sexta-feira, abril 03, 2015

REVERENDO SÉRGIO PAULO MARTINS NASCIMENTO

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 03 Janeiro de 2015.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: REVERENDO SÉRGIO PAULO MARTINS NASCIMENTO  IGREJA PRESBITERIANA DO BRASIL – PIRACICAMIRIM





O Reverendo Sérgio Paulo Martins Nascimento nasceu em Campinas a 4 de agosto de 1960, filho de Noêmia Martins Nascimento, nascida em Avaí, interior de São Paulo,  e Joel Silva Nascimento, sergipano da cidade de Riachão dos Dantas, que veio para São Paulo ainda muito jovem. Os dois se conheceram na Igreja em Campinas, no bairro Campos Elíseos. Seu avô paterno é presbiteriano desde 1914. O casal Noêmia e Joel teve cinco filhos: Sérgio, Raquel, Edson Fernando, Carlos Eduardo, Julia Maria além de uma irmã adotiva, a Araceli.
Em que ano o pai do senhor veio para Campinas?
Foi em 1956, veio para trabalhar como carpinteiro em uma construtora, que depois veio a ser a famosa Lix da Cunha. Ele desenvolveu a carreira até ser mestre de obras.  Aposentou-se após trabalhar por mais de quarenta anos na mesma empresa. É algo raro em um setor que tem grande rotatividade de funcionários.
O senhor iniciou seus estudos em que escola?
Estudei no Colégio Padre José dos Santos, no bairro Campos Elíseos, na mesma rua morava a hoje atriz consagrada Regina Duarte, o Luiz Ceará, jornalista esportivo, eram pré-adolescentes, era da nossa turma, estudou conosco, o jornalista da TV Globo Heraldo Pereira. Campinas deu muitos artistas para a Globo: Claudia Raia, Luis Scamparini, Maitê Proença, Faustão. Nessa escola fiz até o ginásio. Depois fui estudar o segundo grau no Vitor Meirelles.
O senhor trabalhava nessa época?
Sempre trabalhei!  Comecei a trabalhar desde os oito anos. Meu avô materno, Sebastião, gostava de plantar alface eu colocava em uma cestinha de vime e saía vendendo pela vizinhança. Vendia pipoca. Tinha uma senhora negra que tínhamos um carinho muito grande por ela, ela fazia uma paçoquinha de amendoim muito boa, eu vendia, ajudava-a e eu sempre tinha uns trocadinhos, vendi picolé. Nunca tive problema com trabalhar. Tem até uma coincidência interessante, aos 12 anos eu vendia pamonha de Piracicaba.
Como a pamonha de Piracicaba chegava a Campinas?
No centro da cidade, no Largo do Rosário, tinha um estacionamento, e um rapaz ia com uma Kombi de Piracicaba à Campinas, isso todos os dias. Levava curau, pamonha e bolo de milho. Ele então distribuía para alguns meninos que pegavam por consignação, no final do dia fazia o acerto com ele. Na época eu vendia uma média de cem pamonhas por dia! Saia às oito horas da manhã, caminhava a pé pelos bairros, vendendo de porta em porta. A escola eu freqüentava a noite.
O fato de o senhor não ter tido muito tempo para brincar quando era criança o prejudicou em alguma coisa?
Não, acredito que não me prejudicou em nada. Eu gostava de jogar bola, jogava muito, mesmo com todas essas atividades eu tinha o sonho de ser jogador de futebol, era o sonho de todo garoto daquela época. Dentro das possibilidades todo final de semana jogava futebol.
Um jogo clássico de Campinas é do Guarani Futebol Clube e Associação Atlética Ponte Preta, qual é o time do seu coração?
Sou pontepretano! Ia assistir aos jogos, participei das “peneiras” lá da Ponte Preta, comecei a jogar, como centro-avante, era mais meio-direita. Fazia muito gol. Aos finais de semana, as vezes durante a semana frequentávamos a Igreja Prebisteriana do Brasil – Campos Elíseos.
A Igreja Presbiteriana mantém alguma ação social em Piracicaba?
Mantemos a Associação Cristã de Filantropia que mantém o Projeto Crescer. Uma entidade que tem repercussão no Brasil todo é a Universidade Presbiteriana Mackenzie. A mantenedora do Mackenzie é a Igreja Presbiteriana do Brasil. Foi iniciada por missionários presbiterianos, em uma época em que infelizmente havia muita discriminação contra protestantes, judeus e negros então recém-libertos. Os filhos dos missionários não tinham como estudar nas escolas, os missionários que chegaram aqui abriram essa essa escola que era acessivel a negros, judeus e protestantes. (O Instituto Presbiteriano Mackenzie iniciou suas atividades em 1870. Fundado pelo casal de missionários presbiterianos George e Mary Ann Annesley Chamberlain‎. Três crianças, sendo dois meninos e uma menina, foram os primeiros alunos de um sistema educacional em turmas mistas, sem os castigos físicos adotados na época. Em 1879, Dona Maria Antônia da Silva Ramos, baronesa de Antonina, vendeu ao Reverendo Chamberlain, por 800 mil réis, área de sua chácara em Higienópolis. Em 1880, adquiriu-se uma área de 27,7 mil metros quadrados no bairro de Higienópolis. Aceitando a proposta do jornalista José Carlos Rodrigues, adotou-se o nome de Escola Americana. A fama da Escola Americana não se restringia ao Brasil, chegando aos ouvidos do advogado americano John Theron Mackenzie que, sem nunca ter vindo ao Brasil, fez constar em seu testamento, em 1890, uma doação à Igreja Presbiteriana americana para que se construísse no Brasil uma escola de Engenharia. Desta forma, tem início o nome utilizado até hoje: Mackenzie.). Além do Mackenzie temos escolas esplhadas pelo Brasil todo, hoje são mais de 80.000 alunos. Temos dois grandes hospitais: um em Rio Verde (Goiás) e outro em Dourado (Mato Grosso do Sul). São hospitais da igreja.
Com que idade o senhor definiu qual seria a sua trajetória profissional?
Aos 18 anos eu já tinha uma clareza do que deveria fazer em relação ao chamado ministerial. Entendi a vocação, especialmente com o foco de povos não alcançados com o evangelho. Eu era muito ligado ao meu avô materno, ele morava conosco, e todos da família dizem que eu sou o mais parecido com ele, inclusive fisicamente. Eu deveria ter de quatorze para quinze anos quando um dia ele convidou-me para ir a uma reunião que haveria em uma casa naquela semana, acho que foi em uma terça-feira. E para incitar a minha curiosidade ele disse-me que deveria encontrar um grupo de indígenas naquele lugar. Eu nunca tinha visto um índio em minha vida! A noção que a população tinha de índios era distorcida. A curiosidade natural de adolescente me levou a ir com meu avô nessa reunião de oração e estudo bíblico. Encontrei um grupo de cinco índios, guaranis e terenas, vindos de Dourados, Mato Grosso do Sul, também protestantes.
Índios protestantes?
Exato! Eles vieram, estavam dando testemunhos de Jesus, falando e cantando em suas próprias línguas. Aquilo me chamou muito a atenção. A barreira que existia entre nós caiu por terra. Comecei a me perguntar, se tem esses têm outros! Onde estão os outros? Se tiver mais grupos, quem são esses grupos? Onde eles estão? Isso me levou em minha curiosidade de adolescente a pesquisar, aí descobri que nós tínhamos centenas de etnias no Brasil, todas diferentes, e que todas precisavam ter a oportunidade que aqueles estavam tendo de também ouvir o evangelho de Cristo. De uma forma genuína, clara. E lógico que a decisão seria deles. Mas teria que ter essa apresentação do Cristo do Evangelho, para eles também. E não só para eles, aí passei a verificar a partir de pesquisas que fiz naquela época, na década de 70, que havia muitos outros grupos nas mesmas condições, denominados grupos tribais, localizados na África, na Ásia, em várias partes do mundo, que também tinham a mesma necessidade. Aí então passei a me especializar nessa área. Entrei para fazer teologia, com foco na missiologia, para trabalhar em prol da evangelização desses povos não alcançados no mundo. Fui para uma escola específica de treinamento teológico, em Jacutinga, Minas Gerais, Instituto de Treinamento Missiológico Peniel.
Qual é o significado de Peniel?
É uma palavra hebraica que significa face a face com Deus. Jacó deu o nome a esse lugar, foi quando ele lutou com Deus e teve a sua vida transformada, e ai passou a ser chamado Israel. Jacó significa usurpador. Israel quer dizer “Príncipe de Deus”. Jacó lutou com Deus para o seu caráter ser mudado. Deus o tocou na coxa e ele ficou manco a partir daí. Um sinal dessa luta com Deus que lhe disse: “-A partir de agora serás chamado Israel”.
O senhor ficou por quanto tempo freqüentando essa escola?
Todo o curso são cinco anos de duração. São várias fases, tem a parte teológica, a parte missiológica, o treinamento de selva, como íamos trabalhar em contexto de selva com povos nativos, e até mesmo com povos não alcançados em contato com a sociedade envolvente, tínhamos que ter um treinamento específico. Fui entender o valor quando tive que colocar em prática. Além de aspectos como antropologia, lingüística, fonética.



Quantos idiomas o senhor domina?
Além do português, o inglês, comunico-me bem em espanhol, e as línguas tribais, quando você está com eles desenvolvemos, depois se acaba perdendo o domínio por falta de uso. Para se ter uma idéia, tenho aqui umas dez línguas de bíblias já traduzidas. Tenho uma do grupo que trabalhei quando tinha quatorze anos, e foi entregue traduzida no ano passado. Outra é da Guiana Francesa, tem outra que é dos nativos dos Andes, tanto no Peru como no Equador, são índios da região andina. Outra é uma região de Goiás. Outra bíblia está traduzida para o idioma dos índios do Paraná e Rio Grande do Sul. Outra é de índios do Maranhão. Cada bíblia dessas está na língua falada pela tribo, e são totalmente distintas. Quem traduz a bíblia para cada uma dessas línguas são missionários. É um trabalho que consome praticamente uma vida inteira. A que levou menos tempo, foi feita em oito anos. A Bíblia só está traduzida em 443 línguas, para um universo de 6.600 línguas faladas no mundo. È feito um dicionário que antecede a tradução da Bíblia. Um deles está aqui, estive com esse grupo, fui o diretor, esse trabalho foi lá em São Gabriel da Cachoeira na divisa com a Colômbia, era uma língua ágrafe (que não tinha grafia), até quatro anos passados. Em, suas mãos está o dicionário que trabalhou a grafia da língua. È um grupo pequeno, deve ter uns duzentos indivíduos, aqui temos o glossário semântico gramatical desse povo, com tradução para o português. É o projeto inicial, que é quando você trabalha a questão da grafia, a partir dos fonemas, e ai você vai descobrindo os substantivos, os verbos, advérbios, pronomes. A partir disso é formatada a grafia. Na formatação da grafia você vai partir para outro prisma que é a tradução. É um trabalho longo, árduo, demorado. Normalmente isso leva uns 20 anos. Só após definir a grafia é que se elabora a tradução.  A tradução geralmente é feita dos originais, grego, hebraico, para a língua então estudada. E não do português para a língua recém codificada. Existem os colecionadores de Bíblia, Antonio Cabrera, que inclusive foi Ministro da República, ele é presbiteriano, mora na região de São José do Rio Preto, é o maior colecionador de Bíblias do Brasil senão do mundo. As que eu apresentei a você tem uma participação direta ou indireta do meu ministério. Algumas dessas eu estava lá, entregando o trabalho pronto.


