domingo, março 03, 2019

GUILHERME GRANADIER


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 08 de dezembro de 2018.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: GUILHERME GRANADIER

Um dos hábitos costumeiros, tão logo aumentou o número de usuários de telefone, era o de telefonar para o então “empório” ou “armazém” mais próximo de casa. A mulher geralmente com grande prole, fazia o pedido das suas necessidades mais urgentes para realizar a alimentação do dia. Normalmente era algum complemento que faltava: fermento, tomate, sal, margarina, e outras pequenas coisas. Geralmente um garoto de bicicleta fazia a entrega, cada cliente tinha a sua forma de pagar: uns pagavam quando recebiam o salário, outros pagavam na hora da entrega. Esse habito ainda permanece, principalmente nas cidades do interior. Só que foi repaginado: o pedido pode ser feito por telefone ou mensagem eletrônica, a entrega é feita com veículos automotores, levam mais produtos a uma distância maior. Na era dos grandes supermercados, esse é um nicho interessante para ser estudado. Como velhos hábitos, permanecem, mudam de roupagem   Nesse tipo de relação o contato entre fornecedor e cliente é baseado principalmente na confiança mutua. O cliente sabe que irá receber em casa um produto com qualidade e de uma forma tão prática como pedir uma pizza! O perfil matriarcal, em muitos casos mudou. A numerosa família deu lugar a um número menor de filhos. Em contrapartida, muitas mulheres trabalham em algumas atividades externa:  são profissionais liberais, dentistas, médicas, advogadas, administradoras, ocupam cargos importantes. Quem fica em casa é a tão valiosa “secretária” nome carinhoso dado às prestadoras de trabalho doméstico. Elas de certa forma assumiram a função de “dona-de-casa”. Há também as pessoas que tem dificuldade de locomoção, por alguma razão, ou volume de compras é pesado. Ou até mesmo pela praticidade dessa prestação de serviço. Enfim esses locais atendem com muito zelo os seus clientes, sabem que o cliente tem que ser conquistado pela gentileza, sinceridade, preço justo. Cria-se uma relação de amizade. E de fidelidade. 
Em Piracicaba, os Irmão Granadier, acreditaram nessa ideia. Isso há algumas décadas. O patriarca, Guilherme Granadier, do alto dos seus 88 anos, os quais não aparenta, ainda circula com desenvoltura por entre bancas de frutas, conhecido e estimado pelos clientes, diariamente marca sua presença. Torcedor do São Caetano Futebol Clube, da cidade de São Caetano do Sul, e como não poderia deixar de ser. torce também pelo XV de Novembro de Piracicaba. Foi esportista, praticava esporte durante uma hora e meia: meia hora de corrida, meia hora de educação física e meia hora de futebol de salão, no Ginásio do São Caetano. Guilherme Granadier é natural de Santo Antonio de Posse, onde nasceu a 21 de novembro de 1930. Quem nasce em Santo Antônio de Posse é. Possense. São seus pais: João Granadier e Maria Covolo. Tiveram oito filhos: Antonio, Luis, Augusto, Francisco, José, Guilherme, Geraldo e Maria Aparecida.
A família trabalhava em que área?
Naquela época trabalhávamos como meeiros na fazenda de Mário Venâncio. Plantava principalmente café. Era tudo estrada de terra, Para tomar o trem tinha que ir até a estação usando charrete, cavalo. Deixava os animais na Estação de Santo Antonio de Posse e ia geralmente até Jaguariúna, na época uma cidade pequena.
Como foi a infância do senhor?
Foi boa, até que quando eu tinha treze anos a minha mãe faleceu. Meu pai ficou extremamente abalado, sendo que dois meses depois ele faleceu. Ele tinha sido operado da hérnia em Campinas, era uma época em que os médicos de uma forma geral, não explicavam aos pacientes os procedimentos a serem tomados no pós operatório, com os detalhes necessários. Aliado a isso, a família, possivelmente para poupá-lo em sua enfermidade, não o comunicou do falecimento da sua esposa. Meu pai era imigrante alemão, nasceu em Berlim, um homem de físico avantajado. Naquele tempo, quando falecia alguém da família usava-se roupa preta. Quando ele chegou em casa ficou sabendo da morte da minha mãe. Apesar de ser um homem muito forte, o choque foi muito grande. Ele perguntou à um dos meus irmãos o que tinha acontecido. Meu irmão respondeu: “-Morreu a mãe!”. Foi como se alguém o apunhalasse. Meu tio, João Malavase, residente em Perus, veio buscar o meu pai, mas não adiantou nada. Nós estávamos muito bem, tínhamos fartura, todos da família trabalhavam, tínhamos de tudo, criação, plantações, paiol cheio.
