domingo, março 13, 2016

ANTONIO (TONY RODRIGO) RODRIGUES

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 23 de janeiro de 2016.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
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ENTREVISTADO: ANTONIO (TONY RODRIGO)  RODRIGUES


Antonio Rodrigues nasceu a 1º de setembro de 1940 na cidade de Andradas, no Estado de Minas Gerais, é filho de Manoel Rodrigues e Ana Teixeira Rodrigues, que tiveram treze filhos sendo que Antonio é o mais novo. Seus pais eram de Amarante, Portugal. No Brasil chegaram em 1912, desceram no porto de Santos, e dedicaram-se ao cultivo agrícola. È interessante ressaltar que Manoel e Ana já se conheciam em Portugal, mas namoraram e casaram-se no Brasil, em Jacutinga. Permaneceram em Andradas até 1942. Antonio Rodrigues reside em Piracicaba, é além de tudo um artista no violão e dono de uma voz que deixa toda e qualquer platéia maravilhada. Sempre solicito, canta pelo prazer, participou de grandes programas em televisão e rádio. Gravou musicas em Compact Disc (CD). É um artista completo que por opção pessoal seguiu a carreira profissional em outra área, que também envolve muita técnica e arte, a de modelista. É um dos grandes nomes da história da indústria automobilística nacional. Casado em segundas núpcias com Lina Valentim Rodrigues.
Você nasceu em Andradas e foi criado em que cidade?
Nasci em Andradas e fui criado em São Paulo. Fomos morar na Vila Alpina. Mudamos para São Caetano do Sul onde meu pai adquiriu um terreno e construiu uma casa. , estudei na Escola Dom Benedito Alves de Souza. Minha primeira professora foi Maria Soledade. O ginásio eu estudei no Instituto Rocha Pombo.
Você já estava trabalhando?

Comecei a trabalhar aos nove anos, tinha que ajudar a família. Meu pai fez uma caixinha de engraxate, eu ia para o campo de futebol e exercia minha atividade. Ia almoçar em casa, depois ia para o Clube da General Motors, havia jogo de boliche, eu ficava levantado pinos até umas quatro ou cinco horas da tarde. Eram pinos de madeira. Fiz isso até os doze anos, fui trabalhar em uma loja cujo proprietário era do São Caetano Esporte Clube. Eu gostava de jogar bola ele acabou me levando para treinar no time. Jogava como ponta esquerda. Só parei porque aos 17 anos tive um acidente durante um jogo, um adversário com chuteiras com cravos atingiu minha perna. Permaneci 45 dias em casa me recuperando, foi um corte extenso. Passei a jogar ping-pong, hoje denominado de tênis de mesa, no SESI em São Caetano. Fomos campeões intermunicipais, ganhamos o campeonato do ABC e região: São Bernardo, São Caetano, Diadema , Piraporinha e Ribeirão Pires. Como exercício individual, pratiquei natação. A GM – General Motors tinha um grupo de escoteiro, participei desse grupo. Comecei a freqüentar o SENAI, passei a trabalhar na Aços Villares, naquele tempo ficava-se seis meses na Escola SENAI e seis meses na fábrica. E a noite eu estudava o colegial. Na Escola de Desenho 28 de Julho fiz o curso de desenho técnico. Isso em uma época em que havia fila para entrar nas salas de aula colocava-se um a mão no ombro do colega da frente, cantava-se o Hino Nacional. No Dia da Bandeira cantava-se o Hino à Bandeira. Fiz o curso SENAI durante o dia e também o SENAI a noite, onde fiz o curso de modelação, na Escola Castro Alves C-22, no Cambuci. Quando me formei na minha carteira de trabalho colocaram como “Aprendiz Qualificado”.

Da Villares você foi trabalhar em que empresa?

Fui trabalhar na Ford. No inicio tive que desempenhar funções diferentes da que pretendia: eu queria ser modelador.  Nessa época surgiu o Renault, Dauphine, Gordine, ajudei a montar todas as máquinas da linha de montagem, eu sempre ia ao Departamento de Engenharia, queria saber quando passaria para a modelação. Até que em um dia no Departamento de Estilos da Jeep Willys estavam precisando de um modelador. Permaneci lá quase 10 anos, já pertencia a Ford. No Departamento de Estilos trabalhei desde 1963 até 1967.

O que fazia o Departamento de Estilos?

Na época para sair um carro novo na rua demorava-se três anos, um especialista em desenho recebia sugestões do carro desejado, ele então desenhava aquele carro. Ai vinha para o modelador, geralmente diziam: “-Queremos que voce faça isso aqui em escala 1 por 5”. Ou seja, exatamente igual, só que em tamanho cinco vezes menor. As rodas eram torneadas em madeira, com dois pauzinhos fazíamos a longarina, colocava-se um pedaço de compensado em cima, fazíamos uma gaiola, colocávamos longarinas onde é o capô, o teto, em cima daquilo colocávamos um barro especial que colocado em estufa ele amolecia, era preenchida a superfície além do limite, o que estava no papel era feito em escala 1 por 5, saia direitinho.

Tem que ter uma mão de escultor para fazer, ou seja, tem que ser artista?

Entra arte, técnica, o artista não trabalha bem com medida, trabalha mais com proporção. Vinha um desenho para nós com comprimento, largura, bitola, altura, por exemplo, a altura com relação ao chão era padrão. Assim como a altura do para choque, dos faróis, altura do teto.

E as curvaturas?

As curvaturas íamos sempre nos baseando nas medidas do comprimento, largura e altura, dentro da altura máxima fazíamos uma longarina que chegava ao teto, na linha de centro. Depois fazíamos mais duas linhas coordenadas, uma de cada lado em relação a linha de centro. Acompanhando o desenho. Para fazer as curvas tínhamos ferramentas próprias, espátulas, uma infinidade de curvas francesas, era uma escultura técnica.

Tinha que ser artista para fazer isso tudo?

Eu não me considerava um artista. Na modelação voce faz o desenvolvimento de superfície. Tem que ter noções de raios. Uma vez fizemos o modelo de um carro cujo emblema era o Diabo montado no garfo. Fizemos o protótipo, naquele tempo havia uma exposição de carros no Ibirapuera. Não foi aprovado porque o chassi era tubular. Quando a pessoa subia em uma calçada com o carro não conseguia abrir a porta. O Departamento de Estilos no Brasil começou naquela época. Os carros que chegaram aqui foram o Dauphine, Gordini. O Simca veio depois. Da Ford fui para a General Motors onde trabalhei por quatro anos, depois fui para a Chrysler onde trabalhei por cinco anos. Quando trabalhei na Simca fizemos o Dodge Polara, era um carrinho bonito, forte. Na GM fui o primeiro funcionário a ser admitido como Modelador de Estilo. Entrei como Modelador Senior. Lá eu trabalhei de 1967 até 1972.

Modelador de Estilo era uma figura rara na época?

Não existia! Tanto que quando fui para a Chrysler fui como supervisor, a Simca estava sob o comando da Chrysler, fui buscar modeladores conhecidos meus, que já eram do ramo. Se anunciasse a vaga não aparecia ninguém. Na GM trabalhei na criação do Opala, o nome faz referência a uma pedra, o mentor desse nome foi um designer chamado Carlos Alberto de Oliveira. O diretor de engenharia disse que íamos inventar um carro aqui. Eu dava estimativas: vai demorar tanto tempo, quero tantas horas, preciso disto, o pessoal que estava junto comigo se empenhava para entregar tudo no prazo pré estabelecido. Lembro-me que na Chrysler ia vir o painel de instrumentos do Dodge Charger, estávamos aguardando a vinda do painel, julgaram que não tínhamos condições de fazer um painel de luxo, compatível com o carro. Sugeri que fizéssemos um painel, para mostrarmos que também, sabíamos fazer. A nossa equipe fez o painel, utilizando o material que era da época, os americanos vieram, fizeram uma palestra de umas duas horas, quando acabaram a apresentação, mostramos nosso painelzinho, ficaram encantados, o nosso painel é que acabou sendo adotado. O painel que eles fizeram tinha muito aço bisotado, muita coisa que brilhava, e dentro do carro não se pode colocar elementos que dê reflexo com a luz, tanto durante o dia como a noite. Nós tínhamos um painel todo de madeira, naquele tempo usava-se o jacarandá e por dentro colocamos cerejeira, com todos os relógios marcadores muito bem posicionados. Na época não existia computador, era tudo feito na prancheta. Atualmente até as pranchetas são motorizadas. Naquela época era tábua formando a prancheta pantográfica e a famosa régua “T”. Era maravilhoso na época, eu gostava. Na Ford tínhamos um desenhista, Hans, ele trabalhou depois na revista Medicina e Saúde, no Hospital das Clinicas eles pegavam um coração, um pulmão, o Hans desenhava com absoluta perfeição e riqueza de detalhes. O Hans era o responsável por todos os desenhos da revista. Era uma sumidade. Para automóvel também ele era muito bom, quando ele chegou o Brito já estava lá.

