sexta-feira, dezembro 14, 2012

CECÍLIO ELIAS NETTO

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
Sábado 15 de dezembro de 2012
Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/



ENTREVISTADO: CECÍLIO ELIAS NETTO


Adorado por muitos e questionado por alguns, ninguém fica indiferente aos brilhantes textos de Cecílio Elias Neto, advogado, bacharel em filosofia, escritor, jornalista e historiador na acepção da palavra. Cecílio vivenciou a história de Piracicaba por décadas. Em muitas ocasiões conviveu com os personagens centrais da história recente da nossa cidade, sendo ele algumas vezes o próprio protagonista. Seus pais Tuffi Elias e Amélia Abrahão Elias, piracicabanos, filhos de sírios-libaneses, com ascendentes gregos e turcos, tiveram nove filhos sendo que dois faleceram antes do nascimento de Cecílio Elias Netto em Piracicaba a 24 de junho de 1940.
Em que local da cidade o senhor nasceu?
Costumo dizer que nasci bem no umbigo de Piracicaba, na esquina da catedral, ali onde mais tarde por alguns anos funcionou a lanchonete Daytona. A edificação foi demolida e hoje no local se abriga o Banco Santander Nessa esquina meu pai tinha o Café Imperial. Meu tio Elias Cecílio era dentista formado pela antiga Faculdade de Odontologia e Farmácia de Piracicaba. Meu pai já estava cursando essa faculdade, enquanto estudava trabalhava como marceneiro e carpinteiro, nessa atividade ele perdeu um dedo em uma serra, com isso o futuro dentista encerrou seus estudos e passou a ser comerciante, foi proprietário do Café Imperial durante a guerra, até 1945. Depois eles se mudaram para a Rua São José, quase em frente ao Cine Broadway, onde ele criou a Tufiniquim. Ali também se iniciou uma tragédia que abateu sobre a nossa família, foi quando a minha irmãzinha, Carolina, de apenas dois anos, faleceu atropelada por um caminhão. Meu pai tinha ido até a prefeitura que ficava na esquina da Rua Alferes José Caetano com a Rua São José, ninguém percebeu que a pequena Carolina, muito apegada a ele o seguiu, ao atravessar a rua o caminhão a atropelou. Com a gritaria toda, meu pai correu para ver o que estava acontecendo e viu sua filha embaixo do caminhão. Foi um fato que mudou o curso da vida da nossa família. Nessa época eu tinha seis anos. Meus pais ficaram acamados de quatro a seis meses, em profunda depressão. Minha irmã Marlene tinha 16 anos, começou a lecionar piano, devemos a ela a nossa manutenção. Jorge Maluf, pai da Ivone Maluf, tinha um armazém em frente ao Broadway, ele necessitava de caixas de papelão, garrafas vazias. Para ajudar a minha irmã, eu com apenas seis anos, batia de porta em porta, junto aos vizinhos, recolhendo esse material e levava ao Jorge Maluf. Com 10 anos fui trabalhar como recepcionista do consultório médico do meu primo Alarico Coury.
Porque alguns o chamavam de Toninho?
Quando nasci a alegria da família foi muito grande. Fui batizado no mesmo dia, um domingo, deram-me o nome de Antonio João Pedro. Até hoje consta no batistério da igreja católica, assim como consta Cecílio Elias Netto, que já adulto mandei acrescentar, esse sempre foi o meu nome no registro civil. Descobri que me chamava Cecílio quando tinha 10 anos. Iniciei meus estudos no Externato São José, foi lá que conheci um grande amigo, Jayme Antonio Cardoso, hoje morando em Curitiba. Quando entrei no curso primário já estava praticamente alfabetizado, meus pais e irmãos gostavam muito de ler. Minha turma foi a última masculina do Externato São José. Foi quando veio o Colégio Dom Bosco, as meninas foram para o Colégio Assunção, os meninos para o Dom Bosco. O último semestre conclui no Moraes Barros.
Lembra-se da sua primeira professora?
Lembro-me, foi Romilda Casali, por quem eu tinha grande admiração. Ela morava perto de casa, eu apanhava flor para levar até a sua mesa. Quando lancei um livro, apareceu uma moça dando-me uma maçã e dizendo: “Minha mãe mandou-me entregar essa maçã, ela disse que o senhor irá lembra-se dela”. Na hora me lembrei: ”- Dona Romilda!”. Todos os dias ela me dava uma maçã, tinha conhecimento de que a minha família passava por dificuldades até para se alimentar. Voltávamos juntos do externato, fazíamos o mesmo caminho, Ela deveria ter uns dezoito anos. No Colégio Dom Bosco conclui o ginásio e o científico. Sempre tive prazer em estudar. Talvez para ajudar a minha família, alguns professores me indicavam ás mães dos meus coleguinhas, para que eu os acompanhasse nas tarefas de casa. Aos doze anos comecei a fazer reforço de aulas para os meus colegas. Aos dezesseis anos já dava aulas particulares. Meu grande sonho era de ser diplomata para ser escritor.
Quando se deu o ingresso no jornal?

Desde criança tive paixão por escrever. Recordo-me que com sete ou oito anos ia ao Cine São José, levava um caderninho, sentava na primeira fila de cadeiras, anotava as rimas dos filmes musicais. Anotava: “Coração rimando com paixão, querida-vida.” O professor Leandro Guerrini me ajudava muito na biblioteca indicando livros. Minha paixão era escrever. Aos quinze anos escrevi meu primeiro livro, “Estela Estrela”, tenho o original até hoje. Naquela época o jornalismo era a grande escola literária. Ao ser aceito em um jornal era como ganhar um prêmio. Meus professores começaram a mandar meus artigos e composições de escola para os jornais. Com 13 a 14 anos já tinha publicações minhas em jornal. Uma vez João Chiarini me levou até o Dr. Losso, dizendo: “Esse menino quer trabalhar em jornal, o pai dele não quer.”
Porque seu pai não queria que seguisse a carreira de jornalismo?
Ele achava que era coisa de boêmio, era uma profissão estigmatizada. Meus pais tinham o sonho de que eu fizesse o curso de medicina. Entrei no Jornal de Piracicaba como “ouvinte”, na verdade era falante, lia os textos para o revisor que era Samuel Pfromm Netto; Comecei no jornalismo como auxiliar de revisão no Jornal de Piracicaba. “O Diário” realizou um concurso tendo como tema seu aniversário. Resolvi participar. Gostava de escrever de madrugada, no último dia timidamente entreguei meu trabalho. Sempre fui tímido. Recebi um telefonema, tinha sido vencedor do concurso. Eufórico, fiquei sabendo que Leandro Guerrini, Guilherme Vitti e eu tínhamos sido os vencedores. Dr. Losso era um dos juízes, quando fui receber a premiação ele disse aos meus pais: “Por justiça o prêmio era dele, mas não podíamos deixar de premiar os ilustres Leandro e Guilherme”.fiquei entre lisonjeado e indignado. Aquilo me animou muito, fui falar com o Sebastião Ferraz, de “O Diário”: “-Quero começar, posso vir aqui? O Ferraz chamou Izidoro Polacow que além de trabalhar no Banco do Brasil era redator-chefe de “O Diário”. Ele usava gravatinha borboleta, tinha uma figura imponente. Era muito competente. O Ferraz disse-lhe: “Esse menino quer aprender jornalismo, está em suas mãos”. Fui conduzido até uma mesa onde estavam diversos jornais como a Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo, Diário de São Paulo, Folha da Manhã, Diário da Noite. Aquela altura me sentia um David Nasser. O Polacow traz uma tesoura dizendo: “- Agora você lê os jornais e recorte a notícia que achar interessante. ”Disse-me ainda: “ Quem não sabe ler jornal não sabe fazer jornal”. Fiquei louco da vida, tinha me tornado “recorter”!
Existiam alguns temas preferenciais?
Eu tinha curiosidade por tudo: futebol, esporte, política. Getúlio Vargas tinha falecido. Comecei a me interessar por política naquela época, em 1954. O Polacow selecionava as notícias que eu recortava. Fiz isso por uma semana. A seguir me colocaram como ouvinte do Osvaldo de Andrade, o maior revisor que conheci. Após algum tempo me passaram para a seção de polícia, eu ia até o plantão policial, o delegado era Dr. Zenon. Na verdade ia buscar o B.O. e entregava ao redator. Um dia o Ferraz me pediu para escrever um artigo em comemoração ao aniversário de Edson Rontani. Embora já tivesse artigos publicados, esse foi o primeiro a pedido do diretor do jornal. Passei a redigir artigos. Houve um escândalo em Piracicaba, envolvendo menores com pessoas influentes. Escrevi um artigo, contei o fato sem citar nomes, o título eu me inspirei em Shakespeare: “Tempestade em Uma Noite de Verão”. Foi um grande escândalo na cidade, todo o mundo sabia, mas ninguém falava. Animei-me e escrevi outro, esse passou pela mão do Ferraz antes de ser publicado. Ele então me disse: “- Quando você quiser escrever o que bem entender tenha o seu próprio jornal, aqui quem manda sou eu”. Isso tinha acontecido com David Nasser, ele foi reclamar com Chateaubriand que tinha sido censurado e recebeu a mesma resposta. Ali comecei a aprender que a censura começa dentro do jornal. Coloquei como objetivo ter meu próprio jornal. Nessa época eu namorava a Mariana, mãe dos meus filhos. A irmã dela. A Odila, era casada com Wilson Guidotti, filho do Luciano Guidotti. Com os comendadores da cidade, Luciano inventou a criação de um jornal. “A Folha de Piracicaba”. Eles me convidaram para ir para “A Folha” ajudar a montar a equipe, viria um diretor novo. Diziam como se fosse um jornal com o que havia de extraordinário, moderno. Eu estava muito comprometido com “O Diário” e muito comprometido com o Ferraz, que se tornou um grande amigo. Eu era o filho que o Ferraz não teve. Eu disse ao Ferraz: “Vou me casar, estou noivo, fui convidado para ir para “A Folha”, vou dizer à família da moça que não vou trabalhar no jornal ligado a eles?”.
O salário em “O Diário” era compensador?
Ganhava mixaria. Trabalhei por dois anos em “O Diário” sem ganhar nada. Era um favor que os jornais faziam em deixar alguém entrar na redação. Como se fosse o Liceu de Artes e Ofícios. Você ia aprender uma profissão. Não havia a profissão de jornalista. Todo o mundo tinha outra atividade. Eu dava aulas particulares, criei um cursinho.
Como foi seu ingresso na faculdade?
Permaneci por um ano em São Paulo fazendo cursinho, no “Cursinho Nove de Julho” para prestar vestibular em medicina. Não freqüentava muito as aulas, minha paixão era a literatura, eu não saia da biblioteca, ficava no “Estadão” onde via Thales de Andrade, conversava com pessoas que eram amigos do meu pai. Nessa época comecei a escrever meu primeiro romance: “Um Eunuco para Ester” Pensava que não tinha sentido estudar medicina. Nesse período comecei a estudar línguas. Vim à Piracicaba de onde saí para prestar vestibular de medicina. Sai de casa, meus pais rezando o terço, pedindo em meu favor. Na viagem de Piracicaba à São Paulo, comecei a sentir uma angústia, onde é a Bosch, em Campinas, havia um posto de gasolina o ônibus fazia uma parada. Decidi fazer o curso de direito. Tirei a mala do ônibus, esperei uma carona, fui direto para a Faculdade de Direito da PUC. Os exames já estavam marcados, o prazo para inscrição já tinha sido encerrados. Naquele tempo cada faculdade fazia o seu vestibular. O vestibular seria no dia seguinte. Acomodei-me como pude em uma pensão. Fiz o vestibular, com provas escritas e orais. A Ivone Matiazzo era uma amiga da família que estava fazendo também o vestibular. Eu pedi que não contasse â minha família que estava prestando vestibular para o curso de direito. Em determinado dia, estava prestando exame oral de latim, vi a Ivone pela janela, desesperada, fazendo sinais com a mão. Sai exausto do exame oral, a Ivone me deu a notícia: “Seu pai e sua mãe estão ai na porta!”. Meu pai tinha ido fazer um exame médico em Campinas, encontrou-se com meu tio, pai de João Hermann Netto. O meu tio tinha me visto entrar na faculdade, eu não o vi. O meu nome na família era Toninho. Ao ver meu pai ele disse-lhe: “ Então o Toninho está fazendo direito aqui, que bom !” . Meu pai disse-lhe: “Não! Ele está em São Paulo fazendo vestibular para medicina!”.Na hora em que sai da sala e vi os dois, vi que meu pai estava branco, lívido. Ele disse-me: “Prefiro um filho sapateiro a um filho advogado!” Disse-lhe que a partir daquele dia iria dispensar a ajuda financeira que recebia dele. E fiz o curso. Ele já tinha tentado me boicotar em jornalismo, tinha pedido ao Ferraz para me dizer que eu não tinha vocação. Em 1959 entrei na PUC em Campinas, viajava todos os dias.
A formatura foi em Campinas?

