domingo, outubro 22, 2017

LUIZ ANGELO MARCHINI


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado, 21 outubro de  2017.

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

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ENTREVISTADO: LUIZ ANGELO MARCHINI

 


Luiz Ângelo Marchini nasceu a 6 de março de 1945 no bairro Água Branca, Piracicaba. Filho de Luiz Marchini e Margarida Razera Marchini que tiveram 11 filhos: Luiz Ângelo, José Antonio, Maria Elisa, João José, Maria Inês, Sueli Margarida, Marcos Francisco, Pedro Roberto, Humberto Sávio, Roberto Sávio e Maria Regina. Sendo que Humberto e Roberto são gêmeos, assim como José Antonio e Maria Elisa são gêmeos também.
Qual era a atividade do seu pai?
Meu pai tinha olaria, plantava cana, tinha leiteria, uma fábrica de rapadura, fábrica de melado, onde a criançada estava empregada. O primeiro engenho ele adquiriu de José Nassif, era um engenho de tração animal, com três cilindros de ferro. Eu cheguei a tocar o burro que puxava o varal e movia as moendas. Na época eu tinha de 12 a 14 anos. O burro era mansinho, virava sozinho, às vezes ficava muito lerdo tinha que apressar o passo dele. A cana-de-açúcar era produzida no próprio sítio. Calculo que era moída uma tonelada de cana por dia. Havia um tacho muito grande, fazíamos muita rapadura, tinha o formato de um tijolo medindo 10 centímetros de largura por 20 centímetros de comprimento, uns 4 centímetros de espessura. Eram embrulhadas em papel celofane, uma a uma.
Quem fazia a rapadura?
Minha mãe era a técnica! Eu também aprendi e de vez em quando ainda faço, limpo a cana como se fosse fazer garapa, sai uma garapa clara, depois que passo a cana na escova, lavo a cana, coloco no engenho de inox, para não oxidar a garapa, depois em um tacho de inox, coloca-se no fogo por umas cinco horas. No sítio aproveitávamos o próprio bagaço da cana para fazer o fogo na fornalha. Antes eram colocados em uma cerca, como se fosse um varal, onde secavam. Depois meu pai adquiriu um engenho maior, já com o cilindro deitado, o de tração animal tinha o cilindro em pé. Esse segundo engenho era movido por um motor a gasolina de um Chevrolet 1928. O radiador era um tambor de 200 litros de água, saia a água fria embaixo e jogava a água quente em cima. Funcionava o dia inteiro. Depois veio a energia elétrica, ai o motor do Chevrolet foi substituído por um motor elétrico de 10 HP.
Como essa rapadura chegava a São Paulo?
No inicio a produção era menor, trazia com carrinho de tração animal até a Estação da Companhia Paulista de Estradas de Ferro. Despachava também latas de melado com capacidade para 20 litros. Meu pai comprava as latas vazias, daquelas que tem a tampa maior, igual às utilizadas para tintas, não havia rotulo, nada que identificasse. O nível de exigência era bem diferente.
Havia funcionários no engenho?
Sempre tinha algum. A maior parte eram pessoas da nossa família que trabalhavam no engenho. Na olaria que ficava paralela ao engenho tinha os funcionários, foram construídas casas para eles.
O sítio tinha quantos alqueires?
Eram nove alqueires, era uma área bem aproveitada, tinha pasto, vacas de leite. Faziamos até queijo, manteiga. Trabalhei mais na rapadura e na olaria. Na época fabricávamos só tijolos. No início a produção era de uns 3.000 tijolos por dia, tudo artesanal. Quando chegou a energia elétrica colocamos máquinas, que faziam 1.500 tijolos por hora.
Quem fazia as entregas?
Teve época em era só eu que fazia as entregas, com um caminhão F-6 ano 1951. Um Ford a gasolina, transportava 1.500 tijolos a cada viagem. O tijolo era grande. O tamanho padrão dos tijolos foi diminuindo, passei a levar 2.000 tijolos e cheguei a levar até 3.000 tijolos. O tijolo passou a ser metade do que era antes. E hoje está menor ainda!
Você lembra-se de alguns lugares onde entregou tijolos?
Tem muitos lugares! Às vezes estou passando em algum lugar e lembro-me de que aquele prédio foi construído com os tijolos que entreguei. Fiz muita entrega de tijolos na Cidade Jardim, quem construiu muito lá foi o João Fleury.
Você ia entregar com um ajudante?
Ia com ajudante, às vezes ia sozinho. Comecei a puxar tijolo muito novo ainda. Muitas vezes vinha entregar tijolos a noite, de madrugada, não dava tempo durante o dia. Às vezes deixava o caminhão carregado e vinha entregar bem cedo. Quando o pedreiro chegava às sete horas eu já tinha descarregado. O pedreiro assinava o “valinho”. Naquela época a Guarda Civil fazia blitz na curva do “S”.
Você trabalhou nesse sítio até que idade?
Estudei até o quarto ano, no bairro Pau Queimado, ia a pé, naquela época não havia escola no bairro Nova Suissa. A distância de casa até a escola era em torno de três quilômetros, ia descalço, era comum andarmos descalços naquele tempo. Minha primeira professora foi Dona Hilda e a última Dona Rute. Eu saí desse sítio quando tinha 22 anos. Com 22 anos, aluguei uma fazenda que tinha uma olaria grande, e fui tocar a fazenda, sozinho. Era a fazenda do Santo Bueloni. Conheci muito o Francisco (Chico) Bueloni. Lá moravam cinco famílias que trabalhavam na olaria, eu alugava um pedaço, era uma fazenda muito grande. Eu produzia tijolos, depois comecei a fabricar um pouco de telhas e um pouco de lajotas para pisos. O Santo queria fazer uma sociedade comigo para modernizarmos, adquirir máquinas, mas infelizmente ele logo faleceu. Pouco depois, minha família também estava passando por um processo de mudanças, foi quando decidi vir para a cidade e montei a Angemar. Lá se chamava cerâmica Angemar. Meu avô tinha falecido há pouco tempo, o nome dele era Ângelo Marchini, o nome Angemar era em sua homenagem.
Em que local você montou a Angemar?