É uma parte da história automobilística do Brasil que poucos conhecem.

Há fatos interessantes, curiosos. Uma vez o Charles de Gaulle presidente da França veio nos visitar, o Interlagos é uma versão do carro francês Alpine, o Presidente Castelo Branco deu um carro Interlagos de presente para Charles de Gaulle, era um monstro de homem, tinha quase dois metros de altura, como iria entrar naquele carro esportivo? Ele só ameaçou entrar, abriu a porta, a cabeça dele batia. Ele agradeceu, disse que ia dar a seu filho. Dali a uns dois meses saiu uma brincadeira: Castelo Branco foi visitar Charles de Gaulle, ganhou uma gravata! Era sabido que Castelo Branco tinha pescoço muito curto.

Na General Motors você participou de grandes projetos?

Fizemos o projeto do caminhão Chevrolet Brasil, da Veraneio. A famosa caminhonete Marta Rocha era importada e montada no Brasil. Feito aqui foi a F-100 da Ford. A Chevrolet fez a C-10, C-14, D-20 que é fabricada até hoje. Deixei a indústria automobilística, em 1975 houve a crise do petróleo, fecharam cinco fábricas da Chrysler: da Argentina, Colombia, Venezuela, Brasil. Quando me chamaram para ir trabalhar na Chrysler eu já não queria trabalhar na indústria automobilística. Queria trabalhar em um local menos fechado, fui trabalhar com vendas na Melhoramentos, na Abril Cultural. Um funcionário da Chrysler foi duas vezes me procurar em casa, decidi ir até lá. O Celso me levou até a sala do chefe do departamento, era Pedro Falcone, um argentino que tinha trabalhado comigo na General Motors e havia aprendido muito conosco. Fui convencido a trabalhar, entrei como supervisor, com um salário substancial, veículo da empresa, começamos a caçar pessoas de talento no mercado, montamos um departamento de estilo na Chrysler, em frente a Volkswagen, na Via Anchieta. Trabalhei para a Volkswagen, fiz a maquete da Variant e acho que da Kombi também. Para a Mercedes-Benz fiz um para choque de plástico para caminhão, fiz uma versão de plástico, naquele tempo eram para choques de ferro. Fiz um modelo e um protótipo.  

A Kombi não veio com o projeto pronto da Alemanha?

Veio, só que ela sofreu umas modificações, era muito fraca, sofreu modificações nas colunas, tubulação, suspensão, recebeu inclusive uma entrada de ar, era muito abafada.

Há profissionais das mais diversas áreas envolvidos na produção de um veículo?

Na Ford tínhamos três decoradoras: uma cuidava da parte de estofamento, outra da parte externa e outra das cores. Havia um painel enorme, com, por exemplo: tons de verde, tons de todas as cores. Com isso ela tinha uma enorme variedade de opções.
Voce trabalhou em outras empresas com modelação?
Após ter trabalhado na indústria automobilística trabalhei na Modelação Atlântica, na Fast Ship, uma indústria de barcos de corrida e iates, pertencente ao Grupo Souza Ramos. No caso de barcos a aerodinâmica é primordial, tanto as quilhas, como diversos componentes que influenciam muito. A minha participação era só na parte externa, na aparência.
Da Fast Ship você foi para onde?
Fui para Nova Iorque, Estados Unidos, trabalhar em carpintaria naval. Lembro-me bem de que fui preparado para o frio, com roupas e bota forrada com lã, quando desci estava com a temperatura de 40 graus centigrados. Eu tinha um sobrinho que morava lá, ele tinha insistido muito para que eu fosse para lá. Ele era engenheiro na Laminação de Metais no ABC e a esposa era secretária executiva. Lá eles trabalhavam como diaristas, ganhavam um salário bem maior do que aqui onde eram profissionais qualificados.
Quanto tempo você permaneceu nos Estados Unidos?
Fiquei um ano e oito meses. Eu já conhecia o inglês técnico, lá trabalhando com americanos, voce passa a pensar em inglês e não tem alternativa a não ser falar em inglês. Fui fazer um curso de inglês lá e a diretora da escola tinha morado em Goiânia por nove anos.
De lá você foi para que local?
Voltei ao Brasil, comprei um apartamento na Vila Prudente. Em 1991 decidi vir para o interior, adquiri uma chácara em São Pedro, era terra nua, fiz o projeto da casa, construí, enquanto não ficava pronta fiquei hospedado na casa da minha irmã a uns 300 metros. Fiz a cerca, buraco, poço. Fiz toda parte de hidráulica, alvenaria.
Como iniciou o seu gosto pela música?
Comecei quando tinha doze a treze anos. Fui coroinha na Matriz Nova de São Caetano do Sul. Depois passei para a Cruzada Eucarística, fui da Liga Católica. Eu ia para a Congregação e às vezes cantava no coro da igreja. Durante dez anos fui coralista do Coral Clássico e Folclórico Baccarelli do maestro Silvio Baccarelli a sede era na Rua Nazareth, no Ipiranga.
Que voz você faz?
Sou segundo tenor. Estudei com meu ex-sogro. Um dia estava mexendo nas minhas coisinhas, ele disse-me: “–Toninho! Você toca bem! Voce conhece musica?” Ele passou a me ensinar aquela Bona (método completo para divisão musical). Eu gosto de compor, naquele tempo já tinha escrito alguma coisa, ele me levou a Chantecler, mostrei umas musicas, gostaram, me mandaram para o Morumbi, para a Bandeirantes, fui falar com o maestro Cocho, ele me deu um cartão para falar com o Caetano Zama. Arrumaram-me para cantar nas emissoras associadas cantei na Rádio Clube de Santo André, na Rádio Cacique de São Caetano. Fui crooner da Orquestra Carinhoso do maestro Osvaldo. Tive uma dupla sertaneja famosa em São Paulo chamava-se Rodrigo e Rodrigues.  O meu parceiro chamava-se Madiel Rodrigues Figueiredo. Tivemos um programa na Radio São Paulo durante uns quatro anos, chamava-se “Recital Sertanejo”. Voltei a cantar sozinho. No meu primeiro casamento não tive a felicidade de ter filhos, no meu segundo casamento tive dois filhos. Eu cantava em uma casa chamada Cana Verde, no bairro Santa Cecília.  Comecei a cantar musicas de Milionário e José Rico, Miguel Aceves Mejía, Pedro Vargas. A casa encheu outra vez. A Lilian Gonçalves um dia passando lá viu aquele tumulto todo, ficou escutando eu cantar, convidou-me: “Vai lá ao meu restaurante!”. Fui, cantei no Bastidores, na Biroska I , Biroska II, na Toca, trabalhei com ela por uns seis meses.
Ganhava bem?
Dava para levar. O que mais me desanimou é que meus filhos estavam crescendo com o pai ausente. Um dia eu disse a meu parceiro que tocava guitarra, era um boliviano, disse-lhe que assim que terminasse o contrato iria parar. Ele era proprietário da empresa CIMA, era uma indústria que vendia perfis de alumínio para serralheiro. Ele  ofereceu emprego como vendedor. A oferta foi boa, aceitei. Eu cantava no Clube Piratininga, onde havia a Festa Baile. O Agnaldo Rayol e Francisco Petrônio cantavam lá. Conversei com o Agnaldo, ele me convidou cantamos juntos “Galopeira”. Passei a trabalhar com a Promel que fazia fechaduras, assim tive duas representações. Tornei-me evangélico, aos poucos fui deixando o meio musical. Cheguei a vender musicas, compostas por mim.
Quantas composições você tem?
Umas 300 ou mais.
Tem algum motivo que desperta uma determinada inspiração?        
O problema do compositor é o tema. O que mais rola no mundo é a música romântica. A música reflete o grau de escolaridade, de cultura. Infelizmente estamos perdendo valores importantes. O ritmo não é tão importante, o fundamental é a mensagem que a musica transmite.
Você cantou e várias emissoras de rádio e televisão.
Cantei na Record, foi onde conheci Thais de Almeida Dias, como jurada, na Cultura, Tupi, Rádio Clube de Santo André, Rádio Cacique de São Caetano. Vendi uma música que eu tinha composto, o cantor que adquiriu a musica é famoso e fez muito sucesso, não posso revelar nada da negociação. porque tenho um contrato assinado que inclui o sigilo total. Quando vendi tinha uns vinte anos.
Você participou de shows abertos?

Participei com shows onde cantaram Wilson Simonal, Luiz Fontana, Dino Franco, Tião Carreiro, Abel e Caim, Os Vips. Cheguei a fazer shows em Rorâima, Barretos, Porto Velho, Jaboticabal, Rio Preto, Inhandiaára. Uma vez eu estava cantando uma música de Agnaldo Thimóteo, ele estava presente com o irmão dele Major e o Mitta. Ele disse: me: “Olha, irmãozinho, você não sabe como é emocionante alguém cantar a música da gente! Voce conhece a malandragem da musica, você tem jeito”. A música não é só cantar. 