A minha turma foi expulsa da PUC por causa do “Partidão”. Fui filiado ao Partido Comunista, o Monsenhor Salim, nos chamou e disse: “- Os senhores estão convidados a se retirarem da universidade”. Estava cursando o quarto ano. Não havia transferências de faculdades na época, conseguimos em São José dos Campos e Bauru. Optei por Bauru. ”O Diário” queria que eu voltasse, remunerando-me mais. Foi quando em 1961 surgiu “A Folha”. Falei com o Ferraz, que na sua previsão achava que “A Folha” não daria certo, mas como envolvia família ele disse-me que poderia voltar ao “O Diário” quando quisesse. Fui para “A Folha”. Vi que não havia organização, as máquinas adquiridas eram impróprias para um jornal. O diretor era de Leme, nunca tinha dirigido um jornal. Para se ter uma idéia as páginas eram impressas uma a uma. “O Diário” já era rotoplana. O Luciano queria o título em vermelho. Tinham que primeiro imprimir em vermelho o título, deixava secar, limpava a máquina. Começava a imprimir as quatro horas da tarde e terminava as sete horas da manhã. O diretor, Valdemar Arruda, foi mandado embora. O Luiz Tomazzi, grande jornalista de Piracicaba, que trabalhou na Folha de São Paulo, no jornal Ultima Hora, era um consultor dos comendadores proprietários de “A Folha”: Humberto D`Abronzzo, Romano, Luciano Guidotti, João Guidotti, Ometto, eram 33 acionistas. Era para ter sido o melhor jornal, só que os equipamentos adquiridos eram ineficientes.
Qual era o objetivo desse grupo em ter um jornal?
O Dr. Losso e o Ferraz romperam com o Luciano, no último ano do mandato dele, isso em 1955, o Luciano tinha indicado o Aldrovandi para ser seu sucessor. O Aldrovandi era metodista, Dom Ernesto não admitia que Piracicaba tivesse um prefeito protestante. Começou uma guerra na cidade, foi quando Salgot candidatou-se com apoio da igreja, do Dr. Losso e de “O Diário”. O Aldrovandi renunciou. O Luciano achou que o empresariado deveria montar um jornal. Contrataram o Valdemar Arruda que foi infeliz na aquisição dos equipamentos. Eles pagariam o necessário para ter o melhor equipamento possível. Eu tinha 20 anos, fiquei cuidando da redação a espera do novo diretor. Telefonaram-me chamando para ir até a agencia do Guidotti, ao chegar deparei com todos os proprietários de “A Folha”. O Thomazzi disse-me que iria apresentar o novo diretor. Era eu. Ele disse-me que me havia indicado por me achar preparado para dirigir o jornal. Aceitei. “A Folha” situava-se na Rua Regente Feijó esquina com a Rua Benjamin Constant. Eu, em um partido comunista e dirigindo o jornal dos comendadores. Fiquei com “A Folha” até 1967, acabei me tornando proprietário dela. Ela estava deficitária, fizeram-me a proposta para que eu assumisse o prejuízo ou os lucros. Montei uma equipe escolhida por mim, fizemos um tremendo trabalho, em seis meses conseguimos levantar a empresa. “A Folha” chegou a tirar 3.500 exemplares, naquela época era uma tiragem muito significativa. O Gustavo Alvim escreveu um livro sobre “A Folha”, ela foi o jornal mais revolucionário de Piracicaba, de 1961 a 1967. Fui processado pela Lei de Segurança Nacional. Era o único jornal de oposição. Ganhei do Dr. Cera como presente de casamento, 100 ações da Folha. Quando a coisa começou a ferver o D`Abronzo deu-me as suas ações de presente. O Luciano, antes de tomar posse quis me dar suas ações, eu não aceitei. Disse ao Wilson, que não podia aceitar. Se o seu pai quisesse me dar um litro de whisky ou uma gravata eu aceitaria. Se eu aceitasse as ações do prefeito eleito, Luciano Guidotti, eu estaria comprometido. Eu não tenho nenhuma vocação para administração. Quem entrou em crise foi “O Diário”, eu nunca perdi o vinculo com o Ferraz. Fechei a Folha, as máquinas estavam sucateadas. Com Sebastião Ferraz, Lazaro Pinto Sampaio e Domingos Aldrovandi adquirimos as ações dos antigos proprietários de “O Diário”. Eu cuidaria da redação, o Ferraz da administração, o Lázaro da parte financeira e o Aldrovandi era nosso relações públicas, ele era deputado. Fizemos uma revolução em “O Diário”. Após dois ou três meses só se falava em “O Diário”. Fizemos uma reforma gráfica completa. Regionalizamos, não era mais “O Diário de Piracicaba”, mas sim “O Diário”. Levei minha equipe de redatores, uma equipe muito boa, o Geraldo Nunes estava lá. Um sábado fui chamado pelo Ferraz para ir ao “O Diário”, ao chegar, encontrei-o de chapéu de palha, sapato de camurça, todo esportivo. Entrei, ele estava com uma chave na mão. Disse-me: “Toma, é a minha chave”. Perguntei-lhe o que tinha acontecido. Ele estava saindo da cidade, arrebatado por uma paixão alucinada. Jogou tudo para o ar. Todo o esquema montado para a empresa foi desmontado. A administração passou para mim que não entendo nada a respeito. Diante da confusão formada o Lázaro decidiu desligar-se do jornal. Ficamos eu e o Aldrovandi. Passei a cuidar da redação, da parte financeira, comercial e administrativa. Isso foi em 1970. Fomos vencendo, Decidi comprar o off-set, o primeiro do Estado de São Paulo. Fomos os primeiros a comprar e o segundo a instalar, Bauru comprou a vista, instalaram umas duas semanas antes do que nós. Nenhum dos grandes jornais tinha off-set. Lembro-me que estava com financiamento de 150 mil dólares, o Delfin Neto entrou e fez a maxidesvalorização, dormi devendo 150 mil dólares acordei devendo 300 mil dólares. Passava o pente no cabelo, caia cabelo. Lutamos muito e fomos conseguindo vencer. Meu pai adoeceu, se afastou da sua empresa, assumi as pendências da Comercial Tuffi Elias. Fui agüentando até que veio a minha prisão. Os processos não paravam. Tinha tido diversas detenções. A minha primeira condenação foi de um ano e nove meses, a segunda foi de seis ou sete meses.
Essas prisões eram fundamentas em que?