Na esquina da Rua do Rosário com a Avenida Dona Jane Conceição havia dois lotes de terreno vazios, onde periodicamente montavam circos, parques. Esse dois lotes eram de dois donos distintos: o da esquina era de um membro da família Amstalden, e o outro era do José Valério. Acabei comprando primeiro o lote do Valério, já pensando em adquirir a esquina. Construí no primeiro lote.
No inicio eram só o lote com uma edícula no fundo?
No inicio aluguei o terreno da esquina, fiz uma cerca, uma edícula de taboa e a 1º de maio de 1969 comecei a trabalhar comercializando tijolo, areia, pedra, cimento, cal, um pouco de ferro, um pouco de manilha. Naquele tempo vendia-se muita manilha, não existia tubo PVC! A manilha era produzida em Rio Claro. Comprei um caminhãozinho, um Ford ano 1948, verde, funcionava bem, ficou por muitos anos trabalhando.
Era um tempo em que não havia os problemas de segurança existentes atualmente?
Não tinha!
No início você já tinha o caminhão para fazer entregas?
No inicio não, após um mês da abertura do depósito o meu tio vendeu o caminhão para mim, para que eu pagasse da forma que pudesse pagar. Em dezembro de 1969 acabei de pagar o caminhão. Foi um período muito bom para a construção civil, meu estoque aumentou e consegui pagar o caminhão. A carga tributária era menor. Quando comecei já contratei um funcionário: Paulo Polva. Era um senhor já maduro, uma pessoa muito útil. Honesto. Eu saia fazer entrega ele ficava no depósito, ele conhecia os preços, tinha a lista de preços feita a caneta, ele vendia, fazia o troco. Logo depois arrumei um motorista, Miguel Novelo conhecido como “Gué”, irmão do Zé Lambretta. Era um bom motorista, às vezes o Paulo saia com ele, dependendo da carga. O Gué nos ajudou muito, foi muito bom para nós.
Em seguida vocês construíram?
Compramos o lote vizinho, trabalhando no lote da esquina fui construindo no lote anexo. Após construir e mudar a empresa para lá consegui comprar o terreno da esquina, que ficou como depósito.
Você teve um funcionário que o mencionou com muito respeito e gratidão, trabalhava em uma das rádios da cidade.
Tarciso Chiarinelli !  Ele foi muito útil para a Angemar! Outro que foi muito bom, muito útil é José Ângelo Bonamin. Ele entrou menino, aposentou-se e continou trabalhando. Era o financeiro da empresa. Honestíssimo. Surgiu uma oportunidade para nós adquirirmos uma área com 1250 metros quadrados em um local privilegiado. Precisamos de um sócio para fazer a aquisição, na ocasião foi o Marcos Contarini, da Alvarco, que tornou-se nosso sócio. Èramos em três sócios, eu, o Antonio, e o Marcos. Depois o Marcos faleceu fizemos uma divisão, a esquina ficou com a viuva, e a àrea que tinhamos adquirido ficou conosco. Mudamos a loja. Foi um período no mínimo desagradável, houve a influência de terceiro que foi agregado a família do Marcos e que infelizmente trouxe prejuizo para todos nós. Mudamos a loja para a Avenida Madre Maria Teodora em 1992. Lá já morávamos na frente e tinhamos feito um barracão grande no fundo. A minha casa e do Toninho era na frente. Demolimos a casa do Toninho primeiro, depois demoli a minha casa. Expandimos a Angemar. Houve o interesse de terceiros em estabelecerem-se naquele local, alugamos e decidimos encerrar as atividades comerciais da Angemar. Ainda pór algum tempo emprestei o nome Angemar para um ex-funcionário. Hoje já não existe mais essa loja.
Você ainda lembra-se do número do telefone da Angemar?
Era um “telefone quente”, Eu tinha um telefone alugado! O número era 227174.
Nesse período voce casou-se?
Em 19 de outubro de 1968 eu casei com Maria Odete Valverde, na Igreja dos Frades, celebrado por Frei Augusto, tivemos duas filhas, Márcia e Débora. Tenho os netos Rafael, Isabela, Ana e Olívia. Meu genro Tiago mora em Cingapura, juntamente com minha filha e minhas netas. São 27 horas de vôo.  
                        Luiz Ângelo Marchini e sua esposa Maria Odete Valverde
Você chegou a entregr tijolos na Igreja São José quando ela estava em construção?
Entregamos sim, para o cônego Luiz. Meu pai fez doação. Também para o Lar dos Velhinhos, Igreja Imaculada Conceição do Monsenhor Jorge, levamos muito tijolo na Igreja da Paulicéia, Paróquia Imaculado Coração de Maria do padre João de Echevarria.
Você conheceu a Serraria do Galesi, situada na Avenida Dr. João Conceição?
Conheci! Ele fornecia algumas coisas para nós. Mais abaixo, ficava o Ferrari, que fornecia para nós a carriola para puxar tijolo dentro da olaria, era uma carriola manual, com dois varais e uma roda de madeira como de carroça. Carregava uns 50 tijolos por viagem. Levava o tijolo no forno para queimar e depois tirava do forno para por no caminhão. Depois eles criaram a carriola com duas rodas e pneu de Gordini, DKW. Ai foi outra história! Carregava mais e era mais suave.
Seu primeiro carro qual foi?
O meu primeiro carro, depois de casado, foi um DKW Fissore, cor vinho. Era um carrão! O Waldemar Fornazier, vizinho de frente, tinha um também. Conheci o Vittório Fornazier, proprietário de um armazém onde hoje funciona o Supermercado Balan. O José A.(Juca) Dionisio, pai do vereador Vanderlei Luiz Dionísio trabalhou a vida inteira com Vittório Fornazier. Na Praça Takaki tinha a sorveteria Bar da China de propriedade de João Beduscchi, um comerciante que atendia a todos com muita educação, de poucas palavras, mas muito prestativo. Só vendia sorvete. Na esquina da Rua do Rosário com a Avenida Madre Maria Teodora havia o boche do Aliberti e na Avenida Madre Maria Teodoro, a uns 50 metros de distância havia o boche do Roque Bortoletto. Lembro-me da inauguração da Padaria Suissa, depois passou a chamar-se Padaria Takaki por razões de contrato comercial entre os envolvidos, Quem iniciou foi o Francisco (Chicão) Amstalden,filho de Thomaz (Bem-Te-Vi) Amstalden.
Você chegou a fazer um barco inusitado junto com Pedrinho Silveira?
Quem fez foi o Marco da Alvarco, com Pedrinho Silveira, Luiz Vargas e o Antonio (Gegé) Beneton. No início esse barco chamava-se “Barco Quatro Amigos”.


