sexta-feira, dezembro 29, 2017

JAIR ANDREATTO


Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 23 de dezembro de 2017

http://blognassif.blogspot.com/


http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: JAIR ANDREATTO



 

Jair Andreatto nasceu a 23 de junho de 1947, na cidade de Campinas. Filho de Albino Andreatto e Maria da Costa Andreatto que tiveram nove filhos: Doracy; Nadir; Neide; Jair; José Carlos; Virginia; Angélica; Geni e Beto; seu pai era funcionário do DER – Departamento de Estradas de Rodagem, trabalhava com máquinas motoniveladoras.

Com que idade o senhor veio morar em Piracicaba?

Eu era nenezinho! Nem me lembro! Viemos morar em uma casa situada a Rua Cristiano Cleopath entre a Rua Santa Cruz e a Rua Bom Jesus. Depois mudamos para o então distrito de Saltinho. Fomos morar em uma residência que pertencia ao Estado. Havia um pátio onde eram recolhidos os veículos acidentados. A motoniveladora de marca Allis Chalmers com a qual o meu pai trabalhava ficava ali dentro. Não havia luz elétrica, a água era de poço.

O senhor chegou ainda criança a andar com seu pai nessa motoniveladora?

Eu ia com ele, na época eu tinha uns seis a sete anos,  a região na qual ele tinha que dar a conservação de estrada abrangia: Rio das Pedras, Piracicaba, Tietê.

As estradas eram asfaltadas?

Não! A Rodovia Cornélio Pires era terra. Os caminhões ao passarem com seu peso iam pressionando a terra para os lados da estrada, com a lamina da maquina, meu pai puxava essa terra para o centro de novo. Ia por uma lateral da estrada, voltava pela lateral oposta e depois passava a máquina esparramando a terra que ficava no centro da estrada.

O senhor estudou aonde?

O primeiro e o segundo ano de Grupo Escolar eu estudei em Saltinho. A primeira professora era Dona Ada. O DER construiu o prédio que existe até hoje na Avenida Pádua Dias, saída para São Paulo, viemos morar na última casa da Rua Voluntários da Pátria,  em frente onde hoje está o quartel dos bombeiros. A casa era alugada, meu pai trabalhava no DER. Passei a estudar no Grupo Escolar Dr. Alfredo Cardoso. Depois fiz um curso de ajustagem no SENAI, já estava no mesmo prédio que ocupa até hoje. 

Foi aí que o senhor descobriu a sua paixão por mecânica?

Acredito que sim. Eu sai do SENAI um pouco antes de 1969. Logo em seguida casei-me, no dia 6 de setembro de 1969, com Antonia Cangiani Andreatto na Igreja São Judas, o celebrante foi o Padre Henrique. Tivemos três filhos: Cláudio, Roberto e Andrea.

Nesse período o senhor trabalhou em algum lugar?

Trabalhei, na Floricultura Cobal, na parte da manhã freqüentava o SENAI e depois trabalhava na Cobal. A Floricultura Cobal ficava na Avenida Independência, em frente ao Jardim da Cerveja. No sentido do Ribeirão Piracicamirim era o Sítio dos Facco. Trabalhei uns 20 anos com plantas. Eu morava pertinho, ia a pé mesmo. A Avenida Independência era terra.

O senhor é um grande conhecedor de flores!

Fazíamos a ornamentação de igrejas para casamentos, eu era bom nisso: arranjos, cestas com flores, coroas fúnebres.

A coroa fúnebre tem que ser feita de forma muito rápida?

Tem sim. Lembro-me de quando faleceu Luciano Guidotti era muito grande o número de pessoas que queria fazer uma homenagem para ele. Trabalhamos por dois dias seguidos, sem pararmos, íamos buscar flores em Jaguariúna, naquela época praticamente a Cobal era a fornecedora de flores da cidade. A chácara onde ela situava-se foi feita por um agrônomo chamado Nelson Cobal. Depois Antonio de Pádua Libório adquiriu a Cobal, ele tinha a funerária Serviço Piracicabano de Luto, situada a Rua Benjamin Constant, esquina com a Avenida Independência, era uma loja aberta, os caixões ficam em pé, expostos. O Nelson Cobal tinha uma perua Dodge 1951.

