domingo, dezembro 01, 2013

CARLOS MAGNO CAPRANICO CORRÊA


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 02 de novembro de 2013

Entrevista: Publicada aos sábados na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/


ENTREVISTADO: CARLOS MAGNO CAPRANICO CORRÊA

A Escola Preparatória de Cadetes, situada em Campinas, Estado de São Paulo, é o único portal de entrada para o oficial de carreira, combatente, do Exército Brasileiro. Chefe da Seção de Saúde da Escola Preparatória de Cadetes do Exército, o Tenente-Coronel Dentista do Exército Brasileiro, Carlos Magno Capranico Corrêa nasceu em São Paulo a 1 de setembro de 1963, filho do Coronel Geraldo Aparecido Corrêa, oficial da Força Pública, que mais tarde passou a ser denominada Polícia Militar, e Fenicia Trindade Capranico Corrêa,piracicabana, ex-aluna do Colégio Piracicabano. Com três dias de vida Carlos Magno e a família dirigiram-se a Santos, cidade de onde tinham saído apenas para dar a luz a Carlos Magno. Embora nascido em São Paulo, ele se considera santista. O casal teve depois mais uma filha: Carla.

Como seus pais se conheceram?

Minha mãe tinha saído de Piracicaba para ir trabalhar no Tribunal de Justiça de São Paulo, lá ela conheceu meu pai. Como era costume na década de 50, após o casamento minha mãe parou de trabalhar e meus pais foram morar em Santos, no bairro José Menino, onde passei minha infância e juventude. Em 1980, aos 16 anos, meu pai faleceu. Até a quarta série do primeiro grau, estudei no Colégio Coração de Jesus. Depois fui para o Colégio Santista que era um colégio tradicional em Santos, dirigido pelos Irmãos Maristas onde conclui o colegial aos 16 anos de idade. Passei no vestibular, na época denominado Mapofei (Mapofei foi um vestibular da área de Exatas nas universidades da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, Instituto Mauá de Tecnologia e Fei). Fui fazer engenharia na Escola Mauá, fiz quatro anos de Engenharia Elétrica. Não me encontrei, não gostei, em 1985 vim cursar odontologia na FOP – Faculdade de Odontologia de Piracicaba – Unicamp, conclui em 1988. Fiz um ano de mestrado, com a minha aprovação no concurso da Escola de Saúde do Exército situada no Rio de Janeiro., fundada por D. Pedro II. Atualmente ela admite pessoas formadas pelo curso superior, fazem um ano de adaptação e ao serviço militar, e ai formam oficiais de carreira da área de saúde do Exército Brasileiro. Entram e cursam como Primeiro Tenente, no final do curso é declarado Primeiro Tenente. Na odontologia me encontrei. Tive grandes mestres: Sérgio Mazzonetto, Miguel Morano Júnior foi meu orientador em odontologia social, por três anos trabalhei a noite como voluntário na Assistência Social Mariana.

Foi ali que despertou seu interesse pela assistência social?

Acho que despertou em Piracicaba. Aqui fiz muito trabalho voluntário no presídio, nos bairros de Santana, Santa Olímpia, Santa Terezinha, Artemis, em trailers com consultório odontológico montado. Isso nos anos de 1986, 1987. Na época havia muita carie dental, câncer bucal, câncer de lábio inferior, possivelmente provocados pela incidência solar muito intensa em pessoas de origem européia.

Após concluir o curso da Escola de Saúde do Exército para onde o senhor foi designado?

Do Rio de Janeiro fui para a Amazônia, onde servi em 1991,1992 e começo de 1993. O batalhão era em Tabatinga, fui para um pelotão destacado que era em uma região inóspita, a 400 quilômetros de qualquer cidade, localizado na fronteira com a Colômbia. Era primeiro tenente, solteiro. Nesse pelotão destacado havia mais 60 militares. Foi na época em que invadiram o Destacamento Traíra.  Traíra era um pelotão destacado na região da Colômbia, invadido pela FARC - Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia. Mataram três militares brasileiros. É uma região com muito garimpo clandestino. O Exercito Brasileiro reagiu. É muito interessante que as vezes no meio da selva, andando, encontramos um marco da época portuguesa, de mármore. É uma coisa maravilhosa. É impossível não mexer com o sentimento de quem no meio de uma selva encontra um bloco de mármore, lapidado, escrito lado brasileiro, lado colombiano. São peças colocadas há 200,300,400 anos, época de  (Desbravador e militar português que atuou no Norte do Brasil em 1587 a 1641). O único braço do Estado que chega nesses lugares é o Exército. A saúde, vacinação, tratamento médico, odontológico, só chega nesses lugares pelo Exército. O correio só chega pelo Exército. A segurança, só chega pelo Exército. As Forças do Estado não chegam lá.

Nesse período em que o senhor permaneceu lá, como era a subsistência?

Hoje existem balsas do Exército que levam comida até lá. Toda a nossa cadeia de suprimentos é feita através de rios até o local. Naquela época não existiam balsas e o apoio era prestado pela Força Aérea. Nós construímos uma pista que se prestava para o pouso de aeronaves, uma vez a cada três meses a Força Aérea levava a nossa “etapa”. Etapa é como denominamos o nosso meio de subsistência. Só que quando tinha falha de avião, a próxima ida do avião demorava seis meses, daí tínhamos que nos virar com o que tinha na terra. Comprávamos produtos que os índios plantavam, caçávamos, em uma época em que a caça não era proibida como é hoje, pescávamos nos rios da região.

Que tipo de alimento os índios produziam?

Mandioca, milho, banana.

Eles têm o habito de trabalhar?

É outro aspecto também. Fazíamos a história romântica sobre o índio antes de ir para lá. Em contato com eles percebi que não bem dessa forma. Mesmo o índio puro, com pouca influência do branco, é acomodado, só se mexe em caso de muita necessidade. Ele fica na rede o dia todo, quem trabalha é a índia, é uma coitada, com um filho na barriga, um no colo, outro na barra da saia, outro puxando na perna, ela faz a roça da mandioca, de milho, faz as vasilhas onde eles cozinham e guardam alimentos, ela faz a fogueira, prepara os alimentos, o homem só se mexe em caso de guerra, para a caça e para a pesca. Eles fazem uma festa onde todos os homens se reúnem para sair para caçar ou pescar. Vão, pescam muito, enchem uma canoa, caçam em bastante quantidade, trazem, nesse dia fazem uma grande festa, se alcoolizam bastante.

Qual é a origem do álcool que eles consomem?