LUZIA PINTO DE LIMA GORGA

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 16 de janeiro de 2016.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADA: LUZIA PINTO DE LIMA GORGA


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Luzia Pinto de Lima Gorga nasceu em Piracicaba a 20 de março de 1937. Filha de Antonio Pinto de Lima e Angelina Casarini que tiveram dez filhos: Airtom, Oswaldo, Antonio, Olga, Dirce, Dirceu, Terezinha, Aparecida, José e Luzia.  Seu pai era caboclo e sua mãe filha de italianos. Casada em segundas núpcias com Antonio Gorga Filho.
Quando a senhora era ainda criança, sua família morava em que local?
Morávamos na Rua São João próximo a Rua Marechal Deodoro. Aliás as ruas eram todas de terra a Avenida Carlos Botelho era de terra com pedregulho. O bonde passava na frente da nossa casa, a linha do bonde era próxima a calçada. Estudei no Grupo Escolar Moraes Barros, na época eu tinha sete anos, tínhamos mudado para uma casa situada na ESALQ.  Para ir até o Grupo Escolar Moraes Barros, íamos de bonde, comprávamos passe escolar na prefeitura, quem vendia os passes chamava-se Mário Moreno, que nas horas vagas era sanfoneiro.
O que levou a família da senhora a residir nas dependências da ESALQ?
O meu pai era funcionário da ESALQ, motorista, ele nasceu na ESALQ e trabalhou por 54 anos na ESALQ.  Meu avô paterno, Luciano Pinto de Lima, nasceu em terras pertencentes a ESALQ, ele era do tempo de transportar angu para escravos na Fazenda Morro Azul para onde tinha ido trabalhar. Mais tarde trabalhou com aquela antiga carrocinha de lixo, varria a rua e colocava o lixo na carrocinha conduzida a mão. Já com bastante tempo como funcionário da prefeitura, minha avó faleceu, ele passou a morar com a minha tia que morava próxima ao Aviário da ESALQ.  O eu pai nasceu onde hoje é a Colônia do Bananal. Ainda menino o meu pai levava água em corote para as pessoas que trabalhavam na roça. Quando já tinha idade apropriada tirou a habilitação como motorista e passou a ser motorista da ESALQ. Transportava alunos na perua, na caminhonete, naquele tempo havia o transporte de alunos no mesmo formato como eram transportados os bóias-frias. Colocavam umas tábuas eles iam sentados. Era uma caminhonete aberta onde meu pai levava os alunos para aulas na zona rural. Naquele tempo havia uma grande preocupação com as formigas que existiam em grande quantidade. Lembro-me que meu pai dizia: “Não fique andando como barboleutas pelo parque”. Ele usava esse termo mesmo”barboleutas”.
Era o tempo em que havia muita saúva no Brasil?
Havia muita saúva, elas eram exterminadas com o uso de máquinas que enchiam os formigueiros e suas ramificações com a fumaça de carvão em brasa e arsênico. Dr.  Mariconi era professor da ESALQ nesse tempo.O fato do meu pai ter que estar sempre a disposição da ESALQ permitiu que morássemos nas casas que existiam próprias para funcionários. Ele ficava de plantão.
Quantos funcionários moravam nas dependências da ESALQ?
Havia as colônias de casas, a ESALQ tinha quatro colônias, tinha a colônia da carpintaria, em frente ao atual restaurante, havia a colônia que meu pai chamava de “pombal”, eram umas casas ao lado da outra, todas pintadas de branco, essas ficavam próximas ao prédio principal. Depois tinha a conhecida como “colônia das vacas” por estar próxima ao gado leiteiro da escola. E tinha a colônia do Bananal, beirando o Rio Piracicaba. Tinha ainda sete casas no pomar e mais sete casas no campo de aviação. Os funcionários muitas vezes durante a noite tinham que dar assistência as criações, como por exemplo, o parto de uma vaca.
Após concluir o Grupo Escolar Moraes Barros a senhora foi estudar em qual escola?
A minha primeira professora no Grupo Moraes Barros foi Dona Antonia Martins de Toledo, irmã do diretor José Martins de Toledo. De lá fui para a Escola Industrial, sou da primeira turma da Escola Industrial, o diretor era o Sr. Mario Boscolo. Naquele tempo a denominação correta era Escola Técnica Fernado Febeliano da Costa. O bonde da Vila Resende saia do lado da catedral, ao chegar próximo a atual Câmara Municipal havia um desvio na linha, era onde um bonde prosseguia em direção ao centro e outro em direção à Vila Rezende, até onde hoje existe um posto de gasolina, no final da Avenida Rui Barbosa. Próximo havia a estação de trem da Sorocabana que seguia até o Porto João Alfredo, hoje Artemis.
Quantos anos a senhora permaneceu na Escola Técnica Fernando Febeliano da Costa, a Escola Industrial?
Foram quatro anos em período integral. Nós almoçávamos na escola. Ensinavam além das matérias regulares outras como corte e costura, desenho, pintura. entravamos as sete e meia da manhã e saíamos às cinco horas da tarde. Tinha aulas de ginástica, era matéria obrigatória. O professor José Vicente Caixeta dava aulas na Escola Industrial.
Tinha uma fanfarra famosa lá?
Naquele tempo chamava-se fanfarra depois passou a ser chamada de Banda Marcial. Fiz parte da fanfarra, tocava surdo. O professor Danilo Sancinetti foi o primeiro a comandar a fanfarra depois veio o professor Henrique Wolgemuth Miller. Todos os professores eram muito competentes, nós aprendíamos muito com eles. A maioria eram professores que vinham de outras cidades e ficavam em pensões em Piracicaba. O uniforme da fanfarra era uma saia preta, uma blusa branca, gravata, sapato colegial, sendo que na gravata estavam a iniciais FFC – Fernando Febeliano da Costa. Por uns dois anos joguei basquete na quadra do XV. Teve um ano que a Escola Industrial fez ginástica rítmica no antigo campo do XV, o “Roberto Gomes Pedrosa”, na Rua Regente Feijó. Uma aluna ficava em um tablado, era tocada a música e toda a escola acompanhava os movimentos rítmicos.
Havia uma rivalidade muito grande entre o Industrial e o Colégio Dom Bosco para ver quem tinha a melhor fanfarra?
Havia, mas era mais acirrada no desfile de 7 de Setembro. Havia um grande entusiasmo popular em ouvir e ver a fanfarra desfilando.
Com que idade a senhora concluiu o curso na Escola Industrial?
Eu tinha de 15 para 16 anos. Recebemos o diploma na Sociedade Italiana di Mútuo Socorro Aos 18 anos entrei na Décima Terceira Ciretran, isso no tempo do Dr. Adir da Costa Romano, Zenon Batista Citrângulo. Janio Quadros era o governador do Estado. A Ciretran era na Rua São José, junto a delegacia. Isso foi por volta de 1958. Naquela época era tudo feito a máquina, a carteira de habilitação era feita na máquina de escrever. Fazia aqui mesmo, não ia para São Paulo. O exame para habilitação era feito por dois peritos e pelo delegado. Eram exames teóricos e práticos. No Ciretran fiquei uns dois anos e meio, fui trabalhar na fábrica de cordas do Dr. Virgilio Lopes Fagundes, a  Agave Industrial Limitada, o escritório era na Rua Treze de Maio, perto do Museu Prudente de Moraes. O contador era o Pedro Natividade. O Dr. Virgílio tinha uma mangueira no quintal, era dessa manga Tommy. Quando amadurecia, a esposa dele trazia em um pratinho a manga picadas em pedaços para nós. Era muito atenciosa. A fábrica ficava em Santa Terezinha, havia muitas mulheres que trabalhavam lá. Permaneci na Agave uns dois anos e meio. Em 1960 eu casei-me. Tivemos um filho, Alaor Pinazza Júnior, já falecido.
Após o casamento a senhora parou de trabalhar fora de casa?