Na Lei de Imprensa. Fiquei com prisão domiciliar. Na cadeia fiquei em Campinas, no exército.
Sua postura de independência jornalística teve um custo muito alto?

Foi sempre muito alto e a vida toda. Tem uma frase de Millor Fernandes que diz: “Jornal é oposição, o resto é balcão de anúncios”. Se você não for um crítico do poder para que serve o jornal?
O episódio do “Mar de Lama” foi difícil para “O Diário”?
O Luciano Guidotti era meu padrinho de casamento, tinha laços familiares com eles, tive que fazer oposição a eles. O João Hermann era meu primo. O “Mar de Lama” tem um detalhe que muitos não se lembram, não fui eu que fiz. Entrei para o jornalismo pensando em ser escritor, em 1979 tive uma crise pessoal muito séria. Tirei umas férias, fui com a Mariana para o Rio de Janeiro, assisti a uma peça que escolhi aleatoriamente, chamava-se Layout. Na metade da peça me deu um ataque, pensei: “-Desgraçados, quem deu autorização para vocês contarem a minha vida?” Era a minha vida que estava ali na peça, a pessoa se autodestruindo. Ele fazia publicidade, mas não fazia o que queria que era escrever, ele estava se matando. Junto com a minha mulher tomei a decisão: “Vou voltar, vender “O Diário” e começar vida nova. Fiz isso e fui embora para São Paulo. Doei “O Diário” à pessoas que trabalhavam comigo, sem contudo formalizar, ele continuava em meu nome. As pessoas que assumiram “O Diário” juntamente com o Dr. Losso fizeram o “O Mar de Lama”.
No seu conceito a pessoa deve seguir a vocação embora tenha que trabalhar em outra atividade para suprir suas necessidades?

Depende da força da vocação e da necessidade. Questiono muito o aspecto da necessidade. É muito mais fácil viver do que sobreviver. Para sobreviver você tem que ter o carro do ano, o último modelo de celular, tem que ter isso, mais aquilo. Fazer parte desse clube, daquele outro. Ganhar dinheiro sem parar e gastar sem parar. Hoje a minha necessidade é de sossego, paz, ficar lendo. Todo mundo tem necessidades, depende de estabelecer uma escala. O que realmente tem importância e o que não tem. Eu queria ser escritor.
Como foi o episódio da faixa em frente a Comercial Tuffi Elias?

O Diário” estava em uma campanha contra a poluição de faixas existentes no centro da cidade. Liquidação disso, daquilo. Meu pai tinha a sua loja, eu disse-lhe: “ Pai, por favor, tire essa faixa, estou fazendo essa campanha, vai ficar chato, daqui a pouco terei que publicar”. Ele dava risada. Um dia peguei o Henrique Spavieri,e disse-lhe: “- Vai lá em frente a Comercial Tuffi Elias, tire uma foto da faixa, vamos publicar na primeira página. Poluição visual”
Qual foi a reação do seu pai?
Disse: “- Meu filho é macho!”.
E a sua busca por novas tecnologias de impressão e mídia como surgiram?
“O Diário” foi pioneiro na tecnologia de impressão em off-set. Atualmente tenho o jornal eletrônico “ A Província”, que está no ar a uns seis ou sete anos. Ninguém acreditava nesse meio de comunicação. O jornal impresso tem que se reciclar completamente. Hoje notícia em jornal não tem mais sentido. Se morrer o presidente da república agora o jornal irá dar a notícia amanhã? A televisão já está atrasada.
Como o senhor vê o futuro do jornal tradicional?

É difícil prever alguma coisa, no meu entender, o jornal só sobrevive se for investigativo, jornal de opinião, ou jornal que tenha grandes nomes de orientação pública, interprete, traduza os fatos. Quem esta fazendo esse jornalismo e está indo muito bem é a Carta Capital. Piauí é uma novidade, uma mostra do futuro. As grandes revistas no mundo todo estão passando para meios eletrônicos.
Faz sentido uma revista viver de notícias de escândalos?

Não suporto uma postura dessas. Não sei quem é pior, se o público que lê ou quem a publica.
As novas gerações informam-se de uma nova forma?

Não lêem jornais, revistas, querem informações rápidas. Os livros eletrônicos é o futuro. Olho a minha biblioteca e penso: “Coitada!”. A Enciclopédia Britânica é via meio eletrônico.
Sua convivência com as mais diversas ferramentas de comunicação permite dizer que o romantismo nessa área acabou?

Entra o lado emotivo, saudoso. Acho que esse é realmente o admirável mundo novo. Estamos vivendo momento de poeira no ar, ela não abaixou ainda. Muita coisa terá que ser regulamentada. Mas é irreversível. O primeiro livro escrevi em uma máquina de escrever, com um enorme pacote, tomei o ônibus, fui á São Paulo, entreguei para a editora, após um mês estava revisado, ela mandou-me pelo correio, fiz uma nova revisão, levei novamente à São Paulo. Foram de 4 a 5 meses para ser editado. Hoje mando um livro meu em seis segundos para a editora. Nunca tivemos a oportunidade de termos tantas informações como agora. Mas que informação? Um fato real, foi quando pediram a um garoto para fazer a biografia de Beethoven. Ele acessou a internet, e respondeu: “É o cachorro famoso...”. Se você não tem conhecimento a tecnologia não serve para nada. As universidades estão preparando a ciência de acordo com quem financia. O cientista não tem liberdade para fazer o que quer, necessita do financiador, Financiam o que interessa ao mercado. As escolas estão preparando mão-de-obra. Não estão preparando cidadão. Não estão formando. Não deveriam mais falar em educação, deveriam falar “ensino formal”. Educação é outra coisa. Universidade para todos não é correto, é para quem tem talento. Para quem tem vocação. Tenho cinco filhos, três fizeram universidade, dois não quiseram fazer, têm talento para outra coisa. Universidade não é só graduação, é pesquisa, extensão.
O que é necessário para ser um bom jornalista?

Tem que ter vocação, não adianta ter talento. Você pode ter um grande talento, ser espetacular, mas se não tiver vocação, não vai. Vocação exige de você tudo, como a medicina.
Quantos livros o senhor publicou até hoje?
Vinte. Tenho mais uns cinco prontos para publicar. O Dicionário Caipiracicabano conforme disse um amigo, dei um tiro em um mosquito e acertei um elefante. Foi escrito sem qualquer pretensão. Era complementação da Província, já está indo para a sexta edição. Foram vendidos mais de 40.000 exemplares. Ainda vendo 100 a 110 exemplares por mês só na Livraria Nobel. Não costumo reler o que escrevi, tenho dois livros que considero obras primas: “Isto é Meu Corpo” e “Miserere Mei, Amor”.














sexta-feira, dezembro 07, 2012

MONSENHOR LUIZ GONZAGA JULIANI

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 9 de dezembro de 2012
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/




                                                                                                                                  Foto by J.U..Nassif

ENTREVISTADO: MONSENHOR LUIZ GONZAGA JULIANI
Monsenhor Luiz Gonzaga Juliani nasceu em Capivari, a 2 de junho de 1927, filho de Thomaz Juliani e Maria Maschietto Juliani. Seu pai cuidava do sítio situado a uns quatro quilômetros de Capivari de propriedade do seu avô, Miguel Juliani e da sua avó Luiza Armelim Juliani pais de seis filhos, sendo que um deles era filho adotivo. Miguel Juliani, irmão mais velho também se ordenou padre claretiano. Ainda menino, Luiz Gonzaga permanecia a maior parte do tempo na casa de seu avô, em Capivari. Fez a primeira comunhão, foi coroinha na Igreja Matriz São João Batista. O curso primário e o curso preparatório para ingressar no ginásio foram realizados em Capivari na Escola Municipal Augusto Castanho, sua primeira professora foi Dona Judith.


Após fazer o curso preparatório qual foi a etapa seguinte dos estudos do senhor?


Fui fazer o chamado Seminário Menor da Imaculada Conceição de Campinas, diocesano. Aos 13 anos ingressei no seminário.


O que o senhor sentiu ao deixar sua casa e ingressar no seminário?


Fui coroinha, ajudava na igreja, meu irmão mais velho já era padre, incentivado pelos padres da paróquia, meu ingresso no seminário deu-se com naturalidade. Sem dúvidas que sentia saudades de casa, a vida no seminário era de dedicação total. Aos finais de ano tinha férias para passar junto a família. No seminário encontrei colegas, muito trabalho, e com isso acabei me acostumando.


Havia a prática de futebol?


Joguei futebol, geralmente como goleiro.


No seminário menor eram realizados quais cursos?


Eram feitos o ginásio e o colegial. Naquele tempo o estudante do seminário menor não era dispensado de servir o Tiro de Guerra. Tive que fazer o Tiro de Guerra com cursos voltados a ir combater na guerra isso foi em 1945. Estudava, fazia o Tiro de Guerra e Exército juntos. O Brasil estava em guerra, novos contingentes estavam sendo preparados. Os que se encontravam na frente de batalha voltariam e nós íamos ser mandados à frente de combate. Morávamos no seminário em Campinas, no bairro Cambuí e íamos para o quartel, na saída para São Paulo. Sexta feira a noite íamos a um treinamento no mato onde permanecíamos até domingo.


Como religioso qual era seu sentimento em ter que enfrentar uma guerra?


Estávamos sendo preparados para isso.


Havia um conflito de quem passava o dia estudando para amar o próximo e a noite tinha treinamento para matar o próximo?


Éramos muito jovens, estávamos mais preocupados com nossos estudos, nossa vocação. Sequer imaginávamos em combater de fato. Alguns seminaristas mais adiantados e padres já estavam na guerra como capelães. Em 1945 formei-me como atirador. No ano seguinte entrei para o seminário maior onde estudei filosofia e teologia em São Pulo, no bairro Ipiranga. Lá permaneci estudando por sete anos: três de filosofia e quatro de teologia. Fazia apostolado, o Ipiranga era um bairro considerado pobre, ensinávamos catecismo para as crianças de bairros carentes. Assim íamos treinando o exercício de catequese com as crianças da Vila Nair, Vila Gumercindo, Vila Carioca.