O cauim é feito de mandioca ou milho mastigados, as mulheres, normalmente as virgens, mastigam e cospem em uma vasilha, aquilo fermenta e vira um cevejão. É uma viagem pelo tempo, como os portugueses encontraram o Brasil a 500 anos. São grupos indigenas, não tribos propriaente ditas. Eu estava na região onde havia indios Ticunas e indios Tucanos. São dois grupos indigenas semelhantes, falam idiomas semelhantes, oriundos do Tupi-Guarani, com maior ou menor influencia do homem branco. Alguns indios conhecem instrumentos metálicos: facão, machado, armas de fogo, Coca-Cola, chocolate, outros não, ainda usam instrumentos semelhantes aos usados antes dos portugueses chegarem ao Brasil: machado de pedra lascada. Na região onde eu estava pedra era uma raridade. Os nativos: indios, população ribeirinha e descendentes de migrantes do nordeste que foram para lá na época da borracha. Os mais prestimosos tinham uma pedra redonda, com um trilho no meio que dava para fazer uma laçada de corda, usavam como ancora de barca ou como instrumento para pesca de poita. Outras regiões da Amazônia contam com fartura de pedra. Onde eu estava era areia, lama e selva.

Entre os militares que serviam no pelotão havia nativos?

Uma boa parte era constituida de soldados filhos e netos de indios, que ingressaram no Exército para o serviço militar e acabaram ficando como militares de carreira. Era uma mão de obra muito boa. Eles estavam em casa! Conheciam muito bem a região. Até hoje a penetração do Exército nessas áreas só é possível graças ao conhecimento dessa população nativa.

Qual era a atividade do senhor nesse pelotão?

Eu sou da área de saúde, mas lá nós fazemos de tudo. Um dia eu tirava o serviço de oficial de dia, que é o responsável pela segurança do aquartelamento, toda a guarda armada referente a vinte e quatro horas por dia. De tomada de conta daquela área que tínhamos que cuidar, era responsabilidade do oficial de dia. A fronteira não era delimitada pelo rio, de um lado brasileiro e do outro lado do rio, colombiano. Pelo contrário, a zona de fronteira era perpendicular ao rio. Tudo que entrava rio abaixo vinha da Colômbia. Tínhamos que fazer a revista, exercendo as atividades de polícia de fronteira e marinha. Tudo que saía do Brasil tinha que obrigatoriamente parar ali para ser inspecionado. No Brasil chamava-se Rio Içá, antes de chegar ao Brasil era chamado de Rio Putumayo. Além de oficial de dia, fazia todo serviço médico, odontológico, vacinação. De toda a população, colombianos e brasileiros. Havia um oficial dentista, um médico, um farmacêutico que além de fornecer os medicamentos fazia os exames laboratoriais. Tínhamos mais dois oficiais de armas e um oficial de comunicações. Acabávamos exercendo a atividade de polícia, se existissem alguns desafetos entre a população local, tínhamos que interceder. Existiam problemas sociais dos mais diferentes níveis, alguns casos muito chocantes. A coisa mais corriqueira era um pai de família dar uma filha em pagamento das dívidas, ela era vendida pelo barqueiro logo mais adiante.  O único meio de subsistência era o barqueiro que vinha vendo farinha, açúcar, coisas que não existiam na região. O índio não tem esse costume. Nunca vi. Era um habito corriqueiro dos outros habitantes da população ribeirinha. Éramos 60 militares, alguns casados, trouxeram suas esposas, existiam algumas casinhas, muito simples, de madeira. Cheguei a morar em uma dessas casas, onde recebi a minha mãe que foi me visitar e permaneceu por quatro meses, num ato de profundo heroísmo. Eletricidade eram só oito horas por dia. Não existia banho quente. Existia uma aeronave da Força Aérea que ia para lá, pegávamos uma carona até Tabatinga, lá pedíamos dispensa ao comandante do batalhão por dois dias, era o que chamamos de “arejamento”. Saíamos para a cidade para passear, servia para fazer as compras dos materiais mais necessários, era quando íamos ao banco, naquela época a inflação beirava 60% ao mês. O que eu recebia ficava parado na conta por três ou quatro meses, quando conseguia ir até o banco para colocar em uma poupança, o dinheiro não valia mais nada.

A quais riscos corriam os militares que serviam nesse pelotão?

Tinha muitos discos, desde as invasões dos garimpeiros, da Farc, até desavenças locais por ocupação de terra, onde tínhamos que interceder. Eu levei um tiro na canela, acredito ser de revolver calibre 38, ele entrou por um lado e saiu do outro lado. Após 15 dias quando veio a aeronave para me levar, já estava cicatrizado.  Para a época e pelo tamanho do pelotão, tínhamos uma boa infra-estrutura, havia uma sala de cirurgia, algum tipo de anestesia, mas estava longe de ser um hospital. Após permanecer por dois anos, fui transferido para Campinas, para o 2º Batalhão Logístico Leve, onde tive três anos maravilhosos. É um batalhão de apoio, ele apóia todos os exercícios da segunda região, com montagens de campanhas, seção de saúde, atendimento médico-odontológico. Fui promovido a capitão e transferido para a Escola de Cadetes, onde permaneço até hoje. Em 2009 fui para o Haiti.

Como foi essa ida do senhor para o Haiti?

Para o Exército toda missão no exterior é como se fosse uma recompensa. É oferecida essa oportunidade para quem mostra relevantes serviços. Além disso, a pessoa tem que ser voluntária. Se eu for transferido para a Amazônia ou para o Rio Grande do Sul, eu sou obrigado a ir. Para missão no exterior só vou se for voluntario. Ter mérito. E falar um dos idiomas que seja necessário na área. Atualmente o Exército tem várias missões no exterior, missões de paz, de manutenção de paz e missões de aditância, que são representações nos governos ou segurança nas embaixadas. São os adidos militares, exclusivas de pessoal de carreira de arma. Como oficial de Saúde posso ir á missão de paz ou manutenção da paz.

Qual é a situação brasileira no Haiti?

O comando de todas as operações militares dentro do Haiti é do Brasil, isso é uma conquista inédita. Foi conseguida em 2004 e permanece até agora porque a ONU gostou da atuação do Brasil no Haiti. O Brasil tem um Estado-Maior que comanda todas as forças militares do mundo inteiro que estão no Haiti, e mais um batalhão brasileiro que está naquele país.

O senhor estava no Haiti quando ocorreu o terremoto?

