se a lanterna era o suficiente para serenar os animos. Em uma única ocasião tive que acender as luzes, um estudante excedeu-se, armou uma algazarra. Algum tempo depois ele veio desculpar-se. O cinema sempre contava com a presença de um policial da Guarda Civil.

O senhor chegava a ver o mesmo filme por diversas vezes?

As vezes enjoava. Quando surgiu o filme em terceira dimensão tinha-se a impressão de que a imagem saia da tela. Usava-se um óculos especial. Foi um filme muito popular, chamava-se “Museu de Cera” com Vincent Price, foi lançado em 1953. Dava-se a impressão de que os objetos saltavam da tela. Foi um grande sucesso em Piracicaba.

Houve um episódio curioso sobre um filme rodado em Piracicaba?

Quando “Os Três Garimpeiros”, em 1954, foi rodado no Rio Piracicaba, filmavam durante o dia, a noite, depois que terminava a sessão normal eles começavam a assistir que tinham filmado durante o dia. Era uma série de repetições, muitas vezes a mesma cena, para ver se tinha algo errado. Eu ficava até o fim, era afinal eu quem fechava o cinema. Dava quarenta a cinqüenta minutos de filmagem.

Como o senhor ia embora para casa?

A pé. Eu morava na Rua Ipiranga, era solteiro. Não tinha ninguém na rua, não havia viva alma.

E os filmes do Mazzaropi, lotavam o cinema?

Lotava de tal forma que ficava muita gente sem poder entrar no cinema. A fila começava na Rua Benjamin Constant ia pela Rua XV de Novembro e descia até a Avenida Armando Salles. Naquele tempo não existia televisão, o cinema era a diversão.

Até que ano o senhor permaneceu no Cinema Palácio?

Fiquei até 1957. Casei-me com Rita Durrer Leite em 25 de dezembro de 1954, na Catedral de Santo Antonio. Um pouco antes de me casar meu pai mudou-se para a Paulista na Avenida Dr. João Conceição, em uma das casas do Michel Pedro José. Em 1961 comprei uma Lambretta e guardava na casa do Atílio Bortoletto. Onde depois foi a Alvarco era pasto, logo adiante era a embarcadeira de gado da Companhia Paulista. Do Aliberti para baixo, na esquina da Rua do Rosário com Madre Maria Teodoro, existiam umas duas casas, logo depois era plantação de cana. Atrás do barracão do Michel, onde hoje funciona uma imobiliária, era tudo plantação de algodão.

O senhor andou de bonde?

Muito. Hoje penso, como éramos preguiçosos, além de ser jovem, da Rua XV de Novembro até a Estação da Paulista dá mais ou menos 1 quilometro, mas tinha que vir de bonde, talvez para se mostrar. Talvez por ser moda na época, e por estar usando terno de linho branco. Três anos após me casar saí do cinema, na loja fiquei até maio de 1980, foi vendida, já não era mais dos irmãos Coury. Aposentei-me com 33 anos de serviço.

O senhor praticava algum esporte?

Gostava de jogar boche. Aprendi no Aliberti, joguei no Nauti Club, no Club Regatas. Era bom de ponto, no Aliberti era bola de madeira, depois apareceu à bola de massa, era mais pesada. Por várias vezes ganhei disputa de jantares. Um dos últimos lugares onde joguei foi no Bar Cruzeiro, onde ganhei jantares, medalhas, troféus, que o meu neto se encarregou de guardar.

O senhor tinha algum apelido?

Tinha sim, engenheiro. Por causa do boche, eu fazia aqueles efeitos na bola, começaram a me chamar engenheiro, acabou pegando. Era a famosa trivela.

Porque mudou o cinema?

Por causa da televisão, é muito mais pratica você não necessita sair de casa, se quiser até toma um café e continua assistindo. A televisão acabou com o cinema.

O senhor era popular na cidade?

Pelo fato de ter trabalhado na loja e no cinema era muito conhecido.

O cinema fazia a projeção dos filmes com quantas máquinas?

Sempre com duas máquinas, um filme pode ser composto por sete ou oito partes (rolos), vem cada um em uma lata metálica. Quando está terminando um rolo, o segundo operador, já liga a outra máquina. Toda projeção de filmes exigia dois operadores. O filme é contínuo. O filme de terceira dimensão funcionava com as duas máquinas simultaneamente, ele atua sobre a visão do olho esquerdo e direito. Um dos motivos de não ter tido tanto sucesso é o fato de ser extremamente trabalhoso quando partia um pedaço do filme, tinha que buscar o ponto exato do outro rolo.

