sábado, janeiro 16, 2010

LAZARO ANTONIO DE ALMEIDA
PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 09 de janeiro de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.tribunatp.com.br/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: LAZARO ANTONIO DE ALMEIDA
Lázaro Antonio de Almeida nasceu em Porto Feliz, no dia 03 de maio de 1944, é o filho mais velho dos oito filhos de João Augusto de Almeida e Irene Barreiros de Almeida. Logo após o seu nascimento, a sua família transferiu-se para a cidade de Assis. Trabalhou como ferroviário, chegando a Chefe da Agencia de Piracicaba do IBGE, onde se aposentou. Ele lembra-se dos tempos da Sorocabana, onde a cada mudança de administração do alto escalão mudavam-se as diretrizes da empresa, muitas vezes ocasionando perdas incalculáveis. Se não havia uma remuneração satisfatória, havia a dedicação integral dos funcionários efetivos. Trabalhava-se com amor. Motivado por busca de melhores condições, prestou concurso e entrou no IBGE. Assumiu a chefia em Piracicaba, onde desenvolveu seu trabalho sendo até questionado por facções que queriam superestimar a população da cidade buscando benefício pessoal. Desde 1992 ele está aposentado, Lázaro tem uma visão cristalina da realidade brasileira.
O senhor estudou em Assis?
Comecei a estudar em Assis, no Grupo Escolar Lucas Thomaz Menk. Pelo período de um ano estudei em Porto Feliz, no Grupo Escolar Coronel Esmédio, onde fui aluno da professora Lígia. No período em que realizei meus estudos de ginásio e colégio em Assis, fui aluno do Curso de Formação em Transportes, CFT, ministrado pela Estrada de Ferro Sorocabana. Estudava durante o dia na Sorocabana e a noite na escola estadual. No curso do CFT as aulas eram dadas alternando-se um dia era aula prática outro dia aula teórica. Como em Assis havia oficinas da Estrada de Ferro Sorocabana, havia duas modalidades de cursos, um que era voltado para quem iria trabalhar nas oficinas e outro voltado para quem iria trabalhar nas estações. Eu fiz o curso para exercer as atividades nas estações. Além do curso de telegrafista, conferente, formação de composição de trens.
As composições que saiam de Assis eram de trens de cargas, passageiros?
Tinha de tudo. Trem só de carga, só de passageiros, de passageiros e cargas. Existiam quatro divisões na Sorocabana. A Quarta Divisão era sediada em Assis. Ali se controlava os trens dos trechos que iam de Ourinhos até Presidente Epitácio. O ramal Dourados não chegou a concluir o seu projeto na integra, que seria de ir até Dourados.
A linha de trem que passava por Assis saía de onde?
A chamada linha-tronco saía da Estação Julio Prestes em São Paulo e ia até Presidente Epitácio. Piracicaba era um ramal da Sorocabana, que tinha seu ponto final em São Pedro.
Aproximadamente, quanto tempo levava a viagem de São Paulo á Assis?
O trem de passageiro levava onze horas, se não me falha a memória, de Assis á São Paulo o percurso ferroviário era de 580 quilômetros, a velocidade média era de 50 quilômetros por hora. O trem de carga levava mais tempo.
O ramal da Sorocabana que passava por Piracicaba era mais lento?
Era outra situação, a viagem era mais demorada. A linha de São Paulo á Presidente Epitácio tinha um trecho entre São Paulo até Sorocaba onde o trem corria muito, a linha era dupla, não havia parada para aguardar a chegada da composição que vinha no sentido contrário.
Quando o senhor passou a trabalhar na Sorocabana ainda existiam as famosas Maria Fumaça?
Tinha uma ou outra que era utilizada para manobras em pátio. Em Assis não havia o virador de locomotiva, para virar a máquina era utilizado o conhecido sistema chamado triangulo.
A eletrificação da linha chegou a funcionar em Assis?
Eu saí da Sorocabana em 1973, se não me engano a eletrificação da linha até Assis chegou em 1970. Hoje o sistema eletrificado está totalmente desativado. A linha permanece funcionando até hoje.
O senhor tem saudade dessa época?
Eu entrei na Sorocabana quando ainda era menino, fiquei bastante tempo, e só sai porque as condições oferecidas pela Sorocabana não permitiam que eu permanecesse, o salário era baixo. O trabalho em si deixava-nos orgulhosos, todos que trabalhavam lá ganhavam pouco, mas exerciam suas funções com amor pelo serviço.
O uso de farda era para alguns cargos?
O maquinista, o chefe de trem, o chefe da estação, eles tinham um fardamento. Os demais funcionários usavam roupas comuns.
O senhor foi telegrafista, quais foram os equipamentos que chegou a usar?
Na escola aprendemos o alfabeto Morse, onde as letras e números são transformados em código utilizando as grafias de traço e ponto. O telegrafo era uma caixa de madeira com uma campainha em cima e duas pequenas tábuas onde batíamos o código. Outro aparelho era só com o toque. Mudava a sonoridade, a aplicação, embora o código fosse o mesmo.
Havia um apelido para o telegrafista que não operava com muita agilidade?
Era denominado em tom de brincadeira como pica-fumo. Uma referencia ao habito comum na época de picar fumo de corda. Nós tínhamos que receber, decodificar e escrever manualmente a mensagem.
O senhor trabalhou em estações pequenas?
Trabalhei em Presidente Epitácio, Álvares Machado, onde eu fazia praticamente todo tipo de trabalho referente á estação. Quem trabalhava á noite atendia o telegrafo, fazia o recebimento de despacho de trens, vendia bilhete de passagens, recebia os trens que chegavam.
Como eram formadas as composições de passageiros?
De Presidente Epitácio o trem não saia completo, ao longo do percurso ia agregando mais carros á composição. De lá saia uma locomotiva, o primeiro carro que era o de bagagem, depois vinha o carro de segunda classe, o carro restaurante e depois o carro de primeira classe, no meio do caminho eram agregados os carros dormitórios, que eram os últimos da composição.
Como era um carro dormitório?
Era divido em cabines, e cada cabine tinha dois leitos, um em cima do outro. Havia em cada uma delas o vaso sanitário, era isolado, porque poderia ocorrer de viajar com pessoas que não eram conhecidas. Normalmente quem viajava nesse tipo de carro eram pessoas com poder aquisitivo mais alto, pelo próprio preço da passagem.
Dormia-se com a roupa que estava no corpo?
Casso o passageiro desejasse poderia trocar de roupa no banheiro, na própria cabine, se estivesse com pessoa que possibilitasse tal liberdade.
Se quisesse viajar de pijama poderia?
Com certeza sim! É interessante observar que no caso das cabines não havia o que era comum nas primeiras e segundas classes, aonde de trecho em trecho vinha o chefe do trem, acordar o passageiro para conferir a passagem. Cada vagão de cabines tinha um responsável, que sabia onde cada passageiro iria descer, chamava-se camareiro. Ele batia na porta avisando o passageiro que o seu destino de viagem estava próximo.
Quantos funcionários geralmente compunham um trem de passageiros?
Havia o maquinista, o auxiliar do maquinista também chamado de foguista, por ter sido no tempo do trem á vapor a pessoa que alimentava a maquina. Viajavam ainda o chefe de trem, o ajudante de chefe de trem, se tivesse cabines havia o camareiro. Quem picotava o bilhete da passagem era o chefe de trem ou seu auxiliar. No caso do carro restaurante era explorado por terceiros. Como os bares das estações também eram explorados por particulares. No carro restaurante havia o cozinheiro, o garçom. Havia um balcão para lanches ou para tomar algum refrigerante. Nas mesas eram servidas as refeições. Em determinadas épocas do ano, poderia ocorrer da pessoa não conseguir passagem para viajar, por causa da grande procura. O excedente ia de ônibus. Havia um trem com características de trem de carga, onde havia um carro de passageiros, os demais eram vagões de cargas. A sigla desse trem era BG. Passageiro que não tinha muita presa ia nele. No trem superluxo havia o carro chamado Pullman de um lado havia uma poltrona e do outro havia duas poltronas, reclinava ficando um semi-leito. Todo trem superluxo tinha ar condicionado.
Por quanto tempo o senhor permaneceu trabalhando na Estrada de Ferro Sorocabana?
Eu comecei a trabalhar mesmo, quando conclui a escola, em 1963 e permaneci até 1973. Foram 10 anos. Quando estava na fase de transformação para a FEPASA eu sai.
O motivo alegado para desativar o transporte ferroviário era o fato de ser deficitário?
Deficitário como quase todas as estatais no Brasil. A Sorocabana tinha uma revista mensal aonde vinha o balancete, era considerada como décimo segundo estado do Brasil em termos de arrecadação. A administração mudava conforme a mudança de governo. Cada governo eleito nomeava o presidente, a diretoria como cargos de sua confiança. Tive a oportunidade de ser chamado em São Paulo, onde conversei com um diretor e pude constatar seu total desconhecimento e despreparo para a função que exercia. O pessoal que ocupava a chefia de estação, de divisão, era efetivo, os cargos não eram de natureza política.
O senhor desligou-se da Sorocabana e foi trabalhar onde?
A baixa remuneração feita pela Sorocabana me levou a prestar um concurso no qual passei, e fui trabalhar no IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Fui nomeado para trabalhar em Ourinhos onde permaneci por um ano. Em 1973 fui para Assis, onde permaneci até o inicio de 1976. Na época me ofereceram a chefia do IBGE em Piracicaba, e assim vim para cá, onde assumi o cargo de Chefe da Agencia de Piracicaba.
Onde se localizava IBGE na época?
Funcionava na Rua Moraes Barros, ao lado de onde era a garagem da CPFL.
Quantos funcionários trabalhavam lá?
Existiam 11 funcionários.
Qual é a função básica do IBGE?
É fazer levantamento de todas as estatísticas possíveis. É comum associar o nome IBGE com estatística populacional. As pesquisas são em diversos campos: industrial, agrícola, estatísticas realizadas em cartórios, prisões.
A sede do IBGE fica aonde?
Fica no Rio de Janeiro.
O senhor permaneceu quanto tempo no IBGE?
Aposentei-me em 1992. Quando cheguei em Piracicaba , havia um censo qüinqüenal, que era o econômico e o agrícola, e estava em pleno andamento. Fiz o censo demográfico em 1980, depois em 1985 o censo agrícola e econômico e o censo demográfico de 1990.
Qual são as principais finalidades de um censo?
O censo é desde a época de Jesus Cristo. Quando ele nasceu, José e Maria iam prestar informações para o recenseamento. No Brasil começou por volta de 1910. É importante para conhecer a realidade de um país. Tem que haver estatística, embora nem todos reconheçam essa importância, na época tínhamos muitas dificuldades em obter informações. Tínhamos uma retaguarda legal que se a pessoa se negasse a prestar informações ela poderia ser intimada a fornecer os dados exigidos. Hoje a pessoa ao ser recenseada se negar a prestar informações ninguém pode obrigá-la a fazer.
As informações mais distorcidas são as de natureza econômica?
Isso sempre existiu, mesmo quando havia na época a garantia de sigilo total. A estatística no Brasil é relegada a um segundo plano. Quando houve a transição de governo, em que o Sarney assumiu a presidência, o censo demográfico de 1980 foi feito em 1981. Porque na fase de transição, percebendo que havia recursos alocados para o censo, os mesmos foram utilizados para outras finalidades. Com isso perdeu-se a série histórica de 10 anos. Até então, todo censo demográfico tinha sido feito com o ano terminado em zero.
De 1973 até os dias atuais o Brasil praticamente duplicou sua população. Isso é positivo?
Eu acho que o crescimento demográfico em certas regiões é necessário.
O senhor é formado pela UNIMEP?
Sou formado em Ciências Contábeis.
Tecnicamente a emancipação de pequenas localidades é um fator positivo?
Depende da cidade. Tem lugar, como por exemplo, Hortolândia e Sumaré. Hortolândia é maior do que Sumaré, no entanto era distrito de Sumaré. Nesse caso é justificável a emancipação. No Brasil há casos em que se cria um município, e o que se arrecada é insuficiente para pagar o salário do próprio prefeito! Há sinais de que vem uma nova onda de criação de novos municípios. Existem certas situações onde são claros os níveis de dificuldades para que o IBGE faça uma pesquisa. Em grandes centros, onde há regiões de alto índice de violência, é impraticável a realização de pesquisa! Quem se arrisca a entrar nesses locais? Não se trata de preconceito e sim de realidade. O Estado não sabe como atuar em situações dessas.
O fato do IBGE estar sediado no Rio de Janeiro e o centro do poder estar em Brasília podem afetar em alguma coisa?
Acredito que não. Atrapalharia mais se a sede localiza-se em Brasília!
Das diversas classes sociais e econômicas existentes qual é a mais propícia a dar informações corretas?
Acho que encontramos maiores facilidades com as classes menos elevadas. A informação é mais pura, mais real. A classe média e a alta trabalham as informações. Acho que falta uma conscientização por parte dessas pessoas, quando se apura o censo não aparece o nome de ninguém.