Foi coincidência. Fomos escalados para ir para lá em uma missão que acontecia desde 2004 e coincidentemente no final do nosso preparo aconteceu o terremoto, no dia 12 de janeiro de 2010, fomos pegos de surpresa, tínhamos chegado ao Haiti no dia 9 de janeiro de 2010. Passei pelo terremoto. A ida para o Haiti se dá por contingentes, o batalhão tem cerca de 1200 militares, viajam 300 por vez, em dois aviões de passageiros da Força Aérea. O antigo avião da presidência da república é um desses aviões. Vamos de forma rústica, levando todo o armamento, munição e equipamento individual, somos autorizados a embarcar com 45 quilos, além do equipamento. Só o equipamento que é usado diuturnamente lá, colete balístico, colete operacional, capacete, fuzil, pesa cerca de quarenta quilos. A nossa base no Haiti, tem todo aspecto de um campo de concentração requintado. Com guaritas, fios de segurança, cercas, iluminação. Lá dentro podemos ficar aliviados do equipamento, mas se pisar fora da base tem que estar com o equipamento completo. Principalmente na época em que ocorreu o terremoto.

O senhor estava em que lugar quando ocorreu o terremoto?

Eu estava na base brasileira que se chama BRABATT  Brazilian Battalion, Funciona próximo a outros batalhões, próximo a embaixada americana. Tem mais outros pontos de vigilância brasileira: Casa Azul, um aquartelamento no centro da cidade, outro se chama Ponto Forte 16. Esses dois ruíram, onde morreram vários militares brasileiros.  A base é feita com containeres emendados, por isso não ocorreu desabamento, com exceção da parte de alvenaria que desabou: uma lavanderia grande, um local chamado de “refrigério”, onde havia uma churrasqueira, um local para gelar cerveja, era utilizado no final de semana para confraternização entre o pessoal da base. Uma garagem de viaturas não chegou a desabar, mas se abalou bastante, todas as estruturas próximas, desabaram. A população começou a vir na porta do batalhão para pedir ajuda, trazendo feridos em condições terríveis. Tornou-se uma enfermaria em campo de batalha. Todo mundo acabou trazendo seus próprios colchões, colocando no pátio, a céu aberto, para a população deitar ali e receber a atenção de saúde, até os cabos e soldados que tinham uma formação básica acabaram suturando, aplicando soro, não tinha como atender a tantos feridos. Uma amostra do portal do inferno.

Quanto tempo durou o terremoto?

O abalo sísmico durou cerca de dois a três minutos, só que foi de uma intensidade insuportável, víamos as viaturas ficarem com uma roda só no chão, com a ondulação do terreno, é indescritível. Quem estava no lugar certo na hora certa sobreviveu, não dava tempo para atos heróicos, pular pela janela. Tudo foi muito rápido. Durante os seis meses e vinte e um dias em que fiquei no Haiti, eram no mínimo 36 abalos diários, sendo 3 ou 4 perceptíveis, os vidros tremiam. Até hoje, quem estava lá e escuta a vibração de um alto falante potente já fica atento. É marcante. A República Dominicana, que é na mesma ilha não sofreu abalo nenhum, num “arejamento” de três dias, fui para Punta Cana que é o paraíso, eu estava com a minha mãe e minha irmã, tomando um drinque, deu um desses abalos, o único que afetou a República Dominicana, quem estava ali sentiu, foi mínimo, mas sentem o chão vibrar, os móveis, a bebida. Elas sentiram também. Isso é o que passávamos 30 a 40 vezes por dia no Haiti. São pequenos sismos, só que quem está na hora lá não sabe se vai ser grande ou pequeno sismo. Nos primeiros três meses não tivemos nenhuma folga, o trabalho era insano, diuturno, primeiro tentando socorrer e resgatar vítimas de desabamentos, presos em ferragens, entulhos, soterrados.

Havia saques?

No Haiti sempre teve saques e durante um bom tempo imagino que irá ter. Se agravou com o terremoto. No Haiti não existe estrutura pública nenhuma, no ano de 2010 não havia nenhum serviço público. Não se varria ou limpava rua, o governo não atua lá. Noventa e oito por cento da economia é informal. Não tem iluminação pública. Em 2010 apenas dois por cento da cobertura vegetal ainda existia no país todo. Não tinham gás, eles cozinhavam com carvão, com lixo queimado, a cidade inteira são montanhas e mais montanhas de lixo.

Como eles se alimentam?

Assim que cheguei começou o terremoto, a maior parte da alimentação era originária de doações do mundo inteiro. A ONU atua bastante no Haiti. Vinte por cento da atuação da ONU é a parte militar, o resto é a atuação humana em vários aspectos. Desde levar ONGs para atendimento de saúde. No Haiti não existe mais nenhuma matéria prima, em minha opinião a ONU poderia intermediar junto a empresas privadas para que levassem a matéria prima até lá, contratassem a mão de obra por um preço de banana e dessem a eles serviços simples, não dá para exigir nada mais complexo deles, com isso iriam fortalecer a economia local. Se não der emprego o Haiti vai se acabar. Uma coisa é o que estudamos em história e outra coisa é o que pude observar lá, com o pouco contato que tive. A população branca do Haiti foi mandada embora ou morta. Eles se orgulham de ser uma das primeiras nações da América a declararem independência dos europeus. Ficaram só os africanos ou descendentes de africanos. Eles vinham de regiões distantes da África, muitos eram inimigos entre si, até hoje existe uma rixa muito grande entre os próprios negros. Não se entendem se exploram. Talvez sejam mais perniciosos do que os brancos que os escravizavam. Os que são ricos querem que os pobres continuem cada vez mais pobres.

No Haiti tem negro rico?

Tem. Existe uma região chamada Pétionville (em crioulo, Petyonvil), são mansões, seus donos são principalmente aqueles que cuidam de alguma coisa que sobreviveu ao terremoto. São muito ricos, são educados na Europa, Estados Unidos. Mesmo entre a população normal, quem tem uma condição um pouco melhor humilha quem tem condições inferiores.   

Qual era o idioma utilizado para se comunicar com a população?

O haitiano fala uma derivação do francês, chama-se “creole”, na realidade é vinte por cento de francês, com muitas palavras africanas de origem incerta e não sabida. Varias tribos de lugares diferentes foram escravizadas e levadas para o Haiti. Para quem conhece alguma coisa de francês começa bem a conversação, ele então passa a usar o linguajar deles, soa muito agressivo e não parece francês.