Depois e cinco anos de casada é que entrei na Prefeitura Municipal. O prefeito era Luciano Guidotti. Fui trabalhar na Secretaria de Finanças, na Contabilidade. No prédio da Rua São José. Isso foi em 1966, em 1968 o prefeito Luciano Guidotti faleceu. Era um homem muito serio, não gostava de funcionário vagabundo. Permaneci na prefeitura de 1966 até 30 de dezembro de 1992. Quando comecei a trabalhar a prefeitura funcionava ainda na casa que tinha pertencido ao Barão de Serra Negra, o prédio foi demolido e hoje é um páteo.  
Após a morte de Luciano quem assumiu a prefeitura?
Foi o vice-prefeito Nélio Ferraz de Arruda. No nosso tempo era tudo feito com máquinas de somar. A informática entrou quando eu estava saindo. Um curso que fiz e foi muito útil foi o de datilografia com Dona Rosa Orlando Canto, a Dona Rosinha, na Rua XV de Novembro quase esquina com a Rua Governador Pedro de Toledo. Ela não queria alunas de unhas compridas, vinha coma tesourinha cortando as unhas das alunas. Em cima do teclado da máquina havia uma tábua, que permitia escrever sem ver as letras. O exame final era a cópia de um texto, ela ficava com um cronometro marcando o tempo. Fiz o Curso Técnico em Contabilidade na Escola de Comércio Cristovão Colombo. Trabalhei com Luiz Mattiazzo, Florivaldo Coelho Prates, Joanin Bouchardet e Antonio Barrichello. Quando estudava contabilidade na escola do Pedro Zanim e Dona Branca, eram marido e mulher, o secretário era o Bertoco. Tinha aula de português com o professor Cotrin. Quando entrei na Escola de Contabilidade, em 1970 tinha 34 anos, eu era a avó da turma. Com esse jeito, logo essa diferença de idade desapareceu. Sou considerada e condecorada como “Amigos dos Bombeiros”, uma condecoração da qual tenho muito orgulho. Recebi das mãos da então prefeita de São Paulo, Luiza Erundina.
 Meu marido e eu fomos até São Paulo, no Ibirapuera, para receber essa comenda. Teve uma demonstração dos bombeiros, minha cunhada tinha ido junto, eu estava tão absorta com aqueles malabarismos dos soldados, tinha alguém batendo no meu ombro, disse-lhe: “ – Lindinha, pare de bater! Olhe lá que espetáculo!”. Era a prefeita Luiza Erundina que queria me cumprimentar! Fui funcionária pública e tinha orgulho em poder servir as pessoas que procuravam o serviço municipal. Por esse desempenho tenho o reconhecimento da Guarda Civil, do Tiro de Guerra. Nunca fui de estabelecer dificuldades para estabelecer a importância das minhas funções ou por vaidade pessoal.
A senhora é vaidosa?
Eu era muito elegante, até hoje com meus 79 anos sou vaidosa. Mantenho minha agilidade. Acredito que tem muito a ver com hereditariedade. . Meu marido é muito calmo, eu já sou mais agitada. Sempre fui.
A seu ver, de forma geral, o funcionalismo publica mudou?
Mudou! Falta humanidade, solidariedade. Sempre tratei o contribuinte com muita atenção e em particular os idosos eu sempre fiz o que foi possível. Alguns secretários tinham um respeito muito profundo por mim, diria até certo temor. Fiscalizei muitas casas de caridade. Sempre fui muito rigorosa na análise da documentação, sem, no entanto deixar de usar o bom senso. Quando encontrava alguma coisa polemica já tomava uma atitude enérgica. Já ocorreu de em viagens, por descuido, o secretário apresentar as despesas e incluir algum item que a legislação não admite como despesa. Eu fazia o secretário restituir a despesa indevida. Quando houve períodos de contenção de despesa na prefeitura, muitas vezes eu reduzia a quantidade dos itens que eram requeridos.
A senhora lembra-se do tempo em que o pronto socorro era na antiga rodoviária?
Lembro-me! Lembro-me também do Pronto Socorro que funcionou na casa do Pretel, onde hoje é um cartório, na esquina da Rua São José com a Rua do Rosário. Ali por um período funcionou a prefeitura, o prefeito era João_Herrmann_Neto. Lá tinha a imagem de Nossa Senhora Aparecida, eu tinha um carramanchão que dava umas flores azuis, eu cortava e levava para colocar junto a imagem. O João Hermann dizia: “Já sei! A Luzia esteve por aqui!”.
A seu ver, como era o prefeito João Hermann Neto?
Eu gostava dele, era uma pessoa muito expansiva. Sempre olhou muito pelos funcionários. Em qualquer lugar ele abraçava, beijava. Eu sou do tempo em que o Tribunal de Contas vinha para conferir as contas da prefeitura.
Lembro-me da Madalena, que freqüentava sempre a prefeitura. Dia 27 de setembro ela faz aniversário, nós comprávamos uma  champagne e oferecia para ela.
A senhora conheceu a vereadora Ditinha Pinezzi?
Conheci! Era muito extrovertida. Brigava com Luciano Guidotti. Conheci o seu marido Vicente Pinezzi. Vereador não ganhava salário nenhum. O prefeito Luciano Guidotti doava seu salário. Elias Sallun trabalhava com Luciano Guidiotti. Conheci Haldumont Nobre Ferraz, o pai dele era farmacêutico, quando eu tinha 10 anos de idade o pai do “Tiquinho”, como era conhecido o Haldumont furou a minha orelha para colocar brincos. O Tiquinho foi vereador. Trabalhei com João Maffeis Netto. Conheci Jamil Netto, Xilmar Ulisses. Trabalhei com Lazaro Pinto Sampaio, Hide Maluf.
A senhora lembra-se quando foi criado o SEMAE?
Onde está a Câmara Municipal existia um local que eram umas casinhas, ali era o SEMAE, depois foi para um local em frente ao Cine Broadway. Lembro-me de uma funcionária que trabalhava lá, super competente, a Maria Aida.  Na esquina da Rua São José com a Rua Alferes José Caetano ficava a Funerária do Libório. Na esquina oposta ficava o Bar da Lola.
As instalações a prefeitura na antiga mansão do Barão de Serra Negra estavam superadas?
Não tinha mais condições de comportar uma prefeitura, estava tudo desgastado, só havia dois banheiros para todos os funcionários. Na parte inferior do prédio funcionava a Cooperativa dos Funcionários Públicos de Piracicaba. No dia 7 de julho de 1968 em que Luciano Guidotti faleceu, o páteo da Câmara Municipal ficou com muitos idosos do Lar dos Velhinhos de Piracicaba, do qual Luciano Guidotti foi benfeitor por muitos anos. Seu corpo foi velado no prédio da Câmara Municipal. Lá pelas quatro horas o corpo foi levado a pé até a Catedral de Santo Antonio, depois é que foi levado em carro aberto do Corpo dos Bombeiros. Foram necessários dois caminhões basculantes para levar todas as coroas de flores.
A senhora lembra-se da queda do Comurba?
Minha mãe estava em casa. Lazinho Capelari recolheu os entulhos com o poder de pão com mortadela e café com leite.
A senhora conheceu “Nhô-Lica”?
Conheci, eu estava no grupo escolar. Ele andava com uma capa preta, recolhia pedras da rua que dizia serem preciosas.
Como era a poesia que a senhora ouviu ainda criança?
O Meton Maranhão tinha um gato chamado Cazuza. O Zambello,chefe da guarda matou o Cazuza. Naquela época tinha muita raposa, gato do mato, cobra, meu irmão mandava cobra para o Butantã. Isso há 60 ou70 anos. O Meton era meio poeta, ele fez uma música: “Zambello chefe da guarda/Só mata raposa e coruja/Com um tiro da espingarda/ Matou o meu Cazuza”. Eu tinha uns doze anos nessa época. Sou do tempo em que subíamos a caixa de água da ESALQ para espantar as corujas. A caixa tem dois andares, lá em cima onde há uma bola com água dentro e nós chamávamos de bola da água.
Do grupo escolar a senhora lembra-se de algum trecho de música?

