terça-feira, março 05, 2019

ANGELO ALBERTO BERTOCCO


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 02 de fevereiro de 2019.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: ANGELO ALBERTO BERTOCCO
 Quem tem o maior número de dados precisos de uma empresa, independente do seu porte, está fadado a fazer as correções necessárias. Ter um histórico que permite prever o futuro. E com isso obter sucesso. Salvo as exceções de filhos pródigos, hábitos dispendiosos e outros meios de gastar mais do que recebe. Atualmente o empresário brasileiro tem uma das mais pesadas cargas tributárias, nossa burocracia é arcaica, com um cipoal de leis, não somos nem práticos nem objetivos. Algumas leis são tão esdrúxulas que o próprio profissional de contabilidade tem que ter um tempo para poder entendê-la.  Conforme narra o escritor Clemente Nelson de Moura em seu livro a História da Contabilidade em Piracicaba, tivemos o privilégio de termos escolas de contabilidade, formando uma base sólida para as empresas. O Professor José Romão Leite Prestes, mudou-se de São Paulo para Piracicaba em 1845, fundou uma escola que chegou a ter 200 alunos. Entre outros ensinamentos os alunos faziam a “escrituração boa e limpa”. Jeronymo José Lopes de Siqueira foi Escriturário do Engenho Central. Outro guarda-livros foi Francisco Pimenta Gomes que a 12 de agosto de 1882 anunciou leilão de bens e vendas de escravos no Tabelião dos Pescadores. Piracicaba teve muitas escolas de contabilidade com excelentes professores: A Escola de Comércio Prudente de Moraes, com sede na Sociedade Beneficente Operária, em meados de 1921, o Professor, Dr, Jorge Canaan fundou na Rua do Rosário o Curso Prático Comercial. Dr. Jorge Canaan, era imigrante libanês, fixou-se no Rio de Janeiro onde estudou contabilidade, e mais tarde formou-se em Direito. Foi grande amigo de Dr. Noedy Kraembhul e Jacob Diehl Neto que sempre o estimou e admirou. Quando Jorge Canaan faleceu Jacob caiu em prantos (há documentação a respeito). Hoje existe em São Paulo a Rua Jorge Canaan, há pós-doutorados realizando pesquisas sobre a importância do seu trabalho (Há documentação a respeito). Grande orador, tinha o brilho que hipnotizava a sessão do tribunal em São Paulo, Rio de Janeiro e Piracicaba.  Outras escolas de Contabilidade abriram e com o tempo encerraram suas atividades. A Escola Técnica de Comércio Cristóvão Colombo inicialmente denominada “Curso Commercial Christovam Colombo” foi fundada em 12 de outubro de 1913 pelos professores Pedro Zalunardo Zanin, diretor, e Adolpho Carvalho, vice –diretor. Pedro Zanin era guarda-livros da Usina Monte Alegre, emprego que deixou assim que fundou a escola. Após funcionar em diversos locais, em fins de dezembro de 1943, passou a funcionar na Praça José Bonifácio, 930, telefone 366. Até 1936 já haviam sido diplomados 440 alunos, sendo que muitos ocupavam funções importantes. Ângelo Alberto Bertocco tem uma estreita ligação com a Escola Técnica de Comércio Cristóvão Colombo. Ângelo Alberto Bertocco nasceu a 20 de outubro de 1932 em Brotas, é filho de Waldomiro Bertocco e Nina Yarid Bertocco que tiveram os filhos Ângelo e Marcus Antônio. 
Até que idade o senhor permaneceu em Brotas?
Até os 14 anos. Estudei no Grupo Escolar Morais, nome dado ao Grupo Escolar de Brotas inaugurado em 15 de janeiro de 1912. Lá estudei até o quarto ano primário. Meu pai sempre trabalhou em comércio, teve bar, sorveteria, confeitaria, Já aos onze anos batia sorvete, fazia sorvete de massa, o sorvete de palito tem o momento certinho do colocá-lo no sorvete. Os sorvetes mais procurados eram o de limão, de massa o creme holandês, coco, coco queimado, abacaxi vendia bem. O sorvete de groselha era de palito. Eram sorvetes feitos com a própria fruta. O bar de propriedade do meu pai chamava-se “Bar Meia Noite”. Trabalhei com o meu pai também quando ele vendia retalhos de tecidos por peso.
Com 14 anos o senhor veio para Piracicaba?
Vim sozinho, de jardineira. Ia até Torrinha e de Torrinha para Piracicaba. Ou então de Brotas até Rio Claro e de Rio Claro para Piracicaba. A estrada era de terra, levantava uma poeira! Quando chovia era um barro só! Aqui fiquei na casa de uma madrinha minha Tereza Cardinalli. Dia 20 de outubro de 1947 completei os meus 15 anos de vida. Minha madrinha foi embora para São Paulo em 31 de dezembro de 1948. Fiquei um ano e pouco na casa dela. Nesse meio tempo trabalhei em lanchonete no “Café Broadway” ao lado do Cine Broadway. Logo ali na esquina da Rua São José com a Rua Alferes José Caetano era a Funerária Libório. Trabalhei em bar, em uma loja “Casa São Carlos” ficava na Rua Governador Pedro de Toledo, entre a rua Rangel Pestana e a rua Pedro II, era do Sr. Antonio Tanus. No início o Sr. Antonio achou que eu não estava preparado para vender roupas finas. Com o tempo fui me aperfeiçoando, depois ele não queria que eu saísse da loja. Nesse tempo eu estava fazendo a primeira série na Praça José Bonifácio, 930, na Escola Técnica de Comercio Cristóvão Colombo. A filha do Seu Zanin era Dona Evelina Zanin. Em 15 de maio de 1939 faleceu Pedro Zalunardo Zanin, assumiu a direção da Escola seu filho, o Contabilista Antonio Ítalo Zanin. Fui falar com Seu Antonio Zanin, que era o diretor, disse-lhe que teria que sair da escola. Ele queria saber o porquê, expliquei, ele disse-me: “Você não vai embora, vai trabalhar aqui!” Passei a trabalhar como auxiliar de secretaria. Eu já estava na segunda série. Nesse período minha madrinha estava mudando para São Paulo, Seu Antonio disse-me: “Eu arrumo um lugarzinho para você aqui.” Era um quartinho. Conclusão lá eu morava, trabalhava e estudava! A Escola foi para mim uma família!
No tempo em que o senhor trabalhou na Escola Cristóvão Colombo ela ficava em qual local?
Ficava na Praça José Bonifácio, existia o Cine Politeama, ao lado o Passarella, que era famosa pelas balas e doces, hoje acredito que no local foi construído o estacionamento do Bradesco. Um pouco depois do Passarella era a Escola. O prédio foi derrubado para construir o Banco Itaú. Antes, ao lado da escola, para quem olha na entrada, do lado esquerdo havia uma pastelaria. Estava ainda instalado naquela quadra o Cartório do 2º Ofício. Tendo à frente Mozart Aguiar e Cícero Portela. Entre o Cartório e a pastelaria, havia um corredor que dava acesso a uma escada. Ali era a Escola Cristóvão Colombo. Eram dois andares.
Quantos alunos frequentavam a Escola Cristóvão Colombo?
Chegou a ter 600 alunos! Havia sete classes de manhã, três classes a tarde e sete classes à noite. Os cursos eram: Comercial Básico e Técnico em Contabilidade. Esses dados eu sei porque fui subindo de posto, comecei como auxiliar, passei a Secretário, ajudava alunos em aulas, cheguei até a responder pela Diretoria quando seu Pedro faleceu.
Havia um controle rígido de presença de alunos?
Havia! Era uma escola com excelentes professores. Naquela época havia outra escola de contabilidade no Instituto Piracicabano e na Vila Rezende, na Escola Imaculada Conceição, que os alunos encarregaram-se de denominar “Escolinha do Carequinha”. Coisa de aluno. Eu não cheguei a conhece-lo, mas havia um escultor, Cienfuegos, que esculpia em madeira belíssimos quadros, verdadeiras obras de arte, com o local próprio para colocar a fotografia do formando. A ESALQ conserva muitos desses quadros com as fotos dos seus formandos.
Em que ano o senhor saiu da Escola Cristóvão Colombo?