Comentários:
Li a entrevista, a qual revelou o universo dos ferroviários, cujo o entrevistado, o Senhor Lazaro foi ótimo memoralista, pois relatou ricos contextos históricos,de uma era sobre as rodas de ferro.
Ademir Pfiffer - Historiador - Jaraguá do Sul - SC
# postado por ValeItapocu : 8:45 AM












sexta-feira, janeiro 01, 2010

BABALORIXÁ AZOANE J`LOLÁ



PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 02 de janeiro de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
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ENTREVISTADO: BABALORIXÁ AZOANE J`LOLÁ (Diz-se: Azoane Jilolá)
Conhecido em Piracicaba como J`Lolá (pronuncia-se Jilolá), palavra que em iorubá quer dizer “Rei do Sol” ou “Supremo de Dignidade, Virtudes, Qualidades”. É o nome de Obaluaê que é o Universo. Nascido em Salvador, Bahia, no dia 26 de agosto de 1941. Babalorixá, conhecido popularmente como Pai de Santo, que deveria ser chamado de Zelador de Orixá
O senhor é católico?
A minha família sempre foi católica, fui batizado na igreja católica. Eu sou Católico Apostólico Romano, vou á igreja, freqüento a missa. Eu sou o único da família que se interessou pelo candomblé.
Como o padre vê a sua espiritualidade?
Aqui em Piracicaba acredito que eles não sabem a respeito da minha espiritualidade, pelo fato de eu não ter contato com nenhum deles. Em Salvador na Igreja do Bonfim, a Lavagem da Igreja do Bonfim é o candomblé. Lá não existe essa divergência entre o candomblé e o catolicismo. Quando eu tive que fazer uma romaria na Igreja do Bonfim, como uma atividade do candomblé, fui á Igreja do Bonfim com toda a indumentária do candomblé. O Senhor do Bonfim no candomblé é Oxalá! As baianas quando lavam as escadas estão todas de branco, que é a cor de Oxalá. Quem é adepto do candomblé no dia de Oxalá, que é toda sexta feira, não usa roupa de cor, não come comida com sal.
Que idade o senhor tinha quando se despertou para o candomblé?
Eu estava mais ou menos com sete para oito anos de idade. O sentimento espiritual já nasce conosco. É o nosso anjo da guarda. Se ele permanecer abafado ele não se desenvolve. Minha mãe era professora na Ilha de Maré, nessa época eu tinha cinco a seis anos de idade. O dia 16 de agosto é dia de São Roque, nesse dia havia uma procissão marítima. Eu enlouquecia, saia de casa e entrava no mar, os pescadores me acolhiam. Com o passar do tempo, começou a manifestarem-se certas coisas em mim, que apesar de seu ser baiano era leigo no assunto. Eu tinha medo, não aceitava, era completamente contra essas manifestações espirituais.
Como eram essas manifestações?
De repente eu “sumia”, perdia totalmente a noção de tudo que me cercava. Os médicos classificaram “essas ausências” como uma doença clássica. Receitavam remédios fortes. Depois que entrei no candomblé isso tudo passou.
O senhor passou a freqüentar algum local específico em Salvador?
Freqüentei a casa do meu Pai de Santo, Waltinho de Iroco. O local do seu Pai de Santo é denominado Ilê Axé Iba Faromi. Estive lá no mês passado. Lá é que fui feito.
O que é “ser feito”?
É a firmeza daquela entidade. A gente é raspado, é pintado é catulado.
Qual é a diferença entre catulado e raspado?
O catulado é o corte do cabelo com uma tesoura, o raspado é com a navalha.
Esses detalhes que o senhor está fornecendo eram de conhecimento restrito?
Antigamente não era permitido fornecer esse tipo de informação, hoje está aberto. É importante que sejam divulgados para que a cultura seja preservada na sua forma correta.
Como é denominado o seu local, onde o senhor é Pai de Santo?
Quando passei a ser babalorixá recebi a denominação Ilê Axé Iba Tolu.
Quais são as diferenças entre a umbanda e o candomblé?
As diferenças estão nos toques, nas preparações para o axé. O candomblé tem sua origem na África. A umbanda foi desenvolvida no Brasil. A umbanda segue a linha de trabalho com espíritos. O candomblé trabalha com divindades.
Existe a atividade desenvolvida para produzir o bem como também para produzir o mal?
Existe! Isso é lógico! O babalorixá é um conselheiro geral. No mundo existem pessoas querendo fazer de tudo. Cabe ao babalorixá fazer o que melhor decidir que deve ser feito. Já houve caso em que fui procurado para desenvolver um trabalho extremamente prejudicial a uma pessoa. Eu não aceitei. Eu aprendi dentro da seita, que não se pode simplesmente fazer o mal ás pessoas, isso pode voltar contra mim mesmo, o meu anjo da guarda me devolve aquilo.
Existe algum tipo de pessoa que deseja provocar o mal para outra pessoa?
Os mais interessados nesse tipo de ação são pessoas envolvidas na política. Desejam que o seu adversário que se lasque! Procuram travar, enfraquecer, impedir o adversário de ter sucesso.
Pessoas com problemas sérios de saúde procuram suas orações?
Procuram! Somos impedidos de fazer certas coisas na vida, por ser uma afronta com o nosso espírito, com o nosso anjo da guarda. Por desconhecimento muitas vezes as pessoas agem de forma errada. Dentro do nosso ritual, das origens, quem manda em nossa cabeça é Iemanjá. Dia primeiro de fevereiro nas praias são feitas as homenagens á ela.
O senhor ficou até 25 anos de idade em Salvador?
Permaneci em Salvador, porém não me dedicava apenas a religiosidade, trabalhava como professor. Por parte da família da minha mãe todos foram professores, existe em Salvador colégio em nome do meu avô. Meu pai era policial. Toda a minha cultura foi para o lado da minha mãe. Antes de entrar no candomblé eu tinha medo, eu ficava assustado. Existia uma Mãe de Santo que passava sempre na porta da minha casa, quando eu a via, corria. Escondia-me, tal o medo que aquela mulher me dava. Quando entrei para o candomblé eu já não podia fazer mais isso, até que um dia, isso foi em 1961, ela disse-me: “Meu filho, você terá os melhores empregos em sua vida, mas a sua vocação é o candomblé”.
O senhor conheceu Mãe Menininha do Gantois?
Conheci. Ela fazia trabalhos com o meu Pai de Santo.
O senhor veio para São Paulo?
Vim para São Paulo, trabalhei na RCA VICTOR. Depois de certo tempo voltei para Salvador. Voltei para São Paulo, fui trabalhar em Congonhas, na Transbrasil Linhas Aéreas. Descobriram lá dentro que eu era espírita. Passou a ter um afluxo de funcionários da empresa, buscando comigo soluções para problemas afetivos, domésticos. Não havia a história de ver se poderia voar! (risos). É interessante, mas quanto maior o nível de cultura da pessoa maior é o seu gosto em buscar as respostas. É natural do ser humano. Acabei pedindo a conta da Transbrasil, voltei para Salvador. Permaneci mais um tempo lá. Voltei para São Paulo, fui trabalhar na Enciclopédia Britânica. Jogaram-me em Rio Branco, no Acre. Tinha a responsabilidade de realizar cobranças jurídicas. Eles me ofereciam boas condições de trabalho, passagens de avião.Eu morava em uma casa que a companhia me oferecia. Certo dia chegou uma mulher com uma criança e disse-me: “Benza o meu filho!”. Eu disse-lhe: “- A senhora está fora do seu juízo! Eu nem sei o que é isso!”. De tanto ela insistir, para satisfazê-la acabei atendendo o seu pedido. Noutra semana eu não dormia mais era muita gente na minha porta. Comecei a dispensar as pessoas. Voltei para São Paulo e pedi a minha conta. Voltei á Salvador.
E Piracicaba como surgiu na vida do senhor?
Vim em 1992 vim para passar uns dias e já faz 17 anos que estou aqui! Tenho 47 anos de espiritismo, reconhecido pela Federação Baiana de Culto Afro-Religioso.
O que é Ikiri?
É um coquinho. Nele eu consigo ver a trajetória de um ser humano. Só oito pessoas fazem essa leitura no mundo, sendo que mulher não tem acesso ao ikiri, assim meu Pai de Santo me orientou. O verdadeiro fundamento do ikiri está no fundamento branco do meio dos coquinhos. Quem estará presente é o seu anjo da guarda. É essencial que a pessoa esteja presente durante o ritual de leitura do ikiri, não pode ser feito via Embratel e também deve ser guardado o devido respeito, não podendo ser transportado de um lado para outro.
Como o senhor chama uma entidade?
Balançando um sino com duas bocas, ou campânulas, J`Lola explica: “O som produzido pelo adjá é a forma de chamar o Orixá. Não existe como eu falar venha cá”.
O senhor consegue visualizar acontecimentos próximos?
O falecimento da Kassia Eller eu vi aqui. A eleição do Lula eu vi aqui.
O senhor permite fazer duas perguntas que estão na cabeça de muitos brasileiros?
Claro, pode perguntar!
Quem será eleito presidente do Brasil?
(Nesse instante J`Lolá passa a jogar o Ikiri).
O Presidente Lula será o Fidel Castro só que discretamente, mesmo que ele coloque outra pessoa continuará governando na sombra. Ele não irá permanecer se reelegendo, irá colocar alguém, depois essa pessoa sairá, ele entrará de novo. Enquanto ele existir será presidente. Eu vejo isso. A futura presidente é uma mulher.
O Governador José Serra terá alguma chance?
O Serra poderá até atrapalhar ele.
Se a pessoa tiver muita fé em Deus ela estará totalmente protegida?
Lógico que estará. Primeiramente é Deus! Ele é o Ser Supremo.
Se alguém deseja a outro algum mal pode haver uma blindagem?
Se houver fé e um anjo de guarda fortalecido nada te acontecerá!
O senhor recomenda que as pessoas façam suas orações?
Lógico! Todo dia antes de dormir eu rezo, peço a Deus.
A oração é um escudo que o senhor recomenda para que as pessoas pratiquem no ano que se aproxima?
As pessoas devem rezar, ter fé.
O senhor tem uma oração especial para recomendar?
Quando vou deitar rezo: “Com Deus me deito, com Deus me levanto. Com a Graça de Deus, do Divino Espírito Santo. Rezo por três vezes. Amem. Deus me proteja e protegei meus inimigos”. Ás vezes eu rezo uma Ave Maria para as almas dos mortos, dos conhecidos.
Há uma falta de espiritualidade nos dias atuais?
Falta, há uma busca pela satisfação material. Há pessoas que esquecem que Deus está em toda parte e em todos os momentos. Não se podem cometer barbaridades, depois ir até um brechó, comprar um paletó e ir todo comportado a um culto qualquer e ficar perfeito. Sou do candomblé há 47 anos, venho de uma família católica, me considero católico, entro na igreja oro. Isso não é uma mistura, Deus é um só!
A cultura trazida da África mesclou-se com a religião católica?
Os escravos foram quem trouxeram isso tudo. A comida, a dança. Na Bahia teve uma época, que eu não cheguei a ver, mas que o candomblé era proibido. Eu peguei uma época em que para fazer um toque na sua casa precisava pedir licença na polícia.
O que é toque?
É uma festa com atabaque. Para realizar isso nos anos 50 era necessária a autorização policial.
Quando o senhor passa perto de uma pessoa “carregada” o senhor sente?
Sinto! Começo a abrir a boca, a bocejar.
Quem será o ganhador da Copa do Mundo em 2010?
Vai ter muita briga. O fato da representação brasileira sentir-se poderosa irá facilitar ao adversário. Eles estão muito convencidos. Tem graveto que derruba panela. Algum time fraco pode derrubar o grande, e isso pode acontecer ao Brasil. A África do Sul poderá ganhar a copa. A única coisa que pode favorecer o Dunga é que o anjo da guarda dele é da justiça.
Já pediram a ajuda do senhor para que fornecesse os possíveis resultados da Mega Sena?
Já! Eu digo que se eu soubesse não iria contar, iria eu mesmo jogar! Outra coisa, sorte a gente não adquire na vida, já nascemos com ela. Uma criança que nasce no chamado berço de ouro, tem de tudo. Muitas vezes essa pessoa tem um problema. Outra pessoa nasce á mãe joga no lixo, alguém a acolhe, ela um dia será um médico, um doutor. É a sorte!
Existe destino?
Quem faz é gente! Nesse mundo tudo que está na face da terra é o que Deus quer. Se nesse momento estou aqui fazendo isso é por ordem Dele. Não podemos discriminar nada. Ninguém quer ser ladrão, assassino, ou usar droga. Não por vontade própria. São conseqüências.
Uma família que tenha uma pessoa problemática, um dependente químico, por exemplo, há uma razão para a existência desse problema na família?
Tem alguma razão para que exista isso na família.
Um comentário sem fundamento, uma risada maldosa pode trazer conseqüências futuras?
Pode trazer conseqüências graves inclusive. Que acompanhará a pessoa até o final dos seus dias. Dependendo do que você vai falar a palavra é mais forte, em outras ocasiões a mente é mais forte.
O senhor tem discípulos?
Tenho muitos, alguns em grau avançado. É o que me deixa firme. Temos que saber espalhar, dividir.