 
 

sexta-feira, outubro 18, 2013

AILTON DONIZETE DOS SANTOS LUCIANO


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 19 de outubro de 2013.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
 

ENTREVISTADO:AILTON DONIZETE DOS SANTOS LUCIANO
 

Ailton Donizete dos Santos Luciano é soldado da Polícia Militar do Estado de São Paulo. Trabalha no Centro de Operações da Polícia Militar – COPOM. Recebe todos os tipos de chamados telefônicos, ali é o último recurso para qual a população apela. A Câmara dos Vereadores de Piracicaba concedeu-lhe uma Moção de Aplauso pelo excelente trabalho no atendimento a Sra. Iolanda Jussara da Silva, no qual orientou em como salvar sua filha de dois meses que estava engasgando. Ailton é atleta, tem inúmeros troféus, medalhas e prêmios como ciclista. Disciplinado impõem um ritmo forte e constante de treinamento, tendo disputado com atletas brasileiros e estrangeiros, conseguindo se destacar. No ciclismo encontra o equilíbrio e a calma essenciais a um atendimento de excelência para com pessoas em total desespero que ligam para o COPOM. Nascido a 5 de novembro de 1974, na cidade e Aguaí, Estado de São Paulo, filho de Aparecido Paixão Luciano e Aparecida Conceição dos Santos Luciano que tiveram os filhos Antonio Marmo, Ailton Donizete e Adilson Donizete. Seu pai sempre morou na zona rural, onde permanece.
A partir de que idade você começou a trabalhar?
Quem mora em área rural começa a trabalhar bem novo, comecei a trabalhar a partir dos 10 anos. Aprendi a fazer todo tipo de serviço próprios de um sítio. Freqüentei a Escola do Bairro Mato Seco, recentemente estive lá revendo o local onde fiz o curso primário, a professora era Dona Verinha, muito enérgica. Após concluir o quarto ano primário fui estudar na Escola Egle Luporini Costa, em Aguaí, em 1986. Em 1988 fiz a prova para ingressar na Escola do Exército e passei.
Como surgiu sua vocação para a vida militar?
A minha admiração pelas Forças Armadas já vem desde criança, tenho muitos parentes que são militares, inclusive meu tio Antonio Fernando Paixão, me incentivou para o esporte era militar da aeronáutica e era ciclista.
Em que localidade situava-se a Escola do Exército que você ingressou?
Situa-se em Três Corações, Minas Gerais. Lá era o curso de formação de sargento do exército. Entrei com 16 anos, saí antes de me formar, aos 19 anos. Saí com o pensamento voltado para alguma atividade na área de segurança, com 21 anos entrei na Polícia Militar do Estado de São Paulo, me formei em Piracicaba, permaneci por algum tempo em Campinas, voltei à Piracicaba e finalmente Rio das Pedras. Nessa época já pedalava minha bicicleta esportiva. Dos 22 aos 30 anos, já no quadro da Polícia Militar, fiquei sem praticar o ciclismo. Aos 30 anos decidi voltar a praticar o esporte.
A atividade policial exige um equilíbrio emocional muito grande?
Exatamente. Temos que aprender a separar a vida privada da vida profissional.
A educação é dada em casa e a formação é feita na escola?
Em meu ponto de vista a educação vem de casa, a escola só modela, só prepara intelectualmente. A educação vem do berço.
Após quantos anos como policial nas ruas você ingressou em outro setor da polícia?
Foi após uns 15 anos, ingressei no setor de inteligência da polícia militar.
O que é o COPOM?
É o Centro de Operações da Polícia Militar. Toda ocorrência policial passa por lá. Ali atendemos desde ocorrência policial até situações que pode salvar uma vida.
Você tem uma Moção de Aplauso concedida pela Câmara dos Vereadores de Piracicaba, como se deu o fato que gerou essa moção?
Foi uma ocorrência que tive a felicidade e atender, era uma criança de dois meses, que estava sendo amamentada pela mãe e que se afogou. Essa mãe entrou em pânico, o único número que ela se lembrou de imediato foi o número 190, na verdade foi uma criança de 10 anos que estava com ela que se lembrou do 190, dizendo que sua irmãzinha havia afogado com o leite e a mãe não sabia o que fazer. É um fato que acontece muito, uns casos são mais fáceis de resolverem, outros mais complicados. A menina passou o telefone para a mãe, a partir daí passei a orientar. O primeiro passo foi acalmá-la. Em função do estado em que se encontra a pessoa tem dificuldades de raciocinar tomando atitudes que só pioram a situação. Após acalmá-la, passei as orientações, passo a passo, e deu certo, salvamos a criança. A criança estava com obstruções das vias aéreas, ela deve ser colocada de bruços, na palma da mão, apoiada no joelho da mãe e receber tapinhas na costa. Após três a quatro tapinhas, observa-se se saiu o leite, ou se ainda está sem respirar, com uma fralda tirando o excesso de leite, que certamente irá sair. Se a criança não estiver respirando vira-a de novo, mais tapinhas nas costas até que ela consiga expelir o que está obstruindo as vias aéreas. Vira-a novamente de frente, seca o excesso de leite que tenha saído pelo nariz ou pela boca, e observa se ela irá voltar a respirar. Se porventura não voltar, dificilmente isso acontecerá, com a boca o adulto abarca o nariz e a boca da criança, fazendo como se fosse uma máscara com a própria boca, assopra, isso irá auxiliar na desobstrução das vias aéreas.


 
Quando você começou a se interessar por esportes?
O incentivo inicial eu tive através do meu tio Antonio Fernando Paixão, que era ciclista oficial e medalhista olímpico. Ele era de Aguaí, oficial da Aeronáutica, ele tinha várias bicicletas de competição, entre elas ele me deu uma, quando eu tinha uns dez a onze anos, conservo-a até hoje, é uma Caloi 10, ano de fabricação 1984, ele me deu em 1986,  para a época era o que tinha e melhor, bem diferente das bicicletas profissionais existentes atualmente. Optei por trabalhar e pedalar nas horas disponíveis.


 
Qual foi a primeira vez que você competiu?
A primeira competição que participei foi quando tinha 12 anos de idade, em Aguaí. Era em uma avenida em que o pessoal fazia algumas provas. Meu tio sempre incentivando. Nessa primeira prova fui classificado em terceiro lugar. Isso me animou muito. Isso foi na época do Bagunça, que era uma bicicletaria que havia lá, literalmente era uma bagunça mesmo. Chamava-se Bicicletaria do Bagunça. O Bagunça era o bicicleteiro. É comum encontrar um ciclista em uma bicicletaria, se quiser achar um ciclista basta ir até uma bicicletaria a afirmação será: “- Daqui a pouco ele estará ai!”. O Bagunça tinha uma equipe de ciclistas que na época era uma das mais fortes da região. Nesse meio ele conseguiu escrever uma história, através do esporte, da bicicletaria, conseguiu ser eleito vereador, com isso o ciclismo na cidade melhorou muito, graças ao seu apoio. Ali surgiram muitos talentos do ciclismo. Foi lá que assinei um contrato com a Trek Brasil, uma marca dos Estados Unidos representada por uma empresa sediada em São José dos Campos. Pedalei com eles até meus 21 anos. Rescendi o contrato e entrei para a Polícia Militar do Estado de São Paulo. Fiquei oito anos sem mexer com bicicleta.
Com que idade você voltou a praticar o ciclismo?
Com 29 para 30 anos.