                             BÍBLIAS TRADUZIDAS NOS MAIS DIVERSOS IDIOMAS INDÍGENAS BRASILEIROS, ALGUMAS DEMORARAM ATÉ 30 ANOS PARA SEREM TRADUZIDAS, UMA VEZ QUE TEM QUE PRIMEIRO SER ELABORADA A GRAMÁTICA INDÍGENA EXISTENTE APENAS DE FORMA ORAL. 
Pode-se dizer que é muito semelhante ao trabalho que os monges faziam nos mosteiros há alguns séculos?
Exatamente! O meu foco foi trabalhar com esses povos, fui para a Amazônia, mais especificamente Santarém, no Pará, nessa ocasião era recém formado, tinha 22 anos, recém casado com a minha esposa Marlene Xavier Nascimento, temos dois filhos, Felipe e Guilherme.  A Marlene tem a mesma formação, nos conhecemos na igreja, ela estava especializando-se nessa área, casamos. Mais tarde ele veio a fazer mais outras faculdades, inclusive formou-se em Direito. Eu sou formado na área de Missiologia e Teologia. Fiz posteriormente o mestrado. Atualmente estou terminando o mestrado em Antropologia Cultural. Tenho a intenção de voltar à academia.   



Algumas pessoas chegam a determinada idade e sentem-se já maduras demais para continuarem a estudar, isso é uma lenda?
É uma lenda e ao mesmo tempo preguiça! A pessoa nessa situação tem um sentimento de inutilidade. Há pessoas que chegam a um determinado tempo da vida que não se consideram mais úteis. Acredito que isso é um fator cultural, considera tudo que é velho como imprestável, não serve para mais nada. Isso é também com referência ao idoso. É diferente da cultura oriental, onde o idoso é venerado. Nesse aspecto a cultura oriental é muito superior a nossa. Valorizam as pessoas mais experientes. Como o país está a cada dia envelhecendo mais, acredito que essas mudanças têm que ocorrer. Tem que haver uma conscientização. O Brasil está envelhecendo, a média de vida hoje é de 74,2 anos. E isso tende a aumentar cada vez mais. Está na hora de quebrar esse paradigma de que o idoso é inútil. Atualmente, pela pressão social e cultural a pessoa considera que ao chegar a determinada idade não tem mais o que fazer. Eu não creio nisso, enquanto tivermos fôlego de vida estamos ai. Estando ai e temos muito que fazer. Se for possível você fazer, atualizar-se, reciclar, conhecendo novos desafios. Eu vivo de desafios, sempre fui assim.
A primeira missão que o senhor realizou deu-se em que local?
Fui trabalhar com um grupo que ainda estava em fase de reconhecimento da existência ou não deles, fiz parte de uma equipe que tinha chegado antes de mim, fui fazer parte desse grupo. O trabalho era o reconhecimento ou não desse grupo tribal, havia vestígios em uma determinada área, próxima a cidade de Oriximiná, uma cidade do Pará, quase chegando ao Amazonas, próxima ao sul de Roraima, junto a um afluente do Rio Trombetas. Fui fazer contato com esse grupo, chamado de grupo arredio, em contato com a sociedade envolvente. Eu ficava por três meses na selva, minha esposa e meu filho recém-nascido ficavam na cidade de Santarém, lá era a nossa base. Subíamos levando 14 horas de barco, até Oriximiná, e depois andávamos cerca de 150 quilômetros na selva. A pé. Com a mochila nas costas, cada um levando o necessário para passar dois a três meses.
Aí que entra a importância do treinamento de sobrevivência na selva?
Exatamente! É ai que sentimos a importância do treinamento. Hoje é tudo mais fácil, existe o auxilio de GPS, roupas apropriadas. Naquela época entravamos uma selva usando Kichute (calçado, misto de tênis e chuteira, produzido no Brasil desde a década de 1970 pela Alpargatas). Ele era um calçado que não escorreva muito.
Como era feita a alimentação?
Alimentação encontrada na selva. Caça, pesca, frutos. Nós estavamoe em uma fase de contato, que chamavamos de “varação”, tinha que abrir uma picada na selva, não havia muito tempo para parar. A gente comia na medida em que ia encontrando coisas pelo caminho. Muita castanha do Pará, muito açaí, pupunha ou palmito do açai.
Os riscos eram enormes. Uma picada de cobra como poderia ser curada?
Nós levávamos soros antiofídicos eficazes contra o veneno de cobras conhecidas. Passamos por momentos dificeis, mas Deus nos livrou de todos eles.
Você portavam armas?
Sim, mas para caçar  para sobrevivência, era uma cartucheira simples. Jamais para ataque humano. Tinhamos um slogam “ Morremos, mas o indio não”. Estavamos prontos para morrer se necessário fosse, mas não iriamos reagir em hipose alguma para tirar a vida de ninguém. Estávamos conscientes do preço que iriamos pagar caso tivesse algum contato beligerante.
Como foi esse contato?
O contato foi interessante. Descobrimos a existência deles, inicialmente por um sobrevoo que fizemos, identificamos uma clareira na selva, conseguimos baixar com o avião que haviamos alugado, quando nos aproximamos dessa clareira a percepção foi clara de que era uma aldeia, ao baixarmos um pouco mais começou a vir flechadas em nossa direção, percebemos então que tinhamos sido identificados e que havia ali um grupo de seres humanos. A reação deles foi em ddcorrência de que nunca tinham visto aquilo. Aí fomos fazer o contato pessoal por terra, quando mais ou menos estabelecemos esse lugar, já tinhamos aberto uma clareira, tinhamos feito uma espécie de uma cabana, para ficarmos ali até que fossemos entrando, para não chegar imediatamente. Nas trilhas que percebemos, fomos colocando panos vermelhos, espelhos, facão, machado, que faz parte do processo de atração. Um dia os colegas tinham saido para caçar, tinham andado umas seis horas dentro da mata, deram de encontro por acaso com homem, uma mulher, uma criança e um idoso. Os colegas estavam voltando com a caça, tinham abatito um catitu, resolveram repartir ali como sinal de amizade. Já havia a perceção de que eles já estavam sabendo da nossa existência ali. Mais do que imaginávamos. Até porque a mulher estava com um pano desses que haviamos deixado. A principio os dois homens o mais novo e o mais idoso tentaram reagir para proteger a mulher e a criança, sem agreção, porém protegendo-os. O colega que estava com o catititu, ou porco do mato, nas costas, fez sinal de que ia repartir, Eles aceitaram e foram embora. Ele fez um sinal e entenderam que três ou quatro dias desceriam todos para lá. Nessa ocasião desceram os guerreiros mesmo, foi um momento muito tenso. O contato foi sendo estabelecido aos poucos. Essse grupo chama-se Zoé, durante a Copa do Mundo o Ronaldo e o Lucian Huck estiveram lá, entregaram bolas para eles.
O inicio do contato era feito por mímica?
A princípio era feita a comunicação por mímica, Depois fomos descobrindo, aprendendo a lingua, descobrimos que o tronco deles era Tupi-Guarani.
Quanto tempo o senhor permaneceu lá?
Fiquei dois anos e meio. Dormia em rede. Claro que não fiquei o tempo todo lá, vinha para a cidade, passava um tempo com a família. Quando estabelecemos contato abrimos uma pista para aviões, até que contruíssemos as casas para as esposas virem com os filhos. De lá fui para a Guiana Francesa, em São Jorge, divisa com o Oiapoque.
Qual era o idioma naquela região?
Era o francês. Embora na divisa com o Brasil exista uma língua utilizada que é uma mistura do créole, de influência africana, tinha o patuá, que é uma mistura do creóle, francês e línguas tribais maiores que existiam ali. Era uma Torre de Babel! Ouvíamos muitas línguas ao mesmo tempo.
Como é possível pregar para essas pessoas?
É um grande desafio! Primeiro tem que conhecer a língua. A língua que fala ao coração é a língua dele, não é a minha. Nosso objetivo não é cristianizar. Evangelizar é diferente de cristianizar. A evangelização parte do principio de que a pessoa tem o conhecimento de Deus. Inerente a própria raça humana. Esse conhecimento como Paulo diz, pelas coisas criadas os ensinamentos de Davi: “Os céus proclamam a glória de Deus, e o firmamento anuncia as obras das suas mãos.” O ser humano, não importa em que condição ele esteja, ele tem o conhecimento intrínseco de que existe um ser superior, de que existe um Deus. Por mais que os ateus queiram questionar isso, essa é a minha verdade de vida, em contexto até com os que não têm contato nenhum com a chamada civilização. Cristianização nada mais é do que cristianizar as pessoas. A evangelização parte do princípio de ele tem um conhecimento de Deus, desse Deus criador, por exemplo, algumas tribos têm um Deus que é um dos muitos deuses, só que esse Deus é um Deus bom, criador, que dá o sustento, nos cultos dentro do contexto tribal, na sua liturgia cultica, era o único dos deuses nesse Panteão de deuses que havia a participação da família nessa celebração: esposa, filhos, avós, de todo o grupo. Os outros tinham só a participação dos homens onde geralmente havia o consumo da bebida alcoólica feita através da mandioca, milho. Havia muita briga entre eles. Embriagavam-se, drogavam-se.
Qual droga era a mais usada por eles?
Eles retiravam de um cipó, transformavam em uma espécie de pó, e inalavam. A semelhança de uma cocaína, provocando um efeito alucinógeno. Nesses rituais pode ocorrer até morte. Nesse ritual em que todos os membros da tribo participam, as famílias, isso já não tem o risco de acontecer.  Quando o missionário na época chegou lá e foi morar com eles, fazer a grafia da língua, convivendo durante 20 anos, e vendo esses cultos, ele identificou nesse Deus bom, o mesmo Deus que nós cremos. O missionário disse-lhes: “ Esse Deus que vocês cultuam, é um Deus bom, é um Deus que criou todas as coisas, é o Deus que provê as nossas necessidades para a nossa subsistência, não é como os outros deuses que vocês tem medo, por isso vocês constroem as casas altas com medo desses deuses entrarem em suas casas e levarem seus filhos. Para eles ficou a história desse Deus bom ter um filho e esse filho chama-se Jesus que veio para redimir, ser a salvação. A evangelização parte desse principio. Isso não é possível com todos, isso porque esse Deus bom é um Deus casado, que já teve outros filhos. Nesse caso a comparação não dá para ser usada. Mas existem casos em que o Deus é um Deus superior mesmo, que não teve filhos. A partir desse principio que ele já conhece culturalmente, transmitido de forma oral, fica mais fácil para introduzir Jesus como sendo filho desse Deus.
Essas tribos cultuavam alguma imagem?
Todos eles tinham o culto animismo. Tudo é Deus, todas as nossas etnias no Brasil são animistas. Cultuam árvores, animais. O ser humano é animista na sua origem religiosa, intrínseca da natureza humana, ele é um religioso animista. Quando ele vem ter a idéia de um Deus trino: Pai, Filho e Espírito Santo, o animismo fica relegado a um segundo plano.
Os missionários em atividade, para integrar-se a um grupo, tem os mesmos hábitos desse grupo?
Não éramos obrigados e nem nós obrigávamos eles a nada. Essa é a grande questão, eu nunca serei um índio e eles nunca serão como os brancos. Às vezes somos bombardeados pelos antropólogos, de uma forma geral, quando eles afirmam que nós estamos querendo mudar a cultura desses povos. Nós não queremos mudar a cultura de ninguém.
A reserva Raposa do Sol tem qual significado nesse contexto?
É muito complexo. Embora nós já temos na reserva muitos protestantes. Ali tem uma complexidade de fronteira, a Amazônia como um todo é muito complexa. Só que o nosso foco é o ser humano, não importa se for trabalho com nativos na Índia, África, já estive em todos os continentes.
Após permanecer na proximidade de Oriximiná qual foi sua próxima missão?
Após dois anos e meio em Oriximiná fui para a Guiana Francesa, onde permaneci um ano, trabalhava no treinamento e capacitação de lideranças. É um território francês até hoje, inclusive a moeda que circula é o Euro. É o único lugar nas Américas onde o Euro é a moeda corrente..De lá vim para Anápolis, em Goiás, trabalhar no setor de administração, treinamento. na sede da base missionária onde iria trabalhar. Nunca perdi o foco, ia e vinha atuando nessa área. Em paralelo fiz consultoria em várias áreas, com outras agências, inclusive com americanos, alemães, ingleses, estrangeiros que vinham ao Brasil e queriam atuar com os povos nativos. Atualmente a maior parte do trabalho da missão é feita por brasileiros.