Em que ano o senhor ordenou-se padre?


Foi a 8 de dezembro de 1952, na Catedral de Piracicaba pelo primeiro bispo de Piracicaba, Dom Ernesto de Paula No próximo dia 8 de dezembro completarei 60 anos de sacerdócio. Trabalhei com todos os bispos que estiveram em nossa cidade. Após ser ordenado, fiquei um tempo auxiliando monsenhor Rosa (Monsenhor Manoel Francisco Rosa). Santa Bárbara D`Oeste era uma paróquia só, estava crescendo muito, o padre Francisco Michele que estava lá já estava meio cansado, o bispo disse-me que eu iria auxiliá-lo, permaneci lá até o final do ano, quando houve a festa do padroeiro. Trabalhamos em dobro, a paróquia estava crescendo bastante, era uma paróquia só. Trabalhamos muito. O bispo estava providenciando a fundação do seminário menor em Piracicaba, o padre Francisco Michele estava recuperado, ele veio embora eu fiquei sozinho na Paróquia de Santa Bárbara. A primeira construção que administrei foi a construção da Casa Paroquial, até então não existia. Ao concluir as obras da casa paroquial, só faltava a pintura, o bispo mandou-me de volta para o seminário e também ser coadjutor da Igreja Imaculada Conceição, na Vila Rezende. O pároco era monsenhor Romário Pazzianoto. Lá funcionava o seminário, o movimento era muito grande, lecionei quando iniciou em 25 de março de 1954. No início tínhamos uns doze seminaristas, quando deixei o seminário tinha 83 seminaristas residentes. Ficava onde hoje funciona o Centro Pastoral, na esquina. No seminário fui professor, diretor espiritual, reitor, sempre ajudando na paróquia. A Vila Rezende tinha uma única paróquia, era muito grande. Tinha muitas capelas na área rural.


Qual era o meio de transporte utilizado pelo senhor na época?


Usava muito o bonde.


O senhor pagava o bonde ou tinha alguma cortesia?


Naturalmente que pagava. Eu era capelão das Irmãs de Jesus Crucificado, do Dispensário dos Pobres, antigamente elas ficavam na Rua Tiradentes, em uma casa velha, depois foram para o prédio que fica na Rua do Rosário, hoje propriedade da Renovação Carismática; Logo pela manhã, cedinho, eu ia rezar a missa para as irmãs; Depois voltava e ficava na paróquia ajudando o padre, atendendo os fiéis.


Até que ano o senhor permaneceu na Paróquia da Vila Rezende?


Em 1957 o pároco estava cansado, afastou-se e eu fiquei cuidando da paróquia da Vila Rezende. Permaneci lá até 1963. Em 1958 passei a ser reitor do seminário, permaneci por cinco anos e meio como reitor. Coordenei a construção do seminário novo do Bairro Nova Suiça. Foi uma correria danada para levantar aquele prédio. Eu usava uma caminhonete 1946, andava mais no céu do que na terra! Aprendi a dirigir devagarzinho. Era o famoso “queixo-duro”. (sem direção hidráulica).


Quanto tempo demorou a construção do seminário?


Uns dois anos e meio. Não tínhamos recursos, precisei falar com o bispo para realizar um empréstimo na Caixa Econômica Estadual (depois Nossa Caixa Nosso Banco). Foi um belo “nos acuda” para conseguir o empréstimo, na época era aplicada a Tabela Price (A aplicação da Tabela Price impõe excessiva onerosidade). A Caixa Econômica tinha um prédio com 14 andares em São Paulo, o processo tinha que andar nos 14 andares para conseguir o emprestimo.Uma vez por semana ou mais, eu pegava o onibus das 9 horas, chegava ao meio dia, se não atrazasse, Ao meio dia tomva um lanche e ficava na Caixa Econômica até as seis horas da tarde. Empurrando o processo para ver se andava. Adhemar de Barros era o governador, foi um período em que alguns funcionários assinavam o ponto e iam embora. Ensineio-os a trabalhar! Eu cheguei a dizer: “Viajo quase oito horas entre vir e voltar de Piraicaba a São Paulo, e o senhor aqui a assinar o ponto e ir embora! Não senhor! Não sai daqui enquanto não assinar!”


Como o bispo via o seu trabalho?


Dom Aniger Francisco Maria Melillo era o bispo diocesano. Ele via que eu estava trabalhando na construção do seminário, na pastoral vocacional como reitor e ainda cuidava de duas capelas rurais: Tanquinho e Usina Costa Pinto além da quase paróquia da Usina Monte Alegre. Infelizmente quando venderam a usina deram a capela também. (Seu interior é decorado com afrescos pintado por Alfredo Volpi ). Foi uma injustiça muito grande o fato da capela ter sido vendida. Onde foi construído o seminário anteriormente havia apenas uma casa, que era utilizada no período de férias dos alunos que estudavam no seminário da Vila Rezende. Era uma região rural, sem energia elétrica, era utilizado lampião, não havia agua encanada como é hoje, ela era puxada de um córrego que passava perto, com um motor a gasolina trazia água para o seminário. Para providenciar a luz elétrica fui até a empresa responsável, era a Light, ficava em Campinas, São Paulo. Tive também uma ajuda de Dom Ernesto de Paula, que nessa época tinha renunciado e estava em São Paulo. A eletrificação rural deve-se a diocese e ao seminário. Naquele tempo além de não ter eletricidade na área rural, ela estava racionada nas indústrias, elas paravam as cinco horas da tarde. Imagine como foi difícil conseguir a eletrificação rural. Dom Ernesto tinha consagrado a chacara a São José, tudo foi conseguido com muito poder da oração. O dinheiro destinado a construção tive que gastar para levar a luz até o seminário. Os vizinhos ajudaram muito. A eletrificação rural não foi levada pela prefeitura, foi o seminário que levou. Isso foi em 1962. O tronco que fornecia energia era do seminário da diocese. Os políticos me procuraravam, a prefeitura não tinha licença para levar energia elétrica aos sítios. Na ocasião eu assinei como responsável junto a empresa de energia elétrica. A diocese estava sem bispo, depois que Dom Aniger foi eleito. A prefeitura precisava da minha autorização para levar a luz aos sítios por onde passava a rede. Quando pedi ajuda para levar a energia tive muita dificuldade, depois muitos queriam partilhar da energia. Fiz um contrato com a prefeitura, na condição de que colocassem telefone automático, pedi uma estrada para entrar no seminário, tinha que dar uma volta enorme, em dias de chuva era muito difícil chegar ao seminário. O vizinho da frente, cujo terreno foi cedido para a entrada ao seminário, era o Dito Gica, pai do Frei Tito. Coloquei no contrato que a preeitura deveria zelar pela conservação da estrada. A água resolvi montando uma estação de tratamento de água. O Dr. Serra fez o projeto para nós. Puxava água do córrego, mandei fazer dois tanques com capacidade para 10.000 litros cada um, coloquei filtro e tinha que fazer tratamento. Nos últimos anos a prefeitura ligou a água da cidade.


Para ir a esses locais como o senhor fazia?


Ia de onibus, quando chovia ficava na estrada, era tudo terra.


Em que ano o senhor assumiu a Paróquia São José?


Foi no dia primeiro de janeiro de 1964. Aqui era como um sítio, subia da barroca vaca, cabrito, as cabras tinham uma predileção pelas toalhas da igreja, que na época era composta pelas paredes e cobertura. Porta de madeira de construção com cadeado. Cada vez que dava uma ventania arrancava a porta. Era tudo terra, inclusive ao redor da igreja. O mato crescia bastante, a terra é roxa, de boa qualidade, só que não precisava mandar cortar, as cabras e vacas comiam tudo.


Foi o bispo que pediu para que o senhor assumise a paróquia?


Ele que pediu o sacrifício de assumir mais esse desafio.


Ao chegar aqui, ver o estado das coisas, qual foi a sua reação?


Eu estava acostumado a trabalhar, em Santa Bárbara trabalhei bastante, não havia casa paroquial, morava no asilo de idosos. A escola no tempo do seminario foi muito boa para aprender a viver na pobreza como em uma situação melhor. Quando vim para Igreeja São José não tinha um lugar para morar. Fiquei seis meses na casa do padre Jorge. Aluguei uma casa na Rua Sud Mennucci esquina com Avenida Dr. Edgar Conceição, onde permaneci por quatro anos e meio. Nesse período, no início eu tinha uma Kombi, velha, caindo aos pedaços.


Como era a religiosidade do povo do bairro?


A população frequentava a Igreja dos Frades. Após instalar aqui a devoção a Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, incluindo a instalação de um quadro vindo da Espanha, começou a haver uma mudança de comportamento dos paroquianos. Esse quadro foi instalado em setembro de 1964. Com a devoção a Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, aumentou a frequencia de fiéis. O povo da paróquia é muito bom, muito religioso. Logo que assumi a Paróquia de São José, o Comurba caiu, em 6 de novembro de 1964, da maioria dos que faleceram 47 eram da paróquia, tive que socorrer as famílias dando-lhes conforto espiritual e providenciando alimentos, muitos tinham perdido o provedor do seu sustento. Foi feita uma cooérativa, todo o mundo ajudou, da paróquia, da cidade. Foi triste, trabalhoso e preocupante.


O senhor realizou muitas ações para atrair fiéis, inclusive apreentando um programa em uma emissora de rádio?