Esse barco existe até hoje?
Esse barco é meu! Eu adquiri a sucata dele, reformei inteirinho, ele tinha afundado, ficou só o teto fora, estava na ponte do Rio Tietê. Atualmente o barco tem dois quartos, doze camas, dois banheiros, cozinha com fogão de seis bocas, pia de granito com dois metros de comprimento, geladeira com trezentos e tantos litros, televisão, bar completo. Ele fica ancorado dentro da água, pesa 20.000 quilos, o casco é de chapa.




Inicialmente esse barco foi construído sobre tambores de 200 litros?
No início era um barco sobre tambores, eu acompanhei a história porque o Toninho trabalhava na Alvarco, quando começamos a Angemar, começamos juntos. Depois o Marco da Alvarco ficou meu sócio. Constantemente eu ia com o Marco até o barco. Esse barco foi sofrendo transformações, uma vez fizeram uma reforma, o Marco colocou dois tubos grandes de aço e um assoalho. O Pedrinho Silveira colocou uma carroceria de ônibus monobloco em cima. Funcionou assim por um bom tempo. O primeiro motor era um Dodge a gasolina, seis cilindros, depois mudou para um Mercedes-Benz 1111. Depois eu mudei para um MWM seis cilindros.


Qual percurso você faz?
Não ando muito não, subo até perto de Tanquã, tem um lugar bom ali para pescar umas trairas, pousar lá, é uma delícia, no dia seguinte voltamos. É mais pelo passeio.

Você é bom pescador?Não! Vou na retaguarda!



Você guarda recordações de moradores do bairro da Paulista?
No bairro da Paulista tinha figuras marcantes: o juiz de futebol José de Barros que trabalhava na Estação Paulista e aos finais de semana apitava jogos de várzea. Lembro-me do José Grella, Augusto Grella, João Sabino Barbosa, o José Grella era sogro do Hélio Saipp, que tinha os irmãos: José Saipp e Alcides Saipp. O José Saipp trabalhou para mim por muitos anos, era conhecido como “Tio Zé”. Todos gostavam muito dele, era vendedor de balcão. O Hélio tinha a Casa do Lavrador, onde atualmente é uma casa de calçados. Em determinada época ele montou uma serralheria, vendeu a Casa do Lavrador. Eu comprei. O José Saipp veio trabalhar conosco, tinha muitos medicamentos veterinários, e também para uso em plantas, quem entendia do assunto era o José. O estoque foi vendido e ele continuou trabalhando conosco. Ao lado do nosso depósito havia um açougue de propriedade de Mário Scarpari e seus filhos Antonio e Alcides. Depois eles montaram um supermercado na esquina da Avenida Madre Maria Teodora esquina com a Rua da Palma, foi possivelmente o primeiro supermercado da região, mais tarde esse supermercado foi vendido para Décio Canale, e passou a ser o Supermercado Canale.
Você usou muito o trem?
Eu ia para a escola de trem! Na época em que morava no bairro Água Branca ia até bairro Chicó de trem. Eu nasci na Àgua Branca e mudei para a Nova Suissa com onze anos. Comecei a escola no Chicó e terminei no bairro Pau Queimado.
Esse trem passava pela Água Branca e pelo Chicó?
A Estrada de Ferro Sorocabana tinha uma plataforma quase em frente a Igreja da Água Branca, eu morava ali perto. A criançada toda do bairro ia de trem. Tinha uma carteirinha anual, não pagava nada.
Você conheceu uma paineira muito grande que havia nas imediações de onde hoje há o terminal urbano?
Conheci! O João Maranhão morava ali perto.
Consta que essa paineira, por sua beleza e tamanho, recebeu uma proteção legal no terreno que a circundava, documento devidamente registrado em cartório público.
Naquela época havia o Mato do Pupin, não tinha o Postão ainda, a Estrada do Governo como era conhecida a hoje Rodovia Cornélio Pires, era uma estrada bonita, boa, bem apedregulhada. Onde é a Avenida Luciano Guidotti, Avenida 31 de Março, não havia nada. Era tudo pasto. Tinha hortas.
O caminho que você fazia para chegar até a cidade qual era?
O sítio em que morávamos, era do meu avô, saia ali no Postão. O sítio vinha até ali. Era estreito e comprido. Terminava onde hoje é uma fábrica de blocos de cimento. A cidade terminava no Posto São Jorge, na Avenida São Paulo que na época era uma estrada. Depois teve um progresso rápido. Nessa região havia leiteria do Emílio Razera, tio da minha mãe, irmão do meu avô pai da minha mãe. Luiz Razera. Ângelo Marchini era pai do meu pai. Este ano está sendo comemorado 130 anos da imigração dos meus bisavôs, vieram da Itália, da região da Sicília. Estamos organizando uma reunião dos descendentes.
Quando você era jovem qual era a diversão mais comum?
Havia pouca diversão e muito trabalho. Nunca joguei futebol. Não tinha dinheiro para ir ao cinema. Bailinho era pouco, lá pelo sítio às vezes algum. Já moço, os pais não deixavam ficar até tarde.
A família tinha o habito de ir aos domingos à missa?
Todos os domingos meu pai enchia o Fordinho, minha mãe e a criançada menor embaixo, os grandões em cima, na carroceria. Vinhamos para a Igreja dos Frades. Quando chegava a família na igreja, enchia dois bancos, eram treze pessoas! Meus avôs também freqüentavam a Igreja dos Frades, vinham de charrete, de trole. Onde é atualmente a pracinha em frente a Igreja dos Frades era o lugar onde guardavam os troles, os cavalos. A hoje praça, na época era um terreno com um cercadinho. Havia um bebedouro de água para os animais. Em frente o depósito de cargas da Estação da Paulista havia um bebedouro para animais, existia um cano que despejava água, era comum colocarem o dedo impedindo que a água saísse pelo cano, ela saia por um orifício superior tornando-se um bebedouro para as pessoas. Possivelmente deveria ter uma nascente, a água jorrava sem parar.
Você chegou a cortar cana-de-açúcar?
Cortava, carregava, entregava na usina. Naquele tempo não queimava a cana. Meu pai comprou um sítio no Pau DÀlho e encheu de cana, com isso eu tinha que puxar o tijolo, a lenha para queimar o tijolo e a cana na safra. O caminhãozinho trabalhava dia e noite. A lenha comprava cortada, mas tinha que ir buscar e carregar. As coisas mudaram muito, eu sou do tempo da Maria Fumaça, é só comparar com a tecnologia do Metro, para perceber o salto da tecnologia. Máquina de escrever é peça de museu.
Isso é bom para a humanidade?
É bom! Hoje se comunica muito pelo celular. Uso todos esses melhoramentos tecnológicos. Hoje pela manhã conversei com a minha filha em Singapura, ela estava dentro do Uber, estava indo para uma festa de aniversário. Às seis horas da manhã estava conversando com a minha criançada!
Antigamente fazer um interurbano para são Paulo era uma aventura!
Levava às vezes cinco horas para a telefonista completar a ligação! Outra vantagem é que você pode escrever e a pessoa recebe a mensagem imediatamente. A medicina evoluiu muito, lembro-me quando inaugurou o primeiro pronto-socorro de Piracicaba, ficava em cima da rodoviária. Foi inaugurado pelo Dr. Francisco Salgot Castillon. Não tinha nada, recorria-se a farmácia, o Lico tinha farmácia na Rua Benjamin Constant. Os dois médicos mais acessíveis ao povo eram Dr. Alfredo de Castro Neves e o Dr. Samuel de Castro Neves, filho e pai, ambos até hoje venerados pela população. Consultavam gratuitamente e se o paciente não pudesse adquirir os remédios eles davam gratuitamente. Atualmente é obrigação do Estado o fornecimento ao paciente carente dos medicamentos receitados. É vedado ao médico fornecer gratuitamente medicamentos de forma regular. Tenho uma passagem marcante com o Dr. Alfredo (Alfredinho) de Castro Neves. O motor Chevrolet que virava o engenho estava ruim de dar partida, eu estava acertando o platinado dele. Com doze anos fiz curso de mecânica para dar manutenção lá no sítio. Na Avenida Dona Jane Conceição, quase esquina com a Rua da Glória, tinha uma oficina de caminhão, fui lá ajudar e aprender. Com isso passei a trocar molas de caminhão, limpar carburador, regular o platinado. Eu estava regulando o platinado do motorzinho, o botão da partida ficava longe, eu tinha que apertar a partida para por o motor no ponto certo. Estava em desequilíbrio, segurei na correia do gerador, virou na polia, abriu a ponta do dedo da mão, meu pai me levou até o Dr. Alfredinho, já estava escuro, ele me atendeu a noite, na casa dele, na Rua Alferes José Caetano entre a Rua Prudente de Moraes e Rua 13 de Maio.
A alimentação no sítio era bem diferente?
Nós plantávamos arroz na várzea, feijão no meio da cana, tinha horta, leite a vontade, milho, tratava de porcos, naquele tempo não se usava óleo, minha mãe comprava óleo de algodão para colocar na salada. A comida era feita com banha, não existia geladeira, era utilizado um tambor de leite, cheio de banha e os pedaços de porco dentro. Dependurava lingüiça em cima do fogão a lenha, ia depurando. Eu comprei até uma máquina para moer carne, para fazer lingüiça. No sítio eu fazia, descascava alho, moia alho, usava pimenta do reino, ensacava lingüiça. Eu fazia de tudo em casa, dava a mamadeira para o irmão menorzinho, lavava louça, puxava tijolo,
O bairro da Paulista tinha tipos característicos.
Muitos permaneceram em nossa lembrança, como o Geep, do Bar do Geep, Milton Scarpari, um bom mecânico, o Ito que tinha banca no Mercado Municipal, Júlio Takaki, O José Martins seus irmãos Alexandre e Cristóvão tinham um depósito de material de construção a Rua Benjamin Constant quase esquina com a Avenida Dr. Edgar Conceição. Conheci Jayme Pereira, morava na esquina da Rua Sud Mennucci com a Avenida Dona Jane Conceição, foi vereador, era casado com uma das filhas de Vittório Fornazier. Conheci seu pai, Abel Pereira. Sou amigo do Rubens Zillio, o Valdir Zillio mora em Goiás, a família Zillio tinha um açougue na esquina da Avenida do Café com a Rua do Rosário. Eles tiveram um sítio vizinho ao sítio do meu pai, abatiam boi, distribuíam os miúdos com os vizinhos. Em frente tinha o estabelecimento do Francisco(Chico) Sabino que permanece funcionando até hoje com seu filho Giuseppe  administrando. É a Loja do Italiano. Tempo do Ciro Mendes Silveira e a Loja Lev Cred, Alcides Saipp, Manoel Castillho. Lembro-me do Jacinto Bonachella, tinha um posto de gasolina na Rua Benjamin Constant, esquina com a Avenida Dr. Edgard Conceição, onde atualmente funciona uma padaria. Lembro-me do tempo em que a Avenida Dr. Paulo de Moraes terminava na Rua do Rosário, dali para frente era a Chácara Nazareth. O Romeu Gomes de Oliveira, dono da Rodomeu, quando adquiria carrocerias Facchini era no mínimo um lote de 10, não adquiria uma carroceria apenas. Naquele tempo havia muito consórcio de caminhão, conforme ele ia recebendo o  caminhão já ia colocando a carroceria. Romeu tinha um Simca preto com estofamento vermelho. O Sr. João Ferrazzo (Joane Vassoureiro) subia quase todos os dias a Rua do Rosário, em um Simca Rally, vermelho, dirigido pela sua filha. O Joane tocava bem um violão, o Zico Novello com a sanfona e tinha mais alguém que batia alguma coisa formavam uma festa. Lembro-me do Sebastião Rocha, tinha um caminhão que transportava combustível, Osário Pantojo,trabalhou muito tempo na Companhia Paulista de Força e Luz. São pessoas que permanecem em nossa lembran