A sede nacional da Igreja Presbiteriana do Brasil situa-se em que localidade?
Fica em Brasília. Tem um presidente que é eleito pela Assembléia Geral a cada quatro anos, atualmente é o Reverendo Roberto Brasileiro.
O senhor viajou por quantos países?
Já estive em 36 países. Sempre trabalhando. Em alguns atuo até hoje, sou diretor já faz 20 anos desse departamento da igreja: APMT Agencia Presbiteriana de Missões Transculturais, temos hoje missionários espalhados por 44 países, somos cerca de 140 famílias missionárias (marido, esposas, filhos). Casais que estão em Angola, Moçambique, Guiné Bissau, Senegal, África do Sul, Europa: Portugal, Inglaterra, Espanha, Itália, Romênia, Albânia, temos missionários brasileiros presbiterianos presentes nesses países.
Qual país tem uma presença presbiteriana maior?
Estados Unidos e Coréia do Sul. A palavra “presbiteriano” significa um sistema de governo. É a igreja governada por presbíteros. Presbíteros são os lideres eleitos pela comunidade para ser a sua liderança.
Quantos presbiterianos temos em Piracicaba atualmente?
Pouco mais de mil fiéis. Estou calculando uma média de 200 por igreja, são cinco igrejas.
Existe algum cemitério presbiteriano em Piracicaba?
Não temos. Os reverendos Astrogildo de Oliveira Godoy  e Ademar de Oliveira Godoy que por muitos anos foram presbiterianos, ao falecerem foram sepultados no Cemitério Parque da Ressurreição. A Igreja tem algum endereço para contato via Facebook, que é: Igreja Presbiteriana do Piracicamirim. E também tem o meu pessoal que é:  Sergio Paulo Martins Nascimento.
O que o trouxe à Piracicaba?
Eu vim para Piracicaba em 1999, foi uma história interessante, eu estava em Casa Branca nessa época, após cinco anos de permanência lá, dentro do contexto do que podia fazer naquela localidade cheguei a um ponto de buscar novos desafios, temos vários projetos em andamento, são trabalhos muito sérios, um deles é a recuperação do dependente químico (alcool). Chama-se NECI (Núcleo Evangélico de Cura Interior), esse tem um site. Trabalhamos a idéia de que o alcoolismo precisa de uma cura interior. O foco é o alcoolismo, com a grande expansão de pessoas com outras dependências químicas acabamos recebendo-as. Estamos lá ha 18 anos, Tem uma equipe que trabalha lá, sou diretor fundador do projeto, atuo como diretor conselheiro, continuo assessorando a equipe que permanece lá no dia a dia.
Há controvérsias sobre a urbanização de povos até então vivendo em seus redutos?
Hoje a grande questão tribal é que estamos vivendo um processo, cada vez mais crescente, de aproximação dos indígenas dos grandes centros urbanos. Os aldeados estão se tornando minoria.  O que mostra essa questão do ser humano de buscar a melhoria de vida. Por mais que exista o desejo de afirmar que o indígena deveria ficar no seu contexto eles não irão ficar. È da natureza do próprio ser humano. Sempre trabalho o indígena, o nativo, por isso preservamos a língua através do Novo Testamento, através da grafia, na preservação da língua é preservada a cultura também. Se perder a língua perde a cultura. Se você for para uma região onde há uma aproximação dos centros urbanos, principalmente os adolescentes resistem em falar a língua da sua tribo. Querem falar a língua portuguesa. Quer acesso a tecnologia, a mídia. Isso prova que são seres humanos. Temos uma organização que tem a sede em Dourados, Mato Grosso do Sul, chama-se Missão Evangélica Caiuá, ligada à Igreja Presbiteriana. Trabalha com os Caiuá e com os Guaranis,Terenas, vai fazer 80 anos essa organização. Lá temos o hospital indígena, inclusive hospital para crianças desnutridas que chegam das aldeias, e o hospital de atendimento à população indígena. Essa organização acabou sendo convidada pelo Governo Federal para assumir a questão da saúde indígena em quase todo Brasil. Eu acabei de assumir a direção dessa entidade, Só o convenio que existe com o Governo Federal são mais de 300 milhões de reais por ano. Mais de 800.000 atendimentos por ano, da população indígena. Temos médicos, enfermeiros, dentistas, são equipes multidisciplinares. o atendimento é feito “in loco”. Vão às aldeias.. Eu assumi, vou tomar posse agora como Diretor da Missão Caiuá. É um grande desafio. Pelo que tenho analisado são mais de 7.000 funcionários espalhados nesses convênios que são convênios anuais, renováveis. Fiquei sabendo que ia assumir na Assembléia Geral que se realizou na igreja. Eu até levei um susto. Com isso a gente tem muita atividade, cuida desde a saúde indígena, cuida da evangelização, dos projetos educacionais, projetos sociais.
O senhor mencionou que os indígenas estão em contato a tecnologia, de que forma?
Nas aldeias mais próximas das cidades a maioria dos jovens adolescentes está com computadores e tablets. Em Dourados temos seis escolas grandes, em uma delas a nossa igreja aqui de Piracicaba construiu uma sala ampla que se tornou a biblioteca para eles. Isso foi em uma aldeia próxima da cidade de Amambai.  
O que o senhor pode nos informar sobre a Associação Presbiteriana de Filantropia de Piracicaba?
É uma atividade que é muito cara aos meus olhos e coração. Há oito anos criamos esse projeto aqui. Sou o presidente dessa entidade, que tem o Projeto Crescer como o seu projeto. O objetivo é cuidar das crianças, que as chamo de minhas crianças, portadoras de Síndrome de Down, déficit intelectual.
São quantas crianças que estão freqüentando a Associação?
Hoje são 18 crianças. Nosso projeto é manter 20 crianças. Isso no espaço que temos. Agora estamos com um desafio, ampliarmos fisicamente nossas instalações, já temos o local, o projeto aprovado, estaremos iniciando nos próximos dias a construção desse projeto. Fica no Jardim Califórnia, próximo ao Jornal de Piracicaba. Esse é o nosso desafio, um desafio para nós e para a cidade. Esse projeto é mantido por voluntários, os associados, hoje temos uma parceria com a prefeitura através da Ação Social, temos o reconhecimento como entidade de utilidade pública da cidade. O nosso alvo é nessa sede atender até 190 crianças por dia, de manhã e a tarde. Ela irá ter essa capacidade para atender por dois períodos até 190 crianças. Hoje nosso foco é trabalhar com adultos, portadores da síndrome de Down, é a nossa principal meta. É um grupo que não tem muita gente trabalhando com eles. Nosso desejo é construir essa sede nos próximos 18 meses. Já temos o apoio do Fórum local, que nos ajudou para dar um início.
Esse projeto originou-se como?
Na verdade veio de um sonho muito antigo, quando vi inclusive crianças indígenas com síndrome de Down.
Lenda ou não, há uma noção divulgada de que as crianças indígenas com síndrome de Down são sacrificadas.
Alguns são. Depende do grupo. É uma luta nossa, o articulador da lei é um presbiteriano, o pastor Henrique Afonso, deputado federal, inclusive ele e a esposa adotaram como filhos deles duas crianças indígenas que seriam sacrificadas. Há uma corrente de antropólogos que defendem esse procedimento praticado por alguns grupos, alegam que faz parte da cultura. Alguns classificam os indígenas em um sub raça e outros em uma sobre raça, uma visão antropológica equivocada onde colocam o indígena um patamar acima dos demais seres humanos.    
Aberrações dessa natureza, outras totalmente contestáveis nasce em uma das mais conceituadas universidades do país. Isso é um esnobismo pseudo-intelectual?
Não tenho como definir o porquê isso acontece. Uma das coisas que também é verdade, na preservação desses grupos nativos “in natura” é que muitos antropólogos irão perder suas fontes de pesquisas. Isso é esmurrar o vento. Vai ter um fim.
Qual é o horário do culto na Igreja Presbiteriana do Brasil – Piracicamirim?
Nossos cultos semanais é das 9:00 horas da manhã até as 10:00 horas, depois temos a Escola Bíblica Dominical, que começas as 10:10 horas até as 11:00 horas, voltado para crianças, jovens e adultos. Só que dividimos em faixas etárias para estudarmos a Bíblia em faixas etárias e a noite das 19:00 às 20:00 horas, com estacionamento próprio.
Que mensagem o senhor quer passar para o ano que se inicia?