Saí em 1980. Em 1984 a Escola de Comércio Cristóvão Colombo encerrou suas atividades. Um dos grandes professores foi o Dr. Frederico Alberto Blaauw. O Monteiro, da Casa Monteiro situada na Avenida Rui Barbosa, era um dos alunos que acompanhavam as aulas do Professor Blaauw com a máxima atenção. Não faltava de jeito nenhum. Aprendeu, formou-se contabilista e hoje atua no comércio. O Monteiro foi um dos alunos que eu admirava. O aluno aprendia português com o Professor Blaauw. A Escola Cristóvão Colombo primava pelos seus professores, Professor Acácio de Oliveira Filho, Affonso José Fioravante, Alfredo do Amaral Filho, Antonio Romero, Antonio Buco, Deusdedir Gobbo. Dr. Aurélio Scalise, Geraldo Bragion, Lourdes Aparecida Rocha Carvalho, Nazira Graciema da Silva, Thales Castanho de Andrade, Benedito de Andrade e muitos outros nomes de peso. Com isso, os alunos tinham um ensino de alto nível. Grandes empresários, comerciantes, industriais, executivos, saíram dos bancos da Escola de Contabilidade Cristóvão Colombo entre muitos Pedro Caldari, Tarcísio Mascarin, tinha muitos alunos que trabalhavam no Dedini. O pai do Olênio Veiga, mestre do violino, avô do Dr. Ivan Veiga foi um excelente professor de português. Humberto D`Abronzo formou-se lá. Justo Moretti, professor da ESALQ, estudou lá, outro grande violinista.
Algum religioso estudou na Escola Cristóvão Colombo?
Lembro-me de duas freiras, Irmã Hortência e Irmã Ana, iam às aulas com o habito de freiras. Muitos militares cursaram a escola. A Escola de Comércio era para dar ferramentas para trabalhar.
Existe ainda o arquivo da escola?
Os documentos todos da escola foram encaminhados para a Delegacia de Ensino. Uma vez precisei de uns documentos, havia dado uma enchente e danificado tudo.
A que horas a escola iniciava as aulas?
Eu que abria a escola. Os horários eram: das 8:00 às 11:00; das 14:00 às 17:00 e das 18:00 às 21:00 horas. No curso tinha aulas de datilografia até a terceira série, Havia aula de taquigrafia, Quem era muito bom em taquigrafia era o Telmo Otero, ele que lecionava taquigrafia. Muitos estudantes da Escola de Agronomia vinham cursar a noite a Escola Cristóvão Colombo.
Como era o Sr. Zanin?
Era muito querido pela cidade, tinha inúmeras amizades, não fazia distinção de classe, conversava com todos, sabia dialogar. Ele residia na Rua Governador Pedro de Toledo, próximo à rua Gomes Carneiro.
O senhor é uma pessoa muito considerada em Piracicaba.
Na escola sempre fui, e fora da escola também. Naquela época trabalhava de terno, gravata. Quando iniciei a Escola Cristóvão Colombo ficava na rua Governador Pedro de Toledo quase esquina com a rua XV de Novembro. Próxima onde hoje há uma farmácia na esquina, quase em frente a Sociedade Sírio-Libanesa. O prédio era da família Testa, foi demolido. Minha função era a de secretário, mas cheguei a ser tesoureiro da Escola. O porteiro é quem varria a escola inteirinha, quando ele faltava, eu até varria a escola. O Seu Zanin sempre foi muito bom para mim. Eu que recebia dos alunos, na falta de tesoureiro, muitas vezes sentava com o aluno e escutava as suas dificuldades. Uma vez eu estava atravessando o jardim da Praça José Bonifácio, veio um rapaz, apressado, e disse-me: “Seu Bertocco, tenho que agradecer muito o senhor, eu estava para sair da escola, o senhor não deixou, eu não tinha dinheiro, o senhor deu um jeito”. Para dizer a verdade, chorei junto com ele!. Tão logo fui admitido na escola como secretário, procurei atualizar o cadastro dos alunos, alguns nomes estavam com grafia diferente do documento apresentado. Consegui colocar um uniforme para a escola.
Como era o uniforme da escola?
 Camisa branca e calça marrom. As moças com saia marrom e blusa branca. O emblema da escola era colocado nas camisas e blusas, quem desenhou o emblema foi Edson Rontani! O Edson foi um grande amigo, participava das festas da escola. A escola tinha o seu brazão, bandeira. Tudo desenhado pelo excelente Edson Rontani. Tínhamos um grêmio, fazíamos excursões, passava cinema na escola. Palestras. Tudo isso eu consegui fazer.
Em desfiles cívicos a escola participava?
Participava! Até hoje sinto falta. Foi tudo construído com muito carinho, era uma outra época, dificilmente haverá algo parecido. O professor entrava na sala de aula os alunos levantavam-se, aguardavam a ordem para sentar. O Professor Andrade nunca fez chamada por número, sempre pelo nome.
A escola proporcionou conhecimentos que resultaram em casamentos?
Tinha um grande número de moças e rapazes. Nada mais natural do que resultasse em um bom número de casamentos!
Os alunos daquela época costumam visita-lo em sua casa?
Ganhei uma gravação com mais de 400 músicas de Roberto Carlos! Um ex-aluno fez uma pesquisa, por uns quatro anos, das gravações internacionais e nacionais do Roberto Carlos, ficou excelente. Recebo a visita de muitos ex-alunos da Escola Cristóvão Colombo. Fiz o cursilho, com essa experiência formei um movimento religioso dentro da escola: Juventude Estudantil Cristã – JEC. Fazia reuniões no Seminário Seráfico São Fidélis ou no Seminário da Nova Suiça. Participavam uma centena de pessoas. Ou até mais.
O senhor morou quanto tempo na escola?
Morei cinco anos. Depois casei com Elza Ochiusi Bertocco e fomos morar na Rua XV de Novembro. Vivi com a minha esposa 60 anos, 4 meses e 14 dias casados. Manoel Lopes Alarcon foi meu padrinho, era seresteiro. Conservo até hoje uma coleção de medalhas, certificados, que ganhei por estimular o esporte entre os nossos jovens. O bispo na época era Dom Aniger Francisco Maria Melillo. O Cecílio Elias Netto exerceu por muitos anos a função de Reitor do Cursilho. Após deixar a Escola Cristóvão Colombo, tive um pequeno escritório, todos que ali trabalharam estão muito bem.
O senhor é detalhista?
Quando o assunto me desperta o interesse sou detalhista.
O senhor já ganhou o título de cidadão piracicabano?
Não. Ganhei o título de Contabilista do Ano. Além de uma profusão de medalhas, troféus, Moro nesta casa desde 1957.
No escritório dependurada, a gravura de um jovem, pergunto quem é.
Eu! Foi uma pintura de Edson Rontani! Mais acima outro quadro temático de Edson Rontani.
As festas de formatura eram realizadas em qual local?
Geralmente no Teatro São José. Ângelo Alberto Bertocco do alto dos seus 87 anos dirige o seu veículo, sendo que a sua vaga na garagem possivelmente desafiaria muitos motoristas com experiência. O seu raciocínio rápido e sua memória prodigiosa, mostra como o ser humano pode e deve agradecer os anos vividos. A simpatia de Ângelo Alberto Bertocco possivelmente é a mesma como sempre tratou os alunos da gloriosa Escola de Contabilidade Cristóvão Colombo, a nossa querida Escola do Zanin.

ANTONIO VALENTIM BERTIM (Mazzola)


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 26 de janeiro de 2019.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
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ENTREVISTADO: ANTONIO VALENTIM BERTIM (Mazzola)

Antonio Valentim Berttin nasceu a 11 de fevereiro de 1938, às 8:00 horas da manhã, natural do bairro rural Cillos, município de Americana. Hoje essa região pertence ao município de Nova Odessa.  Antonio é um homem de larga experiência de vida, dinâmico, Gosta de trabalhar. Aposentado, ainda faz visitas a alguns cliente-amigos, pelas cidades próximas. Ele mesmo dirige seu veículo. Já não se arrisca a longas viagens como fazia antigamente, nem vai mais a sua querida Curitiba, onde tinha um amigo, o Professor Dalton Áureo Moro, cujo filho o Sérginho é hoje o Ministro Dr. Sérgio Fernando Moro. Antonio Valentim Berttin é filho de Primo Berttin e Carolina Angela (Tegon) Berttin, que tiveram quatro filhos: Olga, Zilda, Irene e Antonio. Seu pai era empreiteiro de mais de cem alqueires de cana-de-açúcar, que ficava aos cuidados da família, tios, totalizando 17 pessoas. Formava uma colônia. Tinha uma água que vinha da nascente, fizeram um condutor de bambu, a água passava na porta da cozinha, caía dentro de uma caixa, servia também para irrigar a horta. Em Santa Bárbara d´Oeste, todos os sábados seu pai ia ao barbeiro fazer a barba, depois ia trocar uma prosa com os amigos em um bar que havia no centro da cidade, de onde moravam até lá dava uns seis quilômetros, iam de carrocinha.