ALEXANDRE SARKIS NEDER


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado, 14 outubro de  2017.

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

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ENTREVISTADO: ALEXANDRE SARKIS NEDER


 

Piracicaba possivelmente por ser uma das pioneiras do rádio, logo que ele passou a funcionar comercialmente no Brasil, por muitas décadas é um manancial de talentos na área de comunicação radiofônica. Além das rádios comerciais, tradicionais, tem um grande número de rádios alternativas, via internet. Grandes nomes que brilharam e brilha nos meios de comunicação, a chamada “grande mídia” é oriunda de Piracicaba. Desde Carlos Nascimento, Roberto Cabrini, José Occhiuso, executivo que ocupa o cargo de Diretor de Jornalismo do SBT, um currículo de trabalho nas grandes redes de televisão. Gilberto Barros é piracicabano. Luis Carlos Quartarollo. Carlos Colonnese, que foi produtor e diretor da TV Cultura é diretor de uma empresa de comunicação de São Paulo. O lendário Léo Batista que até hoje trabalha na TV Globo já foi locutor em uma das emissoras de rádio de Piracicaba. O não menos impactante Gil Gomes, no inicio de sua carreira trabalhou também em radio piracicabana, assim como o saudoso Francisco Milani, que se tornou muito popular na “Escolinha” apresentada por Chico Anísio. E muitos outros que brilharam na chamada grande mídia. Alguns ainda estão na ativa em Piracicaba e região. Além dos nomes acima citados, muitos saíram de Piracicaba, permaneceram por muito tempo fora, com grande sucesso, mas a saudade da Noiva da Colina falou mais alto. Isso sem mencionarmos os “Monstros Sagrados” do rádio piracicabano, que por décadas desfilaram e muitos continuam ainda encantando seus ouvintes com seu talento. Alexandre Sarkis Neder conta-nos como iniciou a sua paixão pela comunicação social, escrita falada e através da imagem. Conquistou seu público, busca estar sempre com a informação mais precisa possível, ele sabe que a credibilidade do comunicador é o seu maior patrimônio.

Alexandre Sarkis Neder você natural de Piracicaba?

Nasci no dia 30 de janeiro de 1969, em Piracicaba, meus pais são o Professor Dr. Antonio Carlos Neder, cirurgião dentista, professor universitário e farmacologista e Jamile Sarkis Neder que por muitos anos trabalhou em posto de saúde em Piracicaba, foi professora da Rede Pública de Ensino, tiveram dois filhos: Silvia e Alexandre.

  Em qual escola você iniciou os seus estudos?

Foi na Rua D.Pedro I em uma escola denominada Escola Nova Recanto Infantil, depois fui fazer o meu pré-primário na Escola Nossa Senhora da Assunção. Era o tradicional Colégio das Freiras, naquela época era freqüentado tanto por alunos do sexo feminino como alunos do sexo masculino. Lá eu estudei o curso primário, o ginásio eu estudei no Colégio Salesiano Dom Bosco. O curso colegial técnico em administração eu fiz no Colégio Piracicabano. Cursei Jornalismo na UNIMEP Campus Centro, a minha formatura foi em 1991.