Acontecia de acabar a energia elétrica no cinema?

Era muito raro.

Qual foi o filme que mais marcou o senhor?

Foi “Quo Vadis”.

Quantas vezes o senhor assistiu o filme longa metragem “Os Des Mandamentos” com a duração de 3h49min?

Umas cinco ou seis vezes. Era lindo, mas muito cansativo.

Se o senhor ligar a televisão à tarde os filmes exibidos são mais “fortes” do que aqueles proibidos para maiores de 18 anos?

Muito piores! A censura carimbava o que podia exibir. Hoje novela das 18h supera qualquer exibição daquela época.

Em sua opinião a época vivida pelo cinema não tem volta?
Não volta mais.






domingo, março 11, 2012

MONSENHOR RUBENS MARINS

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 03 de maio de 2012
Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços
eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.tribunatp.com.br/
http://www.teleresponde.com.br/

ENTREVISTADO: MONSENHOR RUBENS MARINS
Uma história de fé inabalável, que a princípio parece quase impossível de se realizar, um homem maduro, com 26 anos de trabalho na Usina Monte Alegre, busca por seu ideal maior. Aos 40 anos Rubens decidiu ser padre, encontrou inúmeros obstáculos, desde a sua formação educacional até mesmo restrições pela idade madura. A sua fé venceu. Hoje é Monsenhor, um título ddo pelo Papa. Como Capelão do Lar dos Velhinhos celebra as missas, aconselha, atende, distribui amor ao próximo. É muito querido entre os abrigados. Sempre sorridente, leva bom humor a todos com que convive. Além de ser um exemplo vivo da infinita capacidade do ser humano. Monsenhor Rubens Marin é o filho mais novo dos seis filhos do casal Francisco Marin e Ida Carmaghani, nascido em Ribeirão Bonito, próximo a São Carlos, a 20 de junho de 1936. Francisco Marin sempre trabalhou na agricultura, cultivava café, algodão. A medida que os filhos foram se casando Francisco optou por trabalhar como empregado. Quando tinha aproximadamente seis anos, a família de Rubens mudou-se para a Fazenda Monte Averne, cuja atividade principal era a plantação de tomate, a fazenda tinha uma fábrica de massa de tomate. Quando Rubens tinha 11 anos a família mudou-se para a Usina São Francisco do Quilombo, em Paraisolândia. No tempo de corte de cana ele trabalhava, ia para a roça, a comida era levada de casa em um caldeirãozinho, era composta de arroz, feijão, geralmente ovo frito, chuchu, abobrinha. O pão era feito pela sua mãe, em casa. Era costume levar uma garrafa de café. Almoçava às 9h30 e ao meio dia tomava café. Mais uma vez a família mudou-se, dessa vez para a Usina Monte Alegre. Rubens continuou trabalhando na lavoura, cortando cana, e conseguiu concluir o quarto ano primário na Escola Marquês de Monte Alegre. Só aos 18 anos foi trabalhar na usina, com idade menor do que essa não era possível trabalhar no ambiente da usina. O chamado “de menor” até então só podia trabalhar na lavoura.

Ao completar 18 anos o senhor foi trabalhar com o que na usina?

Trabalhava em uma seção chamada clarificação. A garapa chega a um tacho enorme, ali eram adicionada cal, enxofre, para clarear a garapa fazer o açúcar cristal. Por três anos realizei esse serviço.

Quando jovem o senhor frequentava bailes?

Ia, principalmente nos sítios, Santa Rita, Taquaral, que hoje são regiões urbanizadas de Piracicaba. Naquela época compunham grandes fazendas da Usina Monte Alegre. A família Morganti vendeu essas áreas que foram loteadas. Aos domingos eu jogava futebol, era ponta direita. Frequentava a Teixeirada, que era praticamente um clube a beira do rio.

Após três anos na clarificação qual foi a próxima atividade do senhor?

Fui trabalhar na Fábrica de Papel e Celulose. Conheci muito bem os Morganti: os irmãos gêmeos Lino e Hélio, o Fúlvio, o Pedro Fúlvio, a Dona Beatris, a Bit. Conheci João Bassetti, na Colônia Macabá, onde eu morava. Conheci seus filhos Paulo, Lino, José, Carlos, Arthur. Éramos como uma família. Na Colônia Macabá moravam 23 famílias, eu morava na última casa. Mudei para o Piracicamirim com 24 anos, porém, continuei trabalhando na Usina Monte Alegre, eu tinha permanecido por três anos na Fábrica de Papel.