O senhor tinha um cavalo seu?
Era uma égua, a Favorita! Meio marrom, brava.
O que a família fez?
Meu pai estava em Perus, decidimos vender o que tínhamos e fomos embora para Perus também! O meu irmão mais velho tinha 20 anos de idade. Eu tinha 10 anos. Era uma “escadinha”, cada um com uma idade próxima do outro. Imagine, essa turma chegando, em uma localidade onde o emprego era difícil. Todos solteiros. Trabalhávamos na roça. Eu fui trabalhar com esse meu tio em uma plantação de eucalipto, principalmente matar formigas. Naquele tempo era comum o uso de Formicida Tatu (Cianureto e mata em poucos segundos só pelo odor). Assim foi, até 18 a 20 anos, não sabia o que era pegar um dinheirinho na minha mão. Com 15 anos ou mais não sabia o que era por um sapato no pé. Andava descalço, despois passei a usar a Alpargatas Roda, fui servente de pedreiro, carregava sacaria.
Como o senhor foi parar em São Caetano do Sul?
Dois dos meus irmãos casaram, fui morar com um deles. Fui morar na Rua Anacleto Campanella, Vila Jordanopolis próximo ao Estádio Anacleto Campanella, cujo nome anterior foi Estádio Municipal Lauro Gomes de Almeida, com capacidade para 16,744 pessoas. Foi inaugurado em 2 de janeiro de 1955 sendo que a partida inaugural foi São Bento 1 x 0 XV de Piracicaba. Sofreu várias remodelações sendo a última em 2008.
E o Clube Atlético Juventus?
Era um dos melhores clubes de São Paulo! Jogava bocha no Estádio do Corinthians. No Palmeiras as canchas de bocha eram embaixo da arquibancadas. No São Paulo Futebol Clube as canchas de bocha eram no lugar mais alto do terreno. Eu sou palmeirense! Conheci Ademir da Guia, jogava bonito, não dava botinada, era uma beleza! Vi Pelé, Coutinho, Durval, o Pepe que tinha um canhão no pé!  Oberdan Cattani foi goleiro do Palmeiras, com uma mão só ele pegava bola. O Fábio Crippa, goleiro do Palmeiras, jogava bocha comigo, eu falava: “Fábio, se eu tivesse uma mão igual a sua, dava aquele retorno de bater a bola na prancha e voltar a bola, na puxada, se eu tivesse uma mão igual a sua rachava aquela prancha!” Ele dava risada!
Ali o senhor viu uma cidade grande e as chances de progredir?
Quando comecei a trabalhar em empresa é que passei a ver uns troquinhos. Fui trabalhar na Cerâmica São Caetano. O presidente da Cerâmica São Caetano era Roberto Simonsen. Foi pioneira no Brasil na área de revestimentos e de refratários, Os  ladrilhos levavam 36 horas para serem queimados. Foram colocados uns fornos italianos, em forma de túnel, onde passaram a queimar em duas horas e meia. A Cerâmica era uma potência, tinha três turnos. Eu trabalhei na prensa.
Já havia refeitório da empresa?
Tínhamos que levar a comida de casa. Foi a primeira empresa em que entrei foi no ano de 1950. Depois abriu a fábrica de pilhas Eveready que inventou a primeira pilha em miniatura no final de 1950. Pedi a demissão na Cerâmica São Caetano e entreio na fábrica de pilhas. Naquele tempo havia oferta de empregos, e o serviço com aquele pó preto (entre outros elementos o carvão) . Nessa empresa trabalhei oito anos. Fazia hora extra. Após oito anos eles dispensavam o funcionário, indenizavam.  Eu ainda era solteiro. Casei com 27 anos de idade com Francisca Aurélia Pagan Granadier, tivemos trê4s filhos: Marcelo, Heraldo e Rosemeire. Na Eveready já tinha o restaurante da empresa, eles forneciam o almoço. Com o dinheiro da indexação, peguei um dinheirinho e comprei o terreno ao lado do Clube São Caetano. Era só mato! Era so campo, não tinha casa nenhuma, não tinha luz, água encanada, Tinha ônibus circular que chegava até lá. Casei, paguei aluguel um ano só, construí uma casinha no terreno que havia comprado, tijolos levantados com barro mesmo, nesse período trabalhei em diversas empresas: Firestone de Santo André, até entrar na Genaral Motors. Isso no tempo em ela fazia eletrodomésticos, geladeiras Frigidaire, havia a montagem de veículos, as longarinas, estampagens de latarias eram feitas todas lá. É uma empresa muito grande. Já fabricavam Chevette, Caravan, Opala de duas portas era um dos preferidos.