Como surgiu essa sua paixão pela comunicação social?

Costumo dizer que o que me levou para o jornalismo foi o esporte, sempre fui fã de esporte em especial futebol e Fórmula-1. No início da década de 80 eu demonstrava uma tendência ao jornalismo. Eu recortava os jornais que recebia em minha casa, às vezes até irritando pai e mãe, eles não tinham como ler, estava todo picotado. Montava do meu jeito, um jornal em folha de papel almaço, com várias páginas. Escrevia o nome fictício do jornal, isso eu tinha meus 9 a 10 anos. Fui me desenvolvendo, lendo, me interessando mais pelas coisas do jornalismo. No ano de 1982 houve uma grande revolução na minha vida: tinha chegado ao mercado o videocassete! Isso era uma coisa louca, poder gravar o que você está vendo na televisão!

Havia até consórcio para adquirir videocassete.

Por ai medimos como era difícil adquirir! Em 1982 houve a Copa do Mundo da Espanha. Comecei a fazer um acervo de imagens, que preservo até hoje, Em 1983 um grande amigo da família, Mário Monteiro Terra, veio em minha casa, conversou comigo, viu e leu algumas coisas. A essa altura já estava também escrevendo meus comentários e opiniões. Foi quando ele disse: “-Tem que levar esse menino para ter uma coluna de esportes em O Diário”. Ele viu um comentário que eu tinha feito a respeito do presidente da CBF na época, o Giulite Coutinho, era uma critica que eu tinha feito ao futebol brasileiro. O Mário levou o artigo para ser publicado. Em abril de 1983 eu comecei a ter uma coluna semanal, saia aos domingos,  denominada “Papo Esportivo”. Com o passar do tempo essa coluna foi crescendo. Na época eu tinha 14 anos! Em 1985 comecei a escrever uma segunda coluna que era publicada toda quarta feira,  voltada ao automobilismo, chamava-se “Alta Velocidade”. Até que em 1986 passei a ficar permanentemente em O Diário, com o então editor Renato Fabretti. Em 1987 o Renato mudou-se para São Paulo, foi trabalhar no “Diário Popular”. Eu assumi a editoria de esportes de O Diário. Entrei na faculdade em 1988. De 1988 até 1991 trabalhei no Jornal de Piracicaba. Em 1983 criei o meu próprio jornal “O Democrata” que circulou de abril de 1993 até inicio de 1999.

A sede de “O Democrata” era onde?

Era na Rua Boa Morte, entre a Rua D.Pedro I e a Rua Ipiranga. Era um jornal de circulação semanal, aos sábados, após um ano e meio passou a ser bi-semanal, quarta-feira e sábado. Inicialmente ele era impresso na Gráfica do Jornal de Piracicaba, depois passamos a imprimir no Diário do Povo de Campinas. Até que foi feita uma negociação  com o Ex-Governador Orestes Quercia, isso em 1995, quando adquirimos uma impressora do Diário Popular de São Paulo, não era off-set, era nylon-print, a chapa de impressão era diferente. Tratava-se de um maquinário mais antigo, que tinha servido todos os anos históricos do Diário Popular, o Quércia que era proprietário do jornal havia adquirido equipamentos modernos para sustituir essa impressora. Na época foi feita uma negociação muito camarada e  essa máquina veio para Piracicaba. Rodamos na nossa máquina até o final do nosso jornal. Tinhamos uma equipe própria. A confecçaõ do jornal na época era mais trabalhosa: tinha que fazer o fotolito; “queimar” a chapa, atualmente é mais fácil, através do computador transfere-se para a máquina de impressão. Até então havia um trabalho artesanal e caro. Uma característica marcante dessa máquina é que era muito grande, no dia em que ela chegou no prédio da Rua Boa Morte causou um impacto enorme pelo seu tamanho. Era uma máquina muito antiga. Para acertar o registro da fotografia, sobrepor olho no olho, nariz no nariz, tonalidade da cor, gastava-se uma quantidade de papel assustadora. Quando fechou O Democrata essa máquina foi vendida para um jornal de Poá.

Primeiro você ingressou na televisão ou no rádio?

Primeiro no rádio, na Rádio Educadora de Piracicaba, foi ela que me abriu as portas pela primeira vez em 1988. Comecei a participar de um programa chamado Educadora Esportiva, era as 6 horas da tarde. Quem me convidou para participar do programa foi o Professor Rubens Braga. Além dele participavam o Beto Pastor, Edvaldo Tietz. Nessa época eu estava na redação do Jornal de Piracicaba. Eu ia fazer os comentários juntamente com a equipe todo final de tarde, adquiria a Gazeta Esportiva e analisava para os ouvintes as notícias. Naquele ano houve eleições, o Rubens Braga como candidato a vereador teve que se afastar da rádio. Alguns dias depois o Edvaldo Tietz saiu. Logo em seguida o Beto Pastor saiu também. Assim eu fiquei apresentando por um bom tempo esse programa. Após alguns meses fui para a Rádio Difusora no final de 1988 onde permaneci até o começo de 1992.

Na Rádio Difusora você apresentava qual programa?

Na rádio difusora fiz de tudo, na época havia a Central Difusora de Jornalismo, eu cobria a Câmara Municipal, fazia reportagens de rua ao vivo com a famosa Motorola (equipamentos de transmissão externa). Gravava entrevistas de estúdio. Cobria apresentadores que não podiam fazer o programa em determinada data. Tive ali uma grande experiência. Fui assessor de imprensa do Conselho das Entidades Sindicais de Piracicaba (Conespi). Fiz umas inserções do Conespi na Rádio Difusora. Em 2011 voltei para a Rádio Difusora onde fiz o programa “Neder Especial” das 15 às 17 horas, isso até 2012. Era um programa bem eclético. Um musical com inserções populares: receitas; horóscopo; novela; generalidades. Quem participava comigo desse programa era o saudoso José Alexandre de Almeida, o Xandão. O grande projeto que faço em rádio acredito que seja o que estou realizando atualmente na Rádio Educadora. É um programa muito interessante que foi criado por Jairinho Mattos, ele me deu a honra de tocar esse projeto com toda equipe da rádio, é o programa “Novo Dia”. É um jornal da manhã que tem toda a responsabilidade de dar a primeira notícia, o que não é fácil, você tem os fatos que ocorrem na madrugada ou na noite anterior. Tem que ter tudo mastigado, para poder passar para o ouvinte. É um programa muito ágil, tem que ser muito dinâmico, de uma instantaneidade muito grande. Os comentários também, dentro do calor da notícia. Com isso os comentários saem as vezes emocionados, outras vezes com irritação, as vezes comentários polêmicos, mas são comentários daquele momento. Muito ágil do ponto de vista jornalístico, isso foi uma proposta muito interessante da rádio. Fico feliz com a audiência que está tendo desde janeiro de 2014 quando o programa entrou no ar. O programa tem a produção de Maurício Furlan, que tem um trabalho importante. O João de Oliveira que é um baluarte do rádio, na sonoplastia, eu faço a coordenação das notícias, apresento e comento. É um programa que na véspera já estou trabalhando nele, vejo as notícias em minhas fontes e trabalho a forma como vou apresenta-las. Procuro ter acesso a notícia na madrugada, no momento em que acontece. Tenho que fazer um comentário objetivo sobre a notícia que chega. Tem-se que tomar cuidado, conferir as informações antes de divulgar a notícia. Como exemplo posso citar um determinado dia em que cheguei a rádio e deparei com uma sucessão de acontecimentos ocorridos na noite piracicabana. Eventos de violência em vários bairros da cidade. Tomei o cuidado de verificar com as autoruidades responsáveis, fomos apurando e felizmente não era isso tudo, ocorreu um fato isolado que foi propagado com acrescimos e invencionices de uma tragédia. Pura lenda urbana.