Qual era a atividade do senhor na Usina Monte Alegre?

Trabalhava no laboratório químico da Usina. Era um analista prático, eu tinha estudado até o quarto ano primário. Nessa ocasião eu era responsável pela seção, o laboratório que determinava os padrões de qualidade da usina. Permaneci no laboratório até quase completar 40 de idade. Fui para o seminário com 39 anos e meio.

Como alguém com quase quarenta anos de vida decidir pela carreira religiosa?

Desde menino sempre frequentei a Igreja, era catequista, no sítio havia uma capela, na colônia, eu preparava a criançada para fazer a primeira comunhão. Cuidava da capela. A capela que Alfredo Volpi pintou eu frequentava aos domingos, assistia a missa. Era Congregado Mariano. Desde criança eu já queria ir para o seminário. Os frades capuchinhos é que celebravam as missas nessa capela. Na entre-safra trabalhava das 7 horas até as 17 horas, no período da safra fazia dois horários. Das 6 às 18 e das 18 às 6. Eu morava na Avenida Rio das Pedras, no Piracicamirim. Quando chovia a água inundava as casas. Logo após o cemitério, dali para frente, era tudo barro. Eu ia trabalhar de onibus, do João Pavão, pai do Dr. João Orlando Pavão que foi Provedor da Santa Casa de Misericórdia de Piracicaba. Naquele tempo nós o chamávamos de Joãozinho, as vezes, principalmente nas férias escolares, ele foi cobrador do ônibus de seu pai, recolhia o passe. Naquele tempo às 6h30 tinha missa na Igreja Bom Jesus, eu participava da missa e depois seguia para a minha casa no “Pisca”a pé.

O Piracicamirim era uma área meio deserta?

Pelo amor de Deus! Que coisa tenebrosa era aquilo! Um tempo eu trabalhei das 14hrs. às 23hrs. Lá pelas 23h30 eu estava passando a pé em frente ao cemitério.

Qual era a reação do senhor?

Eu parava um pouco na porta para olhar lá dentro.

Alguém sugeriu que o senhor se tornasse padre?

A sacristã da Igreja Bom Jesus, Dona Ana Zaia um dia me disse: “- Rubens, por que você não vai ser padre?” Respondi-lhe: “- Depois de velho vou ser padre?”. Nessa época havia fundado a assistência social mariana do Bom Jesus, mas funcionava no Piracicamirim. No começo ali foi de tudo, farmácia, ambulatório, gabinete dentário, roupeiro, casa de merenda, fica ali na Avenida Dois Córregos. Por muito tempo foi capela, depois foi criada a Paróquia, e muito tempo assim funcionou aquele salão que era da Assistência Social do Bom Jesus. Muitos tinham medo de trabalhar naquela região, existia a fama de bairro violento. Em uma casinha que existe até hoje, de manhã a minha mãe fazia o leite e a tarde a sopa das crianças.

De fato na época o senhor agia como um padre?

Quando mudei lá, havia uma única família que ia à igreja, eles eram da Ordem Terceira na Igreja dos Frades. Ninguém mais frequentava a igreja. Ninguém rezava aquela criançada abandonada pelas ruas. Comecei a dar catecismo na sala da minha casa. Preparei a primeira turma, de 16 crianças com a idade de 13, 14 anos. Preparando essas crianças para a primeira comunhão a nossa congregação foi visitar Aparecida do Norte eu pedi para o presidente da congregação, José Capranico, vamos começar a levar a imagem de Nossa Senhora Aparecida nas casas, para rezarmos juntos, existia um ambiente de promiscuidade no bairro. Era o que podemos chamar “uma boca qunte”. A Prefeitura Municipal cedeu um telefone que ficava em casa. Para lá da Ponte do Piracicamirim era o único aparelho telefônico. Era usado para tudo: chamar polícia, chamar parteira, de madrugada, muitas vezes íamos buscar o doente trazendo nas costas, a ambulância não conseguia entrar naquelas barrocas.

A casa do senhor, no Piracicamirim era um ponto avançado da civilização?