FELIZ 2010 !




Ainda menino, lembro-me que na escola fazia o cabeçalho das provas, colocava o nome da cidade, o dia o mês e o ano...1965...1972...O ano 2000 era um tempo tão distante!

Hoje é dia 1 de janeiro de 2010, já não faço mais cabeçalhos em folha de papel almaço pautado. Penso apenas: como passou rápido! Hoje se não uso mais calças curtas, uso bermudas compridas. A tela e o teclado do computador substituíram a folha de papel almaço pautada. A letra era desenhada caprichosamente, e, acredite, usei caneta tinteiro com a tinta cor Azul Royal! Ainda não conhecíamos a caneta esferográfica! De uns tempos para cá, passei a observar que as pessoas com mais anos de vida, estão muitas vezes olhando para o vazio. Isso me intrigou muito, até descobrir que eu simplesmente não estava entendendo nada. Á frente dos seus olhos há uma tela de projeções virtuais. Suas recordações são projetadas ali, como um diretor de um filme, ela escala quem participa de suas lembranças. Geralmente os atores principais não podem mais serem escalados para novas produções. Mas é tão gostoso lembrar-se de desempenhos memoráveis, detalhes que passaram quase imperceptíveis. Quadro a quadro ela analisa os mínimos detalhes. Ás vezes sorri outras vezes deixa escorrer uma lagrima no canto dos olhos. São emoções legitimas dos anos que se passaram. E o mais interessante é que cada indivíduo produz seu próprio filme, escolhe o gênero: romântico, de aventuras, comédias, dramas e até...novelas! Dizem que a vida imita a arte.

Desejo que em 2010 e todos os anos que você tiver pela frente, realize suas mega produções, com os grandes astros que são as pessoas de sua convivência. E que escolha o gênero que mais lhe agrade. Desejo mais, que no dia em que seus olhos estiverem fixos no horizonte, projetando seus filmes virtuais, todos vejam um sorriso nos seus lábios!
João Umberto Nassif
Autor:

sexta-feira, dezembro 25, 2009

FREI SAUL PERON

FREI SAUL PERON
PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 26 de dezembro de 2009
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.tribunatp.com.br/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: FREI SAUL PERON
O Natal é uma data em que comemoramos o nascimento de Jesus Cristo. O Papai Noel, a figura do bom velhinho foi inspirada num bispo chamado Nicolau, que nasceu na Turquia em 280 d.C. O bispo, homem de bom coração, costumava ajudar as pessoas pobres, deixando saquinhos com moedas próximas às chaminés das casas. O presépio também representa uma importante decoração natalina. Ele mostra o cenário do nascimento de Jesus, ou seja, uma manjedoura, os animais, os reis Magos e os pais do menino. Esta tradição de montar presépios teve início com São Francisco de Assis, no século XIII. Essas informações são bem conhecidas. O que desperta a atenção é a de a cada dia a figura do Papai Noel estar mais próxima ao recorde do Guiness Book como “Maior Vendedor do Mundo”, sendo relegado a um segundo plano o verdadeiro sentido Natal. Só os pequeninos, e nem todos, acham que Papai Noel existe, mas a voracidade do consumo o materializa na mente de muitos adultos. O nosso entrevistado é muito estimado pelos piracicabanos que o conhecem. Pela sua franqeza e forma lúcida com que expõe suas convicções torna-se um baluarte em defesa do sentido original do Natal.
O nome civil do senhor qual é ?
Saul Peron, sou filho de Guerino Peron e Cezira Cadari Peron, uma família muito conhecida em Piracicaba, especialmente na Vila Rezende. Nasci no dia 5 de novembro de 1934, potanto já fiz 75 anos na localidade rural onde uns chamam de Guamiun por causa do córrego, também conhecida por Santa Fé que fica entre Vila Nova e Cruz Caiada.
Quantos filhos seus pais tiveram?
Cinco filhos. Até os quarenta anos de idade meu pai trabalhou na agricultura, mudando depois para Piracicaba, onde montou um armazém de secos e molhados, me parece que se chamava Empório São Benedito, na Avenida Dona Francisca, Vila Rezende, proximo onde hoje é o Restaurante Monte Sul.
Era uma zona praticamente rural?
Da casa do meu pai, quando se olhava na direção de onde hoje é o bairro Jardim Monumento, onde está o Mosteiro, a Igreja Nossa Senhora dos Prazeres, plantava-se arroz. Onde hoje é o Hospital dos Fornecedores de Cana praticamente determinava o limite das casas construídas. Quando menino eu conheci a Avenida Dona Francisca com meia dúzia de casas, era piso de terra, cercas de pau a pique. A única rua calçada era a Avenida Rui Barbosa, o bonde ia até o seu ponto final, passava pela Casa Valler e fazia seu ponto final onde hoje é um Posto de Saúde Municipal, pena que não tenha sido preservado. Hoje são mais rigorosos com relação á preservação das obras edificadas. Tomba-se um patrimônio, passando a responsabilidade integral de preservação e manutenção ao seu proprietário. É um procedimento comum pelo que sei no Brasil. Algumas experiências em Minas Gerais fizeram com que o bispo pedisse o apoio dos padres para que fosse feito o “destombamento” que permitisse que ele cuidasse das igrejas que estavam prestes a caírem.
O senhor estudou no Grupo Escolar José Romão?
Estudei por dois anos em um grupo escoar que ficava onde na época denominava-se Bimbóca, hoje Avenida Manoel Conceição. Era uma escola mista, e a escola ficava situada entre uma dúzia de casas, inclusive do Vitti. O Romão já existia, mas nós morávamos ali em baixo nessa época.
Ainda menino o senhor chegou a trabalhar na lavoura?
Trabalhei no sítio. Naquela época não havia impedimento para que o menor trabalhasse.
O senhor é favor ou contrário ao trabalho do menor de 16 anos de idade?
Eu acho que o menor não deve ser explorado. A criança não deve ser usada, manipulada. Há a possibilidade de se adquirir uma mão de obra barata sem oferecer segurança, muitas vezes obstruindo a ida da criança para a escola. No meu tempo não havia isso, ia-se á escola, na volta ia para a roça. Era uma atitude comum na época, em todos os lugares. O menor não ser explorado é uma situação evidente, que ele tenha uma oportunidade para estudar é mais evidente ainda. O poder público deveria providenciar uma maneira que permita á família uma sustentação. Um pai com dois ou três filhos pequenos, não tem um bom emprego, fica difícil. Em contrapartida o trabalho do menor proporciona a evasão das escolas.
O senhor acredita que essa proibição do menor de 16 anos de idade ser proibido de trabalhar, sem que o Estado ofereça a contrapartida é uma solução pela metade?
É sempre assim! É difícil uma solução total.
O senhor foi para O seminário Seráfico São Fidelis com que idade?
Eu devia ter de 15 para 16 anos de idade.
Foi uma mudança de vida radical?
Eu procedo de uma família muito religiosa. Nós morávamos no sítio, os meus avôs eram lideres da comunidade, quando havia missa lá, os celebrantes eram a maioria das vezes eram acolhidos em casa. Desde pequeno tive sempre um bom relacionamento com os frades, e a boa maneira de ser deles me encantou. A experiência familiar para o jovem é fundamental.
Ao ir para o seminário os estudos do senhor iniciaram-se como?
Começava-se com o ginásio, depois o equivalente ao colegial, nós denominávamos de Clássico. Antes de ingressar havia dois anos de preparatório, era a base. Três anos de ginásio, dois anos de curso clássico, e o noviciado, onde era feita a formação religiosa. Em seguida mais três anos de filosofia pura. Estudamos francês, italiano, grego clássico, grego bíblico, latim. Naturalmente se dava grade importância ao português.
Quantos anos o senhor estudou?
No Seminário Seráfico foram quatro a cinco anos, de lá fui para Mococa por dois anos, um ano em Taubaté, voltei ara Mococa onde permaneci por três anos, depois mais quatro anos e meio em São Paulo.
Era um longo período de estudos!
Naquele tempo do começo ao fim passava-se por 13 a 14 anos de estudos.
A oratória é importante na função religiosa?
No meu conceito a oratória é um dom pessoal, um carisma.
Qual é o segredo de um bom orador?
Eu penso que é a habilidade e convicção daquilo que você vai falar. É claro que tem que ser usada técnica específica. Quando você está fora do seu ambiente é natural ocorrer um pouco de inibição. Tenho facilidade em falar, desde que seja dentro do meu campo. Tem pessoas que fala sobre tudo de forma bastante natural, e pode ocorrer em erros.
Quando você está expondo um assunto, naquele assunto provavelmente seu domínio é acima da grande maioria que o escuta. Pode ocorrer de haver entre os ouvintes alguém que está com posições divergentes, e que nem sempre quem está apresentando tem uma resposta convincente. Em palestras de um nível mais elevado isso pode ocorrer com mais freqüência. Temos pessoas muito cultas, com grande capacidade, mas quando se apresentam em público pronunciam-se muito acima do entendimento da platéia.
Porque a Missa do Galo acabou?
As coisas mudam! Por que Missa do Galo? Porque era celebrada á meia-noite, hora do galo cantar. Naquele tempo ao se celebravam missas á noite, elas eram celebradas a noite. A missa tinha todo um encanto, por ser rezada a meia-noite. Era a missa festiva do Natal. Há padres que guardam essa tradição até hoje, se não me engano a Matriz da Vila Rezende manteve esse costume até muito pouco tempo. Naquele tempo você rezava a missa e ia embora para casa á pé. Quando eu era menino por muitos anos participei da Missa do Galo, celebrada pelo Monsenhor Gallo! Na nossa igreja será ás 20h00 minutos, vem uma enormidade de fiéis. Depois irão para sãs casas onde celebrarão em família com a ceia. Fato que acho muito importante, por reunir os membros da família.
Um fato que tem ocorrido ultimamente é a dificuldade de se adquirir presépios, e a farta variedade da figura de Papai Noel em situações inimagináveis.
O Natal está totalmente descaracterizado. O que vale hoje é o consumismo. Praticamente tudo que se encontra “brilhando” no comércio vem da China. Qual é o Natal na China? O cristianismo tem uma pequena parcela da população que pratica e sofre perseguições. É comércio e acabou. Isso existe em todas as partes do mundo. Se você for ao Japão poderá ter a impressão de que é o país mais cristão que existe! Natal para nós não é comércio! Sempre trabalhei, e consegui obter sucesso principalmente em cidades menores, incentivando os comerciantes a montarem presépios em suas vitrines. Inclusive alguns comerciantes chegaram a fazer a novena de Natal. Em uma cidade grande como Piracicaba isso se dilui. Eu tentei dar um colorido diferente á igreja, através de enfeites, de presépios, mensagens. Tentei fazer um pouco de frente aquilo que está ai. É um consumismo desnecessário.
Isso tudo empurra a pessoa para uma situação caótica?
De angústia inclusive! Os pais que não têm poder aquisitivo para adquirir presentes, as crianças que não irão receber praticamente nada, o vizinho que mora ao lado, tem coisas muito boas. O que deveria ser motivo de grande alegria para todo mundo para grande parte acaba sendo motivo de angustias e frustração. Até que ponto que as pessoas que estão nessa situação financeira, econômica e social têm condições religiosas de superar o problema e ter uma visão diferente do sentido do Natal.
A impressão de que se tem é que os confessionários á medida que esvaziam, enchem salas de psicólogos e psiquiatras. Qual é a opinião do senhor?
Fala-se. Comenta-se. São opiniões. Desconheço uma estatística que comprove isso cientificamente. É evidente que hoje a problemática é tão grande, que é importante que haja a confissão, mas é importante também que haja psicólogos, psiquiatras. Muitas vezes alguma pessoa que me procura para uma confissão, eu mando para o psiquiatra, para o médico. O problema da pessoa é muito mais de saúde psíquica do que problemas de pecado. Muitas vezes as pessoas não têm condições para pagar um psiquiatra, ela confessa seus pecados e eles são resultados de desajustes emocionais, familiares, sociais. Na nossa paróquia não diminuiu o número de confissões, pelo contrário, aumentou. Na última segunda feira fizemos uma confissão comunitária, havia praticamente 900 pessoas! É um rito especial. Vem pessoas de todos os cantos da cidade inclusive de outras cidades.
O senhor é um capuchinho convicto?
Sou convicto de que sou um verdadeiro frade!
Nas madrugadas, particularmente na televisão, há uma profusão de programas de cunho religioso, alguns até certo ponto hilários. Como o senhor vê isso?
Está profetizado na Bíblia! Haverá tempos em que surgirão falsos profetas de todos os lados que enganarão inclusive os santos.
O que significa no ano de 2009 o Natal, o nascimento de Jesus Cristo?
Significa tudo! Se Jesus Cristo não tivesse nascido nós não seríamos remidos. Nascimento, a vida Dele, a mensagem Dele, a morte e a ressurreição. O Natal é tudo, complementado com a Páscoa. Nada adiantaria Cristo ter nascido se não tivesse ressuscitado. Qual é o crédito da divindade de Jesus Cristo? É a fé na ressurreição! Ela não é a retomada de um cadáver, é o passar a existir em uma dimensão nova, fora do espaço, fora do tempo, fora da realidade humana concreta.
O senhor foi Frei Guardião aqui na Igreja dos Frades, e era tido como “durão”.
É meu caráter. Eu não mostro os dentes com muita facilidade. Se mudar, não sou eu. A incapacidade de gerenciar as próprias emoções são defeitos, limites do próprio caráter. Temos que trabalhar nosso caráter. São meus pontos de vista, se você me provar o contrário eu não tenho dificuldades em aceitar. Eu peço muitos conselhos ás pessoas! Não tenho também muita preocupação em ficar agradando, ou deixar de fazer alguma coisa porque o outro não concorda. Na minha vida nunca deixei de ter nenhuma iniciativa por medo do fracasso. Nem tudo deu certo. O fracasso é não tomar uma iniciativa por medo do fracasso.
O senhor escreveu algum livro?
Não. Tenho muitas palestras e conferências escritas. Acho que existe muito livro para ler hoje, eu não venço ler tanta coisa!