 
Para reiniciar a prática do ciclismo já era uma idade significativa?
Todo esporte de alto nível o alto rendimento ocorre entre os 27 até os 34 a 35 anos.
Quando você retomou o ciclismo foi em um ritmo crescente?
Retomei indo à Monbuca e voltando, são 22 quilômetros. Com uma bicicleta normal, adquirida no mercado. A linha de bicicletas de competição é muito mais elaborada. Fiz uma preparação de uns nove meses, de janeiro a setembro, isso foi em 2004. Em 23 de setembro de 2004 competi em Rio das Pedras, Eu e o Sérginho,competimos em dupla, era um circuito por planilha, de regularidade, saia do centro,ia para a Fazenda São Jorge, Souza, Viegas, e voltava, dava uns vinte e poucos quilômetros, andando na terra, eu nunca tinha pedalado nessas condições, antes eu fiz o circuito de estrada. Tinha andado bem pouco em estrada de terra no sítio.
Qual é a diferença entre pedalar no asfalto e na estrada de terra?
É bem grande. No asfalto rende muito mais, é mais leve para pedalar, faz menos força, ao passo que tem que ter mais resistência física para longas distâncias. Na terra se faz bem mais força. No final da prova ficamos em décimo segundo lugar. Muita gente não atingiu essa marca. Ele acabou desistindo de continuar a competir porque as outras etapas seriam longe. Ai comecei a treinar com a minha esposa, ela já gostava, mas não competia, começamos a treinar quase um mês depois fomos competir em Morungaba. Ganhamos na categoria dupla mista, e ficamos em sexto lugar na categoria geral das duplas. Havia 60 e poucas duplas. Decidimos que iríamos competir em categoria solo, em 2005 disputamos cada um em sua categoria. Fui vice-campeão do Estado de São Paulo, pela Copa Caloi. Minha esposa foi a terceira classificada na categoria feminina. Fui evoluindo, sempre com bons resultados, sigo uma planilha de treinos que é feita ela Quest Academia, de Rio das Pedras, o preparador físico é o Romeu Valerini Neto, muitas vezes deixava pela manhã o plantão que tinha realizado a noite e ia treinar sem dormir.



 
A sua atividade como atleta o ajuda para o exercício da sua profissão?
Sem dúvida! O esporte influencia não só no serviço como também para a vida. Quando me sinto estressado pego a bicicleta e saio pedalando. Desligo do mundo! Pedalo 55, 60, 70 quilômetros, nem sinto o tempo passar. Ontem à tarde saí para pedalar, andei 56 quilômetros em estrada de terra, isso em aproximadamente duas horas e vinte minutos.
Quantos quilômetros por hora você faz em média?
Ontem foi fraco, deu 22,8 quilômetros por hora em média.
Qual é a velocidade máxima que você atinge em uma bicicleta?
Ontem, que eu me lembre, deu 50 e poucos quilômetros por hora, em prova, em descida, deu 78 quilômetros por hora. Ficou gravado no meu ciclo computador.
Quais equipamentos de segurança você usa?
Uso luvas, capacete, óculos e uniforme que é feito com um tecido apropriado, para no caso de uma queda minimizar as escoriações. É comum o uso de bretelles (basicamente uma bermuda com alças). Diversos homens que preferem usar bretelles, por não ter elástico ou cordão na cintura, que incomodam alguns, e pelo fato de ter alças e não tem perigo de cair. O pé fica preso no pedal, a sapatilha é clipada (presa com uma trava) no pedal para aproveitar melhor a força. Dá-se o efeito motor, tanto puxa, quanto empurra o pedal, isso resulta em um rendimento melhor.



