Entrevista: Publicada aos sábados
no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
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PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E
MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 23 de dezembro de 2017
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 23 de dezembro de 2017
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: JAIR ANDREATTO
ENTREVISTADO: JAIR ANDREATTO
Jair Andreatto nasceu a 23 de
junho de 1947, na cidade de Campinas. Filho de Albino Andreatto e Maria da
Costa Andreatto que tiveram nove filhos: Doracy; Nadir; Neide; Jair; José
Carlos; Virginia; Angélica; Geni e Beto; seu pai era funcionário do DER –
Departamento de Estradas de Rodagem, trabalhava com máquinas motoniveladoras.
Com que idade o senhor veio morar em
Piracicaba?
Eu era nenezinho! Nem me lembro!
Viemos morar em uma casa situada a Rua Cristiano Cleopath entre a Rua Santa Cruz e a Rua Bom Jesus. Depois
mudamos para o então distrito de Saltinho. Fomos morar em uma residência que
pertencia ao Estado. Havia um pátio onde eram recolhidos os veículos
acidentados. A motoniveladora de marca Allis Chalmers com a qual o meu pai
trabalhava ficava ali dentro. Não havia luz elétrica, a água era de poço.
O senhor chegou ainda
criança a andar com seu pai nessa motoniveladora?
Eu ia com
ele, na época eu tinha uns seis a sete anos, a região na qual ele tinha que dar a
conservação de estrada abrangia: Rio das Pedras, Piracicaba, Tietê.
As estradas eram
asfaltadas?
Não! A
Rodovia Cornélio Pires era terra. Os caminhões ao passarem com seu peso iam
pressionando a terra para os lados da estrada, com a lamina da maquina, meu pai
puxava essa terra para o centro de novo. Ia por uma lateral da estrada, voltava
pela lateral oposta e depois passava a máquina esparramando a terra que ficava
no centro da estrada.
O senhor estudou aonde?
O primeiro e o segundo ano de Grupo Escolar eu estudei em
Saltinho. A primeira professora era Dona Ada. O DER construiu o prédio que
existe até hoje na Avenida Pádua Dias, saída para São Paulo, viemos morar na
última casa da Rua Voluntários da Pátria,
em frente onde hoje está o quartel dos bombeiros. A casa era alugada,
meu pai trabalhava no DER. Passei a estudar no Grupo Escolar Dr. Alfredo
Cardoso. Depois fiz um curso de ajustagem no SENAI, já estava no mesmo prédio
que ocupa até hoje.
Foi aí que o senhor descobriu a sua paixão por mecânica?
Acredito que sim. Eu sai do SENAI um pouco antes de 1969.
Logo em seguida casei-me, no dia 6 de setembro de 1969, com Antonia Cangiani Andreatto na Igreja São Judas, o celebrante foi
o Padre Henrique. Tivemos três filhos: Cláudio, Roberto e Andrea.
Nesse período o senhor trabalhou em algum lugar?
Trabalhei, na Floricultura Cobal, na parte da manhã
freqüentava o SENAI e depois trabalhava na Cobal. A Floricultura Cobal ficava
na Avenida Independência, em frente ao Jardim da Cerveja. No sentido do
Ribeirão Piracicamirim era o Sítio dos Facco. Trabalhei uns 20 anos com
plantas. Eu morava pertinho, ia a pé mesmo. A Avenida Independência era terra.
O senhor é um grande conhecedor de flores!
Fazíamos a ornamentação de igrejas para casamentos, eu
era bom nisso: arranjos, cestas com flores, coroas fúnebres.
A coroa fúnebre tem que ser feita de forma muito rápida?
Tem sim. Lembro-me de quando faleceu Luciano Guidotti era
muito grande o número de pessoas que queria fazer uma homenagem para ele.
