sábado, janeiro 16, 2010

LAZARO ANTONIO DE ALMEIDA
PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 09 de janeiro de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
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http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: LAZARO ANTONIO DE ALMEIDA
Lázaro Antonio de Almeida nasceu em Porto Feliz, no dia 03 de maio de 1944, é o filho mais velho dos oito filhos de João Augusto de Almeida e Irene Barreiros de Almeida. Logo após o seu nascimento, a sua família transferiu-se para a cidade de Assis. Trabalhou como ferroviário, chegando a Chefe da Agencia de Piracicaba do IBGE, onde se aposentou. Ele lembra-se dos tempos da Sorocabana, onde a cada mudança de administração do alto escalão mudavam-se as diretrizes da empresa, muitas vezes ocasionando perdas incalculáveis. Se não havia uma remuneração satisfatória, havia a dedicação integral dos funcionários efetivos. Trabalhava-se com amor. Motivado por busca de melhores condições, prestou concurso e entrou no IBGE. Assumiu a chefia em Piracicaba, onde desenvolveu seu trabalho sendo até questionado por facções que queriam superestimar a população da cidade buscando benefício pessoal. Desde 1992 ele está aposentado, Lázaro tem uma visão cristalina da realidade brasileira.
O senhor estudou em Assis?
Comecei a estudar em Assis, no Grupo Escolar Lucas Thomaz Menk. Pelo período de um ano estudei em Porto Feliz, no Grupo Escolar Coronel Esmédio, onde fui aluno da professora Lígia. No período em que realizei meus estudos de ginásio e colégio em Assis, fui aluno do Curso de Formação em Transportes, CFT, ministrado pela Estrada de Ferro Sorocabana. Estudava durante o dia na Sorocabana e a noite na escola estadual. No curso do CFT as aulas eram dadas alternando-se um dia era aula prática outro dia aula teórica. Como em Assis havia oficinas da Estrada de Ferro Sorocabana, havia duas modalidades de cursos, um que era voltado para quem iria trabalhar nas oficinas e outro voltado para quem iria trabalhar nas estações. Eu fiz o curso para exercer as atividades nas estações. Além do curso de telegrafista, conferente, formação de composição de trens.
As composições que saiam de Assis eram de trens de cargas, passageiros?
Tinha de tudo. Trem só de carga, só de passageiros, de passageiros e cargas. Existiam quatro divisões na Sorocabana. A Quarta Divisão era sediada em Assis. Ali se controlava os trens dos trechos que iam de Ourinhos até Presidente Epitácio. O ramal Dourados não chegou a concluir o seu projeto na integra, que seria de ir até Dourados.
A linha de trem que passava por Assis saía de onde?
A chamada linha-tronco saía da Estação Julio Prestes em São Paulo e ia até Presidente Epitácio. Piracicaba era um ramal da Sorocabana, que tinha seu ponto final em São Pedro.
Aproximadamente, quanto tempo levava a viagem de São Paulo á Assis?
O trem de passageiro levava onze horas, se não me falha a memória, de Assis á São Paulo o percurso ferroviário era de 580 quilômetros, a velocidade média era de 50 quilômetros por hora. O trem de carga levava mais tempo.
O ramal da Sorocabana que passava por Piracicaba era mais lento?
Era outra situação, a viagem era mais demorada. A linha de São Paulo á Presidente Epitácio tinha um trecho entre São Paulo até Sorocaba onde o trem corria muito, a linha era dupla, não havia parada para aguardar a chegada da composição que vinha no sentido contrário.
Quando o senhor passou a trabalhar na Sorocabana ainda existiam as famosas Maria Fumaça?
Tinha uma ou outra que era utilizada para manobras em pátio. Em Assis não havia o virador de locomotiva, para virar a máquina era utilizado o conhecido sistema chamado triangulo.
A eletrificação da linha chegou a funcionar em Assis?
Eu saí da Sorocabana em 1973, se não me engano a eletrificação da linha até Assis chegou em 1970. Hoje o sistema eletrificado está totalmente desativado. A linha permanece funcionando até hoje.
O senhor tem saudade dessa época?
Eu entrei na Sorocabana quando ainda era menino, fiquei bastante tempo, e só sai porque as condições oferecidas pela Sorocabana não permitiam que eu permanecesse, o salário era baixo. O trabalho em si deixava-nos orgulhosos, todos que trabalhavam lá ganhavam pouco, mas exerciam suas funções com amor pelo serviço.
O uso de farda era para alguns cargos?
O maquinista, o chefe de trem, o chefe da estação, eles tinham um fardamento. Os demais funcionários usavam roupas comuns.