O senhor estudou em qual escola?
Até o quarto ano primário estudei no Cillos, minha primeira professora foi Maria Amélia Camargo, a segunda professora foi sua irmã Aída Camargo, no terceiro ano foi Dona Maria Helena depois veio Dona Judite. Após concluir o quarto ano fui trabalhar em uma fábrica de tecidos de propriedade do Sr. Ítalo Scuro. Eu tinha 12 anos, fui registrado, tudo conforme a legislação, Aposentei-me com 48 anos. Aos 12 anos fazia trama para fazer tecidos. Aos 14 anos passei a ser tecelão, já na fábrica de Roviglio Antonio Cordenonsi. Foi quando meu pai faleceu aos 45 anos. Permaneci por um ano aproximadamente na tecelagem, em seguida fui trabalhar com Geraldo Gobbo. Estudava em uma escola situada atrás da Matriz antiga de Americana. Nas proximidades tinha a Fábrica de Adubo do Zanaga, que espalhava as vezes um odor desagradável. A Basílica Santuário de Santo Antônio de Pádua é o maior templo católico construído ao estilo neoclássico no Brasil, conhecida como “Catedral Nova”, ocupa um quarteirão quadrado, ali foi um colégio de freiras. Pasei a estudar como torneiro mecânico em Campinas, trabalhava na tecelagem das cinco horas da manhã até as cinco horas da tarde, saía, correndo, tomava banho, ia até a estação da Companhia Paulista de Estadas de Ferro de Americana. Pegava o trem as 23:03 em Campinas de volta, chegava em casa meia noite, meia noite e pouco. As quatro horas da manhã me cutucavam, para levantar e ir trabalhar. Fiz isso por dois anos. Continuei os estudos em Piracicaba e me formei na Escola Coronel Febeliano da Costa Piracicaba, conhecida na época como Escola Industrial.
Como o senhor veio morar em Piracicaba?
Decidi batalhar por minha conta, a princípio iria para Campinas, estava à espera da condução, quando vi o ônibus que vinha para Piracicaba, como eu tinha parentes aqui, os Moniz, decidi pegar esse ônibus. A família Chiquito são meus parentes, uma dessas tias tinha criado o meu pai, quando o meu avô faleceu. Muitos anos depois, meu pai pegava o trem na Estação Cillos, toda vez que fazia linguiça trazia para essa minha tia. Na safra de feijão ele vinha da Estação da Paulista até próximo ao Seminário Seráfico São Fidelis com o saco de 60 quilos de feijão nas costas.
Aqui em Piracicaba o senhor foi trabalhar em qual empresa?
O Gino da AVA Auto Viação Americana, era muito meu amigo. Quando desci do ônibus, na agência AVA, próxima onde hoje é o Edifício Canadá, na esquina da Rua Santo Antonio com a Rua Prudente de Moraes, encontrei-me com ele que perguntou-me: “O que você está fazendo aqui menino?” Disse-lhe que eu havia tido uma desavença em casa, e que precisava arrumar um emprego de torneiro mecânico. O Gino Disse-me: “Tem uma pessoa no Dedini que é gerente e me deve muita obrigação, vai lá e diz que eu pedi para arrumar-lhe um emprego!”.  Fui, a pé, até o ponto final do bonde da Vila Rezende. Cheguei lá, pedi para chamar o gerente, expliquei o que o Gino tinha dito. Eles respondeu-me: “Não posso negar nada para o Gino! Mas eu não tenho lugar para você aqui! Você vai na MAUSA fala que eu mandei, eles estão precisando de um torneiro mecânico lá!”. Mandou que pegasse o bonde de volta e perguntasse ao Gino onde era o prédio da MAUSA, pois eu não sabia. Voltei a pé da Vila Rezende, perguntei ao Gino, ele me explicou. Quando cheguei, já tinha sido combinado com o Artemio Bottene, tinha terminado de acertar para no dia seguinte começar a fazer a experiência. Nisso o Toninho, amigo do Gino, que tinha me atendido na Dedini, chegou com seu automóvel Galaxie perguntou-me: “Filho! Você tem onde ficar?”. Falei que pretendia ficar na casa da minha tia Pina Chiquito. Ele mandou-me entrar no Galaxie, disse-lhe que meus pertences estavam no Gino, e o Toninho me levou na casa da minha tia. Ela era a irmã mais velha do meu pai. Ela nasceu na Itália, meu avô Antonio após algum tempo no Brasil, as trouxe: Clementina, Pina, Marieta e Antonia, vieram da região de Veneza.
Voltando ao ingresso na MAUSA o senhor continuou seus estudos?
Conclui o curso, o terceiro ano, no Industrial. O meu professor de português era Orlando Veneziano. 
Quem era o seu chefe na MAUSA?
Era hábito cada um ter o seu apelido próprio, meu chefe era conhecido como “Galo”. Se perguntar por Bertim ninguém sabe quem é, mas se perguntar por Mazzola a cidade inteira sabe quem é.
Por que o apelido do senhor é Mazzola?
O jogado de futebol Mazzola estava no auge, fisicamente eu era parecido com o jogador. Até hoje os conhecidos daquele tempo me chamam de Mazzola. Fui candidato a vereador duas vezes com o nome “Mazzola”. A primeira vez tive mais de 400 votos, só que o partido era muito forte, prevaleceram outros candidatos. A segunda vez foi com o João Hermann Netto candidato a prefeito e José Borghesi candidato a vice-prefeito. Eu vendia grade para aradora que o João fabricava, para o José Borghesi eu vendia elásticos, cordas de varal e cordas de amarrar caminhão. Através do José conheci o João.
Voltando a sua admissão na MAUSA, o senhor continuou morando com a Tia Pina?
No dia seguinte o Toninho me levou para ficar na “Pensão da Vó”, era assim conhecida a pensão que ficava em frente ao Laticínio Noiva da Colina, que ficava na Rua São João e Rua XV de Novembro, A “Pensão da Vó” era na Rua XV de Novembro. Hoje tem um prédio grande onde era a pensão. Isso foi em 1956, em 1958 eu arrumei uma namorada Laila Chuhi, casamos em 24 de maio de 1959. Infelizmente a sua família não apoiava o nosso namoro. Na época a Avenida Independência era terra ainda. Eles tinham uma mansão depois da Santa Casa. Eram muito ricos. Eles tinham fábrica de calcário. Onde era o salão da MAUSA que hoje está desativado, na Rua D. Pedro ali eles só processavam o produto.   Tinha a MAUSA funcionando na Rua Santa Cruz. A mina de calcário era na Estrada de São Pedro, na fazenda deles. Surgiu uma oportunidade para que eu fosse trabalhar em Jundiaí, na Vigorelli, fábrica de máquinas de costura. Eu trabalhava no período da noite, das 22:00 às 6:00 horas. Meu sogro foi fazer-nos uma visita, e viu que nossa situação financeira não era das melhores. Disse que estava abrindo uma empresa em Piracicaba, ia falar com eles. Dali uns dias ele voltou. Viemos de volta para Piracicaba. Provisoriamente fiquei na garagem da casa dele. Ele foi falar com Leonildo(Borrachudo) Checoli, irmão do Paulo. O Borrachudo perguntou ao meu sogro se por acaso o seu genro não era o Mazzola. Ele pediu para o meu sogro me trazer o mais rápido possível. Fiz o teste, passei, e comecei a ganhar o dobro do que ganhava em Jundiaí. Eles tinham um Torno de Revolver Automático que ninguém conseguia virar. Eu sabia porque tinha aprendido na MAUSA. Assim fui trabalhar na Auto Pira S/A Indústria Comércio Peças. Nessa época eu morava na Rua Aquilino Pacheco. Saí da Auto Pira e fui ser corretor. Eu saia da Auto Pira e ia vender o carnê Erontex, o Carnet da Sorte, nome comercial da Empresa Brasileira de Comércio Exportação Ltda. Fundada na década de 50 por Eronides Alves de Oliveira, conhecido por Eron, vendia carnês que sorteavam prêmios e distribuíam cortes de tecidos.