Trabalhar com produtos voltados ao serviço funerário pode sem que a pessoa perceba, trazer um desgaste emocional?   

Não! Acostuma-se com o trabalho. Tem s pessoas que temos que consolar, os que não aceitam a morte.

E casamentos? O senhor ia enfeitar as igrejas? A Igreja dos Frades era a preferida pelas noivas?

A Igreja dos Frades era a mais procurada pelas noivas. Tinha um tapete vermelho que atravessava a igreja toda. Fazíamos uns arranjos que eram colocados nas pontas dos bancos, um cordão isolava o corredor onde passava a noiva. Alguns clientes queriam aproveitar parte da decoração para levar até o salão aonde seria realizada a festa. Fazíamos pirâmides com um floral no topo. A perua ficava estacionada em um local estratégico, enquanto os noivos estavam recebendo os cumprimentos na porta da igreja, saiamos pela porta lateral da Igreja dos Frades, na Rua Alferes José Caetano, colocávamos a peças dentro da perua e tínhamos que levar antes que os noivos chegassem no salão de festas que eles tinham escolhido. Aconteciam situações inusitadas, como em determinado dia um conhecido fotógrafo, buscando o melhor ângulo para fotografar os noivos, foi afastando sem olhar para trás, a noiva saindo, ele aflito em conseguir fotos expressivas, afastava-se, ia de um lado para outro, não percebeu que o tapete tinha formado uma ruga. O fotógrafo caiu de costas! A sua máquina fotográfica, juntamente com uma bolsa de couro que carregava a tiracolo, onde eram colocadas as baterias, filmes, e outras coisas, com o tombo inesperado foi uma chuva de objetos, a máquina caiu longe, a igreja toda despencou em uma gargalhada só.

Solidários, muitos convidados ajudaram-no, a essa altura roxo de vergonha.   

O tão famoso buquê de noiva também era fornecido?

Fazíamos, tem uma flor chamada angélica, perfumada, colocávamos um arame fino e com uns raminhos, o tradicional buquê de flores naturais ainda é a grande preferência das noivas. Os modelos mais comuns são: buquê redondo, cascata e braçada. Após celebrado o casamento a noiva jogava o buquê, quem pegasse era a próxima a se casar. Era uma festa! A moça que estava pensando em casar-se logo realizava uma disputa acirrada. Nesse ramo de floricultura, o início da semana era até folgado. Só que no final de semana, havia muitas festas, lembro-me de uma vez em que ornamentamos o Teatro São José, a volta inteira, é enorme, fizemos uns florões na volta inteira do Teatro. Quando envolvia um serviço muito grande alugávamos um caminhão. As pirâmides de flores que fazíamos eram altas. A camélia era uma das flores preferidas, tanto a rosa como a branca.

E finados como era?

Ficávamos na loja. Montamos uma loja na Rua Moraes Barros quase esquina com a Avenida Independência. Em frente ao estádio Barão de Serra Negra. Era um sobrado, trabalhávamos ali. No dia de finados a flor preferida geralmente era a palma (gladíolo). Era a flor mais procurada, tinha uma durabilidade maior quando imersa em um vaso com água. A flor natural é imbatível, por mais perfeitas que as artificiais sejam.   


Após 20 anos trabalhando com plantas, como surgiu essa sua atração por mecânica?

