sábado, dezembro 27, 2014

PAULO HYPPOLITO DE OLIVEIRA


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 06 dezembro de 2014.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
 

ENTREVISTADO: PAULO HYPPOLITO DE OLIVEIRA

 

O Lar dos Velhinhos de Piracicaba, a Primeira Cidade Geriátrica do Brasil abriga pessoas que têm uma sabedoria imensa, adquirida através de experiências vividas ao correr dos anos. Muitos irradiam felicidade, espantam os fantasmas da depressão com a simples alegria de viver. Casado em segundas núpcias com a dentista Dra. Maria Laura Costa Aggio, Paulo Hyppolito de Oliveira nasceu a 6 de dezembro de 1927 na Fazenda Capoava, em Porto Feliz. Seu avô paterno veio como imigrante alemão aos oito anos de idade, tendo seu nome aportuguesado. Paulo é filho de Antonio Kerches de Oliveira e Maria Antonia de Oliveira que tiveram os filhos: João, Benedito, José (Zéca), Paulo, Maria José, Olga, Lourdes, Maria Iraides.  Seu pai era proprietário de uma fazenda onde era cultivado principalmente café. Com a "quebra" da Bolsa de Valores americana em 1929, o Brasil teve a primeira grande crise de superprodução do café, seu pai vendeu a fazenda e aplicou os valores apurados em imóveis na cidade de Porto Feliz.

Em Porto Feliz a família passou a morar em que local?

Entre as propriedades adquiridas, uma delas foi uma chacara dentro da cidade. Mesmo tendo seu sustento e da familia assegurados, meu pai continuava a trabalhar na roça, ele gostava de trabalhar.

Em PortoFeliz o senhor concluiu o curso primário?

No quarto ano primário sofri um acidente grave. Por um verdadeiro milagre não tive que amputar a perna direita. Ainda menino, fui nadar em um tanque vizinho a nossa chacara, em uma briga de criança, um dos meninos atirou uma colher de pedreiro que estava abandonada no local. A ponta da colher cravou no meu joelho provocando uma profunda lesão. Nessa época eu tinha sete anos. Os recursos médicos eram precários. Dr. Sacramento, primo da minha mãe, foi quem cuidou de mim.

Quanto tempo demorou para curar?

Foi um longo tempo, cerca de um ano, fomos á Pirapora, tinhamos feito essa promessa. Mesmo acidentado conclui o quarto ano primário, a professora era Dona Filomena. Nossa família era muito bem conceituda na cidade, lembro-me que eu era reconhecido como “filho do Hyppolito”. Quando eu tinha dez anos meu pai faleceu. Minha mãe tinha um irmão, Alberto Paes de Arruda, que morava em São Paulo, era gerente da fábrica de fechaduras La Fonte, por sinal ele foi o responsável pelas fechaduras terem esse nome “La Fonte”. Ele era o mestre da fábrica. (Atualmente a La Fonte Participações S. A. é uma holding brasileira que controla empresas como a Iguatemi Empresa de Shopping Centers S.A., o Grande Moinho Cearense e é grande acionista de empresas de telecomunicações. Seu controlador é Carlos Francisco Ribeiro Jereissati).

O senhor lembra-se quem era o proprietário da empresa na época?

Não me lembro, sei apenas que eram muito ligados ao Governador Adhemar de Barros.

Em que bairro de São Paulo localizava-se a La Fonte?

A principio era na Vila Mariana, depois mudou-se para o bairro de Santana, quem seguia para o final da Rua Voluntários da Pátria, á direita era a fábrica. No início fui sozinho morar com a família do meu tio. Fiz o curso de ajustador na La Fonte. Tinha uns doze anos na época. Minha irmã Maria mudou-se para São Paulo, Eu trabalhava na La Fonte, tinha uns quatorze anos, foi quando Adhemar de Barros (nascido em Piracicaba a 22 de abril de 1901) pediu que ajudasse em sua campanha política. O comitê político de Adhemar Pereira de Barros era no centro de São Paulo. Cheguei a ir muitas vezes ao Palácio dos Campos Elísios (antigo "Palacete Elias Chaves"), situado na Avenida Rio Branco. Ajudei em duas de suas candidaturas. Nessa época que conheci sua esposa, a Dona Leonor Mendes de Barros, através de sua ajuda é que fiz a preparação para ingressar no curso ginasial na famosa escola Caetano de Campos,  na Praça da Republica. Mais tarde conheci Paulo Maluf.