O senhor percebeu que era bom de vendas?
 Batia de porta em porta, no fim ganhava mais do que na Auto Pira. Surgiu o Hospital São Lucas em Americana, com o cunhado do Chafi Elias Aidar, pai da psicóloga Edazima Aidar, ao mesmo tempo fiquei cobrador do Bela Vista Nauti Clube, cobrava só os sócios com pagamento atrasado. Acabei conquistando a simpatia dessas pessoas, a ponto de muitos deixarem de pagar no dia correto pela atenção que eu dava quando ia receber. Não sei explicar, mas aumentou muito o número de sócios que só pagavam as mensalidades atrasadas. O empreendedor, que construiu o clube era o Luiz Guidotti, conhecido pela sua precisão em atirar. Ele colocava uma pessoa segurando um cigarro nos lábios e cortava o cigarro com um tiro de revólver. Apresentou-se várias vezes na televisão, era conhecido como “Rei do Gatilho”. Ele não estava nem um pouco satisfeito com o rumo que os pagamentos dos sócios estavam tomando. Todos os domingos eu saia de casa, ia a pé com a minha cestinha fazer compras no Mercado Municipal. Encontramo-nos lá, ele estava irado, disse que o pessoal estava pagando atrasado por minha causa, e descarregou uma série de ofensas, O mercado parou. Embora soubesse que ele estava armado, respondi-lhe a altura. O dono da banca em que estávamos em frente tremia, sabia que algo grave poderia acontecer. Continuei vendendo Erontex. Aí surgiu o loteamento das chácaras acima do Carrefour. Era do dono da Casa Espéria. Vendi muitas chácaras. Fundaram o Hospital Regional São José de Campo Mourão, Paraná. Como eu já tinha vendido filiação para os associados em Americana, naquela época não havia plano de saúde, você comprava a cota e ficava sócio do hospital. Fui de avião para Campo Mourão, Todo dinheiro que eu tinha deixei coma minha mulher, Fui com o dinheiro da passagem e o suficiente para ficar uns dois dias na cidade. Colocaram-me em um avião errado em São Paulo! Era avião da Redes Estaduais Aéreas Ltda. - Real Transportes Aéreos! Fui parar em Curitiba! Dessa maneira que conheci Curitiba. Depois por 27 anos trabalhei visitando clientes em Curitiba. A Real pagou o hotel, onde fiquei até o dia seguinte, quando teria voo pra Campo Mourão. Isso foi no dia em que nasceu o meu filho. Tivemos três filhos: Wagner, Silvia e Adriana. Quando desci em Campo Mourão, a pista de pouso não era asfaltada. Do aeroporto até a cidade dava uns dois quilômetros, pensei em ir a pé. Quando sai na estrada era um lodo só. Parou um homem dirigindo um Simca, perguntou se eu queria carona. De repente o carro encalhou, descemos para empurra-lo. Ele perguntou-me qual era a finalidade da minha ida, quando falei que fui para vender títulos do Hospital São José, ele disse que várias empresas já haviam tentado, trazendo prejuízos aos compradores, faltou honestidade dos vendedores. Ele era dono de uma casa lotérica, fui até o hotel, deixei as minhas coisas e fui até o escritório da empresa, onde tinha um funcionário me esperando. Os demais corretores tinham arrumado uma confusão e estavam me esperando detidos na delegacia. Fui até uma papelaria, peguei um talão de recibo, naquela época vendia-se talão de cheque em papelaria. Adquiri um. Você colocava o nome do banco, o número da conta do cliente, ele assinava, você ia a agência em que ele tinha conta e recebia. Comprei ainda um talão de Notas Promissórias. A entrada de cada plano era de 2.500,00 cruzeiros. Fui até a delegacia, no caminho fui vendendo planos, tinha vendido quatro títulos do hospital. Encontrei-me com Osvaldo Bená, que tinha sido meu barbeiro em Piracicaba, a barbearia dele ficava em frente à Igreja Bom Jesus. Havia a carência de um hospital, os médicos faziam consultas de forma precária, no hotel. Permaneci por 40 dias em Campo Mourão. Arrumei um parceiro que conhecia toda a região, fomos de jipe até uma localidade próxima, fomos até uma farmácia, lá vendemos ao farmacêutico um título de fundador. Tinha um homem sentado nos escutando, Ele nos convidou para ir até o escritório dele, era uma serraria enorme, tudo movido a água. Ele moia madeira para fazer compensado ou aglomerado. Ele pediu-me que repetisse o que tinha dito na farmácia. Disse que iria até o local onde o hospital estava sendo construído, se fosse verdade iria comprar um título para cada funcionário, eram mais de 100 funcionários. Fechamos o negócio. Fui ao hotel, paguei a minha conta e fui até o aeroporto onde alugava-se taxi aéreo, estava lá o Paulo Poli, que era deputado da região. Pedi para ele me levar para Maringá. Em Maringá peguei outro avião da Real que descia em Londrina. Vim para São Paulo, em seguida para Piracicaba.
Aqui o senhor continuou trabalhando como corretor?
Fui vender para o Seu Hermínio Petrin uma chácara, ele disse-me que eu era um vendedor especial, deveria trabalhar com um produto que rendesse um pouco todo dia. Recomendou-me para ir falar com seu filho, Júnior, “Fala que eu mandei ele dar dinheiro para você viajar e dar um itinerário para você. Você vai vender balas Atlante”. (Bons produtos garante. Era o slogan). Ele me deu 30.000,00 cruzeiros. Deixei 25.000,00 cruzeiros com a minha mulher. Comecei a fazer as vendas em Tietê. O primeiro lugar em que entrei já vendi. No fim da semana estava em Sorocaba. Eu não tinha carro, ia de ônibus e a pé. Eu dormia no jardim, para não pagar hotel. Deixava minhas coisas guardadas com um dono de um bar onde parava o ônibus de Sorocaba. Uma madrugada ele passou, me viu sentado no jardim, perguntou o que eu estava fazendo ali, respondi que estava descansando um pouco, não tinha como pagar pensão. Ele me levou para a casa dele. Ele era japonês. Fiquei três dias em Sorocaba, dormia e comia na casa dele. Fui para São Roque, e cidades próximas. Quando voltei para Piracicaba, no final da semana, eu tinha 7.000 quilos de balas vendidas. Era uma carga dos caminhões da época. O Júnior pagou metade da comissão adiantada. Comecei a vender outras coisa também, vendia gaiolas para o João Canomena, eram as Gaiolas Piracicabana. Em 1966 eu comprei uma Lambretta com cardam, ia daqui até Brasilia, coloquei um porta mala, onde ia minha mala, e a pastinha com as amostras de balas ia na minha frente, até Uberlândia era asfalto, De Uberlândia para frente eu ia de ônibus. Deixava a Lambrtetta guardada em algum lugar já combinado. Ia até Goiás Velho. Quando João Goulart caiu, eu estava em Brasília. Tinha sete ministérios, eu vendia para as lanchonetes dos sete ministérios. O irmão da minha mulher, meu cunhado, Eduardo, era ajudante de ordens de João Goulart. Esse cunhado gostava do meu esforço. Ele morava em um apartamento, eu dormia na sala. Quando João Goulart caiu, ele disse-me que teria que levar o presidente deposto e eu teria que sair do apartamento. Foram ele, o filho de Assis Brasil e João Goulart, até o Uruguai. Voltaram para o Brasil, o filho de Assis Brasil foi morto, e o meu cunhado foi preso. Depois por uns tempos ele ficou morando na fazenda do Gibran Athié Coury, ficou uns seis meses, preparou a defesa dele e foi para Brasília. Teve todos os seus direitos restituídos, foi promovido, foi quatro vezes deputado, e por dois anos Governador do Rio de Janeiro.
O senhor vendia em Curitiba também?