De José Martins de Toledo, Dona Antonia Martins de Toledo. Nós cantávamos no recreio, de dois em dois para subir, tinha um Cristo na parede, subíamos a escada cantando: “A escola querida do alegre recreio/ do mais vivo anseio por muito estudar/ e vós amiguinhos que vós mocidade/ oh quanta saudade irão nos levar/assim vamos hoje / de flores ou lentes/ de louros de dentes / a fonte cingir/ jamais esse dia tão cheio de glória/ em nossa memória irá de porvir/ aplausos e palmas aos mestres zelosos/ aos guias que a infância conduz/ a eles louvores e nossos afetos” Outra música que me lembro, sobre o “A” encarnado: “O “A” encarnado da Luiz de Queiroz/ o “A” encarnado saúda todos nós/ Os universitários de todo interior/ Vieram mostrar sua pujança e seu valor/Vamos ao esporte/ Vamos com amor/“. Isso ouvi quando era criança, na época em que foi construído o ginásio da agronomia. 

quarta-feira, dezembro 30, 2015

ALBERTO DIAS PEDROSO DO CARMO



PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 09 de janeiro de 2016.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: ALBERTO DIAS PEDROSO DO CARMO


Alberto Dias Pedroso do Carmo nasceu a 21 de novembro de 1952 em São Paulo no bairro da Bela Vista também conhecido como Bexiga. É filho de Alice das Dores Dias Carmo e Roque Pedroso do Carmo, tem um irmão chamado José Antonio Pedroso do Carmo. Alberto é pai de três filhos: Aline, Alessandra e Cássio. É avô de duas netas piracicabanas Valentina e Mikaela. Hoje Alberto reside em Piracicaba. Formado em Administração de Empresas com especialização em Comércio Exterior. Músico de talento expressivo. É tradutor muito respeitado, traduziu livros, sendo muito procurado por empresas pelo seu talento em traduzir e conseguir transmitir a mensagem original de forma objetiva.
Inicialmente seus estudos foram feitos em qual escola?
O jardim de infância, pré-primário e primário até o segundo ano, estudei no Colégio Santa Monica, na Rua Augusta, próximo havia o Colégio Santo Agostinho. Do terceiro ano até me formar no colegial estudei no Colégio Imaculada Conceição, ficava na Rua Cincinato Braga, onde hoje existe um supermercado. Ficava próximo a Igreja Imaculada Conceição, os padres da Igreja participavam do colégio. O dono do colégio era o Professor Carramenha de Goes. Trabalhei quando tinha uns 14 a 15 anos, em um escritório de engenharia situado na Rua Rocha, onde nós morávamos. Ali eu ficava escrevendo com nanquim nas plantas de construções. Em 1970, aos 18 anos prestei o vestibular chamado MAPOFEI – sigla das escolas Mauá, Politécnica e FEI. Entrei na FEI- Faculdade de Engenharia Industrial. Era paga e ficava no ABC. Não tinha como eu ir para lá, nós éramos uma família simples. Prestei também no Mackenzie e entrei em Engenharia Civil no Mackenzie. Nessa época eu já falava inglês por causa dos Beatles, desde os doze anos eu era fã deles. Essa minha facilidade em falar inglês permitiu que entrasse no departamento de reservas da VARIG, em Congonhas. Era um trabalho de meio período, nós trabalhávamos um sábado e um domingo por mês. Lá só trabalhavam jovens universitários, tinha que saber falar inglês. Eu trabalhava das sete horas da noite até a uma hora da manhã. Estudava engenharia no Mackenzie, as aulas iam das oito horas da manhã até as seis horas da tarde. Minha mãe me levava uma marmita às seis horas da tarde, lá no Mackenzie, subia as escadarias da Rua Avanhandava e ia lá para o Mackenzie. Eu tomava o ônibus Jardim Miriam e ia para o aeroporto, pegava o ônibus lotado. Ao chegar à VARIG ia a uma espécie de cozinha, comia minha marmita, descansava um pouco e ia trabalhar.
E para voltar do Aeroporto de Congonhas até a sua casa?
Eu pegava o último ônibus Jardim Miriam, às vezes um amigo ia me buscar, nós já tocávamos juntos em uma banda desde os treze ou quatorze anos.
Como você aprendeu a tocar?
Começou quando eu tinha 3 a 4 anos de idade, meu pai tocava cavaquinho, ele tinha os discos de 78 rotações, colocavam os discos para tocar, eram com agulhas de metal, tocava um disco e já tinha que trocar de agulha. Era uma agulha por disco! Lembro-me da música “IV Centenário”, com Mario Zan na sanfona e de Luiz Gonzaga "Qui nem Jiló”. Eu pegava o cavaquinho do meu pai e ficava brincando, até que chegou uma época em que pela manhã ele afinava o cavaquinho e deixava para que eu tocasse. A primeira musica que aprendi a tocar foi “Toque de Silêncio”. Ficava o dia inteiro tocando essa musica. Por volta de 1962 a 1963. Andando com a minha mãe ela disse-me: Você viu que surgiu um conjunto de cabeludos? Disse-lhe que não sabia. Ela estava falando dos Beatles. Com os amigos acabei conhecendo os Beatles, com os quais ficamos maravilhados.

Naquela época o habito entre os jovens era usar o cabelo curto?

Todos usavam cabelos curtos. Lá pelos 13 ou 14 anos já começamos a ficar com os cabelos compridos. Era um choque um rapaz usar cabelo comprido, diziam palavras chulas a quem usasse. Começamos a ouvir Beatles. Os discos em vinil, dos Beatles saiam defasados aqui. Fui a um aniversário na casa de um amigo onde estava realizando uma festa de comemoração, esse meu amigo pegou um violão e tocou Twist and Shout. Foi lá que conheci um violão, fiquei fascinado e comecei a aborrecer meu pai, eu também queria ter um violão. Com muito sacrifício meu pai e minha mãe compraram um violão, pagaram em parcelas. Era um violão da marca Rei, Comecei a aprender e aprendi muito rápido. Já formamos um conjunto musical: “Os Nobres”. Era eu tocando um violão, meu irmão que ganhou de uma prima mais abastada um violão em que colocamos só quatro cordas, para ele tocar contrabaixo, o baterista era vizinho nosso, é um grande baterista que toca até hoje em um conjunto chamado Rockover, na época ele colocava uns pedaços de plásticos, como se fosse bateria, o prato da bateria eram aquelas caixas aramadas de transportar garrafas de leite, e o Cecílio que já tocava violão. Começamos a tocar e a fazer música também, versões das musicas dos Beatles. Nessa época eu ainda não falava inglês. Com os discos dos Beatles tentávamos imitar o som do inglês, nós falávamos sem saber o que queria dizer, aos poucos íamos conseguindo uma letra, não era como agora que você entra no Google e pega a letra! As vezes em alguma revista saia uma reportagem, pegávamos a letra e saiamos cantando, com isso começamos a treinar inglês. Isso foi até eu me casar aos 27 anos. Tivemos conjunto, tocamos na TV Excelsior, tocamos no Restaurante Bierhalle, em Moema. Tocávamos em troca do almoço, que era salsicha com maionese e pela sobremesa que podíamos pedir o que quiséssemos, pedíamos Banana split. Minha mãe costurou o uniforme do conjunto. Tocávamos música dos Beatles e algumas músicas compostas por nós. Usávamos uma calça listada, camisas com gola muito alta, um chapeuzinho de veludo vermelho. Eu fiz mais de 50 versões de músicas dos Beatles. Tocamos na TV Cultura, eles nos deram para cada integrante uma caixa de biscoito e pastilhas supra sumo.

Quando você menciona versão o que significa?

Você pega a música “Got To Get You Into My Life” , é uma música do LP Revolver, de 1966, eu fiz a versão dizendo: “Quero você em minha vida” . Não era tradução, às vezes não tinha nada a ver com a letra da música. Aliás, a maioria das vezes! Pegava uma música e inventava uma letra romântica.  Fazíamos isso por diversão, estudava antes de almoçar, o resto do dia tocava. Eu morava na Rua Rocha e o baterista morava na Rua Silvia, onde muitas vezes ensaiávamos. O avô dele era o proprietário da casa onde morávamos. Aos poucos arrumamos uma forma de tocar no Canal 9, há uma foto conosco tocando, éramos pequenos, pegamos as guitarras do conjunto que estava tocando lá. Quando tinha o “Salão da Criança” tinha música ao vivo, fomos tocar e acabamos conhecendo um pessoal da TV Bandeirantes, passamos a participar do programa “Mini Guarda” do Ed Carlos. Acompanhamos o Ed Carlos em muitas musicas. Lembro-me que uma das músicas que mais fazia sucesso quando tocávamos no programa era a música “Israel” que o Moacyr Franco gravou, o baterista Robertinho, um virtuoso, dava um show na bateria. Íamos e voltávamos de taxi com os instrumentos, até a Rua Brigadeiro Luiz Antonio nas imediações da Rua Pedroso. Tocávamos de ouvido, sem partitura. Nós acompanhávamos as crianças que iam cantar. Aparecia um catatau, perguntávamos o que ele iria cantar, ele dizia, por exemplo: “- Vou cantar “Quando” de Roberto Carlos.” Ele começava a cantar nós acompanhávamos, íamos até chegar ao tom de voz dele. Isso me ajudou muito em percepção musical. Quando passamos a estudar no curso científico, passamos a compor muita música. Músicas de Bossa Nova, acordes de Bossa Nova, mais sofisticadas. Em 1976 ou 1977 eu já trabalhava na Goodyear conseguimos um estúdio de gravação Gravamos uma fita, mas não gerou disco nenhum. Lembro-me que quando ainda estudava no Objetivo tinha o FICO Festival Interno do Colégio Objetivo nós participamos do segundo ou terceiro festival. Nessa época tínhamos umas cinco pessoas que tocavam conosco. Fiz uma música “Concerto em Flá Maior”, fiz essa musica para uma namorada chamada Flávia, Esse festival para participar tinha que ser aluno, só o baterista era aluno, arrumamos várias pessoas e colocamos sete músicas, todas entraram nas semifinais, com orquestra do Maestro Zaccaro, e a música “Concerto em Flá Maior” foi para a final. Um fato interessante é que a música estava em nome de um dos alunos do Objetivo: o Roger do Ultraje a Rigor. Na época pegamos em terceiro lugar. E por ai foi, continuamos tocando, estudando música, quando tinha festas de pessoas conhecidas nos convidavam, íamos com a turma toda. Eram cinco violões de doze cordas. Fazíamos três, quatro vozes nas músicas. Tocávamos Beatles, Bossa Nova e músicas nossas. Fazíamos vocal até no Hino Nacional. Começou a época dos namoros mais firmes, com isso houve gradativamente a dissolução do conjunto. Alguns de nós continuamos a nos encontrarmos. Eu, Tarcísio, meu imrão, outro amigo, o Bruno que infelizmente já faleceu, no ano 2000 ou 2001 conversando com o baterista, o Robertinho, que tem o conjunto Rockover disse-nos: ”Vamos nos reunirmos!”. Começamos a ensaiar, na minha casa no Alto da Lapa, fizemos um show em uma festa de final de ano em uma firma de informática, eles queriam só música dos Beatles, Rock anos 60, ficamos uns seis meses ensaiando aos domingos na minha casa, combinei com o Tarcísio e a última musica que tocamos foi What a Wonderful World, era uma festa de comemoração de Natal. Foi o momento mais emocionante do show. O Robertinho conseguiu a terça-feira para tocarmos no Café Piu Piu. O ensaio era na casa do Robertinho aos domingos, começamos a fazer o repertório, com músicas nossas e musicas MPB.