Até hoje mantenho a participação na programação da Rádio Difusora. O CESAC - Centro Social de Assistência e Cultura foi uma forma de enfrentar a pobreza que era muito grande. Antigamente onde é a Vila Cristina era mais conhecido como Risca-Faca, uma enorme pobreza, casas feitas de tábua. Para aquele povo todo tinha apenas um bico de luz e uma torneira de água, a prefeitura tentou instalar um poço artesiano, não deu certo, deixaram a torneira para fornecer água ao povo daquela região.


No alto da Avenida Raposo Tavares existe uma cruz que é vista de longe.


É um marco em homenagem as missões realizadas pelos missionários redentoristas, eu os trouxe para dar uma mexida em toda a paróquia. Sozinho eu não estava dando conta, a paróquia tinha se tornado muito grande. Além da Igreja São José eu tinha 26 a 27 capelas. A paróquia ia até o Rio Tietê, vizinho a Anhembi. Era quase uma mini diocese. Consgui que os missionários redentoristas realizassem um trabalho muito bom por três meses. O encerramento das missões foi com essa cruz, que eu pedi no Dedini. Foi uma cruz tão pesada que os homens que subiram com ela no morro tiveram dificuldade em caregá-la. Foi instalada em 19 de março de 1979. Dia de São José. Todo ano, como penitência na via sacra vamos até lá. Nunca medi a distância, deve ser de uns dois quilômetros, tem uma subida bem acentuada. Para evangelizar o povo, consegui com os missionários estigmatinos que a cada ano eles ficassem uma semana em cada capela. A capela situada no Barreiro Rico era muito longe, pertencia ao municipio de Anhembi, a divisão da diocese não era por municipio e sim por acidente geográfico. Pedimos a Santa Sé que estabelecesse o limite por municipio, o que foi autorizado. Essa capela passou para a diocese de Botucatu, isso depois de eu ter assistido por mais de vinte anos aquela localidade, a estrada era de terra.


O senhor esteve com o Papa?


Estive com o Papa João Paulo II várias vezes. Em uma dessas ocasiões concelebrei a missa com ele em sua capela particular. Toda quarta feira o Papa dá audiência pública. Em algumas dessas ocasiões pude comprimentá-lo. No jubileu, 50 anos de sacerdócio, em 2002, viajei para Roma e também estive com o Papa. Ele me acolheu, abençoou.


Como ele o chamava?


Dizia: “ Brasiliano! Brasiliano!”; sempre dava um terço como presente. Com Bento XVI estive apenas próximo dele, na Itália.


O senhor está completando 60 anos de sacerdócio, como é denominado esse marco histórico?


É o Jubileu de Diamante. A comemoração maior foi no Jubileu de Ouro, com uma semana vocacional, chamando os jovens para a vocação sacerdotal. Agora teremos o Tríduo vocacional preparatório do Jubileu,nos dias 5,6 e 7 na nossa matriz. São tres dias preparatórios vocacional. Dia 8 de dezembro de 2012 será a festa de Jubileu de Diamante, com missa festiva, as 10 horas da manhã. O bispo estará presente, assim como os padres da diocese os amigos e familiares.










domingo, dezembro 02, 2012

Ana Marly de Oliveira Jacobino

Escrevi uma carta para agraciar a coluna em que João Umberto Nassif me presenteia toda semana, através da Tribuna Piracicabana (eu, uma ávida leitora). Está no anexo e gostaria muito que vocês a publicassem. Obrigada!
Ana Marly de Oliveira Jacobino



Carta para João Umberto Nassif



Ler é uma fonte de prazer! Boas leituras, então, abrem portas para o discernimento, além de... nos fazer viajar na máquina do tempo da nossa memória. Fui convidada a prefaciar o livro de uma escritora, eu, a conheci num momento inusitado, enquanto, descascava maçãs para um evento solidário. Ela, ali quieta, e, eu, ao seu lado descascando caixas de maçãs. Silêncio! Perguntei o seu nome. Ela me responde em castelhano. Para que, a conversa fluísse, questiono se nasceu na Argentina. Delicada me conta que é nicaragüense. Confesso para ela a minha grande admiração por um poeta da sua terra Ernesto Cardenal Martinez, pela sua participação junto à resistência à ditadura feroz de Somoza. Conversa vem, conversa vai ... o mundo literário nos envolvendo... declaro amor a outros poetas da sua terra... Ruben Dario, leitor de Machado de Assis, a quem Dario conheceu pessoalmente, e, por conseqüência, escreveu um lindo poema-homenagem ao nosso Bruxo do Cosme Velho. Enfim, conto de como, muito jovem tomei uma forte admiração pelo “Movimento Revolucionário da Nicarágua”. A coragem dos seus membros de lutar contra uma ditadura sangrenta explorava o meu ideal juvenil.

Bem! Abri o boneco do seu livro... impactante! Não parei de ler! Ali estava a história moderna da Nicarágua, desde a ocupação britânica até as ditaduras que mancharam o seu solo, com o sangue do seu povo, marcado a ferro e fogo e catástrofes... as mortes aumentaram com o terremoto de 1970... Eu tinha uma preciosidade diante dos meus olhos... um livro pronto para tornar-se um filme cinematográfico. E, a escritora, agora, uma grande amiga foi personagem de toda essa história.

Na Tribuna de 01 de Dezembro de 2012 (sábado) encontro um pouco desta história escrita por João Umberto Nassif, e, como ele foi feliz ao contá-la. Detalhes preciosos da vida de uma mulher de coragem, abraçada a causa solidária do seu povo, massacrado por ditadores... “Lágrimas e Risos”, o seu livro foi marcado na sua coluna com competência de quem sabe a importância da história da América Latina forjada por Golpes e Ditaduras ferozes, alimentadas muitas vezes pelas mãos da CIA (Serviço Secreto Americano). Parabéns, João Umberto pela sua entrevista com Minia de Los Angeles Reyes Ramires, a nossa Angelita, uma heroína de carne e osso... nos dando a honra de residir aqui na nossa Piracicaba! Parabéns, a Tribuna Piracicabana por publicar a cada semana as histórias desses heróis da modernidade, que vivem tão perto de nós. Parabéns, João Nassif e Tribuna por estes valiosos resgates históricos!





ANGELA REYES

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 01 de dezembro de 2012
Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.tribunatp.com.br/
http://www.teleresponde.com.br/


ENTREVISTADA : ANGELA REYES
Minia de Los Angeles Reyes Ramirez sempre foi conhecida como Ângela ou Angelita. Uma forma carinhosa de tratá-la bem como mais prática do que a chamar pelo seu nome civil completo. Angela Reyes escreveu a obra “Lágrimas e Risos”, um livro que prende a atenção do leitor do começo ao fim. O que aparenta ficção foi parte da sua realidade. Com habilidade descreve fatos, lugares e pessoas algumas vezes preservando a identidade com a simples troca de nome ou localização. Angela Reyes foi interna em um colégio de freiras até sua mocidade, quando desafiou conceitos ultraconservadores, enraizados na sociedade de então. Foi combatente na linha de frente contra o regime ditatorial de Anastasio (Tacho) Somoza García presidente do seu país, Nicaraguá. Uma luta sangrenta, onde Angela prestou serviços voluntários na Cruz Vermelha Internacional. Foi colaboradora ativa do grupo contrário a Somoza. Considerada de grande importância para a guerrilha que lutou e depôs o regime de Somoza. Nascida a 2 de agosto de 1938 em Acoiapa (município) , no departamnto (esatado) de Chontales na Nicaragua. Filha de João Dolores Reyes e Gregoriana Ramirez. João Dolores Reyes contraiu o seu primeiro matimônio com Gregoriana, tiveram quatorze filhos, sendo que cinco faleceram logo ao nascer, permanecendo oito filhos homens e Angêla a única filha. Sua mãe morreu de parto. Seu pai se casou novamente, sem que tivesse nascido nenhum filho desse matrimônio. João Dolores Reyes casou-se pela terceira vez, tornando-se pai de mais dois filhos. Em seu quarto matrimônio teve mais quatro filhos, totalizando vivos, 15 filhos.







Qual era a atividade do pai da senhora?


Ele tinha fazenda de gado de corte. Era tudo muito rústico, onde morávamos não havia energia elétrica, não tinha água potável, não tinham estradas. Eram vários municípios do departamento de Chontales, isso há 74 anos. Era uma vida muito tranqüila, os habitantes eram parentes ou amigos. Havia muita paz, são lembranças lindas, na minha infância tomava-se banho no rio, meu pai armazenava água em alguns tonéis, dali pegávamos água para tomar banho. Era tudo muito simples. A comida tinha como matéria prima o milho e o leite. As receitas caseiras além desses dois ingredientes incluíam arroz e feijão. Éramos uma comunidade onde havia ajuda mútua, éramos solidários. Na última vez em que estive na minha terra natal senti muita tristeza, o chamado progresso, civilização, acabou com tudo isto faz tempo. Foram construídas estradas, vieram muitas pessoas de outras localidades que passaram a tratar os nativos da terra como inferiores.









A senhora estudou onde?


Eu vivia no povoado, viajava para a fazenda nas férias. Minha mãe faleceu quando eu tinha 3 anos. Tive uma infância solitária, minha grande amiga era a Idália, que mais tarde foi morar nos Estados Unidos. A mãe dela era costureira, sempre nós duas estávamos embaixo da mesa onde ela cortava o tecido, com os pedacinhos fazíamos vestidinhos para as bonecas. O Lago Nicarágua (ou Lago Cocibolca ou ainda Mar Dulce) é um lago com uma área de 8.624 km² da Nicarágua. É o maior lago da América Central e o segundo maior da América Latina, um pouco menor que o Titicaca. Para ir da minha cidade até Granada não existiam estradas, a travessia era feita em um barco enorme, meu pai levava o gado no barco para vender em Granada; quando eu era pequen ia cm meu pai. A travessia era linda. Eu me enamorei da lua, da água, do vento, da natureza. Aquels noites iluminadas só pela lua Eram barcos a vapor que dixavam uma esteira na água onde passavam, Quando completei 10 a11 anos meu pai internou-me em um colégio de freiras da ordem salesiana, filhas de Maria Auxiliadora, na cidade de Granada, uma cidade muito linda, turística existente na Nicarágua. Foi fundada pelos espanhóis. Ali vivi por oito anos, saí com dezoito anos.