Por natureza sou otimista, nasci com esse otimismo, tenho a fé em Deus acima de tudo, o ser humano tem grandes possibilidades a partir do seu encontro com Deus. Nesse encontro com Deus e com outro ser humano muitas coisas podem ser mudadas e transformadas para melhor.  A minha fé em Deus é que nesse encontro dos homens com Ele as pessoas se transformem e nessa transformação a sociedade ganhe pessoas melhores. Voltadas mais para o todo do que para si mesma. Temos esse momento histórico denominado pós-modernismo que levou as pessoas a uma individualização muito grande a olhar só para si, para seus próprios interesses, esquecendo do interesse coletivo. Esquecendo da esposa, do esposo, dos filhos, dos pais, esses valores judaico-cristãos foram se perdendo, muitos são religiosos, hoje há uma profusão de religiões, o que pregamos não é religião, pregamos vida com Deus, que é diferente de religião.  É comprometimento com o Reino de Deus. A igreja é uma agência do Reino de Deus, o Reino de Deus não é guerra, não é comida nem bebida, é justiça e paz. Sabemos que o futuro melhor é no Eterno, embora saibamos que podemos ter aqui novos céus e nova terra. Quero deixar a mensagem de que nunca devemos perder a esperança. A esperança não está assentada no homem, quando está assentada no homem a própria Bíblia diz “Maldito aquele que confia no homem”.  Ela diz “Abençoado aquele que teme o Senhor, ama o Senhor e espera pelo Senhor Deus”. Não significa que não devemos confiar no homem, mas sim que quando a nossa confiança esta só no homem ai nos tornamos amaldiçoados, por quê? Porque o homem é imperfeito. O homem é pecador, corrupto. Quando vemos a corrupção nada mais é do que o ser humano. Ficamos indignados, mas quando olhamos para nós mesmos percebemos que somos tão corruptos quanto. Talvez Freud explique, recriminamos o espelho. De alguma forma a gente se vê naquele espelho do corrupto que foi pego, mas poderia ter sido qualquer um de nós. Por mais que a gente queira, esses não são os meus valores, o ser humano é tendencioso a fazer isso. A única que faz a diferença nos transforma para não sermos assim é a presença de Cristo entre nós. Ai os seus valores passam a ser os nossos. Viver Cristo é diferente de viver a religião. A religião tem normas, uma série de coisas, mas o cristianismo é a Vida de Cristo. Ele não veio para vivermos os valores pregados por ele, Ele veio para vivermos a vida Dele em nós. Sermos como Ele foi. Esse é um princípio do cristão. A palavra cristão quer dizer isso, pequenos Cristos. Quando essa palavra foi introduzida pela primeira vez na Antioquia foi exatamente nesse sentido, antes eles eram chamados de “seguidores do caminho”. Eles passam a serem chamados de cristãos porque eram identificados como pequenos Cristos. Agiam como Cristo. Os que conheciam a vida de Cristo viam naqueles que passaram a chamar de cristãos, as mesmas ações. Paulo disse:”- Você também pode, nós podemos, lutarmos para sermos imitadores de Cristo”. Cristo buscou a paz entre os homens, valorizar o homem, curar suas feridas, acolhe-los em amor, arrepender do erro, quando for necessário. E Ele diz: “Vai e não peques mais!” É o caminho do arrependimento, do reencontro que muda e transforma a vida. Quando entendemos que o cristianismo é mais do que viver o que o Cristo pregou, mas viver a sua vida, então ai há esperança. Porque a nossa vida será semelhante a de Cristo. Nossas ações serão a semelhança Dele. Nosso falar, nosso agir, nosso pensar. Paulo quando escreve aos Coríntios disque “Nós temos a mente de Cristo”. É pensar como Cristo. O pensar como Cristo é olhar as escrituras, a base são as escrituras sagradas. Paulo escreve aos Filipenses quando ele diz “ – Esquecendo as coisas que para traz ficam, olho para as que estão diante mim, sigo para o alvo, todavia, andemos de acordo com o que já alcançamos.” Na medida e que ficamos remoendo o passado, as vezes pensando que o passado foi melhor, ou pior, ai ficamos vivendo no passado e do passado. Por outro lado não podemos ficar vivendo dizendo que o futuro será melhor, e vivendo desse futuro que nunca chega. Tenho que ter consciência de que o passado me ajuda a não cometer os mesmos erros. E esse olhar no futuro se torna melhor na medida em que tomo medidas acertadas no presente. Olhando as experiências passsadas para que eu não cometa os mesmos erros. Meu futuro pode ser diferente! A partir das medidas corretas que eu tome no presente. Preisamos sermos gratos por aquilo que já temos, que já alcançamos, isso em todas as áreas da vida. As vezes a gente fica mais preocupadp com o ter do que o ser, o ser é muito mais ter do que o ter. Muitos esquecem de que a gente tem, sendo. E não tendo. Conhecemos casos de pessoas da sociedade que tem muita coisa mas não são. São vazios, vivem nas angustias, nas depressões, vivem a base de diazepans, de whiskys, encontram nessa forma um refugio, um consolo, uma muleta. Mas porque não teve um encontro transformador com esse Cristo, ainda. Tem coisas mas eles não são. Outros não tem nada e são! São gente, seres humanos que nos ensinam verdades profundas. Estão muitas vezes nas periferias da vida. Creio que precisamos voltar para esses valores. A sociedade evaziou-se desses valores de um modo geral. Foram introduzindo outros valores nessa sociedade pós-moderna. Não existem mais valores absolutos, os valores absolutos são individualizados, é para você, isso não tem influência em mim, eu tenho os meus valores. Precisamos cobrar o valor comum que une um ser humano a outro ser humano a sociedade de uma forma geral para vivermos o bem comum. Vejo isso a partir dessa vida em Cristo. A minha mensagem é de esperança, olhando para um Deus que é, que em Cristo veio, que transforma a nossa vida para que sejamos semelhante a ele. Nesse ser semelhante a Ele teremos um olhar diferenciado para nós mesmos que foi o principal mandamento: “– Amar a Deus sobre todas as coisas e o proximo como a si mesmo”. Isso fará vermos como somos, seres dependentes de Deus. Dependentes uns dos outros. Nem mem melhor nem maior do que o outro. Mas que esse olhar de amor para com o outro seja esse amor que tenha essa reciprocidade que transforma para melhor, sempre. 

domingo, janeiro 11, 2015

PROFESSORA CONCEIÇÃO WALDIRA BRASIL VIEIRA JOSÉ

Sábado 3 de outubro de 2009
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
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ENTREVISTADA: PROFESSORA CONCEIÇÃO WALDIRA BRASIL VIEIRA JOSÉ