Comentários:
frei saul peron,
fiz minha primeira comunhão com o senhor em 1976, na capela São José, na Fazenda Taquaral, lá pelo fim da Av. Rio das Pedras.... quanta saudade!
sua benção,
Claudinei Pollesel
# postado por Claudinei Pollesel : 5:17 AM

segunda-feira, dezembro 21, 2009

BRUNO PRATA


                                                     BRUNO PRATA
PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 19 de dezembro de 2009
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.tribunatp.com.br/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: BRUNO PRATA
Os dois bairros rurais vizinhos, Santana e Santa Olímpia, é formado em sua grande maioria por descendentes de tiroleses (trentinos). Bruno Prata nasceu no bairro de Santana, no dia 7 de setembro de 1947. Seus pais João Paulo Prata e Maria Balarim Prata tiveram seis filhos. Bruno Prata está cumprindo seu segundo mandato como vereador em Piracicaba. Além da sua atuação no legislativo ele reúne grande experiência acumulada na assessoria á prefeitos de Piracicaba. É tesoureiro da Pastoral da Caridade da Diocese de Piracicaba.
Onde o senhor realizou seus primeiros estudos?
Foi na Escola Rural da Fazenda Glória. Em Santana permaneci até um ano e meio de idade, depois fomos para Tabela. Lá a escola mais próxima ficava no Bairro do Recreio, uns quatro a cinco quilômetros da fazenda onde nós morávamos. A Escola da Fazenda Glória ficava um pouco mais longe, nós íamos de charrete. Na época havia a necessidade de alguém conduzir a charrete, inclusive porque era a condução que levava a professora depois que ela descia do ônibus que parava na Tabela.
Quem dirigia a charrete levando a professora?
Eu dirigia, na época tinha sete anos de idade, o percurso era de uns oito quilômetros aproximadamente.
Qual é a origem do nome do bairro Tabela?
Havia no local uma placa indicativa para o bairro Recreio. Então dizíamos que ali era Tabela do Recreio. Assim como Santa Luzia, foi o nome dado pelo Seu Pedro Mariconi, que tinha problemas de visão e foi curado, fato que ele atribuiu á Santa Luzia. Quando ele resolveu prestar essa homenagem á Santa Luzia ele procurou meu pai para ajudá-lo a conseguir mais adeptos ao seu propósito.
O pai do senhor exercia qual profissão?
Ele trabalhou na lavoura de café, aos vinte e cinco anos de idade, passou a trabalhar como barbeiro, acumulando a função de fabricar sapatos e arreios. Meus pais levantavam bem cedo e trabalhavam até as 10 horas da noite, inclusive aos sábados e domingos. Eles faziam arreios, tranças, laços, para serem usados em animais que trabalhavam na preparação da terra, na colheita. Não existia o processo mecanizado. Havia muitas encomendas dos engenhos, das usinas.
O senhor trabalhou na fabricação desses produtos?
Aos sete anos de idade eu comecei a trabalhar com selaria. Voltava da escola e já ficava trabalhando. Fabricávamos sapatões para serem utilizados no trabalho rural, não usávamos pregos, eram utilizados os “tornos” feitos de pinho, era um quadradinho com pouco menos de um centímetro. Com a água ele dilatava e nunca despregava, nem enferrujava. Após furar o sapato batíamos com o martelo sobre esses pinos de madeira, fixando-os como se fosse um prego normal. Não havia colas com a qualidade que encontramos hoje. Eu fui me especializando em calçados, fazia sapatos ortopédicos, sapatos femininos. Fazia o modelo, criava os moldes. A fabricação era feita sob encomenda.
Quem usava sapatos era considerado como privilegiado?
Isso acontecia principalmente na zona rural.
Como o seu pai conseguia ter duas atividades tão distintas, a de sapateiro e a de barbeiro?
É interessante! Quando a pessoa vinha procurar os seus serviços de barbeiro ele tinha que inclusive trocar de camisa, além de uma rigorosa limpeza das mãos. Na época a barba era feita com o uso da navalha.
O senhor chegou a aprender o oficio de barbeiro?
Sim! Cortei alguns cabelos, fazia a minha barba com navalha. A melhor navalha era a alemã solingen.
Acertar o fio da navalha é uma arte?
Como tínhamos a sapataria havia a facilidade de amolar na lixadeira, usava-se o rebolo, depois tinha uma pedra mais fina e por último o assentador.
Ao término do corte o cliente gostava de um perfume?
Utilizava-se Água Velva Royal Brilhar. A Bozzano veio depois.
Dizem que barbearia é um ponto fantástico de informação, é verdade?
É o núcleo da fofoca! Fala-se de tudo!
O senhor lembra-se da primeira “vitima” em quem fez a barba?
Lembro-me sim! Foi um primo meu, Renato Prata Garibaldi, falecido recentemente.
O barbeiro era uma figura de destaque na comunidade?
Muitos iam para a barbearia para conversar. Alguns faziam consultas ao me pai, relatavam intimidades, algumas vezes o meu pai tinha que auxiliar a família.
O gosto do senhor por política nasceu ali na barbearia?
Creio que sim! Porque se falava muito em política na barbearia, sobre Janio Quadros, Adhemar de Barros, Luiz Dias Gonzaga. É interessante essa observação, porque meus irmãos não se interessaram por política. Eu era muito curioso, procurava sempre ouvir o que diziam a respeito do que era dito ali
Em que ano a família mudou-se para Piracicaba?
Foi em 1964, tínhamos uma sapataria chamada Casa Prata. Era na Travessa Francisco Faria, 32 na Vila Rezende. A casa existe até hoje. Lá foram realizados os melhores natais das nossas vidas. Meu pai era vivo, tios, havia muitos amigos. Nossa casa era um ponto de referencia, á noite, na passagem do Natal, havia muitas pessoas, até mesmos os vizinhos iam até lá. As pessoas cantavam, a alegria era muito grande. Hoje não existe mais esse tipo de comemoração de Natal.
Era na época uma região menos urbanizada?
As ruas eram de terra, uma ocasião caiu uma carroça com animal e tudo em uma vala produzida pela erosão, decorrente do escoamento constante de águas servidas de uma empresa próxima. Ali era uma região freqüentada predominantemente por pessoas vindas de Santana, Santa Olímpia, Santa Terezinha, Charqueada.
Nessa ocasião a Casa Prata fornecia sapatões para os operários da Dedini?
Fabricávamos sapatões com solas grossas de pneus, para as pessoas poderem trabalhar com os lingotes de ferro, era comum o funcionário trabalhar por meia hora no manuseio dos lingotes e depois ir tomar leite gelado. Havia um constante revezamento de funcionários. A temperatura era muito alta. Trabalhávamos em quatro pessoas na produção da sapataria.
Com quantos anos o senhor casou-se?
Aos 22 anos de idade me casei com Eurides Barbosa Prata, nós tínhamos nos conhecido na escola, no bairro Recreio. Na época o pai dela era frangueiro. O trabalho dele era percorrer a zona rural, levando miudezas, armarinhos, tecidos, produtos industrializados, que muitas vezes eram permutados por ovos, frangos. Embaixo do carrinho de tração animal havia uma gaiola, onde eram transportados os frangos vivos. Meu sogro chamava-se Benedito Barbosa de Oliveira. A Eurides tinha mudado para Piracicaba, quando mudei para Piracicaba a procurei.
Onde foi realizado o casamento do senhor com Dona Eurides?
Foi na Igreja da Imaculada Conceição, na matriz antiga ainda, o celebrante foi Monsenhor Jorge Simão Miguel. Tivemos cinco filhos.
Após casarem-se onde foram morar?
Fizemos uma casa nos fundos da sapataria, nessa época já não havia mais barbearia. Permanecemos lá até 1983. Depois eu e a Eurides mudamos de lá.
Qual é a religião do senhor?
Sou católico, fui inclusive Procurador da Diocese por uns oito ou nove anos, é um cargo normalmente exercido por um padre. O Bispo na época era Dom Eduardo Koaik
Após exercer suas atividades na Casa Prata, o senhor seguiu outra profissão?
Em 1973 comecei a trabalhar como corretor imobiliário, sou um dos corretores mais antigos de Piracicaba. Na ocasião a Nova Piracicaba começou a ter seus lotes vendidos. O responsável pelo loteamento era o Coronel Antonio Bruno e o Capitão Laurival Oliveira, eram funcionários da City, empresa incorporadora. O escritório ficava na Rua Dona Francisca, onde é o Liceu hoje.
Até então a região onde hoje é a Nova Piracicaba era o que?
Era canavial. O loteamento lá começou em 1972 com Ludovico Trevisan, eram lotes padrões de 10 metros de frente por 30 metros de fundo. A City comprou essa área, e o padrão por ela adotado era de no mínimo 12 metros de frente.
A quem pertencia essa área?
Acho que pertencia também á Mário Áreas Vitier, conhecido como Mário da Baronesa.
Onde ficava a casa da Baronesa de Rezende?
Ficava em uma chácara situada no meio do canavial. Próxima onde hoje é a Igreja São Francisco.
Com a atuação do senhor na imobiliária os negócios evoluíram bastante?
Em um período houve uma evolução.
Havia desconfiança por parte do piracicabano de que a Nova Piracicaba poderia não ter o sucesso que teve?
Era difícil vender. Tinha-se que argumentar bastante, os lotes de terreno tinham ruas sem saída, as pessoas ficavam temerosas. O Coronel Bruno era um entusiasta do empreendimento, mostrava os padrões europeus. Quando os compradores passaram a sentir segurança no empreendimento houve uma grande procura pelos lotes. Nessa época trabalhava na imobiliária meu pai e eu, funcionava no mesmo local da Casa Prata.
O mercado imobiliário mudou daquela época para cá?
Não havia tantas exigências como existe hoje, zoneamento, a escritura era passada de forma bastante rápida e simples Hoje há a necessidade de tirar certidões, verificar se o imóvel não tem pendências jurídicas ou comerciais.
A negociação entre comprador e vendedor era mais confiável?
Muito mais confiável!
Quando foi o seu primeiro contato com a política?
Com a abertura política em 1979, 1980 passou a existir a possibilidade de criar-se partidos políticos. Criou-se o Partido Popular, PP, Francisco Salgot Castillon que havia sido injustamente cassado readquiriu seus direitos políticos. Houve a incorporação do PP pelo PMDB para derrotar Paulo Maluf na célebre eleição indireta onde Tancredo Neto venceu as eleições. Fui para o PMDB, e eu saí candidato a vereador foi em 1982, a primeira eleição da qual participei. E ganhei, fui o quarto mais votado de Piracicaba. O prefeito na época era Adilson Maluf. Fui bastante combativo, com atuação efetiva á favor da população. Algumas das minhas atuações tiveram grande repercussão na cidade. Após encerrar meu mandato fiquei um período fora da política. Quando o prefeito Antonio Carlos Mendes Thame foi eleito me convidou para ser seu assessor, meu trabalho era o de acompanhamento de projetos do legislativo.
Como era o Thame como prefeito?
Muito rígido e muito trabalhador. Ás vezes, duas horas da manhã tocava o telefone na minha casa, era o Thame ligando. Não tinha horário, não almoçava, não jantava. Mesmo quando fazia campanha, saia de madrugada com ele, as quatro cinco horas, voltávamos meia noite, uma hora da madrugada seguinte, não almoçávamos, comíamos alguma coisa, e trabalhavamos sem parar. Com isso adquiri o vício de não ter refeições regulares. Hoje eu mudei.
Quando o Thame terminou o mandato o senhor também deixou a assessoria?
Sai quando terminou o período do mandato do Thame. Foi eleito como prefeito Humberto de Campos. Ele me convidou para realizar o mesmo trabalho, o que fiz durante sua gestão. Com a eleição do prefeito José Machado, passei a trabalhar como assessor do deputado Thame. Quando o prefeito Barjas Negri foi eleito exerci a função de seu assessor. No segundo mandato do prefeito Barjas Negri, seis meses antes do período eleitoral sai como candidato a vereador. Fiquei como suplente da vereadora Rosangela Camolesi. Ela assumiu a secretaria municipal de Ação Cultural eu assumi a suplência.
Como é trabalhar com o prefeito Barjas Negri?
Trabalhar com o prefeito Barjas Negri é bom por ser uma administração que tem uma boa referencia popular, ele tem uma aprovação recorde.
Hoje, como vereador qual é a sua bandeira principal?
Meu trabalho principal é o combate as drogas.
O senhor é um político por vocação?
Toda vez que me candidato a minha família é contra.
O que é Pastoral da Caridade?
Pastoral do Serviço da Caridade foi criada por Dom Eduardo, abrange a todos os benefícios que a diocese faz: Pastoral da Criança, Ceame, que trabalha com dependentes químicos, Projeto Recrear, Banco dos Remédios, que distribui gratuitamente remédios á quem não tem condições para adquirir. Essa farmácia existe há 20 anos.
Quando o senhor assiste as imagens transmitidas pelas redes de televisão, mostrando os descalabros que ocorrem em determinados meios políticos qual é a sua reação?
Revolta muito, isso não é política!
Na sua concepção o que é política?
Política é o que definiu Thomaz de Aquino no século XIII: “A arte do bem comum”. Pio XII disse algo formidável: “Uma das maneiras mais belas de se praticar a caridade é através da atividade política”.
A Igreja Católica tem uma grande força junto á população, ela movimenta forças dentro do quadro político que se apresenta?
Ela movimentava mais no tempo de João Paulo II, ela era mais ousada. Com Ratzinger ele ceifou esse ímpeto revolucionário da igreja. A CNBB se pronunciou, condenou atos reprováveis, mas não dita ao clero qual deve ser a ação a ser tomada.
Qual é a saída para a política nacional?
A adoção do voto distrital, que infelizmente não ocorre por falta de interesse de alguns políticos, por motivos óbvios. O Parlamentarismo é outra solução. Hoje, em tese, um analfabeto pode ser eleito.