Qual foi a sensação da senhora logo que foi para o colégio interno?


Chorei e vi meu pai com as lagrimas escorrendo em seu rosto. Sou grata ao meu pai por ele ter me levado a esse colégio, ali eu estava protegida, as freiras deram-me uma boa educação. O internato era muito rígido. Usávamos um uniforme de manga comprida, A blusa era branca e a saia era azul. Havia uma golinha e um lacinho azul. Havia o uniforme de gala, sempre azul. Era mais elegante, de outro tecido,usávamos uma boina, para a festa da pátria, para desfilar. No dia da diretora encenávamos peças de teatro, eu adorava o teatro. A formação nesse colégio era integral. Além das matérias básicas como matemática, geografia, gramática, história, ciências naturais. Uma vez ao ano nos mandava a lavanderia, e não existia máquina de lavar roupas. Naquela época a intenção era formar uma mulher completa para que no futuro fosse uma perfeita mulher do seu lar. Formar a futura dona de casa.


Quantas internas havia naquela época?


Havia três grupos eu estive nos três. Quando entrei fiquei nos grupo das pequenas, todas com no máximo 11 a 12 anos. Depois passei ao grupo das que tinham meninas de 12 a 15,16 anos. Passei ao grupo das que faziam o colegial.


Dormiam todas juntas?


Cada grupo, tinha seu dormitório, dormíamos com mosqueteiros, camisolas de dormir cumpridos, não podíamos comunicar-nos com a companheira ao lado. No dormitório era proibido falar. Uma freira, assistente do grupo, caminhava entre as internas calculava até que todas estavam dormindo, Ela então fechava uma cortina, onde ficava seus aposentos.


Como era o banho?


Era uma fila enorme para tomar banhos. Cada grupo tinha seu lugar de banho, vestidas com uma camisola com mangas. Havia uma chave central para abrir a água, a freira abria a água, tínhamos que estarmos prontas para molhar-nos. Ela então fechava a chave um pouco, para esfregarmo-nos. Depois abria para enxaguar e aquilo era muito rápido. No internato tudo era comandado com toque de sino. E com horário. As vezes acontecia de sairmos ser ter tido tempo de molhar a camisola.


Não tiravam a camisola para banhar-se?


Não! Não! Tínhamos uma bata para sair dali, a porta onde ficava o chuveiro individual não podia ser trancada. Não havia nem tranca. Era a mentalidade da época. Íamos a missa todos os dias, acordávamos as cinco e meia da manhã, As seis e meia estávamos assistindo. a missa. Depois da missa íamos tomar café. O café era composto por leite, com u pouquinho de feijão fritos;. Na Nicarágua se come. de manhã. Havia pessoas que comiam arroz e feijão pela manhã. Quando vim morar no Brasil, no inicio sentia falta do feijão no café da manhã; tínhamos ainda uma banana e dois pães, que não eram grandes,. Algumas meninas cujos pais residiam próximos em suas visitas levavam manteiga, geléia. Passei oito natais sem presentes, sem festas. Havia a missa com cantos, corais, nós íamos a missa da meia noite, depois íamos jantar, onda Havia uma comida típica da Nicarágua, o nacatamal. É de origen indígena, com farinha de milho, diferente da processada no Brasil.


Ao sair do internato qual foi sua próxima atividade?


Sai com o curso colegial completo. Fui para a mina terra, meu pai era super-ciumento., não podía sair a rua, não tinha amigas e muito menos amigos; ele dizia que não existía amizades entre homens e mulheres.

Atuamente o que a senhora pensa a respeito?
Acho que existe! Acho que o amigo homem para mulher é melhor do que a amizade entre duas mulheres, porque não há competição. Meu pai não permitiu que eu freqüentasse uma universidade. A universidade estava na capital, era frequentada também por elementos do sexo masculino; Ele dizia que eu estava preparada para casar-me. Ser doce para meu marido. E para ter filhos; Interiormente eu era rebelde. A cultura da época era o chefe da família jamais ser contestado; minha ilusão era estudar jornalismo na universidade. Ou literatura. Eu disse-lhe que queria ser independente, ele montou-me uma lojinha voltada a mulheres. Eu mão me sentia realizada como pessoa Ele quis me casar por duas vezes com filhos de amigos do mesmo partido político: conservadores. Nas últimas férias eu estava na capital, na casa de umas amigas da minha madrasta, conheci um jovem que estava na casa de cima. Eu gostava de chineses, sua cultura, quadros, pinturas. Chamava-se Ramon Lai. Apaixonamos-nos, tivemos que lutar muito para romper as barreiras existentes na época, dede a aceitação do meu pai até cenas descritas em meu livro “Lágrimas e Risos”. Em de janeiro de 1959 casamo-nos. Ramon Lai faleceu em 28 de novembro de 1996. Tivemos cinco filhos: Ramon que mora no Rio Grande do Sul. Dulce Maria que mora em Miami. Andrés formado pela Esalq e mora comigo em Piracicaba. Meying e Lucien.










Quantos livros a senhora já escreveu?


Na Nicarágua publicar um livro tem um custo muito alto. Porém escrevi muitos artigos para jornais, fiz muito crítica contra a ditadura de Somoza.


A senhora participou da revolução que depôs Somoza?


Participei, nunca matei, nunca peguei em armas. Escondi muita gente procurada. Fui militante de esquerda.Meu marido não se metia em política.


Como ocorreu a vinda da senhora ao Brasil?


Meu filho mais velho, Ramon havia concluído o colegial. Todos os meus filhos tinham sentimento revolucionário como a mamãe. Eu tinha medo que o meu filho fosse para as montanhas com os guerrilheiros. Também a guarda repressora da ditadura obrigava a lutar com eles. Eu estava como se diz no Brasil: “Se parar o bicho come, se correr o bicho pega”. Uma das minhas filhas treinou na guerrilha. Eu era membro da Cruz Vermelha, dava apoio logístico. O primeiro movimento revolucionário começou em 1964. Era um movimento de muita conversa e atentados onde nada acontecia a Somoza. O forte da guerra iniciou em 1977 para triunfar em 1979.


Em que ano a senhora chegou ao Brasil?


Foi em 2001. Quando o governo revolucionário venceu, principiou a alfabetização do povo. Meu filho Andrés esteve ensinando na selva. E Dulce Maria também. Ele não podia sair do país se não constasse que ele havia alfabetizado. Andrés veio estudar na Esalq em Piracicaba.


Quanto tempo a senhora foi militante?


Sempre.









Qual foi a ação mais arriscada que a senhora vivenciou?


Estávamos preparando na capital, Manágua para combate. Estávamos formando centros de pronto socorro. Preparávamos em bairros, esses centros. Tínhamos códigos para telegrafo e para bater na porta de outro militante. Com firmeza, Angelita mostra a seqüência de golpes com os nós dos dedos. Trocávamos esses códigos de um dia para outro. Uma noite chegou um companheiro e me disse: “-Companheira, a senhora pode levar uma caixa de medicamentos ao Bairro Lomalinda?”. Respondi que sim, era só colocar no porta malas do carro. Havia barreiras com guardas que vistoriavam os veículos. Chamei uma amiga, sempre com código, Não podíamos viajar a noite porque havia toque de recolher. Na manhã seguinte, umas oito horas da manhã, saímos, quando chegamos ao centro cívico onde se situavam diversos ministérios, estavam os militares. Com aspectos de quem passou a noite em claro. Eu sempre carregava no porta-luvas, cigarros, fósforos, balas, bolachas, doces. E uma garrafa térmica com café.
Quando chegamos ali disse “Oh muchacho! ( Oi moço!). como vocês estão?” Um deles disse: “Aqui estamos a noite toda, não vieram nos render, ou seja fazer a troca da guarda, Estamos com fome”. Disse-lhes: “Não se preocupem! Tenho bolachas, querem um cafezinho!?” Desci do carro e os servi. Olharam o porta luvas, viram a bolacha se alegraram.Dei-lhes cigarros. Disseram-me: “A senhora vai abrir o porta malas!” Respondi: “-Claro, mas toma antes o cafezinho, fuma o cigarrinho!” assim se passou, eles não pediram para que eu abrisse o porta malas. Se abrisse iriam ver muitos produtos médicos e sabiam para onde iriam. Perguntaram para onde eu estava indo, respondi que ia para Lomalinda, levar pãeszinhos torrados para onde estavam as crianças. Quando cheguei, bati no portão, uma voz me perguntou seu eu trazia tortilhas, disse-lhe que não, estava levando pão torrado. Entramos, sentamos, conversamos, Alguém disse vamos tirar os produtos médicos do automóvel. Eram munições e armas! Eu poderia ter sido morta no carro. Sempre Deus me protegeu.










sábado, novembro 24, 2012

JOSÉ ADEMIR CARLONI (MIKA)

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 24 de novembro de 2012
Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/

ENTREVISTADO: JOSÉ ADEMIR CARLONI (MIKA)


José Ademir Carloni, o Mika é proprietário de um estabelecimento comercial onde além dos produtos que comercializa, destaca-se numerosas fotos do XV de Novembro de Piracicaba. A princípio pode-se imaginar que é mais um apaixonado pelo time. De fato é e inclusive por anos a fio defendeu no gramado a camisa do “Nhô Quim”. Mika foi uma das estrelas do Corinthians, jogou ao lado de grandes astros como Rivelino, na época em que o folclórico e estimado presidente era Vicente Matheus. Tem a sabedoria daqueles que tratam o estrelato do passado com a dignidade que merece. Jogou nos maiores estádios do país, com milhares de torcedores observando cada detalhe. Soube reconhecer o momento em que deveria deixar o futebol profissional. Muitos esportistas ao apagarem-se as luzes da fama não sabem como trabalhar com a situação. José Ademir Carloni com muita determinação iniciou-se na área comercial, obtendo sucesso e reconhecimento. Nascido em Jaú a 29 de janeiro de 1953, é um dos nove filhos de Luiz Carloni e Emília Grava Carloni.