O senhor foi telegrafista, quais foram os equipamentos que chegou a usar?
Na escola aprendemos o alfabeto Morse, onde as letras e números são transformados em código utilizando as grafias de traço e ponto. O telegrafo era uma caixa de madeira com uma campainha em cima e duas pequenas tábuas onde batíamos o código. Outro aparelho era só com o toque. Mudava a sonoridade, a aplicação, embora o código fosse o mesmo.
Havia um apelido para o telegrafista que não operava com muita agilidade?
Era denominado em tom de brincadeira como pica-fumo. Uma referencia ao habito comum na época de picar fumo de corda. Nós tínhamos que receber, decodificar e escrever manualmente a mensagem.
O senhor trabalhou em estações pequenas?
Trabalhei em Presidente Epitácio, Álvares Machado, onde eu fazia praticamente todo tipo de trabalho referente á estação. Quem trabalhava á noite atendia o telegrafo, fazia o recebimento de despacho de trens, vendia bilhete de passagens, recebia os trens que chegavam.
Como eram formadas as composições de passageiros?
De Presidente Epitácio o trem não saia completo, ao longo do percurso ia agregando mais carros á composição. De lá saia uma locomotiva, o primeiro carro que era o de bagagem, depois vinha o carro de segunda classe, o carro restaurante e depois o carro de primeira classe, no meio do caminho eram agregados os carros dormitórios, que eram os últimos da composição.
Como era um carro dormitório?
Era divido em cabines, e cada cabine tinha dois leitos, um em cima do outro. Havia em cada uma delas o vaso sanitário, era isolado, porque poderia ocorrer de viajar com pessoas que não eram conhecidas. Normalmente quem viajava nesse tipo de carro eram pessoas com poder aquisitivo mais alto, pelo próprio preço da passagem.
Dormia-se com a roupa que estava no corpo?
Casso o passageiro desejasse poderia trocar de roupa no banheiro, na própria cabine, se estivesse com pessoa que possibilitasse tal liberdade.
Se quisesse viajar de pijama poderia?
Com certeza sim! É interessante observar que no caso das cabines não havia o que era comum nas primeiras e segundas classes, aonde de trecho em trecho vinha o chefe do trem, acordar o passageiro para conferir a passagem. Cada vagão de cabines tinha um responsável, que sabia onde cada passageiro iria descer, chamava-se camareiro. Ele batia na porta avisando o passageiro que o seu destino de viagem estava próximo.
Quantos funcionários geralmente compunham um trem de passageiros?
Havia o maquinista, o auxiliar do maquinista também chamado de foguista, por ter sido no tempo do trem á vapor a pessoa que alimentava a maquina. Viajavam ainda o chefe de trem, o ajudante de chefe de trem, se tivesse cabines havia o camareiro. Quem picotava o bilhete da passagem era o chefe de trem ou seu auxiliar. No caso do carro restaurante era explorado por terceiros. Como os bares das estações também eram explorados por particulares. No carro restaurante havia o cozinheiro, o garçom. Havia um balcão para lanches ou para tomar algum refrigerante. Nas mesas eram servidas as refeições. Em determinadas épocas do ano, poderia ocorrer da pessoa não conseguir passagem para viajar, por causa da grande procura. O excedente ia de ônibus. Havia um trem com características de trem de carga, onde havia um carro de passageiros, os demais eram vagões de cargas. A sigla desse trem era BG. Passageiro que não tinha muita presa ia nele. No trem superluxo havia o carro chamado Pullman de um lado havia uma poltrona e do outro havia duas poltronas, reclinava ficando um semi-leito. Todo trem superluxo tinha ar condicionado.
Por quanto tempo o senhor permaneceu trabalhando na Estrada de Ferro Sorocabana?
Eu comecei a trabalhar mesmo, quando conclui a escola, em 1963 e permaneci até 1973. Foram 10 anos. Quando estava na fase de transformação para a FEPASA eu sai.
O motivo alegado para desativar o transporte ferroviário era o fato de ser deficitário?
Deficitário como quase todas as estatais no Brasil. A Sorocabana tinha uma revista mensal aonde vinha o balancete, era considerada como décimo segundo estado do Brasil em termos de arrecadação. A administração mudava conforme a mudança de governo. Cada governo eleito nomeava o presidente, a diretoria como cargos de sua confiança. Tive a oportunidade de ser chamado em São Paulo, onde conversei com um diretor e pude constatar seu total desconhecimento e despreparo para a função que exercia. O pessoal que ocupava a chefia de estação, de divisão, era efetivo, os cargos não eram de natureza política.