Mas o Dr. Adhemar de Barros e Paulo Maluf tinham bom relacionamento?

De nenhuma forma!

Quando o senhor trabalhou para o Adhemar de Barros ele já era proprietário da Chocolates Lacta?

Já era dono da Lacta.

Foi no período em que ele construiu o Hospital das Clínicas de São Paulo?

Também! Adhemar de Barros construiu muita coisa em São Paulo. Da mesma forma que Paulo Maluf também construiu. Assisti a muitos comícios de Adhemar de Barros.

Após a La Fonte onde o senhor foi trabalhar?

Fui trabalhar na fábrica de fogões a gás Dex. Acabei me especializando em fogão elétrico, com termostato, da mesma marca. Trabalhei desde fogão a querosene até fogão elétrico. Eu dava manutenção a todo tipo de fogão, viajava muito, lembro-me que fui até Araras no convento das freiras, arrumar o fogão para elas. Fogão indústrial. Eu tinha facilidade para descobrir a origem dos defeitos. Quando o fogão a gás começou a ser utilizado era o desejo de todas as famílias possuir um. A Dex fazia fogões também para gás encanado(gás de rua). Eu instalava esses fogões de gás de rua.  A presssão do gás é completamente diferente.

O senhor dava manutenção à hoteis, restaurantes?

Lembro-me de uma passagem, fui dar manutenção em um fogão no Restaurante Fasano, um templo da gastronomia até hoje, naquela época ele situava-se na Avenida Paulista. Eu cheguei quase na hora do almoço, Era um fogão enorme. Com a experiência e prática que eu tinha consertei rapidamente, mas tirei uma lição que nunca mais esqueci, presenciei uma cena onde vi que nenhum cozinheiro gosta de ser criticado pelo prato que preparou para o cliente. Nos bastidores eles ficam muito irritados se o pedido não saiu de acordo com o que o cliente pediu. Ao meu ver parece ser uma regra em todos os locais que servem refeições. Meu conselho é se o prato que você pediu não saiu a seu gosto, deixe-o de lado ou se estiver com muita fome coma assim mesmo.

Em primeiras nupcias o senhor casou-se em São Paulo?

Não, casei-me com Wanda Ribeiro de Oliveira, minha primeira esposa, em Capivari, o meu sogro trabalhava na Casa da Lavoura em Capivari. Tivemos quatro filhos: Paulo, Elzio, Ana Maria e Ana Paula. Fiz concurso para ser Despachante Policial, passei, e prestei serviços a muitas pessoas, inclusive para políticos como Paulo Maluf, Orestes Quercia.a atleta Hortência. Por muitas vezes vi Jânio Quadros. Em minha atividade como despachante fazia de tudo, vistos de viagem, passaportes, naturalização, permanência em país estrangeiro. Cheguei a ter vários escritórios funcionando simultâneamente, era conhecido como Hyppolito Despachante, comecei a trabalhar dentro de uma concessionária de veículos na Avenida Lins de Vasconcelos, depois passei a ter uma equipe de funcionários, inclusive um deles hoje é funcionário na Rede Globo. Fiz a naturalização de muitos alemães que vinham de Santa Catarina até São Paulo para se naturalizarem. Naturalização é um processo muito trabalhoso.

Para quais localidades eram emitidos o maior número de vistos em passaportes?

Para os Estados Unidos e para a Itália.

O senhor chegou a conhecer algum membro da família Matarazzo?

Trabalhei para eles. Cheguei a ver o Conde Francisco Matarazzo. Eu tratava diretamente com um senhor conhecido como Casagrande, que cuidava dessa parte de documentação da família, conheci a mansão da família Matarazzo na Avenida Paulista. Tive muitos amigos que era do circulo de amizade de Getulio Vargas.

Com toda a vivência que o senhor têm, qual é a visão do senhor sobre a justiça social no Brasil?

Sempre achei que a justiça social deixa muito a desejar em nosso país.

No período da Revolução de 1964 o senhor por dever de ofício tinha que frequentar repartições públicas, com isso conheceu de vista figuras de destaque?

Conheci pessoas que estavam na mídia da época, embora o contato direto não fosse com eles e sim com funcionários burocraticos. Eram pessoas temidas, como Ségio Paranhos Fleury. Conheci Romeu Tuma, o qual sempre me passou uma boa impressão. Luiz Inácio Lula da Silva conheci fazendo discurso em palanque. Eu não me envolvia em política. Limitava-me ao meu serviço de despachante. Era bem quisto por todos os setores.  Tinha que ter uma conduta irrepreensível para ser respeitado.