Qual era a atividade do seu pai em Jaú?


Meu pai era exímio comerciante, ele tinha uma loja com dois toldos e quatro portas, um sinal de prosperidade se comparado a muitos estabelecimentos mais acanhados, típicos da época. Ele tinha uma forma peculiar de apresentar os produtos, ficavam expostos em frente a loja, dependurados nos toldos. Naquela época os cavaleiros vinham do sítio para comprar sapatões, botas, que ele fabricava no fundo da loja, auxiliado por um funcionário. Morávamos no mesmo prédio em que havia a loja, e em função de dar espaço para a loja, a área residencial era pequena para família tão numerosa, sempre fomos muito unidos, até hoje.


Você ajudava na loja também?


Todos os irmãos ajudavam. Em Jaú tinha uma quadra de futebol de salão. Todos os dias Jonas Eduardo Américo, o Edu ponta esquerda do Santos, que é cerca de dois anos mais velho do que eu, jogávamos. O seu pai, que chamávamos de Seu General, formava um time para jogarmos Eu jogava na defesa, ele jogava mais na frente. A nossa infância inteira jogamos futebol.. O tempo que sobrava nós jogávamos, na hora do almoço, a tarde. Jogava descalço. Quando meu pai passou a fazer sapatão, eu era um jogador magrinho, tinha mais agilidade. Jogávamos com sapatão de sola de pneu, na quadra. Com 14 anos eu já tinha carteira de trabalho assinada, trabalhava em uma loja de tecidos,o proprietário era Felix Letaif, família tradicional de Jaú. A nossa família era muito grande, trabalhando em outro emprego eu complementava a renda.




Era comum a prática de esporte na família?

Todos os meus irmãos jogavam muito bem futebol, principalmente os dois irmãos mais velhos. Eu ia sempre “na cola” do meu irmão Jorge Roberto Carloni, que era uma estrela do futebol em Jaú. Na época o XV de Jaú havia paralisado suas atividades, as equipes de futebol amador ganharam destaque. Meu irmão era capitão do Torino Futebol Clube. Foi nesse time que me consagrei campeão da cidade, do Estado, no futebol amador.


Quem o convidou para ir jogar no Sport Club Corinthians Paulista?
Foi o Dr. Geraldo Jabur, na época ele já era um influente conselheiro do Corinthians. Ele tinha me conhecido na partida final do Estado. Eu estava jogando na Rua Javari, no campo do Juventus, contra a equipe da Máquinas Piratininga. Foi um jogo difícil, nós ganhamos de 3 a 1, sendo que eu fiz dois gols. Tinha um “olheiro” do Corinthians, logo fui levado para o Corinthians. Na época eu tinha 18 anos, em 1970. O Corinthians tinha Rivelino, Zé Maria, Vaguinho, Aladim, Tião, Buião. Adãozinho. Já fui morando no alojamento, dentro do Parque São Jorge, onde inclusive havia um restaurante. Vivi ali uns cinco anos.







Como era o presidente Vicente Matheus?


Foi um grande trabalhador para o Corinthians, seu irmão Isidoro Matheus o assessorava. Além do notável advogado Dr. Geraldo Jabur, tenho-o como um grande amigo, ele me ajudou bastante no Corinthians. Criou-se certo folclore em torno da forma simples de Vicente Matheus se expressar, fruto da sua personalidade. Ele era um apaixonado pelo Corinthians.


Como você era conhecido no Corinthians?


Chamavam-me pelo meu nome, Ademir. Eu jogava com a camisa número 5 ou 4.


Quando você entrou pela primeira vez no campo para disputar uma partida jogando pelo Corinthians qual foi a sua sensação?


Sou corinthiano, minha família toda sempre foi corinthiana. Em Jaú me mandaram entrar em um carrão dizendo que eu estava contratado pelo Corinthians e á noite já joguei contra o Nacional de Água Rasa, com todas aquelas estrelas do futebol. Saí de Jaú, tinha aqueles jogadores como ídolos, personagens de álbum de figurinhas e já a noite estava jogando com eles. Foi muito repentino, quase inacreditável. Entrei jogando no quadro principal.










Como era conviver com Rivelino?


Rivelino é uma pessoa muito doce, brincalhão. Amável, ele que era a estrela principal. Ele tinha um chute muito forte, era a chamada “Patada Atômica”










O salário atingia cifras elevadas?


Como fui sem empresário, assim como outros jogadores, quem fazia o salário eram os presidentes do clube. É muito diferente do que é hoje. O jogador de futebol treina cedo e a tarde, recebe ordens como um funcionário. Não é como treinar em uma academia, ao sentir-se cansado simplesmente para. Não pode parar, o preparador físico ganha para aquilo. Ele tem que mostrar serviço, para que dentro do campo o jogador renda e que fique claro que pelo menos na preparação física o jogador foi devidamente trabalhado.







Lá você estranhou o fato de ter roupeiro e outras facilidades?


Era tudo muito bem organizado. Em determinada época chegou um treinador polêmico, o Dorival Knipel, mais conhecido por Yustrich, ele queria que estivessemos as sete horas da manhã dentro do campo. As seis e meia da manhã íamos tomar o café, era uma mesa que eu nunca tinha visto, Tinha de tudo, todas as espécies de frutas, achocolatados, biscoitos, bolachas, lanches diversos. Eu pensei que se o jogador igerisse aquela quantidade e varedade de alimentos como iriaa entrar no campo. Ele afirmava á todos que tinham que se alimentarem muito bem porque o treinamento iria ser duro. Ele fazia um verdadeiro banquete. Só que não deu certo por muito tempo, tinha uns que ficavam um pouco mais na mesa. Não cheguei a excursionar fora do país. Eu estava relacionado na delegação que iria para o Japão, o Eurico iria ser cortado, o que não aconteceu. Eu estava com o terno preparado, acabei não indo. Quem tinha feito o terno foi o grande estilista Thomazin, que se tornou meu amigo e sempre que posso converso com ele. Na época os jogadores que não estavam relacionados para jogar no time principal jogavam no time dos aspirantes. Todos os times grandes faziam esse campeonato dos aspirantes. Uma espécie de segundo quadro, onde havia muita fera. Joguei um bom tempo nesse segundo quadro, todo ano saia uma peneira dali. Jogadores que vinham com um sonho muitas vezes nem chegavam a jogar. Cada treinador tinha um estilo próprio, era difícil jogar em um time grande.


Você jogou contra grandes nomes do futebol brasileiro?


Joguei contra praticamente todas as feras do futebol. No São Paulo tinha o Chicão, Edson, Terto, jogamos muitas vezes contra o Murici. No Palmeiras tinha Alfredo, Luiz Pereira, Zeca, Eurico, Leivinha. Essa rivalidade entre Corinthians e Palmeiras sempre houve.


Qual é a sensação de estar em um campo de futebol, você com uma bola no pé, milhares de pessoas observando, uma responsabilidade muito grande?


É uma questão muito interessante. Muitos torcedores não sabem, mas os grandes atletas já estão jogando desde os 12 anos, em nenhum momento ele irá sentir-se estreiando, ou irá tremer diante de um público enorme. Ele já tem a vivência de seis a sete anos de clube, já se acostumou faz parte da vida dele. Se você quer ser juiz de direito, mesmo que leve 100 anos, um dia será juiz de direito. Se quiser ser médico, mesmo que demore 100 anos um da será médico. Ser um artista como jogador de futebol é um dom. Não adianta querer ensinar um garoto a ser jogador de futebol. Se ele não tiver a aptidão natural, o dom, ele nunca será um bom jogador de futebol. Nem que ele frequente a escola do Zico. Nos dias atuais quem não gostaria de ter em sua família um jogador de futebol? Todo mundo queria.


Você pegou uma época boa?


No aspecto financeiro não. Nunca cheguei a fazer publicidade de algum produto, o marketing com jogador de futebol era muito raro. Por isso digo que os jogadores merecem o que ganham, são os empresários que fazem o salário deles. Valorizam. Antigamente o jogador sentava-se a mesa com o presidente de um clube para fazer o seu salário, ele estava sozinho. Os presidentes sempre tiveram muita habilidade em manipular, com isso o jogador acabava se iludindo com o que estava sendo oferecido e assinava o contrato. Hoje o jogador nem participa da negociação, só vai para assinar o contrato. Ficou mais profissional. O Neymar que é a estrela principal do futebol mundial, tem atrás dele Ronaldo Fenômeno que sabe de tudo e tem uma grande equipe dando-lhe suporte.


O Ronaldo têm se revelado um grande empresário do esporte?


Ele foi muito feliz em ser o grande craque que conhecemos. Um dom que Deus lhe deu, ser um matador, com uma velocidade impressionante. Como empresário torcemos para que tenha bons resultados dos seus investimentos.


Todo atleta tem uma característica própria, qual era a sua?