Trabalhamos por dois dias seguidos, sem pararmos, íamos buscar flores em
Jaguariúna, naquela época praticamente a Cobal era a fornecedora de flores da
cidade. A chácara onde ela situava-se foi feita por um agrônomo chamado Nelson
Cobal. Depois Antonio de Pádua Libório adquiriu a Cobal, ele tinha a funerária
Serviço Piracicabano de Luto, situada a Rua Benjamin Constant, esquina com a
Avenida Independência, era uma loja aberta, os caixões ficam em pé, expostos. O
Nelson Cobal tinha uma perua Dodge 1951.
Trabalhar com produtos voltados ao serviço funerário pode
sem que a pessoa perceba, trazer um desgaste emocional?
Não! Acostuma-se com o trabalho. Tem s pessoas que temos
que consolar, os que não aceitam a morte.
E casamentos? O senhor ia enfeitar as igrejas? A Igreja
dos Frades era a preferida pelas noivas?
A Igreja dos Frades era a mais procurada pelas noivas.
Tinha um tapete vermelho que atravessava a igreja toda. Fazíamos uns arranjos
que eram colocados nas pontas dos bancos, um cordão isolava o corredor onde
passava a noiva. Alguns clientes queriam aproveitar parte da decoração para
levar até o salão aonde seria realizada a festa. Fazíamos pirâmides com um
floral no topo. A perua ficava estacionada em um local estratégico, enquanto os
noivos estavam recebendo os cumprimentos na porta da igreja, saiamos pela porta
lateral da Igreja dos Frades, na Rua Alferes José Caetano, colocávamos a peças
dentro da perua e tínhamos que levar antes que os noivos chegassem no salão de
festas que eles tinham escolhido. Aconteciam situações inusitadas, como em
determinado dia um conhecido fotógrafo, buscando o melhor ângulo para
fotografar os noivos, foi afastando sem olhar para trás, a noiva saindo, ele
aflito em conseguir fotos expressivas, afastava-se, ia de um lado para outro,
não percebeu que o tapete tinha formado uma ruga. O fotógrafo caiu de costas! A
sua máquina fotográfica, juntamente com uma bolsa de couro que carregava a
tiracolo, onde eram colocadas as baterias, filmes, e outras coisas, com o tombo
inesperado foi uma chuva de objetos, a máquina caiu longe, a igreja toda
despencou em uma gargalhada só.
Solidários, muitos convidados ajudaram-no, a essa altura
roxo de vergonha.
O tão famoso buquê de noiva também era fornecido?
Fazíamos, tem uma flor chamada angélica, perfumada,
colocávamos um arame fino e com uns raminhos, o tradicional buquê de
flores naturais ainda é a grande preferência das noivas. Os modelos mais comuns
são: buquê redondo, cascata e braçada. Após
celebrado o casamento a noiva jogava o buquê, quem pegasse era a próxima a se
casar. Era uma festa! A moça que estava pensando em casar-se logo realizava uma
disputa acirrada. Nesse ramo de floricultura, o início da semana era até
folgado. Só que no final de semana, havia muitas festas, lembro-me de uma vez
em que ornamentamos o Teatro São José, a volta inteira, é enorme, fizemos uns
florões na volta inteira do Teatro. Quando envolvia um serviço muito grande
alugávamos um caminhão. As pirâmides de flores que fazíamos eram altas. A
camélia era uma das flores preferidas, tanto a rosa como a branca.
E finados como era?
Ficávamos na loja. Montamos uma loja na Rua Moraes Barros
quase esquina com a Avenida Independência. Em frente ao estádio Barão de Serra
Negra. Era um sobrado, trabalhávamos ali. No dia de finados a flor preferida
geralmente era a palma (gladíolo). Era a flor mais procurada, tinha uma durabilidade
maior quando imersa em um vaso com água. A flor natural é imbatível, por mais
perfeitas que as artificiais sejam.
Após 20 anos trabalhando com
plantas, como surgiu essa sua atração por mecânica?
Comprei uma Lambretta ano 1957,
verde e branca. Quando precisava fazer algum reparo eu mesmo dava a manutenção.