O Rotary Club congrega líderes das comunidades em que vivem ou atuam ajudando a estabelecer a paz e a boa vontade no mundo, prestam serviços voluntários não remunerados em favor da sociedade. Fundado por Paul Harris, em Chicago USA, em 23/02/1905, tem hoje representação em 207 países congregando 1.228.910 sócios. É membro permanente das Nações Unidas. Uma Assembléia Internacional de países, só tem três membros que não são países, mas que, pela sua importância, têm assento naquela Assembléia: a Cruz Vermelha, o Vaticano e o Rotary. (Fonte: Haroldo Rodolfo Zacharias, do Rotary Club de São Paulo – Leste. - Distrito 4430). O Rotary Club Piracicaba – Paulista tem como seu presidente Walmir José Rodrigues. Um dos seus diretores é Adalberto Barrichello. Em uma brilhante iniciativa, O Rotary Club Piracicaba – Paulista decidiu homenagear uma personalidade que através do seu trabalho impecável e dedicação exemplar exerceu influência de forma efetiva no aprimoramento moral e intelectual de muitos profissionais que hoje atuam não só em Piracicaba, mas também muito além de nossos limites geográficos. Agraciada pelos méritos dos seus excelentes serviços prestados, tem uma presença marcante, profissionalismo incomum, e que de forma indelével marcou a trajetória dos seus mais de 10.000 alunos. Trata-se da Professora Conceição Waldira Brasil Vieira José, a Da. Conceição, assim que todos a chamavam durante as aulas.
Professora Da. Conceição, onde a senhora nasceu?
Sou filha de Mario Vieira que pertencia á família tradicional de Capivari, minha mãe é Zoraide Brasil Vieira, sou nascida em 29 de setembro, na parte central de Piracicaba, na Rua Santa Cruz.
A senhora foi a única filha do casal?
Tenho a minha irmã Clélia, também professora, hoje aposentada, e meu irmão Waldemar formado como engenheiro agrônomo e que reside em Fernandópolis. Meu outro irmão é o Dirceu, também engenheiro agrônomo e que mora em Limeira.
Qual era a atividade do pai da senhora?
Ele trabalhava na Companhia Telefônica e mamãe era professora primária, lecionava em Taquaral. Primeiro ela foi lecionar em Itu, em uma linda fazenda.
Seus primeiros estudos foram feitos em que escola?
Comecei fazendo o jardim de infância no Assunção, em seguida fui estudar com a minha tia Hermantina Brasil. A minha primeira professora, foi a minha mãe. Pela pouca idade, eu era considerada como ouvinte, até que o inspetor resolveu me matricular na escola. De lá saí e fui para o Sud Mennucci. Depois fui para o Assunção outra vez.
A senhora conheceu Thales Castanho de Andrade?
Ele era amigo do meu tio. Tive aula com Benedito Dutra, Seu Rossini.
O que a levou a seguir a carreira de professora?
Foi por influencia do meu tio Dario Brasil. (N.J. Advogado e professor de latim, Dr. Dario Brasil foi o primeiro presidente do Centro Cultural e Recreativo Cristóvão Colombo de Piracicaba.) Ele que me levava ao seu escritório e fazia ler as lições em latim. Isso me motivou a ir estudar Letras na Pontifícia Universidade Católica em Campinas, onde tive um grande professor de latim, Francisco Ribeiro Sampaio.
A senhora é uma das poucas professoras que na época cursaram uma faculdade?
Daqui era eu e a Maria Tereza Coelho, que atendeu a um convite que fiz á ela.
Durante o período em que estudou na PUC em Campinas, onde a senhora residia?
Morava no Pensionato Nossa Senhora de Lourdes. Por quatro anos freqüentei a faculdade. Já que eu saí de lá prestei o concurso para lecionar, quem fez a escolha do local onde eu iria dar aulas foi o Sr. Luiz Schimidt, que foi até São Paulo, levando uma procuração minha autorizando-o a escolher a localidade. Acho que ele gostou do nome Santa Rosa de Viterbo e escolheu lá. Uma cidade boa, gente muito acolhedora. Permaneci por uns três anos em Santa Rosa do Viterbo. Nessa época saiu à relação de vagas em Piracicaba, e uma das cidades com vaga disponível era Porto Feliz. Meu tio Dario Brasil disse: “Porto Feliz é um porto feliz! Meus antepassados nasceram lá, gostaria que você escolhesse essa cidade”. Eu disse-lhe: “– Eu não gostaria!”. Na verdade eu não queria sair de Santa Rosa de Viterbo. Para agradar o padrinho, escolhi Porto Feliz. E foi meu porto feliz! Lá eu permaneci mais tempo, eu sempre gostei de lá!
Antes de ir lecionar em Santa Rosa do Viterbo, por indicação do Sr. Mello Ayres, eu fui dar aulas no Externato São José, que funcionava no prédio onde mais tarde foi a Faculdade de Odontologia. Quando eu estava subindo as escadarias logo na entrada, uma irmã disse-me que eu era ainda muito criança para lecionar. Eu disse-lhe: “- A senhora é tão jovem e já é diretora!”. Não sei de que forma ela resolveu o assunto, mas passei a ser professora da escola.
Por qual motivo Porto Feliz a conquistou?
Achei o Jamil! Foi lá que eu conheci o Jamil. Ele tinha um sistema de alto falantes. Depois ele mudou-se para Aparecida, onde ficou por vários anos.
Como foi o seu encontro com o Jamil?
Foi bonitinho! Éramos várias professoras que morávamos em uma casa, na rua principal, inclusive a Professora Flordelis morou lá. Havia um restaurante quase em frente a nossa casa, nós tomávamos nossas refeições lá. Tínhamos uma empregada que cuidava da casa. Era uma casa grande de uma senhora que a repartiu e alugou metade para nós. Na frente morava uma família de sírios. Muitos amigos dessa família iam visitá-los. O Jamil José Neto era parente dessa família, um dia ele veio de Aparecida. Foi assim que o conheci.
Assim começou o namoro, conforme as regras da época, que eram bem rígidas?
O Jamil morava em Aparecida, aos sábados eu vinha para Piracicaba. Casamos depois de um ano.
O que a impressionou mais no Jamil, a voz ou a aparência física?
O coração dele!
Onde foi o casamento?
O casamento civil foi em Piracicaba e o religioso na Basílica de Aparecida do Norte, o celebrante foi o Padre Galvão, do mesmo ramo da família de Frei Galvão. Foi um casamento muito bonito, obedecendo aos rigores da liturgia.
A senhora sentiu-se realizada?
Eu me senti realizada. Digo sempre ás crianças (filhos), que eu tive uma infância feliz, meus pais era muito bons, adolescência também, embora tenha ido muito nova para Campinas, de 15 a 16 anos de idade.
Para a época a senhora era destemida?
Eu era porque o meu tio Dario dizia que se tinha idade para fazer o curso deveria fazer, se não tinha idade iria fazer o curso do mesmo jeito! Ele providenciou a minha emancipação para que eu pudesse estudar.
Em Aparecida do Norte a senhora permaneceu quanto tempo?
Por dois anos aproximadamente. A seguir vim para Piracicaba, lecionei no Sud Mennucci, substituindo meu tio Dario Brasil. Depois prestei concurso, passei, e escolhi o Colégio Dr. Jorge Coury, que funcionava no prédio ao lado da Igreja dos Frades. Depois de uns meses chegou o Seu Arlindo Rufatto como diretor.
A senhora é uma das pioneiras do Colégio Dr. Jorge Coury?
Acho que das professoras efetivas devo ser.
O Diretor Arlindo Rufatto era muito rígido?
Era sim. Eu gosto disso, acho que precisa para andar tudo na linha. Comecei lecionando para a quarta série, depois passei a dar aulas para o colegial, e assim sempre dei aulas no colegial.
A senhora tem noção de quantos alunos já teve?
Eu tinha as anotações com o nome dos alunos, mas na mudança de residência extraviou-se. Cada classe tinha em média quarenta alunos, eram várias turmas, eu lecionava de manhã e a tarde, quarenta anos trabalhando, eu acredito que foram mais de 10.000 alunos.
Como era a relação da senhora professora de português com o seu marido Jamil que sempre trabalhou na área de comunicação?
Interessante! Eu admirava no Jamil a sua capacidade de se expressar muito bem, falava muito bem. Ás vezes ele titubeava um pouco quando escrevia. Mas como ele falava bem!
A senhora ficava ouvindo-o?
Eu ficava! Eu gostava muito do programa que ele apresentava na rádio em Aparecida. Era música ao entardecer. Esse programa eu ouvia desde Porto Feliz.
A senhora morava em Porto Feliz e sintonizava o Jamil Neto transmitindo pela rádio em Aparecida do Norte?
Era isso. Só que não éramos casados ainda.
Ele dizia-lhe algo no ar, durante as suas transmissões?
Quando ia a algum lugar longe ele dizia sim.
Era do seu agrado as narrações de futebol feitas pelo seu marido Jamil Neto?
Eu gostava muito, achava que ele narrava muito bem.
Ele torcia para que time?
Ele torcia pelo Palmeiras e eu pelo São Paulo. Cheguei a visitar o Maracanã.
E carnaval a senhora gostava?
Ah! Carnaval! Gostei de carnaval, dançava. O Jamil foi diretor da escola de Samba Equiperalta, juntamente com meu irmão Dirceu, mais tarde foi diretor da Zoom-Zoom.
Alguns dos seus alunos eram orientados para se apresentarem em público?
Tenho muito a agradecer ao Dr. Jairo Ribeiro de Mattos, eu levava os alunos para apresentarem peças no Lar dos Velhinhos. Acredito que isso ajuda a educar. Ele foi muito atencioso, colocou o Lar a disposição para levar os alunos para as apresentações. Há pouco tempo recebi a visita de uma aluna que mora em uma cidade do sul do país, ela não sossegou enquanto ela não fez uma apresentação na cidade onde reside da peça Os Saltimbancos. Isso de tanto que ela gostou quando se apresentou no Lar dos Velhinhos.
Seus ex-alunos a visitam muito?
Após a minha mudança de residência diminuiu o número de visitas, acredito que seja por não conhecerem o meu novo endereço. Gosto de receber os amigos.
Nos dias atuais, lecionar em algumas escolas tornou-se uma tarefa quase impossível, o que mudou?
Acho que um pouco da culpa é dos pais. Eles não ensinam aos filhos que devem respeitar o professor, sobre a necessidade de estudar direitinho. Isso vem do berço, as famílias têm que amparar as suas crianças. Estabelecer liberdade com limites.
Qual é a visão da senhora sobre as mudanças gramaticais?
Sinceramente só li o comentário de um professor dizendo que essas mudanças foram desnecessárias.
Temos uma figura pública de grande destaque, que em suas falas comete erros grosseiros, isso é reflexo da cultura popular?
Em parte sim. Mas acho que também depende da própria pessoa. Se eu ocupo um cargo importante eu tenho a obrigação de me preparar para exercê-lo.
O brasileiro gosta de ler?
Infelizmente não. Eu sempre fiz meus alunos lerem, para despertar o costume da leitura.
Os jovens atualmente preocupam-se em comunicarem-se em mais de um idioma, motivados pela concorrência profissional. Alguns não conhecem o próprio idioma. É uma atitude sem sentido?
Acho que devemos trabalhar primeiro a nossa língua. Tem alguns dizendo “Nóis vai” e depois falam inglês! Será que os naturais de outros países fazem isso por lá? Tive vários correspondentes quando estava na faculdade, inclusive uma do Hawai, o nome dela era Eisel, ela escrevia alguma coisa em português e não errava. Falta dedicação de nossos alunos.
Quem são seus autores brasileiros prediletos?
Primeiro Machado de Assis. Tenho outros. Em cada autor encontro alguma coisinha. A leitura faz com que o leitor imagine os personagens e dê vida á eles.
O livro é sempre melhor do que o filme?
O livro é melhor! Tem que fazer a imaginação trabalhar.
Dizem que a língua portuguesa é complexa para quem não a conhece, a senhora concorda?
Eu acho que sim. Realmente é uma língua difícil, mas é tão bonita! Um autor que eu sempre admirei foi Camões, o professor exigia que lêssemos Os Lusíadas.
Lembra-se de um trechinho?
“As armas e os Barões assinalados / Que da Ocidental praia Lusitana”, e ai vai! Gosto do episódio da Inês de Castro, Adamastor. Para mim Camões foi o autor completo. Ele conhecia bem a métrica, para fazer aquelas rimas, conhecia bem o português, conhecia geografia, história, conhecia a humanidade. Eu sempre admirei Camões.
A senhora tem algum hobby?
Até pouco tempo me apaixonei pelas orquídeas. Adoro mexer com plantas.
A senhora gosta das novelas transmitidas pela televisão?
Geralmente não assisto. Quando passou a novela “Caminho das Índias” eu assisti, achei muito interessante.
A senhora sempre foi considerada uma professora “linha dura”, qual sua visão a respeito?
Eu tinha prazer em ensinar, e ficava feliz quando o aluno se interessava pela matéria. Tive excelentes alunos.
O que a senhora acha dos autores Jorge Amado e Paulo Coelho?
Uma vez eu estava na biblioteca do Colégio Jorge Coury, juntamente com a professora Bernadeth Balás, chegou uma professora e disse para ela: “Porcaria esses livros aqui! Isso para “O Tronco do Ipê” de José de Alencar, outro era “O Guarani”, do mesmo autor. Eu disse-lhe: “- Você já escreveu algum livro?”Ela respondeu: “-Não!”Eu falei: “Eu também, nunca escrevi um livro, mas como gostaria de escrever! Se eu tivesse um pouquinho do José de Alencar, seria tão bom!”. Acho que se a gente não é capaz de escrever um livro de tal monta, não deve criticar.

sábado, dezembro 27, 2014

JULIA SIMÕES LOURENÇO


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 20 dezembro de 2014.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/



ENTREVISTADA: JULIA SIMÕES LOURENÇO


Julia Simões Lourenço é filha de Walter Ribeiro Simões e Sonia Terezinha Rodondo.  O médico Walter Ribeiro Simões tem dois irmãos, tios de Julia, que são muito conhecidos pela população piracicabana, os professores Newman Ribeiro Simões e Douglas Ribeiro Simões. Julia nasceu a 17 de junho de 1977, em Campinas, tem os irmãos Fernanda e Manoel. Casada com o médico André Luiz Gervatoski Lourenço, médico hematologista e diretor clínico da Santa Casa de Misericórdia de Piracicaba. Julia Simões tem a formação universitária em publicidade e propaganda realizada na UNIMEP, formada na turma de 2002. Julia e André têm duas filhas: Clara e Sofia.

Seus primeiros estudos você fez em qual escola?

Estudei em Campinas em vários colégios, mas sempre estaduais ou municipais. Quando tinha de onze para doze anos mudei-me para São Pedro. Foi um período maravilhoso, o fato de ser uma cidade menor proporcionou uma qualidade de vida superior a de um grande centro. Na minha pré-adolescência e adolescência íamos até a praça central, ficávamos até altas horas tocando violão. Ia fazer serenata. Havia muita liberdade. Em São Pedro estudei na Escola Gustavo Teixeira até a oitava série. Os três anos de colegial fiz na Escola Estadual José Abílio de Paula – JAP. Aos treze anos eu comecei a cantar em uma banda sertanejaa “Sela de Prata”, eles me chamaram para participar, eu fui, apesar de ter crescido ouvindo Caetano Veloso, Gal Costa, Beatles.

Quantos componentes tinha a banda “Sela de Prata”?

Era uma banda pequena, tinha mais um vocalista. Na época estava estourada a música “Nuvem de Lágrimas”. Tocava-se muito “Adeus Paulistinha”. A minha escola de música foi na prática, cantar em bailes, em palcos, fazer barzinho. É uma formação que eu não indicaria para a minha filha por exemplo. Para mim foi uma escola, mas acho muito importante esse contato com uma faculdade de música, que dê uma formação musical de natureza mais acadêmica.

Qual é a classificação da sua voz?

Se for classificar a tessitura (Disposição das notas musicais, para se acomodarem a certa voz) é  Mezzo Contralto. Tenho um alcance que é do contralto, embora pegue um pouco do soprano não é soprano, por isso é denominada mezzo.

Você toca algum instrumento?

Toco violão e estou apendendo a tocar piano. Não sou por definição uma instrumentista, em alguns shows me acompanho, toco algumas músicas.