A internet é uma fonte preciosa de informações, mas para um formador de opinião pode ser uma armadilha?

A gente tem que tomar muito cuidado. A internet fez surgir uma geração de comentaristas e de profissionais de influência pública que ninguém sabe de onde veio e para o que veio. Tem muitos se auto proclamando como isto ou aquilo, na verdade nunca ninguém ouviu falar. As vezes eles vem com alguns conceitos, algumas teorias que tem dois significados: ou a pessoa está de brincadeira ou tem algum interesse escuso. Quando vem no campo da informação é perigoso.

Os pais ultimamente estão aconselhando os filhos a tomar muito cuidado com a internet, a recíproca também é verdadeira, o pai tem tomar cuidado com o que está vendo?

Ultimamente os adultos estão sendo influenciados por “histórias” da medicina! Tem muita gente de jaleco que está gravando vídeos, dizendo que “comer abacate com cenoura é cancerígeno” ou “se não tomar um copo de água quando acorda irá ter dor nas pernas”, coisas dessa natureza. Isso é reproduzido de uma forma exponencial, quando você adverte sobre a veracidade desse tipo de notícia, muitos ficam tristes. Quem vê a notícia nem sempre percebe a ironia com que ela é colocada. Lógico que a internet tem o seu lado bom. Por exemplo quando não havia a internet e eu queria ouvir o meu Corinthians jogar, tinha que ouvir no rádio, tinha que sintonizar uma rádio de São Paulo, com aquela chiadeira toda, ninguém imaginva que você estava ouvindo alguma coisa. No meio da interferência de outras rádios dava para ouvir alguma coisa. Hoje temos as rádios via satélite, canais a cabo, a internet reduziu todos os problemas. O programa que apresento tem audiência em Portugal, além de que, coloco o programa no you tube, facebook.

Você está na tevisão também?

Estou na TVR – TV Regional, Canal 26 e Canal 526 da NET em Piracicaba. Lá eu apresento Neder Especial que em 2018 estará completando 20 anos no ar. Nesse tempo todo abordamos todo tipo de assunto, das mais diversas formas: médico, economico, político, de caráter geral da sociedade, de interesse público. Eventos sociais também. Fatos marcantes no decorrer da história. Cobertura de shows. Acredito que a graça desse programa é fazer de forma diversificada. Segue um formato padrão sendo maleável quanto as abordagens.

Você participa de algumas instituições de Piracicaba?

Sou tesoureiro do Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba, conselheiro do Clube de Campo de Piracicaba, diretor de Comunicação do Clube Coronel Barbosa, fui presidente por dois mandatos na Sociedade Sírio Libanesa de Piracicaba, de janeiro de 2008 a janeiro de 2012.

Foi uma experiência importante dirigir uma instituição secular?

A experiência ali para mim foi muito importante pelos resultados que alcançamos. Cada um que passa pela sociedade desenvolve um tipo de trabalho prioritário. Deixa uma marca, uma contribuição. A nossa Sociedade Sírio Libanesa tem muito dessa característica porque é a única entidade àrabe-brasileira que nunca parou de funcionar. Nós conseguimos fazer um trabalho muito forte na questão da solidariedade. Da beneficência.

 

LUZIA LOPES E APARECIDA LOPES


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 07 de outubro de 2017

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

http://blognassif.blogspot.com/


http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADAS: LUZIA LOPES E APARECIDA LOPES

 


As irmãs Luzia Lopes e Aparecida Lopes  nasceram em Buritizal, Estado de São Paulo, Luzia no dia 11 de julho de 1928 e Aparecida nasceu no dia 21 de dezembro de 1931 são filhas de Rafael Lopes e Albertina Barbosa Lopes que tiveram além das duas filhas o filho José. Rafael era farmacêutico, nascido na Espanha, imigrou ainda jovem para o Brasil juntamente com sua irmã Maria do Carmo e seu irmão José.  Foi um período em que a Europa estava em face de grandes conflitos. Atualmente as irmãs residem em um flat no Lar dos Velhinhos de Piracicaba. São apaixonadas pela natureza.

Quando o pai das senhoras e seus tios vieram da Espanha foram trabalhar em farmácia?

Não. Só o meu pai já trabalhava em uma farmácia na Espanha, onde se preparou, fez curso, para trabalhar nessa área. No início eles foram trabalhar na roça, quando chegaram ao porto de Santos já havia fazendeiros esperando-os. Os fazendeiros concediam um pedaçinho de terra para eles plantarem o que quisessem, podiam criar animais nesse terreno. Aos pouco eles iam adquirindo mais um pedaço de terra.

Vocês moraram em Buritizal até que idade?

A nossa mãe faleceu muito jovem, a irmã do meu pai, Maria do Carmo, passou a morar conosco e a cuidar de nós. Ela já era casada com Rafael Gonzáles, tinham filhos, morávamos todos juntos. Com o passar do tempo, economizando, meu pai e meus tios conseguiram serem proprietários de uma fazenda. Plantava-se café, feijão, arroz, algodão, tinha uma grande horta. Naquele tempo quase todas as fazendas tinham escolas. Quando venderam a fazenda adquiriram uma casa muito grande, em Nuporanga, e uma fazenda também próxima a casa. Essa casa tem uma singularidade, foi de um dos barões do café, ele perdeu sua fortuna quando a bolsa de Nova Iorque quebrou, em 1929. Permanecemos em Nuporanga até atingir nossos 20 e poucos anos de idade.

Qual era a distração comum aos jovens na Nuporanga daquela época?

Havia um jardim muito grande e bonito na área central, onde eram executadas músicas, havia o cinema, uma parte da nossa família morava em Ribeirão Preto, íamos muito para lá, eles vinha muito para Nuporanga, usávamos o trem da Companhia Paulista de Estradas de Ferro. Era muito gostoso andarmos de trem, passava dentro das cidades. A linha de trem cortava as fazendas, as paisagens eram deslumbrantes: canaviais, arrozais, aquela imensidão de plantação de algodão, quando se abria em plumas brancas era de uma beleza indescritível.

Dona Aparecida, a locomotiva era a vapor ainda?