Em Curitiba, passava, fazia a clientela e seguia em frente. Lá eu vendia implementos agrícolas, ração de sabiá, gaiolas. Tinha um fornecedor de gaiolas de São Paulo, chamado Páscoa Eram gaiolas bonitas, coloridas. Vendia os produtos do José Borghesi. no dia em que caiu o governador de Goiás, Mauro Borges afastado por intervenção federal após o golpe de 1964, tendo seus direitos políticos cassados em 1966. Fiquei apavorado, apareceram soldados de todos os cantos, paraquedistas, apareceu um carrão, desceu um militar que deu ordens: “Algeme o Mauro! Algeme todo mundo, menos esse menino! Ele que saia daqui agora!” Como eu vendia sabão Rabeque, de Itatiba, após 60 dias fui para Brasília, pegava o ônibus em Campinas. Vendia no SAPES era uma divisão de abastecimento, assim como o SESI também foi. Seu José, gerente do SAPES disse-me que eu tinha que falar com o Coronel Carlos de Meira Matos. Deu-me o endereço. Fui lá. Dali a pouco ele chegou. Disse: “- Meu Deus! Menino entre!”. Ele disse-me que no dia da tomada do palácio, foi de muita tensão, e ele havia me tratado rispidamente. Perguntou-me o que eu desejava, disse-lhe que o Seu José havia me mandado, eu precisava vender sabão. Ele disse-me: “Você tem que ir em Uberlândia, procurar tal pessoa, fale que eu mandei ele comprar o seu sabão!”. Pegou o telefone, ligou e disse: “Luzia! Hoje eu estou feliz! O menino da bala está aqui e ele vai almoçar conosco.”. Em Uberlândia fui procurar a pessoa indicada. Ele perguntou se eu tinha amostra, testamos com água. Acertamos os detalhes, ele comprou uma quantidade de sabão que na história ninguém vendeu até hoje! Três vagões da Mogiana! Com esse dinheiro, eu tinha já adquirido o terreno, comprei todo material para construir a minha casa. Na Casa Perianes Materiais Para Construcao Ltda. Trabalhei por 50 anos com as confecções Elite, de Matão. Quando começamos, tinha eu, como vendedor, o Lourenço, e quatro funcionários. Hoje tem 1500 funcionários, só no escritório tem mais de 50 pessoas. Atualmente uso muito o Facebook e o WhatsApp.
A história de Mazzola, é muito rica em detalhes, edificante pela sua garra em vencer com determinação e trabalho, e talvez o principal fator é que ele é um profundo conhecedor da natureza humana. Sabe como tratar cada um, da forma que gosta de ser tratado. Seu sucesso é consequência dessa soma de fatores. Há um ditado popular que diz: “Se um cavalo selado passar perto de você, suba porque pode ser que ele passe apenas uma vez”



io de Peças

domingo, março 03, 2019

GUILHERME GRANADIER


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 08 de dezembro de 2018.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: GUILHERME GRANADIER

Um dos hábitos costumeiros, tão logo aumentou o número de usuários de telefone, era o de telefonar para o então “empório” ou “armazém” mais próximo de casa. A mulher geralmente com grande prole, fazia o pedido das suas necessidades mais urgentes para realizar a alimentação do dia. Normalmente era algum complemento que faltava: fermento, tomate, sal, margarina, e outras pequenas coisas. Geralmente um garoto de bicicleta fazia a entrega, cada cliente tinha a sua forma de pagar: uns pagavam quando recebiam o salário, outros pagavam na hora da entrega. Esse habito ainda permanece, principalmente nas cidades do interior. Só que foi repaginado: o pedido pode ser feito por telefone ou mensagem eletrônica, a entrega é feita com veículos automotores, levam mais produtos a uma distância maior. Na era dos grandes supermercados, esse é um nicho interessante para ser estudado. Como velhos hábitos, permanecem, mudam de roupagem   Nesse tipo de relação o contato entre fornecedor e cliente é baseado principalmente na confiança mutua. O cliente sabe que irá receber em casa um produto com qualidade e de uma forma tão prática como pedir uma pizza! O perfil matriarcal, em muitos casos mudou. A numerosa família deu lugar a um número menor de filhos. Em contrapartida, muitas mulheres trabalham em algumas atividades externa:  são profissionais liberais, dentistas, médicas, advogadas, administradoras, ocupam cargos importantes. Quem fica em casa é a tão valiosa “secretária” nome carinhoso dado às prestadoras de trabalho doméstico. Elas de certa forma assumiram a função de “dona-de-casa”. Há também as pessoas que tem dificuldade de locomoção, por alguma razão, ou volume de compras é pesado. Ou até mesmo pela praticidade dessa prestação de serviço. Enfim esses locais atendem com muito zelo os seus clientes, sabem que o cliente tem que ser conquistado pela gentileza, sinceridade, preço justo. Cria-se uma relação de amizade. E de fidelidade. 
Em Piracicaba, os Irmão Granadier, acreditaram nessa ideia. Isso há algumas décadas. O patriarca, Guilherme Granadier, do alto dos seus 88 anos, os quais não aparenta, ainda circula com desenvoltura por entre bancas de frutas, conhecido e estimado pelos clientes, diariamente marca sua presença. Torcedor do São Caetano Futebol Clube, da cidade de São Caetano do Sul, e como não poderia deixar de ser. torce também pelo XV de Novembro de Piracicaba. Foi esportista, praticava esporte durante uma hora e meia: meia hora de corrida, meia hora de educação física e meia hora de futebol de salão, no Ginásio do São Caetano. Guilherme Granadier é natural de Santo Antonio de Posse, onde nasceu a 21 de novembro de 1930. Quem nasce em Santo Antônio de Posse é. Possense. São seus pais: João Granadier e Maria Covolo. Tiveram oito filhos: Antonio, Luis, Augusto, Francisco, José, Guilherme, Geraldo e Maria Aparecida.
A família trabalhava em que área?
Naquela época trabalhávamos como meeiros na fazenda de Mário Venâncio. Plantava principalmente café. Era tudo estrada de terra, Para tomar o trem tinha que ir até a estação usando charrete, cavalo. Deixava os animais na Estação de Santo Antonio de Posse e ia geralmente até Jaguariúna, na época uma cidade pequena.
Como foi a infância do senhor?
Foi boa, até que quando eu tinha treze anos a minha mãe faleceu. Meu pai ficou extremamente abalado, sendo que dois meses depois ele faleceu. Ele tinha sido operado da hérnia em Campinas, era uma época em que os médicos de uma forma geral, não explicavam aos pacientes os procedimentos a serem tomados no pós operatório, com os detalhes necessários. Aliado a isso, a família, possivelmente para poupá-lo em sua enfermidade, não o comunicou do falecimento da sua esposa. Meu pai era imigrante alemão, nasceu em Berlim, um homem de físico avantajado. Naquele tempo, quando falecia alguém da família usava-se roupa preta. Quando ele chegou em casa ficou sabendo da morte da minha mãe. Apesar de ser um homem muito forte, o choque foi muito grande. Ele perguntou à um dos meus irmãos o que tinha acontecido. Meu irmão respondeu: “-Morreu a mãe!”. Foi como se alguém o apunhalasse. Meu tio, João Malavase, residente em Perus, veio buscar o meu pai, mas não adiantou nada. Nós estávamos muito bem, tínhamos fartura, todos da família trabalhavam, tínhamos de tudo, criação, plantações, paiol cheio.
O senhor tinha um cavalo seu?
Era uma égua, a Favorita! Meio marrom, brava.
O que a família fez?
Meu pai estava em Perus, decidimos vender o que tínhamos e fomos embora para Perus também! O meu irmão mais velho tinha 20 anos de idade. Eu tinha 10 anos. Era uma “escadinha”, cada um com uma idade próxima do outro. Imagine, essa turma chegando, em uma localidade onde o emprego era difícil. Todos solteiros. Trabalhávamos na roça. Eu fui trabalhar com esse meu tio em uma plantação de eucalipto, principalmente matar formigas. Naquele tempo era comum o uso de Formicida Tatu (Cianureto e mata em poucos segundos só pelo odor). Assim foi, até 18 a 20 anos, não sabia o que era pegar um dinheirinho na minha mão. Com 15 anos ou mais não sabia o que era por um sapato no pé. Andava descalço, despois passei a usar a Alpargatas Roda, fui servente de pedreiro, carregava sacaria.
Como o senhor foi parar em São Caetano do Sul?
Dois dos meus irmãos casaram, fui morar com um deles. Fui morar na Rua Anacleto Campanella, Vila Jordanopolis próximo ao Estádio Anacleto Campanella, cujo nome anterior foi Estádio Municipal Lauro Gomes de Almeida, com capacidade para 16,744 pessoas. Foi inaugurado em 2 de janeiro de 1955 sendo que a partida inaugural foi São Bento 1 x 0 XV de Piracicaba. Sofreu várias remodelações sendo a última em 2008.
E o Clube Atlético Juventus?