 
Quantas marchas têm uma bicicleta de competição?
Houve uma evolução muito grande, até alguns anos o máximo era de 27 marchas, três coroas na frente e nove coroas atrás. Atualmente são 30 marchas, 10 atrás e três na frente. A bicicleta que uso atualmente é de 20 marchas, duas coroas na frente e 10 coroas atrás, isso por ser aro 29. Freio hidráulico, a disco. Em uma velocidade de 40 quilômetros por hora após acionado o freio a bicicleta ela estanca a uns 10 metros do local em que o freio foi acionado. A evolução da bicicleta não se restringiu as marchas e freios, as bicicletas anteriores tinham o raio das rodas convencional, o aro 26. Atualmente estamos usando as bicicletas de aro 29. Tem um aproveitamento muito melhor, embora exija um pouco mais do atleta, a transposição de obstáculos torna-se bem mais fácil. Rende muito mais na parte reta, de pedal mais solto.
Qual é a largura do pneu?
Existe várias medidas. Hoje uso o pneu 2.2 para competir, é um pneu com uma aderência melhor. Tem uma superfície de contato com o solo de aproximadamente uns quatro centímetros e meio. É um pneu considerado largo. Com a calibragem correta ele toma o formato de uma pêra. Haverá a aderência lateral e o contato para acionar e frear. Essas bicicletas de competição são feitas de alumínio aeronáutico, o escândio. É uma liga mais resistente e mais leve.
Quantas libras usam um pneu desses?
Costumamos calibrar conforme o terreno em que vamos rodar. Sé é um terreno muito técnico, com muita subida usamos uma libragem um pouco menor. Entre 28 e 30 libras.  Se for terreno arenoso, com saibro, usamos essa mesma calibragem. Se for um terreno mais firme, com muita subida, utilizamos entre 30 e 35 libras. No caso de estrada entre 35 e 40 libras.
Você já competiu com chuva?
Já. É duro demais. Muda completamente as estratégias. Tem que administrar a força, o barro, No cross country os atletas competem numa corrida em terreno aberto ou acidentado, são provas que sacrificam muito o atleta, ele sabe que terá que dar várias voltas em um circuito só. As condições psicológicas do atleta tem que estar muito bem, ele sabe que terá que passar por seis vezes pelo mesmo local, pela mesma subida, mesma poça de lama. Tem que estar com o conjunto perfeito. Com chuva o desgaste físico é maior, triplica a necessidade de ingestão de líquidos. O cuidado com o equipamento é maior para poder concluir a prova.
Você realiza salto de altura?
Existe também, tem o “drop” de até 1 metro. O ciclista consegue ficar em cima da bicicleta, é mais trabalhoso, dificilmente cai.
Qual é a quantidade de líquido que um atleta ingere em uma prova?
Recentemente corri em São João da Boa Vista, com um calor insuportável, prova curta de 40 quilômetros, uma duração de uma hora e quinze minutos, nesse período ingeri uns dois litros de água e isotônico mesclados. Além do reservatório na bicicleta, durante a realização a organização oferece líquidos também.
Qual foi a prova mais longa que você já competiu?
Foi a Brasil Ride Our Map, percurso de 100 quilômetros, uma etapa de aquecimento para o Brasil Ride Oficial que começa dia 19 de outubro, na Bahia, corri uma etapa que teve em Botucatu. Fiz uma com duração de quatro dias o Desafio Internacional dos Sertões, foi em 2008. Consegui me classificar entre os cinco primeiros, com competidores das Américas e Europa.
Você chegou a participar de provas no exterior?
Fui para o Uruguai, Argentina e recentemente para a Colômbia, onde disputei em uma prova destinada a competidores militares. No Rio de Janeiro disputei na categoria oficial de militares, onde fui vice-campeão. Disputei em Brasília, 70 quilômetros destinados a competidores militares, fui o terceiro Rei da Montanha.
O que é Rei da Montanha?
O competidor que sobe mais forte ganha um prêmio. Era duas voltas de 35 quilômetros cada uma, na segunda volta, contava o Rei da Montanha, uma subida de três quilômetros, em Águas Lindas de Goiás, ao lado de Brasília. É comum nas provas de ciclismo a premiação ao Rei da Montanha, aonde o ciclista que chegar primeiro recebe uma série de prêmios. Como era categoria internacional valia ponto para o Mundial. Vieram militares de outros países. Contado o tempo da parcial, de onde começava a marcar até onde fechava o Rei da Montanha, o americano passou com 12segundos e 30 décimos, o colombiano com12 segundos e trinta e um décimos e eu 12 segundos e trinta e dois décimos. Fui classificado em terceiro lugar como Rei da Montanha e quinto na prova. Passei pela equipe inteira do Exército que contava com seis atletas.
Quantas medalhas você já conquistou?
Em nove anos participei de trezentas provas, sendo que imagino ter umas 250 com resultados, é o que tenho de medalhas e troféus.
Você tem algum patrocínio?
Graças a Deus recebo o apoio de algumas empresas que me ajudam no custeio de alimentação, equipamentos, viagens.
Você compete com uma bicicleta só ou tem outra de reserva?
Tenho uma oficial para correr (aro 29) e outra de treino (aro 26).
Durante uma competição já aconteceu de estourar um pneu?  
Tem toda uma técnica, hoje eu consigo trocar um pneu em dois minutos e cinquenta segundos. Troco a câmara, encho e coloco lá. Até nisso a tecnologia já chegou, nós usamos um anti furo dentro da câmara de ar. É um líquido que é injetado na câmara e ele protege, furou ele mesmo remenda, você nem percebe.
Você compete à noite?
Já competi a noite. O maior problema é enxergar.
Alguma vez teve algum incidente com insetos ou animais em suas disputas em estradas de terra?
Aconteceu no Horto Florestal em Limeira, dada a largada, passamos por um veículo da imprensa, estavam filmando o pessoal que passava, eu estava com outro ciclista na minha frente, vi que o repórter estava se abanando, dando tapas no ar, passamos, era um enxame de abelhas, a minha velocidade aumentou muito, tanto que ganhei a prova.
Em seu ponto de vista o ciclista deveria ter mais informações sobre as leis e regras de trânsito?
Acho que deveria seguir os mesmos passos que são dados para conduzir um veículo comum. Criar uma conscientização maior sobre as regras de trânsito. Deveria haver uma campanha de conscientização dos ciclistas, e dos motoristas também. Não adianta o ciclista se moldar e o motorista não. É uma questão cultural. Nas décadas de 50 e 60 era um dos esportes que tinha uma cobertura gigantesca. Aguaí, cidade onde nasci o banco teve que se adequar aos clientes, não tem estacionamento de carros em frente ao banco, existe um bicicletário. Bicicletaria existe uma em cada esquina. Sou Tri-Campeão em Aguaí, da Copa Sul-Minas de Mountain Bike Cross Coutry.  No próximo dia 27 de outubro teremos o Bolão Nacional de Ciclismo em Rio das Pedras, a partir das oito e meia da manhã, com saída do portal da Painco, na saída para Mombuca.  Estarão participando todos os ciclistas desde a categoria Elite, Expert, Estreiante e Veteranos. Para Estreante e Veteranos será 23 quilômetros e para Expert e Elite 52 quilômetros. Vai até Mombuca, vira no sentido Serra D Água, até o Parazinho e volta. Tem troféu e medalha do primeiro ao terceiro classificado, Medalha para o Rei da Montanha e prêmio  para o primeiro, segundo e terceiro colocados.

 
 

segunda-feira, outubro 14, 2013

MARIA HELENA da SILVEIRA


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 12 de outubro de 2013
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/

ENTREVISTADA: MARIA HELENA da SILVEIRA

 


O livro “Uma História de Amor Eterno” é um tributo que Maria Helena Silveira fez em homenagem aos seus pais Manoel Sebastião da Silveira e Regina Beltrame. É um relato completo desde quando se conheceram até quando faleceram prestes a completarem um século de vida. A família dá seu testemunho de que a riqueza espiritual supera e muito, as dificuldades materiais. Manoel e Regina viveram 76 anos de feliz união.

Em que localidade você nasceu?

Nasci no bairro rural Peruca a 23 de janeiro de 1946. É um bairro situado na estrada que liga Piracicaba a Laranjal Paulista, passa por Formigueiro, bairro Vai e Vem, na Fazenda do Milhã, Fazenda Velha, Arraial de São Bento, Sítio Novo, até Laranjal Paulista. É conhecida como “Estrada por dentro”. É uma alternativa a estrada que vai por Tietê. Na época em que eu morava no sítio tinha o ônibus que chamávamos de jardineira, ligava Piracicaba a Laranjal Paulista.

Qual é o nome dos seus pais?

Meus pais são Manoel Sebastião da Silveira e Regina Beltrame. Tiveram 10 filhos: o primeiro filho da minha mãe morreu bebezinho, chamava-se Theotônio, depois vieram os filhos: Ana, Pedro, José, João Batista, Maria Helena, Sebastião Davi, Inês Aparecida, Antonio Carlos e Cacilda Isabel.

Seus pais eram proprietários do sítio onde trabalhavam?

Eles tinham um sítio que lhes pertencia, acabaram vendendo porque o sítio era pequeno, tinha que ficar plantando em terras terceirizadas. Os filhos foram crescendo e ele queria uma profissão para os filhos. Eu tinha 13 anos quando a minha família mudou-se para a cidade, já tinha cursado até o terceiro ano, minha professora era a Dona Lourdes, isso na Escola Mista do Bairro Peruca. No sítio não havia quarto ano.

Porque o bairro chamava-se Peruca?