Era! Vinham às fagulhas pelas janelas, cheguei a queimar uma blusa, saiam aquelas faisquinhas, tínhamos que tomar cuidado com elas. Quando o trem parava em uma estação, descíamos, comprávamos biscoitos, maçãs, peras. Naquela época maçã e pêra eram frutas raras, pareciam pertencerem a outro mundo.

Aparecida complementa:

A fazenda em que moramos era muito rica em frutas. Passamos a chamar de mamãe nossa tia Maria do Carmo, eu tinha 10 meses quando minha mãe biológica faleceu. A mãe que nos criou, era muito curiosa, se comesse uma fruta ela guardava a sementinha no fundo da bolsa, chegando em casa ela enterrava, cuidava, ali nascia uma árvore frutífera! Com isso tínhamos uma variedade enorme de frutas. O pomar era lindo, foi ela que formou, com isso tínhamos uma fartura imensa. Tínhamos leite, fazíamos queijo branco, quanto ao queijo meia-cura havia uma maneira especial de fazer. Havia um quarto grande, onde havia a banca de fazer o queijo, no inicio o queijo ficava para sorar,  Tinha umas prateleiras onde colocávamos o queijo, eram constantemente virados, havia uma tela de proteção contra insetos. Era uma região com tradição na produção de queijos. Muitos negociantes iam adquirir nossos queijos.

Dona Luzia como surgiu a decisão da família ir morar em São Paulo?

Nosso irmão já estava trabalhando em São Paulo, era um dos três proprietários de uma empresa metalúrgica. No início fomos morar no bairro Santa Cecília, próximo a Igreja Santa Cecília, imediações da Avenida Angélica.

Dona Aparecida a senhora permaneceu também em São Paulo?

Como professora eu tinha trabalhado com creches, estudei em Ribeirão Preto o curso Educação Infantil com foco no Método Montessori. Em São Paulo trabalhei em uma creche municipal na Bela Vista, era uma instituição modelar, tinha dentistas, médicos, pedagogas, cuidadoras de crianças. A diretora era uma mulher muito chique, de família muito importante. Uma assistente social conheceu o meu trabalho, chamava-se Heloisa, ela casou-se com o dono da fábrica Vulcabrás, uma das maiores empresas de calçados do país. Situava-se em Jundiaí. A Heloisa foi me buscar em São Paulo, disse-me que na empresa em que ela trabalhava, a Argos Industrial, havia uma creche e ela estava precisando de uma pessoa com o meu perfil. Na época a Argos produzia principalmente o brim, ela especializou-se em jeans, foi na época em que o jeans passou a dominar o mercado. A Arrgos tinha uns 6.000 funcionários, exportava para Itália, Alemha, Estados Unidos. Era uma fábrica completa, entrava o algodão cru e saiam as peças prontas. Na frente da fábrica havia um edificio muito grande, uma parte ficou como ambulatório, com quatro médicos, sendo que um deles era pediatra, tinha desde bebes até crianças com nove anos, era cerca 250 crianças. Junto a indústria havia uma vila de casas para funcionários, sendo dada prioridade a bombeiros, pessoal de manutenção. Todas as casas tinham telefone para emergências. Ali trabalhei como diretora até me aposentar. A fábrica trabalhava as 24 horas do dia. As crianças maiores subiam uma escada já estavam no grupo escolar. A creche fornecia café da manhã, almoço, café da tarde, lanche. Eu morava em São Paulo, mas tinha um apartamento dentro desse prédio.

Entre São Paulo e Jundiaí qual onibus a senhora utilizava?

Usava os ônibus da empresa Cometa.

Dona Luzia a senhora trabalhava em que área?

Trabalhei em diversas atividades, por muito tempo trabalhei em um colégio em Americana, Trabalhava na secretaria do Colégio Divino Salvador, era de freiras. Infelizmente esse colégio não existe mais. Trabalhei muito com assistência a pobres, como voluntária, com essas meninas que trabalhavam como empregadas domésticas e não tinham sequer um documento. Em São Paulo me envolvi muito nessa atividade assistencial.

A senhora trabalhou com Dom Paulo Evaristo Arns, frade franciscano, arcebispo emérito de São Paulo e cardeal brasileiro?

Trabalhei com Dom Paulo, mas não na Catedral da Sé e sim nas paróquias que faziam parte da Catedral da Sé. Conheci muito Dom Evaristo, era uma pessoa muito boa, gostava muito do povo, realizei atividades com jovens, preparando-os para ajudar as pessoas necessitadas.

No período da Revolução de 1964 e o que veio a seguir, trouxe dificuldades ao seu trabalho?

Eu estava trabalhando com esses jovens, passamos por momentos muito difíceis. Havia um cuidado extremo sobre o que iríamos falar com quem iríamos falar, era muito perigoso, havia um controle muito grande, muitos agentes do governo infiltrados, vivíamos o tempo da ditadura. Dom Evaristo era a favor da liberdade, como brasileiro, como cristão. Ele foi muito ativo nesse setor.

Dona Luzia, nesse período havia muitas lideranças políticas, a senhora conheceu algum?

Conheci de longe, bem de longe! Não queríamos envolvimento com política. Sobretudo porque era muito perigoso. As grandes concentrações que eram feitas em frente à Catedral da Sé às vezes assistíamos para conhecer, mas de longe. Nunca subi no palanque! Mesmo entre os jovens havia os que eram revoltados com a situação e outros eram a favor. Todo cuidado era necessário com o que dizíamos.

Sob o seu ponto de vista, naquela época o jovem era preocupado com a questão social?

Era muito preocupado! Hoje o jovem é muito preocupado com a situação social dele, está preocupado exclusivamente com ele. Houve uma mudança muito grande nesse período. A ditadura foi uma coisa terrível. As prisões que eram realizadas,  acompanhamos a prisão de dois filhos de um professor da USP. Não havia unanimidade de opinião dentro da USP, uns eram contra, outros a favor do regime militar. A ditadura impôs um regime de vigilância extremamente eficaz. Sabiam de tudo, escutavam tudo. Um dos filhos do professor desapareceu, só muito mais tarde é que descobriram que tinha sido morto e enterrado naquelas valas onde sepultaram muitos corpos. O outro estava “ruinzinho da cabeça”. Rezamos muito naquela época, Trabalhei muito com cursilhistas, (O Cursilho, também conhecido como Movimento de Cursilhos de Cristandade, é um movimento eclesial de evangelização cristã, surgido na Igreja Católica Apostólica Romana, no seio da Ação Católica Espanhola do início do século XX). Assim como grupo de casais que acompanhávamos. Rezamos o terço inteiro de joelhos, na intenção de descobrir o que estava acontecendo com esses meninos.

Isso foi em qual igreja?