Era. Conseguimos um terreno com José Francisco Prudente, tanto que o nome oficial do bairro é Vila Prudente, quando foi para ser construído o salão da Assistência Social da Paróquia do Bom Jesus fui pedir o terreno para esse senhor. A princípio ele se negou a dar o terreno. Passados uns dias ele me chamou e disse: “Eu vou dar o terreno porque você está ensinando as crianças a rezarem, já fizeram a primeira comunhão” O altar foi em cima de um caminhão, a celebração foi feita pelo Monsenhor Martinho Salgot. A imagem de Nossa Senhora Aparecida cada dia ficava em uma casa, se é que podíamos chamar aquele amontoado de papelão e latas de casas.

De onde vinham os recursos para leite e sopa para tantas pessoas?

Haldumont Nobre Ferraz, o Tiquinho, era o presidente da Assistência da Igreja do Bom Jesus, logo pela manhã ele ia ao Mercado Municipal, com a colaboração dos comerciantes, as verduras e legumes em boas condições, mas que não atendiam clientes mais exigentes, ele carregava tudo em sua perua, levava até a minha casa e a minha mãe com algumas meninas que ajudavam, preparavam aquele sopão. Os açougues contribuiam com um pouco de carne, até mesmo osso para juntar àquela sopa.

Com o falecimento da mãe do senhor o que aconteceu?

Eu mudei, fui morar com a minha irmã, que morava em frente. Nessa época que Dona Ana Zaia disse-me que deveria ser padre, quando argumentei sobre como faria para atender os “meus pobres”, ela retrucou dizendo que para atender aos pobres tem muita gente. Um dia eu estava em casa, tinha acabado de chegar do trabalho, quando Dona Ana chegou acompanhada de um padre visitador dos salesianos. Chamava-se Eduardo Serradel, era o responsável pelas vocações salesianas. Conversamos muito, ele disse-me que para ser padre bastava ter vontade. Eu tinha 26 anos de emprego efetivo, registrado em carteira. Passados uns meses o padre Diretor do Dom Bosco, Padre Vicente Gerdes mandou dizer que queria falar comigo, para procurá-lo no Dom Bosco. Ele disse-me que se quisesse de fato entrar para o seminário deveria fazer o curso supletivo João Wesley.Ele me disse: “ Você tem que se desligar da empresa em que trabalha, vir morar aqui conosco, e estudar a noite, porque só há esse curso à noite”. Isso foi a 6 de janeiro de 1976. O gerente, quando disse-lhe que estava deixando a empresa para ir para o seminário disse-me: “Você vai deixar tantos anos de empresa para ir para o seminário? Você deveria ir para o hospício!” O Padre Gerdes já tinha marcado a matrícula no João Wesley, que ficava na Rua Alferes José Caetano esquina com a Rua Voluntários de Piracicaba. Acabei o colegial, fui a Aparecida do Norte fazer vestibular para estudar filosofia.

Aos quarenta anos qual foi a sensação que o senhor teve ao pensar: “Agora vou ser seminarista!”

Pensei, agora estou no Colégio Dom Bosco, antes eu era analista responsável por uma seção, um laboratório, talvez eu vá trabalhar na secretaria do colégio. Eu passei a morar na clausura, junto aos padres, um local reservado, de acesso restrito, sem duvida um privilégio. Na segunda-feira o economo da casa disse-me: “Rubens, agora você irá ficar responsável pela manutenção dos apartamentos dos padres, sala de reunião, tudo que estiver dentro da clausura”. O material de limpeza fica naquele quartinho. Eu ia ser o faxineiro. Eu que pensava que iria fazer serviço de escritório. Graças a Deus eu tive um chefe muito bom, quimico, chamava-se João de Godoy, aprendi muito com ele, técnicas de manutenção e limpeza. Para limpar 9 apartamentos mais o do inspetor quando vinha, e outro de visita, no total eram 11 apartamentos. Quando passei a morar lá a ordem que me deram era as 5h30 tocar a campainha para os padres levantarem-se, 6 horas já estavam rezando o ofício da manhã, terminando o ofício desciam para o café, que eu já tinha levantado as 4h30 para fazer, preparar tudo, para depois subirem e começarem as aulas. Passei a servir o almoço, o jantar, no refeitório não era permitida a entrada feminina. Havia as mulheres que cozinhavam. Hoje não há mais clausura no colégio.

O senhor conheceu Dom Aniger?