domingo, dezembro 13, 2009

LUIGINO (LUIS) ZAVA


                                           LUIGINO (LUIS) ZAVA



PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 12 de dezembro de 2009
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: LUIGINO (LUIS) ZAVA
Nasci no norte da Itália, em Pistóia, em 21 de setembro de 1920, filho de Hermelinda e João Zava. Aos dois anos de idade perdi a minha mãe. Meu pai aos 15 anos de idade tinha saído da casa dos pais dele, permanecendo por 15 anos no Canadá. Ele conheceu a minha mãe por carta. Ela era amiga da minha tia, irmã de meu pai. Minha mãe e a minha tia freqüentaram uma escola de obstetrícia. Essa minha tia escreveu uma carta para o meu pai, onde apresentou a sua amiga, que depois veio a ser a minha mãe, e a partir daí começou o namoro entre o meu pai e a minha mãe, um namoro por carta que durou anos. Em 1914, quando a Itália entrou em guerra meu pai tinha saído da Itália, voltado para o Canadá para providenciar a ida da minha mãe e minha irmã que tinha nascido. O ataque dos submarinos alemães aos comboios comerciais suspendeu a navegação que atravessava o Oceano Atlântico. Minha mãe não pode ir para o Canadá, e permaneceu esperando na Itália até o termino da guerra. Em 1918 meu pai voltou á Itália, em 1920 eu nasci.
Qual era a atividade do pai do senhor no Canadá?
Ele era ebanista, marceneiro que trabalhava em ébano e outras madeiras finas, ele fazia mobiliário fino. Profissionalmente sua formação foi nos estaleiros de Veneza.
Como o senhor veio ao Brasil?
Quando eu tinha três anos de idade a minha tia perguntou ao meu pai se ele não queria vir para o Brasil, na Itália não se encontrava trabalho, era só brigas de fascistas pelas ruas. Ele concordou, e veio para São Paulo com essa minha tia, Ursulina, trazendo minha irmã Vilma, hoje com 96 anos de idade e que mora em São Paulo. Fizeram a carta de chamada, que permitia que ele entrasse no país como profissional na sua área. Chegamos ao porto de Santos, em seguida fomos a São Paulo, onde dirigimo-nos á casa da Tia Ursulina. Essa minha tia era parteira, tinha conhecimento com grande parte das famílias moradoras no bairro de Santana, era a única parteira por perto. No dia seguinte meu pai já foi trabalhar no Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo.
Em que local de São Paulo morava a tia do senhor?
Morava em Santana, na Rua Voluntários da Pátria, próximo aonde hoje é a Avenida General Ataliba Leonel. Quase em frente onde eu morava havia uma escola pública foi lá que fiz o curso primário. Após quatro anos nessa escola, eu tinha 11 anos de idade, fui estudar Desenho Geométrico no Liceu de Artes e Ofícios onde estudei por dois anos geometria plana. Ocorreu um fato interessante, quando entrei para o curso de Desenho Geométrico, tinha 12 anos de idade, porém só com a idade de 14 anos era permitido o acesso do aluno, foi aberta uma exceção e passei a estudar regularmente. Tive meu interesse despertado em fazer um curso profissional, fiz o Curso de Tecnologia Mecânica lá mesmo no Liceu de Artes e Ofícios. As oficinas onde eram ministradas as aulas práticas de mecânica ficavam no fim da Rua João Teodoro, próximo a Rua da Cantareira. Das 7 horas da manhã até as 3 horas da tarde eram dadas as aulas práticas. Á noite eram dadas as aulas teóricas, das 19 horas até 21 horas e 30 minutos. Nas aulas práticas era ensinado desde picar carvão para acender a forja até forjar as peças, aprendíamos a dar o acabamento ás peças, era o único curso nesse setor em São Paulo.
Em que ano o senhor formou-se no Liceu de Artes e Ofícios?
No fim de 1938, eu tinha 18 anos. Fui trabalhar como ferramenteiro. Meu primeiro dia de trabalho, já como profissional, foi no dia 25 de dezembro de 1938.
Mas 25 de dezembro é comemorado o dia de natal!
Era Dia de Natal! Entrei ás sete horas da manhã e saí ao meio dia. Naquela época não existia carteira de trabalho, não se falava em Cédula de Identidade! Aos sábados trabalhávamos o dia todo, no Natal trabalhava-se até o meio-dia. Não havia esses feriados todos que existem hoje.
Como se chamava a primeira empresa em que o senhor trabalhou?
Chamava-se Metal Ars Natale. Era um gravador de aço, fazia medalhas, chatilene, que era uma corrente com uma plaqueta com os dizeres que a pessoa queria usar, o nome da pessoa, uma frase. Era gravado com buril no latão, mandava-se niquelar. Eram feitos porta-chaves de casas. Ele fazia em aço, depois temperava o aço e estampava em latão.
Logo que o senhor formou-se adquiriu uma motocicleta?
Logo no começo que me formei adquiri uma motocicleta da marca Triumph, inglesa, usada. Meu objetivo era melhorar minha pontualidade no trabalho. Nessa época a Rua Voluntários da Pátria não era asfaltada, era calçada com paralelepípedo, com o tempo a passagem do bonde afundava os dormentes e os trilhos ficavam salientes, se tivesse que cortar a via eram grandes as possibilidades de cair. O número dos bondes que iam para a Voluntários eram os 43 e o 44.
A empresa ficava onde?
Ficava na Praça Princesa Isabel, na Luz. Permaneci nessa empresa por dois anos.
O senhor morava em Santana?
Morava com a nossa família em Santana, ia trabalhar de bonde.
Já existia a Ponte das Bandeiras?
Não existia ainda. Havia a Ponte Grande, era uma ponte de madeira. Nessa ponte havia trilhos só para um bonde passar, muitas vezes um dos bondes esperava em um desvio o outro passar para ele seguir a viagem.
O bonde era fechado?
Era bonde aberto! O único bonde fechado era o que fazia a linha do centro da cidade da Praça da Sé até o Largo do Socorro em Santo Amaro. Só esses bondes eram chamados de “camarão” por serem pintados de vermelho.
O senhor andava no estribo do bonde?
Não havia outro jeito! Tinha que me agarrar onde dava, para não perder hora de trabalho. Quando chegava à Ponte Grande, muitas vezes acontecia de encontrar com os bondes que traziam soldados da Força Pública, hoje Polícia Militar. Eles saiam do quartel situado na Avenida Tiradentes e iam para uma área de treinamento lá pelos lados de Santana. Tínhamos que esperar passar aquele tremendo batalhão de soldados!
O senhor almoçava onde nessa época?
Nesses dois anos em que trabalhei no Natale, almoçava em uma lanchonete, na Rua Santa Efigênia, o proprietário era um português, havia dois pratos, o completo que geralmente nós dispensávamos e outro prato mais simples. A verdade é que não podíamos gastar muito dinheiro por isso não pedíamos o prato completo!
Da empresa Metal Ars Natale o senhor foi trabalhar onde?
Fui trabalhar na Laminação Nacional de Metais, uma empresa de propriedade de Francisco (Baby) Pignatari, neto do Conde Francisco Matarazzo. Entrei já como desenhista mecânico. A empresa fazia laminação e extrusão de latão. Eram feitos tubos de latão por extrusão, laminadas as chapas de latão. Essa empresa ficava em Utinga, no município de Santo André. Tinha que tomar o trem na Estação da Luz. Quantas vezes eu não corri para apanhar o trem? Permaneci lá por uns três anos. Por algum tempo me interessei por tecelagem, queria abrir um caminho para me especializar em manutenção nessa área. Infelizmente não deu certo. Com isso fiquei conhecendo malharias, fiações. Era um trabalho mais voltado á parte comercial, eu não me adaptei. Preferia permanecer na área técnica.
O senhor foi trabalhar em outra empresa?
Fui trabalhar em uma indústria que fundia tarugos e mancais de bronze. A usina era no Ipiranga, o escritório, a parte técnica ficava no centro de São Paulo, na Rua Marconi. Permaneci lá por uns dois anos.
Após esse período onde o senhor trabalhou?
Fui trabalhar na então Rua Ataliba Leonel, em um ponto em que cruzava com uma Rua chamada Nelson, são ruas que vem do alto do morro e descem até Santana. Ali tinha a Fabrica de Maquinas Para Beneficiar Madeiras Raiman. Apresentei-me como projetista de ferramentas e máquinas, a matriz da empresa ficava em Santa Catarina. O diretor da indústria me transferiu para chefiar a usinagem, tornearia, retificação. Permaneci por sete anos como chefe da oficina. A Rua Ataliba Leonel já era calçada. Diziam que era porque uma importante figura do cenário nacional tinha nessa rua interesses de cunho afetivo.
Após a Raiman o senhor trabalhou onde?
Trabalhei na Columbia por 30 anos. Era uma empresa de autopeças, fazia buzinas, bombas d’água. Ficava na Lapa, depois mudaram para a Vila Leopoldina. Aposentei-me e permaneci trabalhando lá mesmo por mais alguns anos. O que eu me orgulho não é o que eu fiz na minha profissão, mas o que eu fiz com os profissionais que dirigi. Proporcionei a possibilidade para que os profissionais de destaque fizessem cursos, como o TWI, (“Training Within Industry”) ou Treinamento Dentro da Indústria, onde é abordado o aspecto de como se explica um serviço para um aprendiz. Também mandei fazer o curso de Supervisor pelo SESI. Formei supervisores, coordenadores de máquinas. A linha de montagem não podia parar.
Quantos funcionários havia no total?
Uns 350 funcionários. Havia prensas desde 5 toneladas até 150 toneladas. Eles preparavam, punham as ferramentas, as estampas. Os estampos eram feitos de tal maneira que era necessário pisar no pedal e a prensa descia. Com as mãos o operador tinha que puxar dois manúbios e disparar a prensa, para evitar que as mãos corressem riscos de acidentes. Todas as máquinas tinham recomendações prevenindo contra acidentes.
O senhor é uma testemunha do crescimento da cidade de São Paulo?
Lembro-me que no final do ano de 1936, com um grupo de amigos do curso do Liceu fomos acampar no Pico do Jaraguá Era um mato total! Permanecemos por uma semana, acampados. Foi uma semana de chuva! Á noite nós víamos o Edifício Martinelli com a propaganda da Bayer. Aquele círculo escrito: Bayer. Ele acendia e apagava. Era o único prédio de São Paulo!
O senhor freqüentava cinema?
Freqüentava cinema. Mas freqüentei teatro, adoro ópera. Durante 20 anos não perdi uma temporada. Freqüentava o Teatro Municipal onde eram encenadas essas óperas, assisti ali a apresentação com o grande trágico italiano do século passado Ermete Zacconi, ele estava com 80 anos quando apresentou Rei Lear de Shakespeare. Na Rua Barão de Itapetininga havia a Vienense, com chás e doces finos.
O senhor chegou a freqüentar o famoso Táxi Dancing Avenida?
Sim! Na Avenida Ipiranga! Freqüentei, mas gastava-se muito dinheiro. Elas dançavam muito bem, sabiam quando o individuo não sabia dançar, elas facilitavam os passos. Eu nunca fui bom de dança.
O senhor chegou a ver as pessoas nadarem, pescarem no Rio Tietê?
Quantas vezes eu fui nadar nos cochos que tinha no Tietê! No verão, a noite, descia a Voluntários e ia nadar no Tietê. Antes de o Esperia fazer a piscina. A primeira piscina construída tinha o formato oval, com uns 15 metros de comprimento, por 10 de largura. Foi feito pelo clube Sociedade Paulista de Esportes. A piscina era toda de cimento, não era azulejada. Era a única de São Paulo!
O que eram os cochos existentes no Tietê?
Eram uns quadrados de madeira, enterrados no leito do rio, amarrado nas margens com cabos. Era como se fosse uma piscina. Nadava-se no rio também. Tinha peixes, havia pessoas que pescavam diariamente.
Isso era onde hoje é a Ponte das Bandeiras?
Chamava-se Ponte Grande, a Ponte das Bandeiras foi feita depois.
O senhor nadou no Rio Pinheiros?
Eu tinha um amigo que morava próximo ao Rio Pinheiros, íamos a pé nadar no Rio Pinheiros.
Do que o senhor tem mais saudade em São Paulo?
Eu adoro São Paulo! Gosto de andar no centro, eu sou citadino! Onde há atividade artística, cultural. Adoro teatro, “Deus Lhe Pague” com Procópio Ferreira é uma das peças que assisti.
O senhor andava muito de trem?
Com a idade de 12, 14 anos saia de São Paulo ás sete horas da manhã e ia para Santos pelo trem expresso. Existiam o “Cometa” e o “Planeta” eram trens com três carros de passageiros. Passava as férias na casa de uma prima que morava em Santos, no bairro Gonzaga. Existia o Parque Balneário. Assisti a inauguração do Atlântico Hotel.
Como o senhor resolveu mudar-se para Piracicaba?
Li uma reportagem sobre o Lar dos Velhinhos de Piracicaba, qual era a área, toda arborizada, com a possibilidade de se construir chalés por preços convidativos. Vim para cá, conversei com o Dr. Jairo Ribeiro de Mattos, ele me expôs o que realmente era o Lar dos Velhinhos.
Entre o que foi exposto e hoje oito anos já morando no Lar qual é sua opinião?
Não acredito que exista um lugar melhor do que este. Pode ter igual, mas melhor não!
Atualmente o senhor dedica parte do seu tempo na área de venda de livros usados que o Lar dos Velhinhos recebe em doação.