O senhor atuou como ator em uma peça de sucesso?

Em São Paulo eu morava ao lado de um local onde havia um centro religioso. A peça era “Auto da Compadecida” de Ariano Suassuna. Interpretei o bispo, a peça todas as vezes em que foi apresentada foi interrompida pelos aplausos do público. Foi um sucessso! É um drama nordestino apresentado em três atos. Contém elementos da literatura de cordel e está inserido no gênero da comédia, se aproximando do barroco católico brasileiro. Ensaiamos bastante e apresentamos no Teatro Arthur Vila Nova.

Qual é a importância para uma pessoa participar da encenação de uma peça?

Considero muito importante. Desenvolve maior compreensão dos momentos que se passa na vida. Desinibe o ator, a pessoa aprende a ficar mais desenvolvida. Desde que seja um bom texto eu recomendo que se pratique o teatro, em qualquer idade.

O senhor viveu um período nos Estados Unidos?

Residi na Flórida, por aproximadamente dez anos. Minha filha Ana Paula casou-se, tem um filho e mora naquele país.

Nesse período o senhor dirigia veículos de passeio da família?

Dirigia, o trânsito lá é maravilhoso! Dirigi até no centro de Nova Iorque. Qualquer garoto consegue dirigir em um transito daqueles.

E a alimentação nos Estados Unidos, o que o senhor achou?

Eu gostava, fazia minha própria comida!

O senhor é bom cozinheiro?

Dentro do limite do que sei fazer me considero um bom cozinheiro.

Qual é o prato que o quando o senhor faz ninguém quer deixar de comer?

A lasanha!  Em uma ocasião adquiri para uma das minhas filhas um local no ponto de alimentação do Shopping Tatuapé, chamava-se “Coxinha e Cia.”. Eu fazia a lasanha, vinham pessoas da Lapa, um bairro relativamente distante, para adquirir a lasanha. O meu neto nos Estados Unidos foi comigo em um local famoso pela lasanha, ele começou a comer, quando disse-me: “ Vô, porque não é igual a sua lasanha?”. Acabou deixando-a no prato.

O americano alimenta-se mal?

Muito mal!

O senhor fala inglês?

Na Flórida, pela influência de um grande número de imigrantes latinos, o idioma muito utilizado é o espanhol. Era nesse idioma que eu me comunicava quando ia fazer compras no mercado. Em 2001 foi a primeira vez que fui para os Estados Unidos. Eu estava lá quando ocorreu a queda das Torres Gêmeas. Foi indescritível o comportamento da população, mesmo estando na Flórida.

O senhor tem um tipo físico característico, a primeira vista imaginavam que sua origem era de qual país?

Por diversas vezes fui tratado como sendo originário da Itália.

Tendo a oportunidade de observar o comportamento do americano e conhecendo a nossa realidade, o senhor vê alguma possibilidade de haver uma aproximação maior entre os dois países?

São formas distintas de comportamento. Tanto o Brasil como os Estados Unidos tem visões muito diferentes de aspectos básicos.

O seu otimismo, seu bom humor, influencia na sua qualidade de vida?

Sem dúvida!

O senhor gosta de escrever?

Gosto, meu assunto preferido é sobre política, mas tratando-a de uma forma irreverente. Sou membro do Clube dos Escritores de Piracicaba.

A crítica política feita de forma cômica é a que produz resultados?

Funciona, sem dúvida.

Há um célebre e conhecido ditado que diz que: “Colhe-se o que se planta”. Em seu ponto de vista isso acontece de fato?

Acredito, sem duvida!

O senhor gosta de ler?

Gosto muito! O meu tema preferido é filosofia. Gosto de ler Paraíso Perdido de John Milton. (Paraíso Perdido (em inglês: Paradise Lost) é uma obra poética do século XVII, escrita por John Milton, originalmente publicada em 1667 em dez cantos. Uma segunda edição foi publicada em 1674 em doze cantos, em memória à Eneida de Virgílio com revisões menores ao longo do texto e notas sobre os versos.) Pronto! Está aqui o livro traduzido em português. É um livro formidável. Essa frase é profunda: “Ninguém, exceto Deus, ao justo pode calcular o valor do bem que encara”.

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