Comprei uma Lambretta ano 1957, verde e branca. Quando precisava fazer algum reparo eu mesmo dava a manutenção. Meus amigos, proprietários de lambretas começaram a trazer para que eu desse a manutenção. Eu trabalhava em casa. Continuava na floricultura, mas fazia os reparos nas lambretas no tempo que tinha disponível. Eu comprava as peças do Seu Atos Cadioli que era a Revenda Oficial Lambretta de Piracicaba, situada a Rua XV de Novembro quase esquina com a Rua José Pinto de Almeida. Passei a ter bastante serviço em casa, a floricultura estava diminuindo o seu movimento, Por volta de 1975 a 1976 o Seu Atos Cadioli, que era italiano, teve um problema de saúde. Ele trabalhava com tratores da marca Landini, motor com um pistão só, funcionava com óleo queimado, óleo de cozinha, o que fosse colocado virava combustível! Se o motor esfriasse tinha que colocar um maçarico para aquecer o local apropriado e fazer funcionar o motor. Eu ajudei o Seu Atos a reformar um Landini que veio do Paraná, por motivo de saúde Seu Atos não podia fazer pessoalmente o trabalho, eu fui fazendo e ele me orientando. Fiz esse Landini, saiu com a partida acionada na mão. Não precisava nem esquentar o cabeçote do motor. Ele tem uma vela aquecedora dentro, o primeiro ponto da chave faz com que a vela fique avermelhada, quando dava a partida as vezes ele pegava até para trás, tinha que cortar o óleo dele, quando ele estava quase parando, tinha que soltar o óleo, ai ele pegava para frente. Tinha dois “volantes” enormes, era o pêndulo dele. Se deixasse o Landini funcionava o dia todo. Por recomendação médica, o Seu Atos decidiu vender a loja, a Ortema. Ele me ofereceu. Na época eu tinha Fusquinha 1966! Vendi o Fusquinha, dei como entrada, só que eu não pude ficar onde era a loja, o aluguel seria caro. No fundo do prédio ele tinha 18 boxes que ele alugava para os vizinhos guardarem veículos. Fechamos um, que ficou sendo a minha oficina, outro barracãozinho do lado, foi onde colocamos todas s peças da loja, permaneci ali de 1976 a 1982. Guardo até hoje o emblema de Revenda Autorizada Lambretta. Veio de lá. Consegui comprar um barracão na Rua D.Pedro I, entre a Rua São João e Santa Cruz. Atualmente ocupado pelo Bertoncelli que trabalha com uma distribuidora de doces. Ali permaneci por mais de 20 anos, Só Lambretta, Vespa e motos. Lá eu tinha peças de motos também, ai começou a aparecer Honda, Yamaha, Suzuki. Tive uma Moto Jawa 250 cilindradas, preta.


Em sua juventude havia um grupo de rapazes que tinha Lambretta?

Entre Lambretta e Vespa éramos uns 20. Parávamos em frente a catedral, a Rua Moraes Barros e a Rua São José não eram interrompidas na praça, elas continuavam normalmente. As motinhas ficavam todas ali. Íamos aos cinemas Politeama, Broadway, São José. Na época existia o Bar Americano, ali na Praça, alguns iam até lá. Não se usava capacete naquele tempo. Era necessário ter carta de motociclista. No auge da Lambretta, da Vespa, não havia outro tipo de moto só algumas Harley Davidson, Indian, Mas era uma minoria.  Quando surgiu a Lambretta todos os funcionários da Mausa, tinham Lambetta ou Vespa. Estacionavam todos em frente a Mausa, na Rua Santa Cruz, enfileirados lado a lado, passavam uma corda para evitar que alguém mexesse. Por volta de 1971 começou a aparecerem as máquinas japonesas. Todo mundo foi vendendo as Lambrettas.


Qual é a diferença da Vespa para a Lambretta?

A marca é uma delas. A Vespa fabricada pela Piaggio e a Lambretta produzida pela Innocenti ambas empresas italianas. Até 1963 a Vespa tinha 150 cilindradas. As primeiras Lambrettas tinham 150 cilindradas, após 1964 surgiu a de 175 cilindradas. Pesa pouco mais de 100 quilos, comporta duas pessoas. No pneu traseiro colocamos 30 libras de ar, no pneu dianteiro são de 18 a 20 libras. A Lambretta e a Vespa antiga tem partida no acionamento do pedal de partida, a Vespa de 1987 em diante já saiu com partida elétrica. Ambas tem pneu de estepe. 


A transmissão do motor para a roda é feita por corrente?