Morei com ele na Casa Paroquial da Paulicéia durante oito meses, na Igreja Sagrado Coração de Maria. O Padre João Echevarria faleceu, não tinha padre, Dom Aniger foi de pároco lá. Ele já era o bispo diocesano de Piracicaba.

Como o senhor foi parar lá?

Eu permaneci por 2 anos no Dom Bosco, como seminarista salesiano. Fui aconselhado a ser seminarista diocesano, seria mais interessante no sentido de ganhar tempo de estudos. Fui falar com Dom Aniger. Ele me conhecia muito bem, da forma como eu trabalhava naquele Piracicamirim. Consegui terreno para construção do local voltado a comunidade e o terreno da matriz, logo mais acima. Também doado por José Francisco Prudente. Passei a ser seminarista diocesano, embora morando no colégio diocesano, até completar os estudos básicos. Quando fui falar com Dom Aniger para ir para o seminário ele disse que eu não deveria ir mais, pois vocação na minha idade era muito tardia, ou seja, não era vocação. Cheguei no Colégio Dom Bosco, o diretor era o Padre Antonio Feltrin, o diretor já sabia, apenas disse-me que não era para me preocupar com nada. Um compadre meu ficou sabendo, disse-me que já tinha conseguido um serviço para mim na Itelpa. Um dia fui falar com Frei Saul, eu o conhecia, pensei quem sabe ele me convida para entrar lá, eu vou querer ser um irmão leigo, nem vou querer ser padre. Tinha mudado o bispo, era Dom Eduardo Koiak, embora ainda como titular, Dom Aniger estava em São Paulo. Frei Saul disse-me: “- Vai falar com Dom Eduardo!” Eu respondi, que se o titular tinha dito que não era vocação o que o outro bispo iria dizer? Frei Saul ligou, e disse-me para ir depressa que Dom Eduardo estava de saída. Desci a Rua Governador Pedro de Toledo, contei o caso a Dom Eduardo. Ele me disse como estava morando no Dom Bosco, para pedir ao meu diretor uma carta: “Com tudo que ele sabe de ruim de você. Carta fechada, hem!” Nesse momento chega Dom Aniger, e me diz: “O meu filho, você por aqui?” Eu queria que abrisse um buraco no chão para poder entrar. Já tinha terminado a conversa com Dom Eduardo, mas sai com a sensação de que tinha acabado tudo. Levei as cartas ao Dom Eduardo, uma semana depois. Ele então me disse que nada impedia, mas como as aulas já tinham começado você vai fazer o propedêutico em Rio Claro, condução você pega uma carona com os padres da Igreja São Judas Tadeu, você vai estudar mais um pouco de latim e grego. Eu tinha que deixar o café pronto para os padres e ir. Levantava as 4h30, preparava aquilo tudo lá, esse aqui precisa ovo quente, esse aqui banana assada, cada coisa no seu lugar. Pegava meus cadernos e saia por essas ruas a pé. Um ano fiz o tal de propedêutico. Tinha um abençoado padre espanhol, que todo santo dia fazia a chamada, com o lápis batia na mesa e dizia: “Kýrios Rubens!” que em grego quer dizer, Senhor Rubens! Leia, vamos! Todo dia eu tinha que ler. Conclui, falei com Dom Eduardo, fiz outra vez o bendito vestibular no Seminário Bom Jesus em Aparecida, eu estava com uns 45 anos, em 1986 terminei o curso. Em 29 de novembro de 1986 na Paróquia Nossa Senhora Aparecida fui ordenado padre. O primeiro ano de padre morei com o Monsenhor Jamil, em Rio Claro, e também dava assistência em Santa Gertrudes. Em 1988 fui pároco da Paróquia Nossa Senhora da Saúde em Rio Claro. Continuava dando assistência em Santa Gertrudes. Depois fui para a Paróquia do Bom Jesus em Santa Bárbara D’Oeste, fui pároco na Nossa Senhora do Rosário em Charqueada, em 2001 fui para Menino Jesus de Praga, e agora sou capelão no Lar dos Velhinhos, já a mais de nove anos. Recebi o título de Monsenhor, um dos padres do conselho diocesano deve ter entrado com esse pedido, eu não sabia. Todo esse conselho aprovou, houve a aprovação do bispo, é feita uma carta ao Santo Padre o Papa, pedindo que o referido padre passe a ser monsenhor.

Como o senhor se sente sendo capelão do Lar dos Velhinhos?

A maior alegria que sinto é ser Capelão do Lar dos Velhinhos.
















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