O senhor desligou-se da Sorocabana e foi trabalhar onde?
A baixa remuneração feita pela Sorocabana me levou a prestar um concurso no qual passei, e fui trabalhar no IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Fui nomeado para trabalhar em Ourinhos onde permaneci por um ano. Em 1973 fui para Assis, onde permaneci até o inicio de 1976. Na época me ofereceram a chefia do IBGE em Piracicaba, e assim vim para cá, onde assumi o cargo de Chefe da Agencia de Piracicaba.
Onde se localizava IBGE na época?
Funcionava na Rua Moraes Barros, ao lado de onde era a garagem da CPFL.
Quantos funcionários trabalhavam lá?
Existiam 11 funcionários.
Qual é a função básica do IBGE?
É fazer levantamento de todas as estatísticas possíveis. É comum associar o nome IBGE com estatística populacional. As pesquisas são em diversos campos: industrial, agrícola, estatísticas realizadas em cartórios, prisões.
A sede do IBGE fica aonde?
Fica no Rio de Janeiro.
O senhor permaneceu quanto tempo no IBGE?
Aposentei-me em 1992. Quando cheguei em Piracicaba , havia um censo qüinqüenal, que era o econômico e o agrícola, e estava em pleno andamento. Fiz o censo demográfico em 1980, depois em 1985 o censo agrícola e econômico e o censo demográfico de 1990.
Qual são as principais finalidades de um censo?
O censo é desde a época de Jesus Cristo. Quando ele nasceu, José e Maria iam prestar informações para o recenseamento. No Brasil começou por volta de 1910. É importante para conhecer a realidade de um país. Tem que haver estatística, embora nem todos reconheçam essa importância, na época tínhamos muitas dificuldades em obter informações. Tínhamos uma retaguarda legal que se a pessoa se negasse a prestar informações ela poderia ser intimada a fornecer os dados exigidos. Hoje a pessoa ao ser recenseada se negar a prestar informações ninguém pode obrigá-la a fazer.
As informações mais distorcidas são as de natureza econômica?
Isso sempre existiu, mesmo quando havia na época a garantia de sigilo total. A estatística no Brasil é relegada a um segundo plano. Quando houve a transição de governo, em que o Sarney assumiu a presidência, o censo demográfico de 1980 foi feito em 1981. Porque na fase de transição, percebendo que havia recursos alocados para o censo, os mesmos foram utilizados para outras finalidades. Com isso perdeu-se a série histórica de 10 anos. Até então, todo censo demográfico tinha sido feito com o ano terminado em zero.
De 1973 até os dias atuais o Brasil praticamente duplicou sua população. Isso é positivo?
Eu acho que o crescimento demográfico em certas regiões é necessário.
O senhor é formado pela UNIMEP?
Sou formado em Ciências Contábeis.
Tecnicamente a emancipação de pequenas localidades é um fator positivo?
Depende da cidade. Tem lugar, como por exemplo, Hortolândia e Sumaré. Hortolândia é maior do que Sumaré, no entanto era distrito de Sumaré. Nesse caso é justificável a emancipação. No Brasil há casos em que se cria um município, e o que se arrecada é insuficiente para pagar o salário do próprio prefeito! Há sinais de que vem uma nova onda de criação de novos municípios. Existem certas situações onde são claros os níveis de dificuldades para que o IBGE faça uma pesquisa. Em grandes centros, onde há regiões de alto índice de violência, é impraticável a realização de pesquisa! Quem se arrisca a entrar nesses locais? Não se trata de preconceito e sim de realidade. O Estado não sabe como atuar em situações dessas.
O fato do IBGE estar sediado no Rio de Janeiro e o centro do poder estar em Brasília podem afetar em alguma coisa?
Acredito que não. Atrapalharia mais se a sede localiza-se em Brasília!
Das diversas classes sociais e econômicas existentes qual é a mais propícia a dar informações corretas?
Acho que encontramos maiores facilidades com as classes menos elevadas. A informação é mais pura, mais real. A classe média e a alta trabalham as informações. Acho que falta uma conscientização por parte dessas pessoas, quando se apura o censo não aparece o nome de ninguém.

Comentários:
Li a entrevista, a qual revelou o universo dos ferroviários, cujo o entrevistado, o Senhor Lazaro foi ótimo memoralista, pois relatou ricos contextos históricos,de uma era sobre as rodas de ferro.
Ademir Pfiffer - Historiador - Jaraguá do Sul - SC
# postado por ValeItapocu : 8:45 AM












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