Não era igreja, era nas casas, tudo era muito visado. Houve uma missa que metade da igreja era composta por fiéis e outra metade por policiais. Fazíamos muitas reuniões sem aviso prévio. O perigo estava sempre rondando. Fazíamos reuniões para rezar o terço, vinha o padre para celebrar a missa, era tudo camuflado. Rezávamos não só para o filho do professor, mas para todos os jovens, inclusive para o jornalista Vladimir Herzog, foi uma morte que ficou na cabeça dos jovens, das pessoas.

A senhora chegou a conhecer Sérgio Fernando Paranhos Fleury que atuou como delegado do DOPS de São Paulo ?

Se conheci! Cometeu muitos desacertos! Aprendi a ler jornal quando era criança ainda. Meu tio tinha catarata, naquele tempo para operar diziam que tinha que esperar a catarata amadurecer. Era o tempo da guerra, todos eram acostumados a ler “O Estado de São Paulo”, meu tio pedia para ler para ele, eu estava no primeiro ano escolar, ele me ensiva o significado das palavras que eu desconhecia. Acostumei-me tanto com o jornal que lia do começo ao fim. Tinha os anúncios dos cinemas de São Paulo. Até hoje minha irmã e eu lemos o “Estadão”. Meu pai estava sempre com o Estadão embaixo do braço.

No período em que moravam em São Paulo frequentavam os cinemas?

São Paaulo tinha ótimos cinemas, o Ipiranga, o Cine República, Cine Cairo, eram muitos na região central. Frequentavamos o Mappin, ficamos muito tristes quando o Mappin encerrou as suas atividades. Havia a TELESP na Rua Sete de Abril, era uma beleza de prédio, com muitas cabines  telefônicas para chamadas interurbanas. Dois acontecimentos muito tristes foram os incendios do Edificio Andraus em 24 de fevereiro de 1972  e  Edifício Joelma ocorrido a 1 de fevereiro de 1974  chegamos a presenciar as cenas que ficaram gravadas em nossa memória. Do nosso apartamento dava para ver.



Vocês frequentavam algum clube?

Íamos ao Clube Piratininga, onde havia bailes com orquestras. Usávamos o bonde como meio de transporte. Na Bela Vista havia muitas cantinas lindas, festas italianas. A Rua José Paulino naquele tempo era uma beleza, os judeus dominavam o comércio local. A Estação da Luz era muito linda. Íamos de trem para Santos.

As mudanças ocorridas através do tempo foram positivas?

Com o progresso vieram coisas novas, boas e ruins. A violência aumentou. Não tínhamos o Metrô, que trouxe grande facilidade de mobilidade.

Qual foi a sensação que vocês tiveram a primeira vez que usaram o Metrô logo após a inauguração?

Aquilo foi tão rápido! Nessa época andávamos muito de ônibus, que parava em todo lugar.

Vocês chegaram a utilizar o papa-fila, que era um caminhão rebocando uma carroceria de ônibus?

Chegamos a ver, mas não andamos. Em Santos havia o papa-fila. Andamos muito com o ônibus elétrico. Conhecemos a mansão do Conde Matarazzo, era um casarão amarelo situado na Avenida Paulista. Quando íamos à fazenda comprávamos muitos produtos com a marca Matarazzo: sabão, querosene para lamparina e outros itens. Morávamos no Alto da Lapa, íamos a pé até o Ceasa. Conhecemos o famoso Castelo da Rua Apa, esquina com a Avenida São João, na Santa Cecília. Ali ocorreu um dos crimes mais comentados de todos os tempos, faleceram dois irmãos, ambos eram advogados, e a mãe deles também foi assassinada, três cadáveres e muito mistério que ainda paira até hoje. No centro havia também um restaurante muito famoso, e caro, o Fasano, de Vittório Fasano. No Mosteiro São Bento há uma missa as 9:45 com canto gregoriano. Sempre que possível íamos assistir.

Dona Luzia, São Paulo está em mudança constante?

Com certeza! Trabalhei em um ateliê de alta costura na Rua Augusta, ali eram feitos vestidos finos para a alta sociedade paulistana. A casa da estilista Dener Pamplona de Abreu e a casa do também estilista Clodovil Hernandes eram bem próximas do ateliê em que eu trabalhava. Conheci os dois. No ateliê do Dener ele tinha uma pessoa que forrava o sapato com o mesmo tecido do vestido da moça. Os dois eram muito amigos das donas do atelê, a Dina e a Arlete. Eu sempre ia levar sapatos para eles forrarem.

O Clodovil e o Dener sempre foram rivais?

Sempre! Elas contavam as histórias deles, eram muito engraçadas. Naquela época víamos muitos artistas famosos circulando pela Rua Augusta.

É verdade que nesse meio tem muita fofoca?

E como tem! Escutávamos muitas coisas. Conheci também a Madame Rosita (Rosa de Libman) fez o seu primeiro desfile profissional do Brasil em 1944, era uma pessoa muito boa e humana.

Como a senhora aprendeu a costurar Dona Luzia?

Eu era menina ainda, morava na fazenda, “O Estadão” trazia o Suplemento Feminino, lá ofereceram um curso de costura, minha mãe costurava de tudo, eu queria aprender com técnica, fiz o curso daquele jornal, por correspondência, ali tive as primeiras noções. Eu gostava muito de artesanato, fui aprendendo artesanato: crochê, tricô, bordado. Depois fiz alguns cursos em São Paulo. Surgiu a linha Varicor, hoje é um artigo raro, pois a fábrica Varicor fechou na década de 1970. É um produto lindíssimo com uma qualidade impressionante. Essas linhas fazem parte da história do bordado brasileiro. Um fio 100% Viscose com tons surpreendentes. Foi criada por uma senhora que construiu uma fábrica, ela deu um curso. Assim fui aprendendo sempre coisas novas.

Como são vistos os jovens de hoje por pessoas com a experiência de vida que as senhoras têm?

Infelizmente os jovens de hoje já não se comunicam mais, estão vivendo uma geração onde o apelo da comunicação digital os absorve totalmente. Nós tivemos a oportunidade de trabalhar com muitas pessoas pelo fato de nenhuma de nós não termos casado e não termos filhos.

Dona Luzia a senhora gosta de algum esporte?

- Ela é louca por futebol! Adianta-se a irmã Aparecida. Luzia completa: -Torço para o São Paulo! Tudo começou quando fui fazer um trabalho missionário em uma região muito carente, em Minas Gerais. Estávamos em uma casa, aos poucos foram chegando pessoas muito pobres, que construíam casa de pau a pique coberta por sapé.  As crianças queriam jogar futebol, mas não sabiam, Nem bola tinha. Reuni um grupinho, ganhamos uma bola de futebol, eu fui aprender o que é futebol, os nomes, como se joga, a posição que cada um ocupa para jogar, virei técnica do time. Um moço que jogava futebol veio trabalhar comigo, aprendi e acabei gostando. Em Campinas, em uma região muito pobre, também como missionária,  montamos dois times de futebol, fui até a prefeitura pedir uniformes, ganhamos até as chuteiras. Gosto muito de futebol. Já vi hoje que o Tite vai para a Bolívia, está preocupado com a altitude e no que possa afetar o jogo.  

 

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