Você voltou a tocar na noite?

Eu estava morando com os meus pais, tinha me separado, ficava a noite em casa, meus amigos me convidaram para ir tocar em uma boate chamada “Azul da Meia Noite” na Rua Franz_Schubert. Nessa época eu trabalhava no Banco de Boston. Fiquei tocando na boate “Azul da Meia Noite” e em uma boate chamada “House”, em uma travessa da Avenida Jardim.

Você trabalhou na VARIG até que idade?

Eu tinha entrado no Mackenzie em 1972, sai porque o meu salário era todo para pagar a mensalidade. Eu não conseguia estudar, e engenharia civil você tem que estudar muito. Um dia peguei o meu salário, fui até a Del Vecchio na Rua Aurora e comprei um violão de 12 cordas. Esperei, fiz vestibular na faculdade de música na Faculdade Paulista de Música era em um prédio que parecia um castelo, ficava na rua atrás do MASP e comecei a dar aulas no FISK e aulas particulares de inglês. Fiz isso uns dois anos, fiz a opção por composição nosso professor era Edmundo Milani, toda sala tinha um piano, quando ele dava aula executava a musica explicando a composição, nós olhávamos extasiados. Um dia ele estava na lousa e percebi que ele estava com a calça rasgada, aquilo me chamou a atenção. Ao terminar a aula, convidei-o para tomar café, fomos até a Rua Frei Caneca. Perguntei-lhe como era a vida de musico. Ele disse-me que trabalhava no Programa do Chacrinha, tocava em boate até as quatro horas da manhã, vi a vida que um gênio da música levava. Naquele mesmo dia deixei a faculdade. Por coincidência um vizinho que trabalhava na Goodyear ia sair de férias e eles estavam precisando de um funcionário no departamento de marketing por um mês. Fui lá, fiquei um mês, o meu chefe era um americano que morava com a família no hotel Caesar Park. Um dia ele disse-me que tinha nascido um terceiro filho e os outros dois estavam no Caesar Park, eles só sabiam falar inglês, ele precisava de alguém que ficasse com seus filhos enquanto ele dava atenção a sua esposa que estava no hospital, fora uma gravidez complicada. Fui, sob a maior gozação do pessoal da Goodyear, chamavam-me de babá! Fiquei vários dias cuidando dos dois meninos até sua esposa sair do hospital. Nessa época a Goodyear estava formando o departamento de exportação, eles chamaram um senhor de nome Nakagima, chefe de exportação da Goodyear do Japão, maior exportadora da empresa. Fui contratado, começamos com três ou quatro funcionários, quando sai da empresa eram quarenta. Ali veio a minha profissão de comércio exterior. Fiz a faculdade de Comércio Exterior na FAASP. Entrei na Goodyear em 1977. No Banco de Boston trabalhei na Divisão Internacional, na Área de Controle. Foi a época em que começaram os computadores, eu trabalhava com um HP-41C, entraram os Personal Computers, comecei a colocar o meu trabalho todo em computadores. Fiz um banco de dados em Lotus, passei a fazer serviços para o departamento, automatizei a maior parte do serviço de câmbio em rede com o Clipper. No Banco de Boston entrei em 1981 e saí em 1990. Alguns amigos foram trabalhar em um banco chamado Exxcel, na Rua Augusta quase esquina com a Avenida Paulista. Permaneci algum tempo e decidi sair. Meu amigo Tarcisio sugeriu que eu trabalhasse com tradução. Anunciei na revista Veja São Paulo. No inicio apareceram muitas pessoas físicas, querendo traduzir currículo.  Eu e minha parceira Leila, trabalhávamos juntos e adquirimos um computador 286. Adquirimos um programa em DOS, começamos a trabalhar com uma empresa de assessoria de marketing, até que surgiu a internet, com uma novidade o e-mail! Trabalhei com essa empresa de 1992 até 2015.

Você faz tradução técnica e coloquial?

Faço ambas. Principalmente na área de informática e muito em comunicação de empresas. Marketing. Propaganda. Aconteceu um fenômeno no mercado de tradução, começaram a aparecer agenciadores de tradutores, são grupos de tradução na internet. Eles abrem uma agencia de tradução. Há o Sintra -Sindicato Nacional dos Tradutores, são eles que recomendam o preço a ser praticado pelos tradutores. Há sites com mais de 2.000 tradutores, até mandarim eles traduzem. O preço eles espremem, é quem paga menos, se você olhar textos de press-release de muitas empresas o vocabulário está mesmificando, nivelado por baixo.

Quando você traduz algo sigiloso é assinado algum termo de responsabilidade?

Normalmente não assinava, traduzi textos de grandes corporações e extremamente confidenciais, mas o que eu traduzo nem os meus filhos olham. Existe empresa que tem por norma assinar um termo de confiabilidade. Nunca precisei assinar. Trabalhei por dezessete anos com uma empresa, muitas vezes eu dava a minha opinião a respeito da eficácia do texto com relação ao objetivo a ser atingido. Fui tradutor para muitas empresas como Gartner, HP, Texas Instruments, Embratel/Olimpíadas, Dassault Systems, Polaroid, AMD, D-Link, EMC, Verint, Hamburg Süd, Roland Berger, DHL,Schneider Electric, Canon. Traduzi três livros técnicos do inglês para o português. Uma empresa que deseja fazer um anuncio em inglês para colocar no exterior eu sou uma pessoa capacitada para fazer isso. Há muitas empresas que recebem muita correspondência comercial da matriz, tem que colocar para o português, seja algo para ser publicado, um plano que a matriz queira que seja elaborado, textos corporativos, eu traduzia para um bom português para ser publicado. Cheguei a colocar “nota do tradutor” em vermelho quando começaram a vulgarizar demais o vocabulário. Por exemplo, “a nível de”, “focado” “obstaculizar”, cansei de ver escrito repetidamente no mesmo texto. Gosto dos textos do Veríssimo, quando ele é irônico com a americanização que estão fazendo com a nossa língua. Porque “50% off”  põe “50% de desconto”, “sale” escreva “venda”.
Qual é o seu facebook?

 É Alberto Carmo (existe um homônimo), o meu email é: lennon@netpoint.com.br . Um dos motivos que credito ao meu sucesso como tradutor é que eu estava sempre disponível. Lembro-me de uma pessoa que estava o exterior e ligou-me pedindo um texto para que ela usasse dali a algumas horas em uma reunião importante. Segundo ela me disse o texto que elaborei e enviei salvou a conta com um cliente dela. Conheço bem o linguajar do pessoal de propaganda e marketing para escrever de forma bem feita com uma conversa que venda o produto ou serviço. Esse sempre foi o meu diferencial, não era traduzir literalmente, mas sim traduzir de forma que atingisse o objetivo final. Eu opinava, dizia que não achava bom aquilo, que tal escrever desta forma. Nunca usei o que chamam de “motores de tradução” que são programas que traduzem. Vou traduzir de acordo com a realidade do momento, a tradução tem que ficar cada vez melhor. Por exemplo, no Brasil há muitas cidades que buscam investimentos de empresas do exterior. Só que tem que saber falar a linguagem das possíveis empresas interessadas. Simplesmente fazer um site pode funcionar de forma inversa, passa uma impressão errada da cidade, temos que saber que nem sempre a linguagem compreensível para nós é entendida da mesma forma por povos de outra cultura. Um ótimo site para nós pode suscitar duvidas e ate inviabilizar o investimento se não for dito na linguagem que o pretenso interessado entenda.

 

domingo, dezembro 27, 2015

WILSON TEODORO







PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS 
JOÃO UMBERTO NASSIF 
Jornalista e Radialista 
joaonassif@gmail.com 
Sábado 26 de dezembro de 2015.

Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana 
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:

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ENTREVISTADO: WILSON TEODORO


Wilson Aparecido Teodoro nasceu a 10 de maio de 1971 em Piracicaba. Filho de Wilson Antonio Teodoro e Guiomar Flores Teodoro que tiveram ainda os filhos Fabiano e Fernando. A família residiu sempre no bairro Paulicéia. Wilson atualmente é empresário ligado ao ramo das artes marciais na Academia Company Top Fight, Coaching da Confederação Brasileira de Kickboxing. Para todos os eventos no território nacional e internacional. Wilson Teodoro é um Mestre de Artes Marciais.