Era um dos melhores clubes de São Paulo! Jogava bocha no Estádio do Corinthians. No Palmeiras as canchas de bocha eram embaixo da arquibancadas. No São Paulo Futebol Clube as canchas de bocha eram no lugar mais alto do terreno. Eu sou palmeirense! Conheci Ademir da Guia, jogava bonito, não dava botinada, era uma beleza! Vi Pelé, Coutinho, Durval, o Pepe que tinha um canhão no pé!  Oberdan Cattani foi goleiro do Palmeiras, com uma mão só ele pegava bola. O Fábio Crippa, goleiro do Palmeiras, jogava bocha comigo, eu falava: “Fábio, se eu tivesse uma mão igual a sua, dava aquele retorno de bater a bola na prancha e voltar a bola, na puxada, se eu tivesse uma mão igual a sua rachava aquela prancha!” Ele dava risada!
Ali o senhor viu uma cidade grande e as chances de progredir?
Quando comecei a trabalhar em empresa é que passei a ver uns troquinhos. Fui trabalhar na Cerâmica São Caetano. O presidente da Cerâmica São Caetano era Roberto Simonsen. Foi pioneira no Brasil na área de revestimentos e de refratários, Os  ladrilhos levavam 36 horas para serem queimados. Foram colocados uns fornos italianos, em forma de túnel, onde passaram a queimar em duas horas e meia. A Cerâmica era uma potência, tinha três turnos. Eu trabalhei na prensa.
Já havia refeitório da empresa?
Tínhamos que levar a comida de casa. Foi a primeira empresa em que entrei foi no ano de 1950. Depois abriu a fábrica de pilhas Eveready que inventou a primeira pilha em miniatura no final de 1950. Pedi a demissão na Cerâmica São Caetano e entreio na fábrica de pilhas. Naquele tempo havia oferta de empregos, e o serviço com aquele pó preto (entre outros elementos o carvão) . Nessa empresa trabalhei oito anos. Fazia hora extra. Após oito anos eles dispensavam o funcionário, indenizavam.  Eu ainda era solteiro. Casei com 27 anos de idade com Francisca Aurélia Pagan Granadier, tivemos trê4s filhos: Marcelo, Heraldo e Rosemeire. Na Eveready já tinha o restaurante da empresa, eles forneciam o almoço. Com o dinheiro da indexação, peguei um dinheirinho e comprei o terreno ao lado do Clube São Caetano. Era só mato! Era so campo, não tinha casa nenhuma, não tinha luz, água encanada, Tinha ônibus circular que chegava até lá. Casei, paguei aluguel um ano só, construí uma casinha no terreno que havia comprado, tijolos levantados com barro mesmo, nesse período trabalhei em diversas empresas: Firestone de Santo André, até entrar na Genaral Motors. Isso no tempo em ela fazia eletrodomésticos, geladeiras Frigidaire, havia a montagem de veículos, as longarinas, estampagens de latarias eram feitas todas lá. É uma empresa muito grande. Já fabricavam Chevette, Caravan, Opala de duas portas era um dos preferidos.
O senhor conheceu o Lula?
Nas greves ele sempre estava junto conosco! Ficava junto de nós. Meu filho Heraldo trabalhou próximo dele quando ele cortou o dedo. O Lula fazia um discurso que arrebanhava os trabalhadores. Conheci o Vicentinho, todos os sindicalistas vinha para fazer piquete na porta da fábrica. Em 1982 eu me aposentei. Trabalhei mais três anos aposentado. Em 1985 foi a última greve que saiu lá.  Na penúltima greve fizeram uma greve e eu fiquei preso dentro da General Motors por uma semana!
E o que o pessoal fazia lá dentro nesse tempo todo?
Quem estava lá dentro e não podia sair ficava revoltado! , em 1985, eu já estava aposentado, Na última greve, fiquei em casa!
O que o senhor foi fazer?
Eu já estava aposentado, passei a frequentar os clubes, ia disputar boche, disputava o Campeonato Sul Americano. Tenho uma caixa de medalhas: Campão, Vice-Campeão, Terceiro, Segundo Lugar. Troféus.
Jogava a ponto?
Jogava a ponto e no tiro (de bota como é chamado em alguns lugares) Frequentei todos os Clubes do ABC, jogamos contra muitos clubes famosos: Pinheiros, Círculo Militar. Defendi o São José, o São Caetano Esporte Clube, disputei pela General |Motors também.
Quando foi a decisão do senhor sair de São Caetano e vir morar em Piracicaba?
Foi quando os meus filhos montaram o Varejão Paraty. Há 24 anos. Meus filhos vieram trabalhar em um varejão na Rua Marechal Deodoro com a Avenida São João, de propriedade de João Dorigatti. Ali realizaram um serviço muito bem feito, deram um grande impulso aquele varejão. Pegou uma freguesia tremenda. Antes o Marcelo fazia feira na rua em São Caetano, como eu era aposentado, trabalhava com ele. É triste! Na rua, tem dia que chove. O Marcelo chegou a conclusão de que aquilo não tinha futuro, foi quando ele e o irmão vieram para Piracicaba. O João Dorigatti faleceu. O Marcelo e o Heraldo permaneceram em Piracicaba, encontraram um barracão para alugar, tinha sido um depósito de batatas. Eu só me divertindo lá nos clubes do ABC, de São Paulo. Jogava bocha, fazia ginástica. Frequentava excelentes clubes. Tinha um círculo de amigos muito unido. O Heraldo me disse que estavam com a intenção de montar um varejão, se eu podia dar uma mão. Acabou o meu divertimento!  Arrumei uma sacola, com algumas roupas e vim para Piracicaba. Cheguei aqui a tarde, ao olhar pela porta da frente, deu vontade de voltar. Meus filhos foram comprar uma cama de solteiro para mim, dormíamos os três aqui dentro do barracão. Era mês de julho, um frio tremendo. A primeira coisa foi fazer a faxina. Fizemos o possível, em 15 dias inauguramos. Contratamos um carro para anunciar a inauguração. A freguesia que eles tinham no varejão em que trabalharam, veio para cá. Naquele tempo trabalhávamos apenas com frutas, verduras e legumes.
Foi tudo com muita luta!
Foi sim! Muita luta! Ganhamos nesses anos todos uma tradição, a maior parte dos nossos clientes tornaram-se nossos amigos. Assim como nossos fornecedores. Apesar de ser um ambiente descontraído, a educação e o respeito existe entre clientes, funcionários e proprietários. Há uma dedicação muito grande de todos para atender da melhor forma possível.
O senhor acha que fez uma boa troca vinde de São Caetano para Piracicaba?
Eu acho que fiz uma boa troca! Me sinto feliz em saber que eles estão encaminhados. Aqui tem muita área de lazer, mata, o Rio Piracicaba é a riqueza da cidade, o parque da Esalq é o lugar onde vou caminhar. Eu achava que nunca mais iria sair de São Caetano.
E o senhor está tendo tempo para jogar bocha?
A forma como jogam aqui é diferente da foma como o boche é jogado lá!
E malha, o senhor jogava?
Lá eu jogava, dava para quebra o galho! No snooker eu também ia bem. Quando me convidavam para jogar, sempre fui modesto, dizia que nem sabia pegar no taco, no final da partida ficavam bravos! Viam que eu jogava bem! Gosto de jogar um truco! Só não gosto de nenhum jogo que envolva dinheiro. Quando envolve dinheiro dá muita confusão, disso eu não gosto.



MANUEL EDUDUARDO DE ALBERNAZ E CHIHAYA NISHIOKA DE ALBERNAZ

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 12 de janeiro de 2019.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços
eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.tribunatp.com.br/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADOS:MANUEL EDUDUARDO DE ALBERNAZ E                      CHIHAYA NISHIOKA DE ALBERNAZ

O casal Manuel Eduardo de Albernaz e Chihaya Nishioka de Albernaz por mais de duas
décadas moram no Canadá. No período de férias, geralmente ao final de cada ano, eles
viajam até o Brasil, onde residem parentes e amigos. Fazem nesta edição, um breve
relato da experiência em morar em um país onde o clima frio predomina. É o segundo
maior país do mundo em área total, país bilíngue e multicultural, tendo o inglês e
o francês como línguas oficiais. O censo canadense de 2016 registrou uma população
total de pouco mais de 35 milhões de habitantes.
Manuel Eduardo de Albernaz nasceu a primeiro de abril, em Capão Bonito, filho de
João Marcondes e Elsa Stipp, a sua mãe é de Piracicaba e seu pai de Capão Bonito, tem
uma irmã: Nilza. Manuel e Chihaya são pais de um filho: Eduardo.