Em decorrência de um senhor conhecido por Peruca, era dono de muita terra. Todos o chamavam de Seu Peruca, o bairro acabou sendo chamado de Peruca, ele tinha muitos meeiros. Havia uma colônia de casinhas dos meeiros dele. Eu ajudava minha mãe no serviço doméstico, meu pai tinha umas vacas leiteiras, lembro-me que ia prender os bezerros a tarde. Eu recolhia as vacas e os bezerros, ia a pé, porque não era muito longe. As vacas eram mansinhas, mansinhas. A primeira vaca que meu pai comprou quando mudamos nesse sítio, chamava-se Baia, ela tinha uma novilha chamada Prata. Depois ele adquiriu as vacas Nobreza e Rolinha. A essa altura a Prata já tinha criado, ele estava com quatro vacas de leite. Distribuía leite até para os vizinhos,  

Aos treze anos juntamente com sua família vieram morar em que bairro de Piracicaba?

Viemos morar na Rua Marquês de Monte Alegre, 1038, próximo ao Cesac. Isso foi em 1959.

Já tinha sido construída a Igreja São José?

Havia apenas o terreno, o alicerce estava sendo construído, eu ia brincar no monte de areia. Em volta havia poucas casas. A Rua Marques de Monte Alegre era cheia de casas, em frente a igreja, no sentido de quem vai mais para o bairro havia poucas casas. Era bem descampado. Descendo a Rua Ubatuba não havia casa. O Grupo Escolar Dr. João Conceição foi construído depois, era tudo um campinho. Havia muito terreno vazio.

Você continuou seus estudos?

Fui fazer o curso de costura, aprendi um pouco no SESI que funcionava na Sociedade Italiana, na Rua D. Pedro I, fui por pouco tempo. Minha mãe arrumou uma senhora que ensinava costurar, ficava próxima a Praça Takaki, na Rua Maria Nazareth, era a Dona Olívia, ela me ensinava a costurar a noite, minha mãe fazia-me companhia no trajeto. Ali terminei de aprender a costurar, minha mãe também costurava, ela me ajudava. Trabalhei toda a vida como costureira. Bem mais tarde voltei a estudar, Minha primeira máquina foi da marca Elgin, movida a força dos pés, com pedal, não tinha motor. Eu fazia calça para alfaiates, eles cortavam o tecido e davam para as costureiras costurarem. Cheguei a fazer sete calças em único dia. O tecido utilizado na época para calças era a calça de casimira. Depois começou a vir o tecido tergal. Costurava também sob medida, tanto roupas masculinas como femininas. Fiz vários vestidos de noiva. Cheguei a montar uma confecção com a minha irmã, mas ficamos um pouco de tempo só. Ela costura comigo até hoje. Atualmente trabalho mais com consertos, as pessoas compram muita roupa pronta e nem sempre são do agrado delas, sempre tem algum ajuste, alguma coisa para fazer. Faço mais isso hoje, mas ainda faço roupas.

A senhora é casada?

Não sou. A princípio achava que iria ser uma religiosa, cheguei a fazer algumas experiências em algumas congregações, participei de encontros vocacionais, mas eu sentia que em casa eles precisavam demais de mim. Depois eu achava que tinha um trabalho intenso na paróquia, achava que poderia fazer muita coisa sem ter ido a um convento.

Que tipo de trabalho a senhora fazia?

Trabalhei muito nessa paróquia. Trabalhei na catequese, fui catequista, coordenadora, tenho o trabalho realizado na comunidade, a paróquia é dividida em pequenas comunidades. Na comunidade eu fazia de tudo, recolhia o dízimo, fazia os encontros da reza semanal, faço até hoje. Atualmente o dizimo é levado diretamente para a igreja. No começo quando trabalhei na catequese, fiz um trabalho muito dedicado lá no “Risca-Faca”, como era conhecida a atual Vila Cristina.

Você conheceu o Frei Sigrist?

Conheci muito o Frei Sigrist, era outro São Francisco! Uma simplicidade total e uma cultura muito elevada. Um homem muito culto e que morava em uma favela. Não cheguei a trabalhar na favela com o Frei Sigrist mas o conheci porque na época ele dava aula para agentes da pastoral.

Como era a Vila Cistina na época?

O pároco da Igreja São José Monsenhor Luiz Gonzaga Giuliani quando chegou à paróquia, queria que as catequistas fossem de casa em casa buscar as crianças domingo de manhã para trazer à missa. Nós íamos no Risca-Faca de porta em porta, chamar as crianças, tirá-las da cama, para trazê-las a missa. Quantas vezes eu fiz isso? A pé! Depois tinha que levá-las de volta. A catequese, com essas crianças, fazíamos nas casas do bairro. Às vezes até embaixo de uma árvore.

Tinha algum atrativo para motivar essas crianças?

O Monsenhor fazia, quando chegava ao final do ano dava presentinhos na novena do Natal, Fazia muito sorteio dava para as crianças um tipo de um pequeno álbum, a cada encontro da catequese as crianças ganhavam um santinho, como se fosse um álbum de figurinhas, após preencher aquele pequeno álbum de santinhos, a criança ganhava um premio. No dia das Crianças dava doce. Ele cativava as crianças.

Qual é a importância da Igreja São José para o bairro?

Foi muito importante! Para mim principalmente que vim da área rural, foi na igreja que aprendi muita coisa. Devo muito ao monsenhor, através de cursos de formação de catequese, a formação de agente pastoral, ganhei muito com isso. Só depois é que fui fazer o MOBRAL, ai me despertou a perspectiva de estudar. Isso foi em 1969. Prestei exame de admissão, necessário naquela época, assim fui cursar o ginásio, isso em 1970. Nessa época já estava construído o prédio atual do Ginásio Dr. João Conceição, que tinha só o curso primário, no mesmo local o ginásio foi ocupado inicialmente pela E. E. Prof. Alcides Guidetti Zagatto, onde funcionou por alguns anos. Consegui estudar ali meus quatro anos. Conclui o ginásio no Zagatto, que já havia se mudado para o prédio atual. O curso colegial fiz um ano no Colégio Piracicabano, era escola particular. Parei de estudar por razões econômicas. Depois fui fazer supletivo. Fiz dois anos no Dom Bosco. Pensava em fazer uma faculdade, mas por empecilhos financeiros não foi possível.

A senhora acha que doou muito de si para a comunidade?

Doei! Tenho uma alegria imensa em ter doado a minha vida para o trabalho pastoral. Dediquei o melhor da minha vida para a comunidade. Tenho muita alegria em falar isso.
Minha mãe dizia: “- Porque fazer tanto! Não tem mais pessoas que possam também trabalhar? Só você que tem que fazer?”. Eu respondia-lhe: “Não é só eu, é que outras pessoas não fazem!” Eu estava sempre na coordenação, o trabalho é dobrado.
 
Financeiramente a senhora não teve nenhuma compensação, qual foi sua recompensa?