O que o motivou a participar desse trabalho?
É uma paixão!

sábado, dezembro 05, 2009

HUGO PEREIRA DE LIMA







HUGO PEREIRA DE LIMA




PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 05 de dezembro de 2009
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: HUGO PEREIRA DE LIMA
A frase "O sertanejo é, antes de tudo, um forte" foi escrita por Euclides da Cunha, que se tornou famoso com a publicação do livro Os Sertões, em 1902. O mestre Hugo Pereira de Lima é uma forma viva dessa frase. Sua vida é um retrato do migrante nordestino, com as cores mais marcantes que a realidade nua e crua pode oferecer. A determinação, a luta pela sobrevivência, a incansável maratona para avançar passo a passo, sem renegar seus princípios. Realizou trabalho rude, pesado, suas mãos foram embrutecidas pelo esforço físico. A sua fome por cultura o levou a tornar-se um respeitado poliglota, é reconhecido pelo seu saber, e muito requisitado por pessoas que cursam mestrado, doutorado. Sua marcante simplicidade é natural dos verdadeiros sábios. Mestre Hugo Pereira de Lima é, antes de tudo, um forte!
O senhor nasceu em que cidade?

Sou natural de Maraial, na Zona da Mata de Pernambuco, nasci no dia 30 de novembro de 1940. Meus pais são José Manuel de Lima e Maria Pereira de Lima. Fui criado em Garanhuns, que é uma cidade aonde a temperatura chega até os cinco graus centígrados. Muitas pessoas pensam que no nordeste do país todo lugar é quente, há lugares frios. O nome Maraial originou-se de uma palmeira espinhosa que existia em grande quantidade quando a cidade foi fundada. Embora eu tenha morado lá por três anos e meio nunca vi uma dessas palmeiras. Há muito tempo elas já tinham sido extintas. As pessoas que moram lá sabem a origem do nome da cidade, mas não conhecem a palmeira.
De Maraial o senhor foi morar onde?

Aos dois anos e meio de idade fui levado para Miracica, que faz parte de Garanhuns. Lá eu morava com meus avôs maternos Joaquim Pereira de Araujo e Laura Pereira de Araujo. O meu avô era carpinteiro, marceneiro, ferreiro e tanoeiro. Até hoje o seu nome é famoso na localidade. Era conhecido como Mestre Joaquim, além da sua habilidade, inteligência, era muito afável. Ele era muito respeitado pelos moradores de Miracica.
O senhor herdou um pouco do caráter dele?

Eu creio que herdei quase tudo que sou praticamente! Por mais nefasto que fosse um fato ele não ficava triste. Na época em Miracica não havia funerária, ele fazia muitos ataúdes. Ás vezes ele era acordado por alguém dizendo: “Tem que fazer um ataúde, fulano morreu!”. Ele levantava, me chamava, eu ia junto.
O senhor ajudou a fabricar ataúdes?

Ajudei muito! Era feito com tábuas e revestido com tecido na cor correspondente ao perfil do falecido. Se a pessoa era viúva usava-se pano roxo, se fosse uma pessoa de idade avançada usava-se tecido preto. No caso de crianças, o caixão era revestido na cor azul clara. Quando era feito um caixão para uma criança, dizia-se que era caixão para anjo. Havia uns enfeites prateados, na forma de cruz, de anjo com asa, anjo sem asa. Ficava até bonito!. Como ali era uma região pobre, havia um caixão na Igreja São José, era preto, grande, recebia a denominação de “Caixão de Caridade”. Quando a pessoa muito pobre morria, a igreja emprestava aquele caixão. Era colocada uma mortalha (um pano que cobria a pessoa morta), o caixão era conduzido até aonde a pessoa seria enterrada, era então retirado o corpo, sepultado, e o caixão voltava para a igreja. Esse costume não existe mais nos dias atuais. Na época havia muito o enterro de rede, o corpo era conduzido e sepultado envolto em uma rede. Meu avô se sabia que a pessoa não tinha condições financeiras ele não cobrava pelo caixão. No período em que ele estava fazendo o caixão, isso poderia ocorrer durante o dia ou á noite, era um habito dele contar piadas, rir, para amenizar o ambiente de tristeza da família.
Durante o velório, onde era apoiado o caixão?
Sobre dois cavaletes. As pessoas ficavam cantando as ladainhas, os Bem-Ditos, as excelências, hábitos do folclore, acendiam velas, lá não havia carpideiras. (Mulheres que recebem dinheiro para rezar e chorar por mortos desconhecidos). Minha avó era “tiradeira de excelência”, as pessoas cantavam aquelas excelências. Lá não se chama velório, é Sentinela. Uma característica era o repique do sino da igreja. Quando falecia uma criança havia uma seqüencia de toques. Se a falecida era uma moça solteira era outra seqüencia de toques. Conforme tocava o sino sabia-se as características da pessoa falecida.
O senhor mudou-se de Miracica quando?