As minhas características eram a velocidade e impulsão. Por ser um jogador de baixa estatura eu era bastante explosivo. Tinha uma impulsão muito grande, fora do comum. Os jogadores laterais tinham que ser muito rápidos. O time que não tiver dois bons laterais não irá chegar ao ataque nunca. Eles desafogam o meio de campo, desafogam os pontas de lança que jogam na frente do time.


Quando você jogava no Corinthians em alguma partida sentiu que arbitragem interferia contra o time?


No caso do Corinthians não prejudicava. Como todos os outros times grandes, se houve alguma interferência foi a favor desses times. O famoso caso da “Máfia do Apito” revelou fatos que já ocorriam há muito tempo. A presença da televisão inibiu bastante as distorções. No Brasil é muito difícil enganar um torcedor, todo mundo conhece futebol, tem o dom de ser treinador.


Recentemente o Neymar chutou um pênalti que lhe valeu muita critica, qual é o seu diagnóstico a respeito?


É muito difícil falar sobre pênalti. Todos os grandes batedores de pênalti acabam errando. Isso não ira tirar a credibilidade dele, às vezes basta bater mal na bola. Quem tem que bater o pênalti é o diretor do clube de futebol, é uma responsabilidade muito grande. Se ele marcar o gol não terá muito mérito, mas se errar a cobrança é alta.


Você chutou muitos pênaltis?


Eu batia pênalti, nunca cheguei a errar nenhum. Batia bem na bola e batia forte. Nunca fui um batedor muito clássico, daqueles que sabem deslocar o goleiro. Eu visava um canto e chutava bem forte. Tem jogador que tem uma visão maior, bate, dá paradinha, deixa o goleiro se deslocar primeiro para depois ele bater. O goleiro é o único que ganha com o pênalti. Se ele não pegar ninguém irá falar nada, mas se ele defender estará consagrado. Grandes goleiros se consagram defendendo pênalti.


Chegou a estudar o comportamento de goleiros?


Não. Estudava as gravações do jogo de um ponta. Via que ele fintava pelo fundo e saia para dentro, outro fintava para dentro e saia pelo fundo. Naquele tempo já se estudava. Hoje os treinadores dispõem de muitos recursos tecnológicos para suas análises. Atualmente o futebol é muito mais tabelado, antigamente era mais cruzamento,
Linha de fundo e cruzamento. Hoje os jogadores são mais habilidosos em termos de espaço, antigamente éramos mais habilidosos em termos de campo, geralmente o meia-esquerda era mais habilidosos. Os outros praticamente só carregavam o piano. Hoje cada jogador é especialista em sua posição e o espaço diminuiu bastante, é uma correria muito grande, mas todo jogador habilidoso desequilibra. Tem que proteger bem a bola e tocar rápido.


Qual foi o jogo onde ganharam com a goleada mais expressiva?


Foi um jogo onde o Corinthians ganhou de 7 a 0 do Ribeirão Preto. Saimos consagrados até pela torcida adversária. O Corinthians só saia escoltado quando perdia dentro do Pacaembu.


Em que ano você saiu do Corinthians?


Fiquei até 1975, foi quando vim jogar no XV de Novembro de Piracicaba, o presidente era Romeu Ítalo Ripoli, uma pessoa muito inteligente, de raciocínio rápido, brigava pelo XV. A estrela principal do time era ele. Tínhamos um time muito bom. Nos campeonatos nacional, quando chegávamos a grandes estádios, de grandes capitais, notava-se uma aglomeração, parecia que estava ocorrendo alguma briga, era todo mundo aplaudindo o Rípoli, ele brigava contra a federação em nome dos times menores. A federação fazia resultados, prejudicando os times pequenos. Hoje melhorou muito em função da presença da televisão nos estádios.







No XV você permaneceu até que ano?


A primeira vez que joguei no XV foi em 1972, o time estava mal das pernas, foram me buscar no Corinthians. Fui muito bem sucedido aqui, fiz uma ótima campanha, o XV estava para cair, conseguimos nos classificarmos. Eles não conseguiram comprar o meu passe eu voltei para o Corinthians. Em 1975 vim em definitivo para o XV, onde joguei até 1981, como lateral direito. Disputei três campeonatos nacional. Joguei de quarto zagueiro, em um campeonato nacional ficamos em oitavo lugar com todo assalto que havia em cima de nós. Era um roubo descomunal em cima da gente. Ganhamos de todos os times grandes, ficamos invictos em treze partidas, acho que nenhum time faria isso hoje.













O Rípoli costumava dar um bom bicho aos jogadores?


Ele foi excelente, tinha jogos em que ele via que o juiz tinha favorecido nosso adversário, ele dizia em frente a toda imprensa, que daria o bicho para nós, pois nós éramos de fato os vencedores, a parcialidade do juiz tinha favorecido o resultado para o adversário. O Rípoli explicitava a toda imprensa quando o XV era prejudicado pela arbitragem. Uma vez empatamos com o Palmeiras no Parque Antártica, Ele nos disse que não teríamos bicho, dizia que tínhamos empatado com um time medíocre. Aquilo deu uma repercussão enorme na imprensa. Ele reafirmou que seus jogadores não podiam empatar com aquele timinho. Já em Piracicaba ele nos deu o bicho. Na história do futebol “bicho molhado” você recebe logo após a partida, quando o jogador está embaixo do chuveiro. Nosso bicho era sempre molhado. Muitos times prometem um bicho bom e não pagam, levam 90 dias para pagar. O Ripoli quando acabava o jogo já nos pagava o bicho, não tinha que passar na sede.


Qual é o aspecto ruim da concentração?


É ter que deixar a família. Em 1979 me casei com uma piracicabana, Sonia Regina de Paula Carloni, temos três filhos: Matheus de Paula Carloni, Eloah Roberta Carloni e Renan de Paula Carloni. Eu a conheci quando morava na Rua Riachuelo. Naquele tempo jogador de futebol não era visto com bons olhos, principalmente para contrair matrimônio. Como chefe da concentração eu impunha algumas regras de disciplina dos jogadores com o pessoal do bairro. Eu era querido por todo mundo. Com o passar do tempos nos conhecendo melhor. Para começar a namorar eu tinha que ir primeiro muitos domingos a missa. Eu sempre fui de ir a missa, mesmo nas concentrações, aos domingos ia a missa. Fui coroinha por três anos, na Igreja São Sebastião em Jaú. A concentração é boa, você se enturma com o pessoal, conversa o que tem que conversar, quem gosta de jogar um baralhinho joga, quem gosta de ping-pong joga, quem gosta de música, ou algum pesqueiro de pesque e pague.


Alguns jogadores, inclusive falecidos, chegaram a perder somas representativas em carteado de concentração.


São jogadores viciados em jogo, isso pode ocorrer inclusive em times grandes, pelo fato de ganhar um salário bem mais alto ele já não se empolga em jogar apenas por brincadeira. No XV praticamente nunca teve essa situação de jogar a dinheiro. Um fato perigoso é que o perdedor pode nutrir raiva contra o companheiro por ter perdido dinheiro para ele no jogo. Ao invés de lazer cria-se uma bronca da pessoa. O baralho quando foge do controle, sai da normalidade, pode destruir famílias, vidas. Nas concentrações sempre tivemos passatempos inocentes e amigáveis, passamos mais tempo juntos do que com nossas próprias famílias. Vivemos todos os dias juntos, viajamos, concentramos.


Em seu estabelecimento há muitas fotos ampliadas referentes ao XV de Piracicaba.


É o time da cidade, foi onde permaneci por mais tempo jogando. É um time pelo qual tenho grande amor. Joguei oito anos defendendo o XV.


Conseguiu ficar rico?


Infelizmente não. Se na época tivéssemos um orientador financeiro possivelmente o dinheiro aplicado em automóveis de luxo poderia ter sido aplicado em um bem durável, como terrenos por exemplo.


Até que ano você permaneceu no XV?


Fiquei até 1982, depois montamos um time muito bom. O Dracena Futebol Clube queria montar um time para ser campeão da Segunda Divisão, o Rípoli acabou me cedendo, fui capitanear aquele time com 18 jogadores contratados de times que disputavam a divisão especial. Fizemos uma campanha muito boa, Dracena nunca irá esquecer. Montamos um timão, perdemos apenas duas partidas no ano inteiro, só que não deixaram que nós subíssemos. Era ano político. Fizeram um jogo de apagão em Araçatuba, onde fizeram com que perdêssemos os pontos.


Política influencia no futebol?


Dracena era uma cidade de seis a sete vezes menor do que Araçatuba. A renda maior se dá em cidade maior. No ano seguinte fui para a cidade de Novo Horizonte no Novorizontino.Depois fui jogar no União Agrícola Barbarense Futebol Clube, fizemos uma campanha extraordinária, quando chegou no quadrangular final eu me machuquei, não pude disputar o quadrangular final. Tive que fazer uma cirurgia de reconstrução total dos ligamentos. Operei por três vezes o joelho esquerdo. Depois voltei a brincar nos clubes de Piracicaba, não tive mais nada.


Hoje você ainda joga um pouco?


Hoje já não jogo mais porque está dando artrose no joelho. (risos).


Como surgiu o nome Mika?


Mika era o meu apelido em Jaú. Não sei direito o porquê desse apelido, o que sei é que mica era a resistência de ferro de passar roupa. Quando vim jogar no XV, era conhecido como Ademir, de vez em quando ouvia na torcida alguém gritar: Mika! Imaginava que poderia ser meus primos de Jaú que tinham vindo para trabalhar na Caterpillar, os Pracucho, entre eles o João Batista.


Como é a relação do jogador de futebol com a imprensa?


Nunca fui um jogador com nota abaixo de sete, com isso eu estava sempre bem com a imprensa. Um jogador de altos e baixos será criticado, isso é normal. O profissional da imprensa está ali para fazer o seu trabalho, se o desempenho foi sofrível ele tem que falar.






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