Meus amigos, proprietários de lambretas começaram a trazer para que eu desse a
manutenção. Eu trabalhava em casa. Continuava na floricultura, mas fazia os
reparos nas lambretas no tempo que tinha disponível. Eu comprava as peças do
Seu Atos Cadioli que era a Revenda Oficial Lambretta de Piracicaba, situada a
Rua XV de Novembro quase esquina com a Rua José Pinto de Almeida. Passei a ter
bastante serviço em casa, a floricultura estava diminuindo o seu movimento, Por
volta de 1975 a 1976 o Seu Atos Cadioli, que era italiano, teve um problema de
saúde. Ele trabalhava com tratores da marca Landini, motor com um pistão só,
funcionava com óleo queimado, óleo de cozinha, o que fosse colocado virava
combustível! Se o motor esfriasse tinha que colocar um maçarico para aquecer o
local apropriado e fazer funcionar o motor. Eu ajudei o Seu Atos a reformar um
Landini que veio do Paraná, por motivo de saúde Seu Atos não podia fazer
pessoalmente o trabalho, eu fui fazendo e ele me orientando. Fiz esse Landini,
saiu com a partida acionada na mão. Não precisava nem esquentar o cabeçote do
motor. Ele tem uma vela aquecedora dentro, o primeiro ponto da chave faz com
que a vela fique avermelhada, quando dava a partida as vezes ele pegava até
para trás, tinha que cortar o óleo dele, quando ele estava quase parando, tinha
que soltar o óleo, ai ele pegava para frente. Tinha dois “volantes” enormes,
era o pêndulo dele. Se deixasse o Landini funcionava o dia todo. Por
recomendação médica, o Seu Atos decidiu vender a loja, a Ortema. Ele me
ofereceu. Na época eu tinha Fusquinha 1966! Vendi o Fusquinha, dei como
entrada, só que eu não pude ficar onde era a loja, o aluguel seria caro. No
fundo do prédio ele tinha 18 boxes que ele alugava para os vizinhos guardarem
veículos. Fechamos um, que ficou sendo a minha oficina, outro barracãozinho do
lado, foi onde colocamos todas s peças da loja, permaneci ali de 1976 a 1982.
Guardo até hoje o emblema de Revenda Autorizada Lambretta. Veio de lá. Consegui
comprar um barracão na Rua D.Pedro I, entre a Rua São João e Santa Cruz.
Atualmente ocupado pelo Bertoncelli que trabalha com uma distribuidora de
doces. Ali permaneci por mais de 20 anos, Só Lambretta, Vespa e motos. Lá eu
tinha peças de motos também, ai começou a aparecer Honda, Yamaha, Suzuki. Tive
uma Moto Jawa 250 cilindradas, preta.
Em sua juventude havia um grupo de rapazes que tinha Lambretta?
Entre Lambretta e Vespa éramos uns 20. Parávamos
em frente a catedral, a Rua Moraes Barros e a Rua São José não eram
interrompidas na praça, elas continuavam normalmente. As motinhas ficavam todas
ali. Íamos aos cinemas Politeama, Broadway, São José. Na época existia o Bar
Americano, ali na Praça, alguns iam até lá. Não se usava capacete naquele
tempo. Era necessário ter carta de motociclista. No auge da Lambretta, da
Vespa, não havia outro tipo de moto só algumas Harley Davidson, Indian, Mas era
uma minoria. Quando surgiu a Lambretta
todos os funcionários da Mausa, tinham Lambetta ou Vespa. Estacionavam todos em
frente a Mausa, na Rua Santa Cruz, enfileirados lado a lado, passavam uma corda
para evitar que alguém mexesse. Por volta de 1971 começou a aparecerem as
máquinas japonesas. Todo mundo foi vendendo as Lambrettas.
Qual é a diferença da Vespa para a Lambretta?