Aos quatorze anos de idade voltei a morar em Maraial, onde permaneci até dezessete anos e meio. Não nutria por lá a satisfação que tinha quando morava em Miracica. Resolvi ir sozinho para Maceió.
O senhor já conhecia Maceió?

Não conhecia nada! Fui de trem, era a Rede Ferroviária do Nordeste, antiga Great Western. A Great Western do Brasil Railway Co., empresa inglesa, tinha sido encampada pelo Governo da União. Só que as pessoas mantinham o nome original quando se referiam ao trem. Cheguei a Maceió, fiquei andando pelas ruas da cidade, acabou o meu dinheiro, não tinha como voltar para casa. Eu tinha fraturado a clavícula durante o percurso da viagem de trem Quando já fazia cinqüenta horas que eu não tinha comido nada, fui até uma pensão, subi uma escada, e disse para a dona da pensão: “- Faz 50 horas que eu não como, estou muito faminto, não tenho dinheiro para ir embora, não tenho nada!”. Ela respondeu-me: “-Certo!”. Não me deu comida, não me deu nada. Desci a escada, fraco de fome, segui por uma rua chamada Dias Cabral, quando cheguei ao número, 217 não conseguia andar mais. Só que não era por estar fraco, embora não seja espírita, sentia alguma coisa que me impedia de prosseguir caminhando. Coloquei a mala no chão e sentei sobre ela. Algumas portas têm uma pequena janela, que lá é chamada de postigo, uma jovem senhora abriu essa janelinha e falou: “-Moço! O que você deseja!”. Contei a história. Ela fez um bom prato de comida. Após eu ter me alimentado, ela disse-me: “Meu marido é do Exército Brasileiro, ele está trabalhando. Guarde a mala aqui.”. Ela então me deu algum dinheiro para pagar ônibus e recomendou-me que andasse pela cidade, e quando fosse 4 horas da tarde o seu marido retornaria para casa e eu falaria com ele. Voltei no horário que ela disse, ele havia chegado. Recebeu-me como se fosse uma pessoa conhecida há muitos anos. Ele era Primeiro-Sargento do Vigésimo Batalhão de Maceió. Isso foi em junho de 1958, havia a Copa do Mundo, ia ter um jogo Brasil e França. Ele tinha um rádio que estava sem funcionar. Eu disse-lhe que entendia um pouco de rádio, como eu estava com a mão imobilizada por causa da clavícula, fui orientando como ele deveria desmontar e proceder para consertar. Era rádio á válvula. Consegui consertar o rádio, e ele pode ouvir o jogo. Permaneci oito dias sendo hospedado pelo casal. Voltei para Pernambuco, até a minha casa, onde morava com minha mãe e padrasto. Disse á minha mãe que iria até Miracica, onde morava meu avô. Tomei o trem e fui para Lourenço de Albuquerque, em seguida fui para Propriá, que é na divisa de Alagoas com Sergipe. De lá atravessei o Rio São Francisco em um barco, tomei um trem até Muribé e ai acabou o dinheiro. Naquele tempo guarda-chuva não era como hoje, um bom guarda-chuva tinha valor. Eu tinha um guarda-chuva bom. Vendi esse guarda-chuva e com o dinheiro consegui chegar até Aracaju. Fiquei andando pela cidade, com uma mala na mão. Era de madeira. Permaneci por 3 dias em um albergue de um centro espírita. Fui orientado para que procurasse o Departamento de Migração. Eu não tinha completado 18 anos ainda, e a diretora da instituição por esse motivo não me concedeu a passagem. Permanecei mais algum tempo na cidade, dormindo na beira do mar, no aeroporto.
E como o senhor fazia para alimentar-se?

Conheci um amigo que era gago, chamava-se Gabriel. Saiamos juntos e ele pedia o alimento ás pessoas. Eu não pedia. Fomos para São Cristóvão, que é uma cidade histórica, fomos para Salgado, em seguida para Estância. Sentados em um banco na Praça Rio Branco, decidi que devíamos ir á delegacia como ultimo recurso. Na época o cargo de delegado de policia no Nordeste era ocupado por militares. Um sargento nos acolheu, alimentou e arrumou emprego para nós dois. Fui trabalhar em uma padaria, onde também iria morar. O Gabriel foi trabalhar em uma serraria, brigou com o dono pegou o ônibus, que lá chamavam de marinete e saiu da cidade. Permaneci em Estância por quase dois anos. Fui para Salvador, onde trabalhei em tudo, até pegar caranguejo na loca.
De Salvador o senhor dirigiu-se para onde?

Na época a Irmã Dulce deu uma autorização de passe, que era para retirar a passagem na prefeitura. Fui para Minas Gerais, onde permaneci algum tempo trabalhando no campo. Em seguida passei pelo Rio de Janeiro, São Paulo e fui morar no meio da selva no Mato Grosso. Trabalhei seis meses, o dia inteiro cortando madeira com o machado. Voltei para São Paulo e fui trabalhar em uma empresa cuja sede era em Piracicaba. Chamava-se Sobar, Sociedade Bandeirante de Reflorestamento. Fui trabalhar como braçal, carpindo. Um rapaz que hoje mora próximo á minha casa, chamado Irineu Camargo Peixoto, era meu supervisor, na época era chamado feitor. Nós morávamos em pequenos barracos. Eu ficava ali com muita saudade do Nordeste. Escrevia cartas que jamais mandei, eu as dependurava em um prego. Um dia o administrador, Álvaro Wingeter entrou para fiscalizar o barraco. Ele viu as cartas, leu uma a uma, perguntou quem tinha escrito. Apresentei-me, ele então disse: “-A partir de amanhã você será inspetor!”. Deu-me o material necessário para fazer as anotações. Recebi diversas promoções até passar a administrador.
O senhor fez seus estudos onde?

Até o terceiro ano do curso primário estudei em Miracica. O quarto ano, eu estudei na Usina Água Branca. Voltei para Marial, quando sai de casa tinha o quarto ano primário. O curso de rádio eu fiz por correspondência no Instituto Monitor.
O senhor está concluindo um livro?

O nome do livro é “Histórias Que A Vida Me Contou”. Relata histórias verídicas. Mantenho o nome real das pessoas quando o fato é positivo para a personagem. Quando o fato é negativo dou um nome fictício. As histórias são fatos acontecidos em Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia, Mato Grosso, Minas Gerais e São Paulo. Cada lugar tem um capítulo, gerando cem histórias.
Quantos idiomas o senhor domina?

Falo o inglês, italiano e espanhol, fluentes, e tenho boas noções de francês. Estudei esperanto com a professora Nair Barbosa.
Como o senhor chegou a Piracicaba?

Pelo fato da empresa ser de Piracicaba, vim para fazer o acerto de contas aqui. Fiquei hospedado em uma pensão. Quando cheguei á Piracicaba tive muito problema com uma palavra: unspardela. Diziam: pegue unspardela! Ou seja: Pegue uns pares dela!
Lembra-se do dia em que o senhor chegou á Piracicaba?

Foi no dia 15 de fevereiro de 1963, entrei na pensão umas três horas da tarde. Essa pensão hospedava muitas pessoas que trabalhavam nessa empresa de reflorestamento.A partir dessa fase eu iniciei uma nova etapa na minha vida. Nessa pensão aconteceram fatos típicos, um deles foi com um mineiro, funcionário da Dedini que ganhou por cinco vezes na loteria esportiva, era uma quantia de dinheiro muito expressiva. Ele acabou torrando tudo e morreu como indigente.
Qual foi o seu primeiro trabalho em Piracicaba?

Fui trabalhar na Usina Monte Alegre, trabalhar no guincho. No meu emprego anterior eu era administrador da fazenda, tinha secretária, era uma estrutura bem montada, onde chefiava 120 pessoas. Todo meu conhecimento na empresa de reflorestamento de nada valia nas atividades da usina. Trabalhei o período da safra por seis meses. Fui trabalhar com raspagem de taco, aprendi com a necessidade! Um dia comprei o Jornal de Piracicaba e vi que a Eneo, que era uma empresa de contratação de mão de obra, estava oferecendo vagas para trabalhar na Dedini. Eu tinha 23 anos. Fui contratado para trabalhar na Dedini, entrei pintando peças. Logo eles perceberam que eu sabia ler e escrever bem, passei a ser apontador, Em 1963 houve um período muito conturbado na nossa história. Com isso muitos funcionários foram dispensados da Dedini. Após algum tempo, esse meu amigo que tinha ganhado na loteria tinha perdido tudo e voltado a trabalhar na Dedini. Ele falou com o chefe e me levou de volta para trabalhar na Dedini. Ao analisarem a minha ficha fui designado para ser inspetor de qualidade, fui promovido a programador de produção, supervisor de programação e depois fui transferido outro departamento como tradutor. Nessa época eu já acompanhava os estrangeiros em visita á empresa.
O senhor conheceu Armando Dedini?

Conheci. Era uma pessoa de um coração maravilhoso, muito humano.
Como o senhor, migrante nordestino falava inglês fluente?

Quando eu morava com meu avô ele dizia: “-Quando esse menino crescer, eu quero que ele fale três idiomas, como Rui Barbosa”. Eu estava fazendo o Tiro de Guerra em Sergipe, havia na cidade um rapaz tido como intelectual. Ele soube que eu havia feito o curso de taquigrafia. Apresentou-me a um professor de inglês, que tinha sido marinheiro e me ensinou conversação. Em minhas andanças, nos períodos de folga eu lia muito. Já em Piracicaba, passando pela Livraria Brasil vi um cartaz: “Aulas de inglês grátis, ministradas por professores americanos”. Era da Igreja Mórmon. Eu já tinha um vocabulário grande. No dia 25 de agosto de 1965 fiz um discurso em inglês, sobre Luiz Alves de Lima e Silva, Duque de Caxias. Fui muito aplaudido. Permaneci por quatro anos estudando.
E italiano como o senhor aprendeu?

Li no Jornal de Piracicaba um anúncio: “Aulas de italiano grátis”. Inscrevi-me, a professora era Dona Ada Cavioli. Aprendi muito bem o idioma. Na Dedini tive um chefe argentino, José Luiz Castelioni. Combinamos que eu ensinaria inglês para ele e sua esposa e eles me ensinariam o espanhol. Foram dois anos, três horas por semana, dedicados ás aulas. Depois Estudei na Aliança Francesa, com Dona Janine estudei francês. Estudei alemão por dois anos com Dona Briguitte. Simultaneamente dava aula no Lessa, Inglês para brasileiros. No Instituto Piracicabano lecionei inglês em 1978.




























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