Com que idade você começou a cantar profissionalmente?

Sempre cantei, desde muito pequena, tenho gravações cantando aos quatro anos de idade. Acredito que tem uma grande influência dos meus pais. Meu pai apesar de médico sempre tocou violão, sempre foi autodidata. Meu tio Douglas sempre tocou piano. Meu tio Newman não toca nenhum instrumento, mas sempre se envolveu na parte de produção, direção. Aos treze anos A minha avó materna, Emília Canhada, foi cantora de rádio. A minha avó paterna é descente de italianos, meu bisavô veio da Itália, é da família Maurutto. Da parte da minha mãe tem a origem espanhola, que originalmente era Rotondo e foi aportuguesado para Rodondo.

Você já se deu conta de que é um nome muito forte no meio musical de Piracicaba?

Acredito que sou conhecida pelo trabalho que desenvolvo. No início diziam; “A Julia, sobrinha do Douglas, do Newman!” Alguns até achavam que eu era filha de um deles Acredito que ao longo dos vinte anos que estou em Piracicaba fui construindo a minha carreira.

A Primeira Casa de Noel teve a sua participação que foi marcante!

Participei também da Segunda Casa de Noel. Neste ano de 2014 foi comemorado os quinze anos de Casa de Noel, o Bruno (Chamochumbi) me chamou, tive uma participação na noite em que ele fez uma apresentação especial.

Em São Pedro você morou até que idade?

Até os dezessete anos quando vim à Piracicaba fazer o cursinho. A princípio eu ia prestar o vestibular para medicina. Morei algum tempo com a minha avó paterna, outro período dividi um apartamento com uma amiga, e depois fiquei com a minha avó por dez anos. Quando eu estava fazendo cursinho, o dono da cantina do cursinho, o Santão, era músico percursionista, tocava na Banda Opus, fazia parte do espetáculo “Falando da Vida”. O Santão disse-me: “- Julia estão precisando de uma cantora no estúdio, você não quer fazer um teste para fazer jingle?”. Fui, adorei, comecei a ir sempre. Nesse meio tempo fui convidada pelo Souza para fazer parte da Banda Opus. Tudo isso no comecinho, isso foi em 1995. Foi então que decidi: “- Não tem nada a ver eu fazer o curso de medicina! Tem que ser alguma coisa próxima da música, da comunicação!”. Como eu queria ficar em Piracicaba, se fosse fazer música teria que ir para Campinas, iria estudar na Unicamp. Decidi ficar em Piracicaba, fui estudar publicidade, que achei que tinha o perfil do que eu queria fazer. Estava dentro da área que eu queria trabalhar, produzir jingle, coisa que faço até hoje, sou produtora de jingle. Trabalho com estúdio há 20 anos. As últimas campanhas políticas, as duas do Barjas Negri, do Gabriel Ferrato, do Machado antes do Barjas eu tinha feito. Componho as musicas e produzo.

Além de jingles voltados à política você faz outros, de cunho comercial?

Faço muitos! Fiz da Unimed, Amhpla, Drogal, Farmavip. Componho a letra, a música, locução. Faço toda parte de produção e execução também. Trabalhei dois anos na Rádio 92 FM e dois anos na Rádio 97 FM. Foi no período em que estava cursando a faculdade. Da uma hora da tarde até as cinco horas da tarde eu apresentava um programa ao vivo. Eu seguia a programação da rádio e dentro do meu horário tinha alguns quadros. Do tipo “De Coração para Coração”, que manda recadinhos, fazia tradução de música. As pessoas gostavam! Por dois anos fiquei na rádio 97 FM, o estúdio era em Águas de São Pedro, viajava todos os dias de segunda a sexta-feira.

Isso não a motivou a continuar trabalhando em rádio?

Eu adoro rádio, tenho vontade de ter um programa, mas que seja um programa meu, que eu possa desenvolver fazer uma programação das coisas que eu gosto de ouvir, que os meus ouvintes curtissem. Na época em que trabalhei em rádio fazia a programação da rádio, já era uma programação fechada, eu não intervinha em nada. Às vezes quando eu ficava sozinha na rádio, meu diretor, o Mário Cesar, até ligava dizendo; “- Julia, eu não me lembro de ter colocado essa música!”. No finalzinho da programação eu soltava uma música que eu estava a fim de ouvir! Mudava a programação!

Quando alguém encomenda-lhe um jingle é feito um estudo e uma analise do perfil do cliente e do objetivo a ser alcançado?

Quando chega para mim já vem através de uma pessoa ou agência que está cuidando da campanha. Passam-me o perfil, um briefing (conjunto de informações). Não tenho uma regra para compor, as vezes vem uma melodia, as vezes vem logo de cara o refrão da música, tem coisas que eu pego e escrevo a letra, a música vem depois. O segredo é gostar do que faz e as coisas fluem naturalmente.  Das minhas gravações em CD, um deles, que fiz com meu tio Douglas, demoramos quase 15 anos para aprontá-lo. São CDs independendentes, não há nenhuma gravadora patrocinando. Há uma grande preocupação com o arranjo, com a letra. É uma coisa bonita, artística, sem a pretensão de realizar venda em massa. Seria demagogia da minha parte dizer que não tenho o sonho de uma música minha entrar em uma novela. Lógico que gostaria de ser reconhecida, da minha música “estourar”. Não com o objetivo financeiro, mas sim como divulgação do meu trabalho. Sou conhecida em Piracicaba, talvez um pouco na região. Mas essa coisa de nacional, mundial, depende de uma estrutura de grande alcance.

O que simboliza a música para você?

A musica para mim é mais do que profissão. A musica está presente no riso das minhas filhas, na alegria de escolher uma trilha sonora para estar com os amigos, para mim a música está sempre presente. Em um batizado feito em minha casa chamei a Banda Décadas para tocar, a música tem esse poder de unir as pessoas. Independente de idiomas. Estive recentemente em São Francisco (Estados Unidos), pude ver de tudo na rua, vários artistas se apresentando na rua, cantora lírica cantando na rua, todo mundo parando para ver. Outro só tocando bateria, muita gente parando para assistir. Muitas vezes cantando em uma lingua que você nem entende, mas aquilo te toca de alguma forma. Fui a uma casa de jazz. Adoro jazz. Por dois anos cantei em uma casa de jazz em Campinas. Cheguei a participar de alguns eventos do Traditional Jazz Band quando vieram a Piracicaba, através do José Fernando que toca jazz manouche através do Hot Club. Partiipei do Primeiro Festival de Jazz de Águas de São Pedro, fui convidada pelo Paulo Caruso. Participei de alguns festivais, um deles foi em Americana, em 2007, com uma música do meu tio Douglas: “Vida e Amor”. Ganhei em primeiro lugar como interprete. Neste ano de 2014, no final de agosto e inicio de setembro, ganhei como melhor interprete no Festival de Tatuí, no evento “Certame da Canção”. A música ganhou em quarto lugar. Ganhei também um prêmio de Aclamação Popular com essa mesma musica Cantiga pra Mariana, do CD Julia Canta Douglas Simões, “Tempo de Delicadeza”.

Você está lançando um CD?

É o “Sombra e Luz”, gravei com Marcos Cavalcante, que era de Piracicaba, mora ha mais de 10 anos nos Estados Unidos, é doutor em música, foi diretor da Faculdade de Música da Unicamp, todas as composições desse CD são dele, gravamos esse CD no final de 2012,foi lançado no começo do ano e agora no final do ano saiu no iTunes.

Você é casada com um profissional que tem uma atividade completamente diferente, como é a convivência de vocês?

É otima! Ele me conheceu cantando. É o meu maior incentivador, me apoia. Apesar das nossas profissões serem diferentes, tem uma coisa em comum, cada um da sua forma cuidam do ser humano. No caso dele cuida da saúde fisica, e eu imagino que a musica cuida da saúde espiritual, da saúde emocional, que é muito importante.

No seu ponto de vista a pessoa que canta esá tratando da sua própria saúde?

Acho que sim! A música em si deixa a pessoa mais leve. Isso faz bem.

Alguns artistas de renome envolveram-se com estimulantes químicos, criando dependência, sendo que alguns até faleceram precocemente. O que os levou a isso , sob seu ponto de vista?

Logo depois que saio do palco levo algum tempo para baixar a minha adrenalina. Quando nos apresentamos ficamos em uma excitação, em uma euforia. É natural que algumas pessoas acabem procurando algum subterfúgio no alcool ou em alguma droga, que relaxe, acalme, estabilize. A coisa acaba virando um habito. Quando você está no palco não é só o cantar, você tem que lidar com muitas situações que estão envolvidas naquele momento. Você fica a berto a muitas coisas, ai tem quem acredite em vibração, energia. O artista acaba virando uma esponja, vem todo tipo de vibração, de energia.

Voce tem idéia de quantas músicas você já compos até hoje?

Isso é uma particularidade, eu não sou compositora de música! No CD “Novos Ares”até tem duas músicas minhas. Compus poucas musicas. Eu consigo compor músicas por encomenda. Por isso eu faço jingle!

Isso é uma característica rara!

Tenho facilidade para isso. Não consigo sentar e dizer: “-Ah! Vou compor uma música!”. Preciso ter um tema, alguns elementos.

Você já chegou a fazer aquele jingle tipo “voz de aeroporto”?

Já! Na verdade faço muito o que é denominada de URA - Unidade de Resposta Audível. A entrada da Santa Casa usa a minha voz quando diz: “Insira o seu cartão de estacionamento!”. Faço para bancos: “-Você ligou para Banco Tal”. Devo ter feito mais de 600 jingles, com certeza.

É uma área rentável?

Em Piracicaba eu trabalho bastante, possivelmente em São Paulo o retorno financeiro seria bem mais expressivo. Outra atividade que tive foi a dublagem, trabalhei muito tempo nessa área. Existia em Piracicaba um estúdio de dublagem, eles mudaram para São Paulo. Era de uns argentinos que moravam em Piracicaba.

Você arquiva os jingles que faz?

Tenho muita coisa arquivada, mas tem muita coisa antiga que acabei perdendo. Graças a Deus tenho meu pai e minha irmã que me ajudam nessa parte de arquivar. Há um CD que gravei em São Paulo com uma banda de forró, a Buxixo, eu não tenho esse CD, meu pai tem! Meus CDs de demonstração que gravei antes de lançar os CDs oficiais  não tenho.

Normalmente você grava em Piracicaba ou fora daqui?

Meu último CD gravei em Piracicaba, na Som Mix. O CD Novos Ares eu gravei em Campinas, isso porque queríamos gravar ao vivo, para gravar a banda ao vivo tinha que cada um estar em uma sala separada, para gravarmos, mas se por ventura alguém errasse alguma coisa depois refazia só aquele instrumento, não precisaria gravar todo mundo novamente. O único estúdio que tinha e podia realizar esse tipo de gravação era em Campinas. Em Piracicaba temos um estúdio maravilhoso, do Rogério Chiarinelli, baterista. Foi onde gravei meu mais recente CD.

Você faz regularmente shows ao vivo?