Recebi muita formação, o Monsenhor Luiz Gonzaga promovia cursos para nós. Fiz diversos cursos de formação, entre eles um de formação catequética, em Campinas, na casa de umas irmãs chamadas Lumen Christi em Campinas. Fiz um curso de várias etapas, fiz um curso de Teologia da Diocese foram várias etapas, quando chegou ao final, por motivos domésticos, não pude concluir o curso. Depois voltei a fazer a Teologia aqui no Seminário Seráfico São Fidelis. Na época lecionavam lá Frei Sigrist e Frei Augusto.

Como a senhora vê a realidade das pessoas menos favorecidas?

O pobre do Evangelho não é o pobre material, é o pobre de espírito. È pobre que não tem Deus, não tem conhecimento da fé. Para Deus a matéria não tem valor, ela é importante enquanto você permanece aqui. Ninguém irá levar nada dos seus bens materiais.

A senhora é uma idealista?

Sou, tenho um ideal. Pertenço a um grupo de leigos associados a Congregação dos Missionários Claretianos. Já faz 40 anos que pertenço a esse grupo. Conheci esse grupo de leigos nessa época em que eu queria ser religiosa, participei de encontros vocacionais, tive a oportunidade de conhecer esse grupo de leigos. Com o Concilio Vaticano II ele teve uma abertura muito grande. Foi reformulado. Esse grupo está espalhado, onde os claretianos tem casa eles têm os grupos de leigos, sou privilegiada, aqui em Piracicaba não existem claretianos, eu ia  a São Paulo, na Editora Ave Maria, participar de reuniões. Ficava na Rua Martim Francisco, no bairro Santa Cecília. Eles têm um seminário em Campinas, às vezes eu ia para Campinas.

A senhora morou na Rua Marques de Monte Alegre quantos anos?

Moramos lá por cerca de 19 anos. Alugamos uma casa na Rua Bernardino de Campos, próximo ao Colégio Dom Bosco. Com o dinheiro que o meu pai tinha ele queria comprar uma casa, só que esse dinheiro não dava para comprar uma casa, ele comprou esse terreno aqui. E construiu essa casa. Aqui o nome correto é Jardim São Miguel, estamos nessa casa já há 35 anos. Foi uma das primeiras casas do bairro, não tinha asfalto, era só buraco porque aqui é muita descida, a chuva abria aquelas valetas. No dia de chuva tinha que ir com um calçado até a Avenida Nove de Julho, e trocar o calçado, para ir á uma missa, ou algum lugar. Era muita lama, era horrível sair em dia de chuva, logo depois passou o asfalto.


Avenida Dr. Paulo de Moraes logo após ser construída, do lado direito ainda se vê os pés de café da Chacara Nazareth. As edificações são quase inexistentes.


A Avenida Dr. Paulo de Moraes já estava aberta?

Abriu naquela época, beirando a Avenida Dr. Paulo de Moraes na Chácara Nazareth, ainda existiam as vacas de leite, existia uma cerca onde elas ficavam. Quando construímos a nossa casa fotografamos a Avenida Dr. Paulo de Moraes, não havia nenhuma construção ainda. A nossa casa foi construída pelo meu pai, um irmão dele que trabalhava como pedreiro, residente em Quatá, cidade do Estado de São Paulo. Esse meu tio vinha e ficava a semana toda




O livro que a senhora escreveu  “Uma História de Amor Eterno”é ilustrado com muitas fotografias.

É sim, inclusive recuperei uma que o meu pai deu para a minha mãe quando começaram a namorar. Tem um versinho escrito por ele atrás da fotografia: “ Minha querida Regina Beltrame, queira aceitar esta fotografia, de lembrança do seu aniversário. Com pena pequei na pena, com pena para te escrever, com pena larguei da pena, com pena de não te ver” Ele escreve ainda: “Desse coração que por ti padece.”.

Qual era a profissão do seu pai?

Ele trabalhava no roça. Antes de vir morar na cidade foi contratado a 2 de agosto de 1948  pela prefeitura para trabalhar como conserveiro das estradas, ele deixou a roça, o sítio era pequeno, meus irmãos foram crescendo, mudamos para a cidade. Ele continuava ainda a trabalhar no sítio. Ia pela manhã e voltava à tarde pela jardineira.
Ele foi trabalhar na turma, iam de caminhão para abrir estradas com picareta. Ele permaneceu um ano nesse serviço, quando foi transferido para trabalhar como guarda de abrigo público, nos sanitários municipal. Depois o passaram para chefe, cargo em que se aposentou. Meu pai fazia muito serviços em casa. Fazia vassouras. Fabricava doces, ele tinha a experiência do tempo em que havia montado uma padaria no sítio, logo que se casou, foi onde aprendeu a fazer doce, pão. Em casa ele fazia doce de abóbora, cocadas, doce de mamão, de batata. Colocava os doces nos tabuleiros, para secar, nós íamos vender os doces que ele produzia. Muitas vezes entreguei doces feitos por ele. As crianças ajudavam-no muito, não tinham tempo para ficarem ociosas, sempre tinham um pequeno serviço em casa.

Como educadora, o que a senhora pensa a respeito de criança não poder trabalhar?

Em minha opinião deveria haver uma conciliação, não dispensar de uma vez o trabalho. Meu pai arrumou um serviço para o meu irmão caçula, Antonio Carlos, quando ele tinha sete anos, era para trabalhar em uma farmácia, entregava remédios. Ele ia à escola, depois da escola ia ajudar na farmácia. Meu pai dizia que ele tinha que aprender, a ter responsabilidade. Não sou partidária de um trabalho forçado, de um trabalho pesado para crianças. Meu pai fazendo pequenos serviços em casa nos ensinou a amarrar vassouras, cortar as pontas bem certinha. Ajudavamos a descascar as frutas para fazer os doces. E depois os entregava. O excesso de zelo com as crianças considero como uma desculpa para que a criança não trabalhe. Elas devem aprender a fazer as coisas desde cedo, quando crescer será mais difícil aprender a trabalhar. Se estudarmos a vida de pessoas ilustres, veremos que desde os cinco anos a pessoa já começa a despertar aquilo. Os meninos iam para o seminário com onze a doze anos. E não voltavam a ver os pais.

A senhora lê bastante?

Leio.

A senhora é uma pessoa que está de bem com a vida.

Tenho freqüentado um grupo de terapia, chama-se “Oficina de Emoções”, comecei a ir para motivar outras pessoas a irem. Agora estou indo, sinto que me faz muito bem.

O que é terapia?

É a gente se conhecer. Nós não nos conhecemos. Com essa terapia começamos a entrar em nosso interior. Os sentimentos emocionais têm que ser equilibrados. Temos que aprender a lidar com o emocional. Aos poucos cada um conhece a si mesmo, conseguindo trabalhar a nossa própria história. Vivemos aprendendo. Aprendemos a cada dia.

 

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