Você é técnico contratado por diversas entidades esportivas quando são realizados eventos?
Sou contratado pela Selam - Secretaria Municipal de Esportes, Lazer e Atividades Motoras. Quando você passa a ser um treinador que ganha muitos prêmios, automaticamente a Federação vai colocando você como técnico, quando vamos disputar pelo Estado de São Paulo eu sou o técnico de São Paulo.
Você estudou aqui no bairro mesmo?
Estudei na Escola Estadual Professor Antonio de Mello Cotrim até a oitava série. Minha primeira professora foi Dona Marta. A seguir fui estudar química no Anglo Piracicaba. Foram quatro anos, fiz simultaneamente o curso colegial.
Você seguiu a carreira de Técnico em Química?
Nessa época eu já estava desenvolvendo-me como atleta e simultaneamente fiz estágio na ESALQ onde trabalhei no laboratório de solos. Meu chefe era o Professor José Alexandre Melo Demattê. Pelo fato de ser perfeccionista, foram me segurando dentro do laboratório. Nesse trabalho fiquei por três anos. Eu sabia fazer todos os processos do laboratório, de análise foliar até análise de adubo.
Você não pensou em seguir carreira nessa área?
Pensei, mas o Estado não podia ficar comigo, o Conselho Regional de Química não admitia a minha permanência como estagiário por tanto tempo, eu teria que ser funcionário do Estado. Na época houve uma mudança na chefia do departamento e eu sentia que não era visto com muita simpatia pela nova chefia. Mesmo eu sendo um funcionário pontual e extremamente dedicado. Cheguei a fazer os corpos de provas repetidamente por cinco vezes para que reconhecessem que eu sabia de fato o que estava fazendo. Fiz análises com 1% (um por cento) de erro, sendo que a tabela permitia até 10% (dez por cento) de erro. Permaneci lá de 1991 a 1993. Em 1993 fui contratado pela Caterpillar. Minha intenção era trabalhar no laboratório de metalurgia. Fiz o curso de metalurgia na Metalúrgica Bom Jesus. Fui contratado como rebarbador de peças. Conheci como é o ambiente em uma grande empresa, o fato de eu ter uma disciplina marcial me auxiliou muito. Trabalhei por dois contratos, um de um ano e oito meses e outro de um ano e meio. Eu já havia descoberto outros setores dentro da empresa que necessitava de elementos cuja capacitação eu tinha. Fui trabalhar no que era chamado de rolete para montar o scraper. Em três meses eu já estava montando a caçamba do scraper. De lá fui trabalhar na afiação de brocas. De lá fui trabalhar com o Jaime, um colega que faleceu em frente a empresa em um acidente de moto. Era um setor estratégico da logística da empresa. Em 1996 sai da Caterpillar. Minha mãe disse-me: “- Você não gosta de luta? Porque você não investe na luta?”
Quando surgiu essa sua atração pela luta?

A primeira luta marcial minha foi capoeira. Isso ocorreu no Jardim Esplanada, era o Mestre Ousado. Ele tinha vindo de Recife. Seu intuito era ficar em São Paulo, tinha vários atletas formados por ele. Ele estudava química comigo, um dia disse-me “–Wilson! Você não quer fazer uma luta?” Eu já praticava musculação desde muito novo. Comecei em 1986. Meu primeiro professor foi o“Maçã”, seu nome era Maciel, era proprietário da academia Hercules. O segundo foi o Rainha. Fui para a Academia Clif Alternativa, situada na Rua Treze de Maio, de propriedade do Bertaglia e do Rainha que acredito ser um dos melhores treinadores de musculação que conheço, aprendi muita coisa com ele. É muito disciplinador nessa parte de musculação. Praticamente o que faço hoje na luta. Quando fiz o Tiro de Guerra em 1990 eu fazia 150 quilos de supino, 200 quilos de agachamento, eu sempre tive um potencial violento na parte de lutas. Quando o meu mestre foi embora para Londres ele queria me levar, ele foi conversar com os meus pais, disse que eu tinha um grande potencial, minha mãe não aprovou, sequer imaginava seu filho em um país tão distante. Foi quando na Clif Alternativa, fazendo musculação chegou um professor chamado Antonio Silva. Ele disse que ia ter uma modalidade chamada Box Tailandês em Piracicaba. Eu via o Box Tailandês no desenho que passava na televisão o Sawamu. Foi ai que ele implantou o Muay Thai que é a mesma coisa que Box Talilandês, Thai Box, Toy Muay,  Box in Tailândia. Existem algumas denominações regionais para ao mesmo esporte. Fui treinar o que na época era mais comum chamar de Box Tailandês. É muito dinâmico e competitivo. Em 1988 fui campeão regional de Muay Thay.