Muitos! No final do ano recebo muitos convites para realizar shows em eventos corporativos. Durante o ano além dos shows dos meus CDs, do “Falando da Vida” que tem uma vez por ano, faço mais eventos fechados: aniversários, casamentos. Tanto a cerimônia como a festa do casamento, tenho uma banda para isso. Entre a noiva chegar e o término da festa são quase três horas de música.

Você tem alguma novidade para ser lançada brevemente?

Junto com uma amiga estamos fazendo em parceria um CD infantil, tenho a pretensão de lançar no próximo ano, já temos a maior parte das músicas prontas.

Qual foi o fato mais inusitado que você realizou ou presenciou em alguma de suas apresentações?

Já fiz muita coisa, desde voz de violão onde me apresento com Otinel Aleixo, o Legal, que é muito conhecido, dá aulas. Temos um projeto muito bacana, no próximo ano já estou desenvolvendo um aplicativo para celular, é o “Julia Legal à La Carte”. As pessoas têm o habito de pedir musica, pensando com o meu marido, imaginamos em desenvolver um cardápio com as músicas que a gente faz, dividido por estilo musical, e as pessoas pedem a musica dentro do repertório que a gente faz. É tanta música às vezes a pessoa fica com vergonha de pedir. A idéia é a pessoa pedir a musica partir do seu celular, e já vir o pedido no meu iPad durante o show. A meu ver fica interativa, dinâmica. Dos muitos acontecimentos interessantes, teve um casamento em que o noivo era fã incondicional de Elvis Presley, todas as músicas da cerimônia era uma música do Elvis. Cantei. Foi muito legal. Sou muito fã da Rita Lee, em 1999 ela veio à Piracicaba, descobri em qual hotel ela estava, fui até lá, levei flores, um CD de demonstração. Escrevi uma carta enorme para ela, onde dizia que era sua fã, tinha o sonho de cantar uma música com ela. Fui ao show dela, e ela em determinado momento disse: “Queria chamar ao palco a Julia Simões que é uma cantora da cidade”. Cantei, junto com a Rita Lee. Foi muito legal. Abri show para muita gente: para Ana Carolina, já cantei com Seu Jorge , com Alcione, em um carnaval da Revista Vogue, em 2006.

Você é carnavalesca?

Atualmente não. Gostava muito quando morava em São Pedro, tinha essa coisa de bloco, a gente saia para a rua mesmo, era carnaval de rua. Já cantei muito em carnaval.  Em 2008 eu até cantei em um carnaval em que a prefeitura de Piracicaba me contratou.

Como artista e mãe de duas filhas, qual é o seu ponto de vista sobre musicas que a mídia divulga sem critério algum, influenciando crianças sem capacidade de analise e julgamento? 

Filtro muito o que eu ouço, o que ponho na televisão. Por mais que você proteja é impossível colocar um filho em uma redoma de cristal. Eu acredito muito na orientação, na educação, da minha parte vou mostrar o que é bom. Acho que a decisão deverá ser dela. A partir do momento que disser: “– Eu proíbo....” é o momento em que irá incentivar. Isso com tudo, não só com a música.

O sucesso a qualquer preço e a formação cultural prolifera essas aberrações musicais?

Muito do que é tocado em rádio tem pura motivação comercial. A partir do momento que passa a serem tocadas essas coisas, o ouvinte passa a consumir esse tipo de cultura. Acho meio utópico querer que o consumo aqui seja o mesmo da Europa, onde em  qualquer praça tem musica clássica sendo executada. Há dez anos eu me apresento com a Orquestra Filarmônica de Rio Claro, temos um projeto muito interessante que é MPB em Concerto. A minha parte eu procuro fazer, acho que cada um tem que fazer a sua. Procuro mostra isso para as minhas filhas.

Qual é o endereço do seu site?

juliasimoes.com

MARIA LAURA COSTA AGGIO


PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 20 dezembro de 2014.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/

ENTREVISTADA: MARIA LAURA COSTA AGGIO

 

 Maria Laura Costa Aggio nasceu a 1 de junho de 1946, na cidade de Pirassununga,  é filha de João Aggio Neto e Hermínia Costa Aggio, que tiveram também os filhos João Carlos e Carlos Alberto.  Seu pai era desenhista do hoje IBAMA, antes denominado Superintendência de Pesca (Sudepe), ele ilustrava livros técnicos de piscicultura. Era um verdadeiro artista, reproduzia com perfeição todas as espécies e evoluções de peixes existentes no Brasil. Eram ilustrações feitas a “bico de pena”, que permite aos artistas usufruir facilmente do chamado "efeito fino-grosso" do traço.  A letra existente na famosa “Caninha Pirassununga” é obra dele, foi ele quem fez o primeiro rótulo da famosa aguardente “51”. Além de excelente artista era também advogado, concluiu a faculdade com 59 anos. Maria Laura casou-se com Paulo Hyppolito de Oliveira em 1 de novembro de 2007.

Em que escola você estudou em Pirassununga?

Estudei no Instituto de Educação Pirassununga, desde o grupo escolar até o Curso Normal, o hoje denominado magistério. Formei-me como professora.

Pirassununga na época era uma cidade relativamente pequena?

Era uma cidade relativamente pequena, mas dotada de instituições reconhecidas não só no Brasil como no exterior. Em 1971 a Academia da Força Aérea (AFA) foi transferida para suas novas instalações em Pirassununga, município que reunia as melhores condições de clima e temperatura de todo o país para a prática de atividades de instrução aérea. da Força Aérea (AFA). Em Pirassununga está o 13º Regimento de Cavalaria Mecanizada ou Esquadrão Anhangüera, aprendi a nadar no quartel, não havia outra piscina na cidade. O meu pai tinha excelentes relações de amizade com os oficiais que nos convidavam para nadar. Aos dois anos de idade aprendi a nadar nessa piscina. Papai e mamãe gostavam muito de natação, fizeram a travessia de São Paulo a Nado, na época da Maria Lenk (Maria Emma Hulga Lenk Zigler principal nadadora brasileira, a única mulher do país a ser introduzida no Swimming Hall of Fame, em Fort Lauderdale, Flórida). Meus pais eram amigos da Maria Lenk.

Como era essa Travessia de São Paulo a Nado?

Era no Rio Tietê. Eles nadavam em uma piscina de madeira dentro do Rio Tietê. A Travessia de São Paulo a Nado era o mais badalado evento esportivo do rio e chegou a reunir 1.900 atletas. O Clube não tinha piscina. Para treinar seus nadadores e jogadores de pólo aquático, o clube, mandou fazer uma 'piscina' de 25 metros de cumprimento por uns 10 de largura. A 'piscina' consistia em dois pontões de ripas de madeira ( mais  ou  menos de 10 cm de largura e 10 metros de cumprimento, formando um retângulo). Em baixo desse pontão eram colocados tambores vazios de óleo de 200 litros. Com isso, os pontões flutuavam à beira do rio, em uma distância entre eles de 25 metros. Entre os pontões eram colocadas raias dando a impressão perfeita de uma piscina de concreto. Ali treinavam seus nadadores e jogadores de pólo aquático.
Para os sócios havia duas 'piscinas' que eram feitas da seguinte maneira: construíram uma espécie de gaiola com 1,20 de profundidade com beiradas que formavam uma espécie de corredor.  Era um retângulo de 15 metros de cumprimento, 10 de largura e 1,20 metros (uma) e 1,80 metros (a outra) de profundidade com ripas que tinham cerca de 10 centímetros de largura e deixaram um espaço entre elas para que a água entrasse. Os corredores eram feitos de tábuas que ficavam juntas umas às outras, formando um passadiço (abaixo desses passadiços eram colocados tambores vazios).
O fundo da 'piscina' era também de ripa. Essa piscina era feita de ripas de madeira e tábuas nas beiradas formando corredores em volta. Duas dessas 'caixas de sapatos' enormes eram colocadas à margem do rio e nelas, os sócios nadavam e brincavam.

Você chegou a nadar no Rio Tietê?

No Tietê não, competi em natação por uns cinco anos. Medalhas de ouro devo ter umas trinta. Minha mãe tinha muitas medalhas que conquistou na natação, ela e papai nadaram muito com Maria Lenk. Eles eram sócios do Clube Tietê moravam em São Paulo. Meu pai nessa época trabalhava no bairro Água Branca. Depois foram morar no Rio de Janeiro, em 1941 eles estava morando lá, na Praia de Icaraí, em Niterói, meu pai trabalhava junto ao entreposto de pesca. Após permanecer um tempo no Rio de Janeiro meu pai foi transferido para Pirassununga que foi quando nasci.

Até que idade você morou em Pirassununga?

Até uns 22 anos. A diversão dos jovens era “quadrar o jardim”, a rua do comércio era a Rua Duque de Caxias, Rua XV de Novembro.

Como eram os desfiles comemorativos a 7 de Setembro em Pirassununga?

Meu irmão Carlos Alberto era o instrutor da fanfarra. Eu era baliza. Isso no Instituto de Educação Pirassununga. Nessa época eu estudava balé com a Dona Muni, uma alemã. Como baliza eu dava salto mortal no quarteirão inteiro, durante o trajeto, a luva branca em pouco tempo já estava negra. Nos aniversários de cidades vizinhas como Leme, Araras, Porto Ferreira, nós íamos desfilar. Era uma fanfarra grande, muito bonita, toda uniformizada. Eu usava um tênis branco e uma polainazinha. Desfilei dos onze aos quinze anos.

Você participava dos bailes de carnaval?

Sempre ganhava premio, na maioria das vezes prêmio de originalidade. Minha mãe entrava no “quarto dos milagres”, aquele quarto onde guardamos um pouco de tudo, aos oito meses eu já estava fantasiada de Carmem Miranda, com tamanquinho de cortiça. Outro dia fui de coelhinha. Fui premiada! Ia no colo da minha mãe. Naquela época não havia carros alegóricos, tínhamos o chamado corso. Isso tudo ocorria dentro do Clube Pirassununga, onde inclusive papai foi presidente por duas vezes. Depois fui fantasiada de Marilyn Monroe, minha mãe desfiou fez a tanga, o bustiê, tudo com saco de estopa. Ganhei em primeiro lugar na categoria originalidade. Eu tinha uns sete anos, era loirinha. Outra ocasião fui fantasiada de Nega Maluca. Ganhava sempre na categoria originalidade. Eu gostava muito de dançar nos bailes de carnaval. A última fantasia que usei foi de múmia, meu pai tinha um mosqueteiro que usava quando viajava para o Mato Grosso, cortei em tiras largas, fui para o clube, toda enfaixada, tive que ir em pé, a sorte é que sou baixinha, o carro que me levou era um fusca! Por baixo eu estava com um pijama, era um calor insuportável, tomava líquido (água, refrigerante) através de um canudinho. Foi uma fantasia bem original, ganhei em primeiro lugar!

Os jornais publicavam?

Acho que nem tinha jornais em Pirassununga ainda, as fotografias ficavam expostas no próprio clube. Participei de bailes de carnaval até os meus 18 anos.

Para externar essa animação e alegria toda, você ingeria algum tipo de bebida alcoólica?