O senhor conheceu o Lula?
Nas greves ele sempre estava junto conosco! Ficava junto de nós. Meu filho Heraldo trabalhou próximo dele quando ele cortou o dedo. O Lula fazia um discurso que arrebanhava os trabalhadores. Conheci o Vicentinho, todos os sindicalistas vinha para fazer piquete na porta da fábrica. Em 1982 eu me aposentei. Trabalhei mais três anos aposentado. Em 1985 foi a última greve que saiu lá.  Na penúltima greve fizeram uma greve e eu fiquei preso dentro da General Motors por uma semana!
E o que o pessoal fazia lá dentro nesse tempo todo?
Quem estava lá dentro e não podia sair ficava revoltado! , em 1985, eu já estava aposentado, Na última greve, fiquei em casa!
O que o senhor foi fazer?
Eu já estava aposentado, passei a frequentar os clubes, ia disputar boche, disputava o Campeonato Sul Americano. Tenho uma caixa de medalhas: Campão, Vice-Campeão, Terceiro, Segundo Lugar. Troféus.
Jogava a ponto?
Jogava a ponto e no tiro (de bota como é chamado em alguns lugares) Frequentei todos os Clubes do ABC, jogamos contra muitos clubes famosos: Pinheiros, Círculo Militar. Defendi o São José, o São Caetano Esporte Clube, disputei pela General |Motors também.
Quando foi a decisão do senhor sair de São Caetano e vir morar em Piracicaba?
Foi quando os meus filhos montaram o Varejão Paraty. Há 24 anos. Meus filhos vieram trabalhar em um varejão na Rua Marechal Deodoro com a Avenida São João, de propriedade de João Dorigatti. Ali realizaram um serviço muito bem feito, deram um grande impulso aquele varejão. Pegou uma freguesia tremenda. Antes o Marcelo fazia feira na rua em São Caetano, como eu era aposentado, trabalhava com ele. É triste! Na rua, tem dia que chove. O Marcelo chegou a conclusão de que aquilo não tinha futuro, foi quando ele e o irmão vieram para Piracicaba. O João Dorigatti faleceu. O Marcelo e o Heraldo permaneceram em Piracicaba, encontraram um barracão para alugar, tinha sido um depósito de batatas. Eu só me divertindo lá nos clubes do ABC, de São Paulo. Jogava bocha, fazia ginástica. Frequentava excelentes clubes. Tinha um círculo de amigos muito unido. O Heraldo me disse que estavam com a intenção de montar um varejão, se eu podia dar uma mão. Acabou o meu divertimento!  Arrumei uma sacola, com algumas roupas e vim para Piracicaba. Cheguei aqui a tarde, ao olhar pela porta da frente, deu vontade de voltar. Meus filhos foram comprar uma cama de solteiro para mim, dormíamos os três aqui dentro do barracão. Era mês de julho, um frio tremendo. A primeira coisa foi fazer a faxina. Fizemos o possível, em 15 dias inauguramos. Contratamos um carro para anunciar a inauguração. A freguesia que eles tinham no varejão em que trabalharam, veio para cá. Naquele tempo trabalhávamos apenas com frutas, verduras e legumes.
Foi tudo com muita luta!
Foi sim! Muita luta! Ganhamos nesses anos todos uma tradição, a maior parte dos nossos clientes tornaram-se nossos amigos. Assim como nossos fornecedores. Apesar de ser um ambiente descontraído, a educação e o respeito existe entre clientes, funcionários e proprietários. Há uma dedicação muito grande de todos para atender da melhor forma possível.
O senhor acha que fez uma boa troca vinde de São Caetano para Piracicaba?
Eu acho que fiz uma boa troca! Me sinto feliz em saber que eles estão encaminhados. Aqui tem muita área de lazer, mata, o Rio Piracicaba é a riqueza da cidade, o parque da Esalq é o lugar onde vou caminhar. Eu achava que nunca mais iria sair de São Caetano.
E o senhor está tendo tempo para jogar bocha?
A forma como jogam aqui é diferente da foma como o boche é jogado lá!
E malha, o senhor jogava?
Lá eu jogava, dava para quebra o galho! No snooker eu também ia bem. Quando me convidavam para jogar, sempre fui modesto, dizia que nem sabia pegar no taco, no final da partida ficavam bravos! Viam que eu jogava bem! Gosto de jogar um truco! Só não gosto de nenhum jogo que envolva dinheiro. Quando envolve dinheiro dá muita confusão, disso eu não gosto.



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