Nessa época você trabalhava também?
Trabalhava na Caterpillar e treinava. Fazia três horas de treino, às vezes saia dali e ia para o Anglo onde fazia alguns cursos de especialização em química. Os treinos eram de segunda a segunda, incluindo sábado e domingo. Muitas vezes fazia quatro horas de treino por dia.  Ele fazia o mesmo tempo de treino que é feito na Europa. O dono da academia é como se fosse seu patrão. Na Tailândia é chamado de Boss ( patrão, chefe, mestre).  Treinava para ser um dos melhores, e para ser um dos melhores tem que treinar muito, muito mesmo.
Tinha alguma alimentação especial?
Como eu já tinha tido como professores o Rainha, o Maçã, eu usava a alimentação da musculação. Eu diluía, porque o nosso exercício é mais aeróbico e não de hipertrofia. Na época não tínhamos as opções alimentares que hoje temos.
A questão da suplementação em determinadas circunstâncias desperta polemicas?
Para alguns atletas de alto nível como o Jhonatan Teodoro de 20 anos, meu filho, o Marcos Roberto Alves de 19 anos, a Isabella Correr Spadotti de 11 anos,a  suplementação é usada perto do campeonato, você não pode viver só de suplementação. O Muay Thay é muito explosivo, o que não se admite é criar a dependência psicológica do suplemento. O corpo não irá agüentar, não irá conseguir processar tão rápido.
Em determinados meios esportivos há uma polemica muito grande com relação aos anabolizantes, também popularmente conhecidos como “bomba”. Qual é a sua opinião?
No Muay Thay não tem nem como utilizar anabolizantes. É uma boa pergunta, porque há generalização de algumas exceções, principalmente em determinado tipo de esporte, onde a recuperação do atleta é muito rápida após uma competição. Nós passamos treinando o ano inteiro para os eventos em um campeonato consegue-se recuperar entre uma disputa e outra, no máximo setenta por cento, jamais voltará a forma inicial rapidamente. Nós necessariamente passamos pelo exame de doping. Se você estiver tomando algum produto que não esteja relacionado em seu exame médico a medalha ganha pode ser contestada. Um simples analgésico para uma dor de cabeça, se não for antecipadamente declarado ao médico, pode ser a causa da perda de uma medalha. Além de multa e punições.
Quando foi a sua primeira luta?
A primeira luta minha foi em 1988, em Campinas, em um evento denominado “Aberto de Thai Box”. Foi quando me sagrei campeão conquistando a medalha de ouro. A próxima foi quando o Antonio fez um campeonato regional aqui em Piracicaba, veio um pessoal de São Paulo, também fiquei campeão na minha categoria. E assim foi a minha ascensão Tenho 1,84 metros de altura e na época pesava 96 a 97 quilos. Minha categoria era peso pesado. Um dia o Mestre Antonio disse: “- Wilson, não vou mais poder dar aulas aqui!”.  Isso tirou o nosso chão. Ele disse que tinha que ir para outra cidade, abrir outro espaço para conhecer a modalidade. Disse que iria nomear alguém para instrutor.  Disse-nos: “Agora vocês vão treinar com meu professor, com quem eu treinei!”. Chamava-se Paulo de Souza Faria Nicolai. Ele me telefonou e pediu que eu fosse até Campinas. A academia ficava na Rua Barão de Jaguara. Quando cheguei já senti o impacto, muitos lutadores, uma academia enorme. Ele então me disse: “- Agora você irá fazer parte da equipe principal! Você será a pessoa que irá dar aulas em Piracicaba. Terá que vir treinar em Campinas, a academia abre de domingo a domingo e o horário está lá embaixo.”
Nessa época você trabalhava em qual empresa?
Trabalhava na Caterpillar. Tomava o ônibus para Campinas em frente a Caterpillar, treinava em Campinas, pegava o ultimo ônibus de Campinas à Piracicaba, se não me engano era o das 23:30 horas. Fazia isso as terças, quinta e sexta feiras e no sábado. Ai chegou um dia que passei a fazer de segunda a segunda. De vez em quando trabalhava na Caterpillar na parte da manhã, pegava um ônibus e ficava lá, só voltava no domingo a noite. Treinava, quando não ficava na casa de amigos dormia em algum hotelzinho ou pensãozinha. Tomava o café da manhã e já entrava na academia, ia até a noite.
Você é casado?
Sou! Minha esposa é Selma Aparecida Paes Teodoro. Temos um filho, Jhonatan Teodoro.
Como ela vê essa agitação toda?
A partir do momento em que ela nos viu em competição ela também passou a ser atleta.
Eu continuei a ir treinar em Campinas, Até chegar a um ponto em que poucos permaneceram treinando, muitos desistiram pelo caminho. Ficamos em uma meia dúzia, que se tornou o conselho da academia de faixa preta. Um dia o mestre perguntou se acreditávamos que o Muay Thay poderia nos proporcionar um padrão de vida confortável. Eu disse-lhe: “Acredito no senhor Mestre!”. Os outros não acreditavam! Ele dizia que tínhamos que ter as nossas próprias academias. Eu fui um dos que foi acreditando. Em 1996 tornei-me faixa preta em Muay Thay. Falei com a minha esposa, meus pais, disse-lhes que a partir daquele dia iria viver da academia, o Jhonatan tinha um ano, ele nasceu a 21 de dezembro de 1995. Comecei a dar aulas na Academia Atlas, do Toninho. Dei aula na Academia Associação Giatti, na academia Athenas Fitness. O Giatti abriu um dos primeiros centros de artes marciais de Piracicaba tinha: Karatê com o professor Giatti, Aikidô com o professor Umberto, Judô com o professor Kleber,  Muay Thay com o professor Wilson Teodoro, Tai Chi Chuan com o professor Ronaldo Massaruto, Kendô, Kenjutsu (luta com espadas), o Zequinha na Capoeira Angola. Formou-se um grupo de professores de artes marciais, isso foi em 1997, ficava em um prédio na Rua Santo Antonio, onde anteriormente tinha sido a Loja Maçônica Piracicaba e mais tarde foi uma escola infantil.
Esse centro de treinamento de artes marciais existe até hoje em outro local ?
Não existe mais. O professor Giatti montou sua própria academia. Cada um foi seguindo o seu caminho. Foi quando decidi montar minha própria academia. Minha primeira academia foi montada em 2010 na Rua Basílio Machado, 2605, no bairro da Paulista.
Você chegou a ir à Tailândia?
Fui para a Tailândia em 2008.
A sua academia ocupa uma área expressiva, existe mais alguma academia na cidade?
Atualmente tem outras academias que são co-ligadas a nossa. Onde atletas meus montaram suas próprias academias. São filiais minhas, onde sou o coaching deles.
Quantos atletas da Company Top Fight existem hoje em piracicaba praticando Muay-Thai?
Na central temos cerca de 200 atletas. Próximo ao SESI deve ter uns 60 atletas. Do Leandro, que é na Vila Rezende são uns 70 atletas. Do João Paulo, na Rua Treze de Maio, no centro, deve ter mais uns 100. Do Gigante, no bairro Santa Rosa devemos ter uns 60 alunos. Jhonatan Teodoro, meu filho, tem em Rio das Pedras uns 80 atletas. Na praça central do bairro Santa Terezinha, aberta recentemente pelo João, tem uns 35 atletas. Na Rua Edgar Lima temos outra academia com mais uns 25 atletas, próximo a madereira Naléssio mais 25 atletas. Na Avenida Rio das Pedras tem mais uns 100 alunos. Totalizando chegamos a cerca de aproximadamente 750 atletas. Temos ainda em Capivari, Tietê, Rafard, Cerquilho, Jumirim.
Vivemos na atualidade um problema social muito sério, que é o envolvimento da sociedade e principalmente dos jovens com a dependência química, seja de qual natureza for. O atleta pode ter esses hábitos?
Não! Atleta nunca é da noite! Os atletas competidores não tomam bebida alcoólica, não fumam.
Você segue alguma religião?
Sou católico. Tenho muita influência da cultura budista, mais em função dos mestres. A filosofia que eles têm na Tailândia eu prego dentro do centro de treinamento. Ela diz que temos que “Doar-se para o esporte como Buda doou-se para o próximo”. O Muay- Thai tem essa cultura budista, essa parte filosófica, onde se prega que para ser feliz não há a necessidade de acumular riquezas e sim ter uma boa saúde, uma boa disciplina espiritual e mental. Essa é a disciplina que eles me ensinam quando vou para lá.
Há uma faixa etária definida para a prática do esporte?
Para o esporte não. Para a luta em cima do ringue sim. Começa aos 18 anos e termina aos 40 anos. Tem o tatame, que é outra modalidade, só que você não causa nocaute. É a modalidade onde o Victor Vagner é o máster. Chama-se Light Contact. Tem que colocar apenas cinqüenta por cento da potência.
A partir de qual idade pode ser praticado esse esporte?
Desde os sete anos. O Kauã é um atleta que começou treinar quando tinha quatro anos. A Isabella começou a treinar com oito anos hoje está com onze anos, faz três anos que ela treina. São crianças que já vem determinadas a treinar Muay-Thai.
Qual é a idade do atleta na faixa etária mais avançada que treina na academia?
O que tem mais idade tem 51 anos.
O atleta tem o poder de ser letal a um adversário ou em situação de risco. O que você pode afirmar a respeito?
A arte marcial Muay-Thai tem um poder muito grande com alto reflexo e alto impacto. O homem desconhece o próprio corpo. Quando colocamos um ambiente de família dentro da academia, fazemos com que o atleta prossiga esse trabalho. Quem ingressa na academia já entra pensando como atleta. Quando quiser encontrar um praticante de Muay-Thai basta vir até a academia, eles praticamente moram aqui, passam grande parte do seu tempo na academia. Com isso não sobra tempo para atividades que possam desvirtuar o comportamento do atleta. Vamos fazer um churrasco na casa de um deles, todo mundo vai. Vai ter uma festa no Clube de Campo onde vamos promover uma ação para ajudar alguma entidade, vão todas as academias. Eles não têm muito tempo para que a mídia, principalmente a televisão, os bombardeie com futilidades. Nós temos 15 eventos ao ano, todos querem participar. Não nos restringimos a lutar só em Piracicaba, vamos a todos os lugares do Brasil: Paraná, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia, Amazonas, Distrito Federal. Quando alguém vai ao cinema geralmente vão todos ao cinema, juntos. Nosso primeiro evento será no dia 17 de janeiro de 2016, vão lutar 45 atletas em São Pedro. O pessoal do Rio de Janeiro estará em Piracicaba no dia 18 de janeiro para fazer seminário comigo.
Como o público pode ficar sabendo dos eventos?
Pela internet. Temos vários endereços eletrônicos: wilsonteodoro.com.br, face book companytopfight, instagram wilsonteodoro, you tube wilsonteodoro. Tenho uns 6.000 seguidores no face.Uma boa parte são estrangeiros.
Quantos idiomas você fala?
Falo um pouco de tailandês, inglês, estou aperfeiçoando o espanhol. Em 2008 fui para a Tailândia sem saber de nada, sem falar inglês, permaneci por três meses na Tailândia.
Qual é a visão do tailandês a seu respeito?
No começo viam uma pessoa de porte grande, tatuado.
O que significam essas tatuagens que você tem pelo corpo?

São mantras, nem todos podem ter. Hoje sou considerado por eles como um professor da Tailândia, um tailandês. Vou para lá todos os anos. Criei uma identidade tão grande que quando entro na Tailândia sou muito conhecido. O brasileiro é muito comunicativo, pega na mão, abraça. Cumprimenta. O piracicabano parece que tem um jeito mais carinhoso com o povo. Quando fiquei na Tailândia fiquei sozinho, tenho um amigo que mora lá, um brasileiro, piracicabano, chamado Paulo Kawai, primo do Pedro Kawai, era quem me levava a todos os lugares. Cheguei à Tailândia usando uma camiseta do XV de Piracicaba, atrás escrito Wilson Teodoro nas costas, mando fazer na Deffende.  O Paulo me viu, olhou, perguntou de onde eu era. Disse-lhe que era de Piracicaba. Ele perguntou-me se eu conhecia o dono da Vidraçaria Kawai. Respondi que era pai de um grande amigo chamado Pedro, fizemos o Tiro de Guerra juntos, eu era número 150 ele 123. Ele foi me levando a todos os maiores centros de Muay-Thai da Tailândia. O Paulo Kawai fala nove idiomas. Passei a ter como mestre Khru Pairojnoi que foi mestre de um grande amigo, Cosmo Alexandre, um brasileiro que foi morar na Tailândia e ficou muito famoso na Tailândia. Eu estava treinando no mesmo centro de treinamento onde ele estava. Fui o quarto brasileiro a ir a um lugar onde um brasileiro tornou-se o rei do Muay-Thay na Tailândia. 





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