Qual era atividade do pai do senhor?
Na época ele era proprietário de um açougue, minha mãe é professora. Iniciei meus
estudos em Piracicaba, no Grupo Escolar Barão do Rio Branco, depois fui estudar no
Colégio Jorge Coury, fiz o curso técnico na Escola Industrial, na Unimep fiz o curso
Técnico em Transmissão e Distribuição de Energia. Sou da primeira turma, inclusive
quando começamos o curso não era reconhecido pelo MEC. Foi reconhecido na metade
do primeiro ano. Fiz a faculdade de Engenharia Elétrica-Eletrônica em São José dos
Campos, na Universidade do Vale do Paraíba.
Inicialmente o senhor trabalhou em qual empresa?
Trabalhei em Piracicaba, na Telepira, depois fui trabalhar com transformadores na
Superkavea S/A, um dos donos era Humberto Capellari, depois fui para a Dedini na
área de projetos. Desliguei-me da Dedini, fui para São José dos Campos, trabalhar na
EMBRAER. Foi na época do fundador da EMBRAER, o engenheiro Coronel Oziris
Silva. Eu trabalhava na parte de projetos, ele fazia a inspeção em todos os setores, então
o conheci.
Como o senhor vê a fusão da Boeing com a EMBRAER?
Como estou um pouco desligado da área aqui no Brasil, não acompanhei muito. Mas
vejo isso como uma oportunidade para a EMBRAER entrar em um mercado em que ela
ainda não está. As duas empresas se complementarão. A Boeing não tem aeronaves do
porte dos que são feitos pela EMBRAER, e em contrapartida a EMBRAER entrará em
um mercado que a Boeing trabalha. Na minha opinião vai ser um casamento de sucesso.
As aeronaves da EMBRAER são seguras, confortáveis, gosto muito dos aviões da
EMBRAER, no Canadá usamos muito em voos pequenos. As companhias americanas
utilizam bastante os aviões da EMBRAER.
Quanto tempo o senhor permaneceu na EMBRAER?
Foi de 1982 a 1987, cinco anos. Saí da EMBRAER e fui para a ABC que era uma
empresa que estava fazendo equipamentos para a EMBRAER, junto com a Itália.
Fomos morar na Itália, em Legnano, cidade próxima a Milão. A empresa ficava em
Nerviano. Na Itália permaneci por um ano. Fomos para aprender a fazer os
equipamentos e depois montar a fábrica aqui no Brasil. Éramos um grupo de
engenheiros e técnicos que fomos para lá, eu era responsável por 5 ou 6 equipamentos
na época. Voltamos, montamos a fábrica, colocamos os equipamentos em produção,
entregamos, fizemos manutenção, garantia dos equipamentos. Fui convidado para voltar
para a EMBRAER, onde permanecer até ser convidado pela Bombardier que é um
grupo de empresas do Canadá, sediada em Montreal, Quebec.
Na Bombardier o senhor trabalha em que setor?
Trabalho na área de projetos. Hoje já não me encontro mais na Bombardier. Quando fui
para lá fui para trabalhar na Divisão Militar da Bombardier. Fazia a manutenção de
aeronaves militares. Em 2003 a Bombardier decidiu separar as divisões militar e
comercial. Foi ai que uma empresa americana comprou a parte militar. É onde estou
hoje, a empresa é americana, mas ela tem braços no Canadá.
Após 21 anos morando no Canadá, como o senhor o define?
Uma rápida definição: é frio! Só que tudo funciona, é um país justo.
O povo canadense, como é o seu temperamento?
São receptivos, acredito que seja a mesma reação que existe no Brasil com relação a
imigrantes, só que isso é uma postura que não pode ser generalizada, dizer: “-O país é
assim!”, cada região tem uma postura própria. Eles não tem a postura mais descontraída
do brasileiro, nesse aspecto são como americanos ou europeus. Na Itália o
comportamento é semelhante ao do Brasil, são muito espontâneos. O brasileiro tem um
contato físico maior, lá o contato físico resume-se em um aperto de mão.
No Brasil, marcamos as 7 horas para chegar as 7:30, se você chegar as 7 está fora do
horário. Lá não! Há toda uma formalidade. O convite de aniversário vem com o horário de início
e do fim da festa. Tudo é feito rigorosamente dentro daquele horário. Um aniversário de
criança é feito para criança, o adulto não comparece. Leva a criança até a porta e vai
buscar depois. O adulto não fica tomando cervejinha! É aniversário de criança! No
convite está explicito que hora começa e qual hora termina. Os pais não levam antes e
nem vão buscar após o horário estabelecido.
Chihaya Nishioka de Albernaz a senhora é natural de Piracicaba?
Não, eu nasci no Japão, são meus pais Issamo Nishioka Myuki Nishioca que tiveram
quatro filhos. Vim para o Brasil com oito anos, fiquei seis meses em Santópolis do
Aguapeí, região de Tupã, vindo depois morar em Piracicaba onde permaneci de 1958
até 1983. O meu pai como imigrante recente, onde tinha trabalho ia, com isso moramos
em vários lugares. Estudei o primário em diversas escolas da área rural. Moramos no
Bairro dos Marains, Itaperu, Nova Suíça, Bairro do Rolador. Meu pai plantava legumes
e nos últimos dois ou três anos plantávamos pêssego.
O pêssego cultivado deu bons resultados?
As pessoas que comeram o pêssego que plantávamos, quando as encontro dizem que
nunca comeram um pêssego tão gostoso como o que cultivamos.
A senhora prosseguiu seus estudos?
Continuei morando na roça, fiz o curso de madureza (depois chamado supletivo) do
ginásio, fiz no Curso Ativo, situado no andar superior do prédio onde ficava a Lojas
Arapuã, na Rua Governador Pedro de Toledo. O colegial estudei no Instituto
Piracicabano, ainda trabalhando na roça, eu ia do Piracicabano até o Bairro do Rolador,
a pé, a noite. Do Piracicamirim até o nosso sítio tinha a distância de 2.800 metros. Isso
foi medido pela Telesp na época. As vezes para vir, o meu pai me trazia até o ponto de
ônibus na rotatória do Piracicamirim. Vínhamos de carroça, não tínhamos carro. Eu
trabalhava o dia inteiro na roça e perdia a hora da aula. Trabalhei na roça por 20 anos!
Na enxada mesmo! Quando morávamos no Bairro Nova Suiça, vinhamos para
Piracicaba com duas carroças, meu pai em uma e eu em outra, isso as duas horas da
manhã, descíamos a Rua Governador Pedro de Toledo até o mercadão. Eu era uma das
únicas mulheres presentes de madrugada no mercado. Tive e estou tendo uma vida rica.
Vejo a criançada de hoje, com 15, 17 anos, passam o dia dormindo! Não sei se é a
educação, no Japão fui até o terceiro ano na escola, e nas férias, quem não precisava
ajudar os pais as sete horas da manhã estava na escola, fazendo ginástica. Todos os dias!
Meu pai quis instalar um telefone porque ele gostava de contato com gente.
Minha amiga Branca Cecilia Vicentim telefonou-me e disse-me “Chihaya, vamos
estudar em Tatuí?”. Meu pai e a minha mãe ouviram a nossa conversa, perguntaram:
“Você quer ir?” Respondi-lhes que gostaria. Fiz a Faculdade de Filosofia na área de
Educação Artística, Estudei com a Mércia Angeleli, íamos de ônibus.
Chihaya e Manuel vocês se conheceram em Piracicaba?
Foi quando estávamos estudando inglês na Escola Fisk. Na época a Chihaya trabalhava
na CICOBRA, depois trabalhou na Dedini. Logo depois eu, Manuel, passei a trabalhar
na Dedini. Tínhamos amigos em comum, saiamos todos juntos. Íamos ao Restaurante
Flamboyant. Cine Polyteama. Bailes do Clube Coronel Barbosa, onde a elite
piracicabana frequentava. Uma curiosidade, diz a Senhora Chihaya: “Fiz a última
viagem do bonde da agronomia até o centro. Ali encerrou-se o serviço de bonde em
Piracicaba”. Ela diz: “Adoro Piracicaba.”
Manuel, a qualidade de vida no Canadá é superior a do Brasil?
O Canadá oferece uma série de vantagens com relação ao Brasil: segurança é uma delas.