Na Lambretta até 1960 a transmissão é por cardam. De 1961 em diante já saiu com corrente de malha dupla. Não é simples como de moto e trabalha no meio do óleo. Ela trabalha em uma caixa de óleo, pega o óleo e joga para cima. Circula o óleo dentro do câmbio.





A Lambretta é mais confortável?

Uma das vantagens é ter pneu estepe. A posição em que o condutor fica é mais confortável.

Quantas marchas de velocidade possui a Lambretta?

O modelo LD que foi fabricada até 1960 são três marchas. A LE já são quatro marchas. Não existe marcha-a-ré.


E a velocidade máxima?

A 100 quilômetros por hora já está exigindo um pouco dela. Os freios são com pastilhas, na frente e atrás.

Como o senhor vê a substituição da Lambretta pela motocicleta?

A Lambretta parou no tempo! Na Itália o forte é a Vespa com motor de quatro tempos, antes eram dois tempos, a Vespa e a Lambretta, esse tipo de motor obriga a colocar certa proporção de óleo ao abastecer com gasolina. Torna-se uma mistura de óleo e gasolina. As Vespas italianas são com câmbio automático. As Vespas e Lambrettas são carismáticas!


O senhor está com um veiculo bem antigo sendo montado?

É um automóvel Ford 1929 Model A Roadster também conhecido como “Carro da Sogra”. Isso porque é um automóvel para dois passageiros, sendo que o porta malas pode transformar-se em um terceiro banco, o detalhe é que é conversível, a capota só cobre os dois passageiros da frente. Quem vai atrás está sujeito ao sol, chuva, neve. Diz a lenda que o casal de namorados ia na frente e a sogra sentava-se atrás. Esse veículo estou restaurando.


Qual é o consumo de um carro desses?

Para os padrões de hoje consome bastante. O motor tem 2.300 cilindradas. Com toda a potência do motor ele só alcança 2.200 rotações por minuto, é um motor de biela longa.

Piracicaba já teve corrida de Lambrettas?

Foi na época em faziam corridas de automóveis em ruas de Piracicaba, as vias eram isoladas, e os a automóveis da época DKW, Gordini, Simca, disputavam em plena via pública.  Participavam nomes como: Maks Weiser  Walter Hahn  Junior e muitos outros.

A Polícia usava Lambretta?

Usou bastante! Era para fiscalização de trânsito. Alguns investigadores utilizavam para entregar intimações judiciais, em 1968 a Prefeitura Municipal de Piracicaba adquiriu 10 Lambrettas para a Guarda Civil, que mais tarde foram incorporadas à Polícia Militar. Com essas Lambrettas eles faziam rondas, tinha até um amigo, o Cabo Ademar, que tinha uma Lambretta dessas. Com passar do tempo e a utilização, essas Lambrettas foram sucateadas. A Prefeitura recolheu essas 10 Lambrettas. No início as cores eram Azul e Branca, depois pintaram-nas de cinza, com dois revólveres cruzados nas laterais. Essas Lambrettas, sucateadas, foram doadas para a Associação dos Funcionários Públicos Municipais, o objetivo era vender para arrecadar fundos, eles estavam fazendo o Clube da Associação na Avenida Luciano Guidotti.






Além das Lambrettas e Vespas, o senhor teve participação em diversos times de futebol?

Sempre joguei como quarto zagueiro joguei na Associação Ferroviária de Esportes de Piracicaba, no União Porto, no Esporte Clube Cobal. A Ferroviária não tinha sede, reuníamo-nos na Rua Bela Vista, pegávamos um caminhão e íamos para a disputa com o time adversário. Para o União Porto eu ia de Lambretta, deixava-a no barracão do Largo dos Pescadores, trocava de roupa e ia para a partida de futebol. Era um uniforme vermelho com as listras brancas. A cor do uniforme da Ferroviária era bordô. A Ferroviária ficou campeã da Segunda Divisão da Liga Piracicabana de Futebol, isso foi em 7 de fevereiro de1981. O União Porto também chegou para a final. Jogávamos no Estádio Barão de Serra Negra. Outro time em que joguei foi no Ponte Preta de Piracicaba, também no Barão.







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