Nunca bebi nada de álcool. Na época era permitido o uso de lança-perfume, nunca utilizei esse tipo de estimulante. Alguns inalavam propositadamente e tinham paradas cardíacas. A minha alegria era espontânea! Eu acho que é uma injuria muito forte à Deus o uso de estimulantes, ele já nos deu o dom de sermos alegres. Se sentir-se constrangido em pular carnaval então não vá! Antigamente havia um grande respeito em bailes de carnaval, as famílias acompanhavam os filhos. Com o passar do tempo as coisas foram mudando. Perdi o entusiasmo em participar de bailes de carnaval.

Você tinha alguma atividade artística além do balé?

Pintei várias telas, cheguei a expor aqui no Clube Cristóvão Colombo, em Piracicaba,  onde sou sócia remida. Toquei piano por uns dez anos, hoje toco teclado. Tive aula coma a Cecília Belatto. Quando morei em Campo Grande quando íamos aos restaurantes almoçar ou jantar tinha aqueles conjuntos com artistas tocando harpa paraguaia, dois violões, contrabaixo. Havia também o Baile do Grito e o Baile do Fazendeiro. No meio do baile aquela harpa paraguaia! Davam uns gritos melódicos. Aquilo é típico de Campo Grande!  Dançava-se muito. Aqueles fazendeiros de terno, com a mão calejada da lide no campo. Tinha um deles que era conhecido como Zé do Boi, diziam que vendia boi por hora.

O que é vender boi por hora?

Diziam que abria a porteira e passava boi marcando o tempo e não número de animais, é o chamado “boi por hora”. 

Até que idade você permaneceu em Pirassununga?

Até meus 22 anos. Meu pai foi transferido para Campo Grande e mudamos para lá. Isso foi em 1968. Era uma cidade muito boa, tinha 70 anos de fundação. Eu tinha concluído o Curso Normal, após dois anos prestei o vestibular e entrei em medicina e odontologia de Campo Grande.

Como surgiu essa vocação para odontologia?

Fiz o vestibular para medicina e odontologia e entrei na Universidade Estadual de Mato Grosso. Eu tinha o dom de esculpir, me identifiquei mais com a odontologia. Eu estava cursando a faculdade, meu pai aposentou-se, e quis voltar a morar em São Paulo novamente.

Quanto tempo você morou em Campo Grande?

Foram quatro anos. Lecionei em uma escola particular: “O Reizinho”. Quando mudamos para Piracicaba fiz quatro provas para poder transferir-me para a Faculdade de Odontologia de Piracicaba, tirei dez em todas as provas. Isso foi em 1972. Sempre fui boa aluna, em Campo Grande era primeira aluna. No vestibular eu tinha passado em terceiro lugar. Aqui em Piracicaba havia cinco candidatos e eu consegui a vaga. Tive que fazer prova escrita, oral e teórica. Um dos componentes da banca examinadora foi o professor doutor Mauro Antonio de Arruda Nóbilo. Aqui tive aulas de ortodontia com o  professor e ortodontista Darcy Flávio Nouer, Dr. Miguel Morano Júnior, Dra. Clotildes Peters. O diretor era o Dr. Plínio Alves de Moraes. O primeiro consultório em que trabalhei foi no da Clotildes. Ela foi muito bacana comigo, eu não tinha ainda como montar meu consultório.

Você formou-se em que ano?

Foi em 1973. Trabalhei no consultório da Dra. Clotildes e trabalhei também no SOM – Serviço Odontológico da Prefeitura. Com o Dr. Gentil Calil Chain. Trabalhei na unidade de Tanquinho, no Centro Social Caritas. Trabalhei em diversas unidades da zona rural. Após dois anos montei meu consultório na Rua Benjamin Constant, em frente a antiga agência Ford. O dentista se não tiver um consultório montado, que custa o preço de um veículo, ele não tem como trabalhar. No início adquiri um consultório da marca Odontobrás, trabalhei um bom tempo com ele, depois é que adquiri um Dabi Atlante. Doei para o Lar Franciscano de Menores o consultório Odontobrás. Quando parei de trabalhar doei o Dabi Atlante para o Centro Social Caritas.

Quantos anos você trabalhou como dentista?

Foram 26 anos. A minha mãe era a minha enfermeira, ela trabalhou comigo por 23 anos. Ela aprendeu tudo, instrumentava. Tinha um banquinho para mim e outro para ela, trabalhávamos a quatro mãos. Minha especialidade era dentistica estética e reabilitação oral. Fiz uns dois anos de endodontia.

Em média quantos pacientes você atendia por dia?

Eu sempre trabalhei em pé, odontologia em si é um trabalho muito cansativo. A coluna sente muitas conseqüências. Isso porque não sou uma pessoa alta. A postura em que o dentista trabalha é sacrificante. Em média atendia um paciente por hora, quatro pela manhã e quatro a tarde. Quando trabalhei na prefeitura começava a trabalhar às sete horas da manhã e depois ia para a zona rural, Tanquinho, quem me levava era o motorista da prefeitura, o Seu Vitório. Eu voltava, almoçava, atendia meus clientes no consultório e ficava às vezes até as onze horas da noite. Depois mudei da Rua Benjamin Constant e adquiri minha sala no Racz Center e fiquei lá até 2000.

A seu ver qual é o maior problema da saúde bucal do brasileiro?

Em minha opinião, eu acho que a saúde bucal do brasileiro é conseqüência da própria educação. Se o Estado tivesse mais cuidado com a saúde do brasileiro a primeira medida seria instituir postos de odontologia. Educação básica de higiene bucal.

Nós temos na Faculdade de Odontologia de Piracicaba um “escovódromo” onde são dadas noções básicas.

Nós temos aqui, mas tem cidades que nem pensam nisso! De uns dez anos para cá estão se preocupando mais. É uma questão cultural. A boca é a entrada da saúde do ser humano.

A saúde bucal pode afetar inclusive a saúde cardiológica?

Pode afetar. Se tiver uma periodontite, muito pús. Pode dar uma endocardite.

Qual é a idade em que a criança deve aprender a escovar os dentes?

A partir dos dois anos, a criança quando começa a andar, a entender um pouco as coisas, nem que ela morda um pouco a escova, mas já educar, a ensinar.

Qual é a forma de escovação correta dos dentes?

Deve-se usar uma escova sempre macia, colocar pasta sem excesso, a escova tem que ser macia porque escova também a gengiva. Que entre nos espaços inter dentais. Na arcada dentária inferior, escovar de baixo para cima, levantando sempre a gengiva no dente. Massageando a gengiva para o dente. E na arcada dentaria superior massageando a gengiva para baixo.

Deve-se escovar o céu da boca?

O céu da boca deve ser escovado assim como a língua. Temos milhares de bactérias na boca. Não adianta escovar os dentes e não escovar o céu da boca e a língua. Sobrou bactéria lá!

Existe uma gama enorme de produtos utilizados como anticépticos bucais, qual é o mais indicado e acessível à população?

É o mais antiácido.

Algum produto “caseiro” pode ser utilizado?

Por muito tempo foi muito utilizado o bochecho de meio copo de água com uma colherinha de bicarbonato de sódio. Funciona. Só que não se deve esfregar o bicarbonato no dente porque ele é corrosivo, tira o esmalte.

Há uma história que afirma que algumas poucas gotas de água oxigenada diluídas em água pode ser eficiente, é lenda?

É bom quando se tem gengivite. Bochechos com Malvona é eficiente e tem um custo  acessível. A água oxigenada só pode ser utilizada se for 10 volumes, não pode usar aquela que se usa em cabelo. Não colocar mais do que quatro gotas em meio copo de água. Fazer o bochecho e cuspir, jamais engolir.

Há dentistas que acordam, tomam um belo café da manhã, escutam pássaros cantando, vão ao seu consultório, ao atender o primeiro paciente quando o mesmo abre a boca parece abrir uma boca de lobo, já aconteceu isso com você?

A gente passa até a não sentir mais o cheiro. A rinite ataca tanto com o cheiro de resina que neutraliza. Na realidade a gente sente, usa-se a mascara. O mau hálito pode ser tanto dos dentes, do estomago como até intestino. Às vezes tem pessoas que não tem nem cárie. Quando detectamos esse tipo de situação aconselhamos que consulte um médico gastroenterologista.

Quem tem mais problemas odontológicos o homem ou a mulher?

A mulher tem mais problemas em ortodontia. Posicionamento dos dentes. Isso é transmitido aos filhos mais pela mãe. Pelo menos na minha época estudávamos isso, que a hereditariedade maior é da mãe para o filho. Carie é uma incidência com hereditariedade maior transmitida pelo pai.  

Você chegou a pegar a fase em que o paciente pedia para extrair todos os dentes?

Tive um caso em que um médico neurologista, já falecido, mandou-me uma solicitação de extração de todos os dentes de um jovem de 19 anos. O rapaz não tinha uma cárie, mas estava com uma gengivite terrível, uma periodontite avançada. Examinei, mandei uma carta para o médico, comunicando que ele não tinha nenhum problema nos dentes, e sim na gengiva em decorrência do medicamento que ele estava receitando ao jovem. Quase todos os psicotrópicos causam gengivite. Eu tinha o Cavitron (ultrassom), tirei todo o tártaro, deixei linda a gengiva dele.

O que é psicotrópico?

São remédios que vão para o sistema nervoso central.

Hoje o Brasil é o país que consome a maior tonelagem de um determinado medicamento antidepressivo.

É mania! Às vezes não é necessário! Um medicamento mais suave pode resolver.

Porque o brasileiro tem tanto medo de ir ao dentista?

Porque antigamente o tratamento era sem anestesia, esse sentimento passou de pai para filho. Normalmente o local de trabalho eram as barbearias onde havia os barbeiros ou tiradentes. Não se tratava, tiravam o dente, na época não havia anestesia. Hoje isso mudou muito, as crianças estão indo ao dentista e gostando de tratar dos dentes. Muitos são exemplos para os próprios pais. Cuidam mais, tem um poder aquisitivo melhor. O dentista tem que usar um bom material para poder fazer uma boa odontologia.

Há alguns dentistas que durante o procedimento sem perceber acabam criando uma situação inusitada. O paciente com a boca imobilizada, com algodão, não tem como dialogar, mesmo assim cria-se um monologo.

Realmente, em alguns casos cria-se um monologo, o dentista pergunta e ele mesmo responde aquilo que o paciente iria responder. Tem uma passagem, verídica, quando eu estava na faculdade, tinha um colega fazendo uma cirurgia e nós estávamos assistindo, ele estava extraindo um molar, são três raízes, uma é a raiz palatina, se na extração quebra a pontinha dessa raiz tem que ser feita uma cirurgia maior, ao extrair, quebrou e foi no seio maxilar. A pontinha da raiz estava em comunicação com o seio maxilar. O professor tirou a radiografia. A paciente era uma senhora, de seios fartos, um decote acentuado em seu vestido. O professor examinando a radiografia disse ao aluno: “-A raiz caiu no seio”. (Ele queria afirmar que tinha caído no seio maxilar). Imediatamente a senhora prestativa disse: “Pode deixar, eu a pego e dirigiu sua mão ao decote”.

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