Fomos obrigados a ir a uma instituição bancária aqui no Brasil, um assunto
relativamente simples, consumiu um tempo enorme. Uma burocracia que não existe lá.
Pode-se dizer que no Canadá tudo funciona de forma sincronizada. Chihaya diz:
“Sempre digo que gostaria de ter a vida que tenho no Canadá, aqui no Brasil!”.
O Canadá não é um pais de densidade populacional muito grande?
Não, não é. É um país muito extenso com população pequena.
Comenta-se muito aqui no Brasil sobre os shoppings subterrâneos existentes no
Canadá. São verdadeiras cidades. Não no Canadá todo. Nós moramos em Halifax, na província
da Nova Escócia, lá não existe isso. Predomina o idioma inglês, mas o francês também
é utilizado. Antes moramos em Quebec, uma das dez províncias do Canadá, em
Montreal que é a maior cidade d a província, existe uma cidade subterrânea. Tem
prédios que tem acesso a essa parte de baixo, a pessoa não sai na rua, já desce do
elevador na cidade subterrânea. Tem supermercado, farmácia, escola, tudo que você
precisar. Só não tem veículos.
Vocês praticam algum esporte?
No inverno praticamos patinação, mas em superfície totalmente horizontal, não é o
esqui que desce montanhas! O curling é um dos principais esportes praticados no
Canadá. Apelidado de xadrez no gelo é praticado desde o século XVI. É um jogo
formado por duas equipes, com quatro jogadores em cada equipe. O objetivo é empurrar
blocos de granito sobre uma pista de gelo e colocá-los o mais próximo possível de uma
marca predeterminada. Esse esporte já joguei, é gostoso, sendo engenheiro, vejo que
aquilo nada mais é do que a aplicação da física. Há uma técnica muito refinada para
direcionar o bloco, há uma pessoa com uma vassourinha na frente, a função é aquecer o
gelo, formar uma película de água e deslizar mais rápido.
Há um hábito de acharmos que o Brasil está extremamente defasado com relação a
muitos países. O senhor concorda?
Não diria isso. Pegamos o exemplo da EMBRAER. Porque a Boeing veio atrás da
EMBRAER? Os trens de pouso de aviões fabricados pela EMBRAER não são só
utilizados pela EMBRAER. São utilizados lá fora também. O Brasil tem tecnologia.
Tem gente muito boa trabalhando. O Brasil não fica atrás de países lá fora não! Talvez
falte interesse do governo, de incentivos, tudo isso custa. Tem que haver treinamento, A
EMBRAER treina seus funcionários muito bem. A quantidade de engenheiros com
Master, com Doutorado, é muito grande. Notícias do Brasil lá fora são raras. Falam do
carnaval como uma festa folclórica, nunca vi ser tratado de forma pejorativa. As vezes
passam notícias sobre tiroteio em favelas, mas são notícias de cunho informativo. Aqui
no Brasil, a pessoa que está passando a notícia ela explora todos os detalhes, muitas
vezes dá sua opinião pessoal. O objetivo é chamar a atenção para o fato e ganhar
audiência com o mesmo. Lá quando dão a notícia limitam-se a dizer o que aconteceu. É
uma notícia objetiva. Informação.
O senhor estranhou muito a televisão do Brasil, nesses dias em que está aqui?
Não assisto televisão. Não consigo. Sinto muito dizer, mas a nossa televisão no Brasil é
de um nível de programas abaixo da crítica. Não vejo sentido o apresentador, repórter,
fazer o carnaval que faz.
Infelizmente a cultura de grande parcela da população, admite esse tipo de postura.
Exato! Mesmo porque, até mesmo no Canadá, pela minha falta de tempo recebo
informações pela internet, praticamente não assisto televisão.
A senhora também não assiste a televisão canadense?
Assisto muito pouco. Não tenho tempo. Fiz trabalho voluntário para um organismo que
ajudava os imigrantes.
Como foi a relação que vocês tiveram dom os dois principais idiomas do Canadá?
Quando fomos para lá, fomos na região francesa, morávamos no norte de Montreal.
Tem inclusive pessoas que não falam inglês. E não admitem falar em inglês. A Chihaya
aprendeu francês primeiro, eu já sabia o inglês, minha entrevista aqui no Brasil, antes de
ser contratado foi em inglês, depois foi por telefone por duas vezes. O processo foi
longo e cansativo. Meu inglês foi aprimorado com a vivência no Canadá. O meu
trabalho apesar de ser em empresa francesa era todo em inglês, a documentação é
inglesa. Tive que aprender o francês também, pelo uso com as pessoas do trabalho,
algumas não falavam inglês. Escreviam, mas não falavam. E também fora da empresa,
tudo que se fazia era em francês.
A assistência médica no Canadá é boa?
É boa, sem dúvida nenhuma. Tem dois sistemas: do governo e tem um adicional que é
pela empresa. O sistema do governo é muito bom. O sistema de emergência funciona
com excelência. Se o atendimento não for por motivos graves, há uma pequena espera
para ser atendido.
Como é a alimentação?
Chihaya responde: “Eu diria que é um pouco pobre se comparada à que temos no
Brasil”. Lá não se planta nada por causa do frio, ou é cultivado em estufa, ou é
importado. É decepcionante, as frutas não tem sabor. São colhidas verdes, para dar
tempo de chegarem lá.
Como é o transporte ferroviário?
O transporte de trem não é muito utilizado, como na Europa por exemplo. O trem de
Halifax a Montreal leva 22 horas de viagem, de avião leva 1:30 horas! De carro são 12
horas.
O senhor é de ascendência espanhola, e a Espanha tem tradição em ter bons vinhos.
Os do Canadá são tão bons?
O Canadá tem bons vinhos, ficam atrás dos espanhóis, italianos. O que existe são
empresas pequenas que fazem vinho. Assim como a grande maioria das cervejas são
artesanais. E são boas. Onde nós moramos, hoje é uma tendência irlandesa, uma cerveja
forte.
A alimentação tem a batata como base?
Comem bastante batata. Há um grande problema lá: a picanha não existe! O boi existe,
mas a picanha não. O corte da carne não contempla a picanha. Agora estão surgindo
alguns brasileiros que estão introduzindo a picanha no mercado.
O churrasco é de hambúrguer ainda?
É de hambúrguer e feito na churrasqueira a gás ou elétrica!
Há restaurantes com comida típica brasileira?
Na região aonde estamos não tem nenhum, existe em Montreal, Toronto provavelmente
deve ter mais restaurantes brasileiros. Toronto é mais multicultural do que outros
lugares.
Há em uma cidade do Canadá uma torre com um restaurante que faz um giro de 360
graus?
Em Toronto tem o Canada’s National Tower. Restaurante Giratório 360.
Nos dias de neve o senhor dirige com correntes nos pneus?
A corrente não é permitida. Tem que trocar os pneus, existem os pneus de neve e os de
verão. Onde estamos hoje é permitido pneus com pinos de aço. Em Quebec não é
permitido isso, simplesmente o tipo da borracha dos pneus é que faz a diferença.
A mão de obra é cara?
É caríssima, temos que ser um faz-de-tudo. Só para dar o orçamento cobram 50 dólares.
A facilidade é que existem empresas que vendem todo o material e dão todas as
instruções. Não mexo na parte elétrica da casa porque a legislação exige que só faz isso
quem tem um registro do sindicato. Se alguém que não tiver esse registro mexer, e
ocorrer alguma coisa o seguro não paga. Posso trocar uma lâmpada, mas não posso
instalar, puxar um fio. Se tiver um incêndio, que foi causado por aquele pedaço, o
seguro não paga e vou ter problemas com a polícia.
Existem favelas? 
Tem. Mas vamos dizer que são favelas de alto nível. Existe muita
casa móvel, a pessoa aluga o terreno, traz a casa e põe ali. Outra opção é a pessoa
comprar um trailer usado, põe no terreno e mora lá.
Qual é a velocidade máxima permitida no Canadá?
No máximo 110 quilômetros por hora. No Canadá é adotado o sistema em quilômetros,
não em milhas.
Qual é a diferença de horário do Brasil para o Canadá?
Depende da região do Canadá. Onde nós estamos a diferença é de uma hora no horário
normal. Horário de verão e horário de inverno distancia. Tem época em que ficamos
com duas horas de diferença e outras em que ficamos igual. Lá também tem horário de
verão. Lá justifica o horário de verão, nove horas da noite tem sol ainda!

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