A marca é uma delas. A Vespa fabricada pela
Piaggio e a Lambretta produzida
pela Innocenti ambas
empresas italianas. Até 1963 a Vespa tinha 150 cilindradas. As primeiras
Lambrettas tinham 150 cilindradas, após 1964 surgiu a de 175 cilindradas. Pesa
pouco mais de 100 quilos, comporta duas pessoas. No pneu traseiro colocamos 30
libras de ar, no pneu dianteiro são de 18 a 20 libras. A Lambretta e a Vespa
antiga tem partida no acionamento do pedal de partida, a Vespa de 1987 em
diante já saiu com partida elétrica. Ambas tem pneu de estepe.
A transmissão do motor
para a roda é feita por corrente?
Na Lambretta até 1960 a transmissão é por cardam. De 1961
em diante já saiu com corrente de malha dupla. Não é simples como de moto e
trabalha no meio do óleo. Ela trabalha em uma caixa de óleo, pega o óleo e joga
para cima. Circula o óleo dentro do câmbio.
A Lambretta é mais confortável?
Uma das vantagens é ter pneu estepe. A posição em que o
condutor fica é mais confortável.
Quantas marchas de velocidade possui a Lambretta?
O modelo LD que foi fabricada até 1960 são três marchas.
A LE já são quatro marchas. Não existe marcha-a-ré.
E a velocidade máxima?
A 100 quilômetros por hora já está exigindo um pouco
dela. Os freios são com pastilhas, na frente e atrás.
Como o senhor vê a substituição da Lambretta pela motocicleta?
A Lambretta parou no tempo! Na Itália o forte é a Vespa
com motor de quatro tempos, antes eram dois tempos, a Vespa e a Lambretta, esse
tipo de motor obriga a colocar certa proporção de óleo ao abastecer com
gasolina. Torna-se uma mistura de óleo e gasolina. As Vespas italianas são com
câmbio automático. As Vespas e Lambrettas são carismáticas!
O senhor está com um veiculo bem antigo sendo montado?
É um automóvel Ford 1929 Model A
Roadster também conhecido como “Carro da Sogra”. Isso porque é um automóvel
para dois passageiros, sendo que o porta malas pode transformar-se em um
terceiro banco, o detalhe é que é conversível, a capota só cobre os dois
passageiros da frente. Quem vai atrás está sujeito ao sol, chuva, neve. Diz a
lenda que o casal de namorados ia na frente e a sogra sentava-se atrás. Esse
veículo estou restaurando.
Qual é o consumo
de um carro desses?
Para os padrões de
hoje consome bastante. O motor tem 2.300 cilindradas. Com toda a potência do
motor ele só alcança 2.200 rotações por minuto, é um motor de biela longa.
Piracicaba já teve
corrida de Lambrettas?
Foi na época em faziam corridas de automóveis em ruas de
Piracicaba, as vias eram isoladas, e os a automóveis da época DKW, Gordini,
Simca, disputavam em plena via pública. Participavam
nomes como: Maks Weiser Walter Hahn Junior e muitos outros.
A Polícia usava Lambretta?
Usou bastante! Era para fiscalização de trânsito. Alguns
investigadores utilizavam para entregar intimações judiciais, em 1968 a
Prefeitura Municipal de Piracicaba adquiriu 10 Lambrettas para a Guarda Civil,
que mais tarde foram incorporadas à Polícia Militar. Com essas Lambrettas eles
faziam rondas, tinha até um amigo, o Cabo Ademar, que tinha uma Lambretta
dessas. Com passar do tempo e a utilização, essas Lambrettas foram sucateadas.
A Prefeitura recolheu essas 10 Lambrettas. No início as cores eram Azul e
Branca, depois pintaram-nas de cinza, com dois revólveres cruzados nas laterais.
Essas Lambrettas, sucateadas, foram doadas para a Associação dos Funcionários
Públicos Municipais, o objetivo era vender para arrecadar fundos, eles estavam
fazendo o Clube da Associação na Avenida Luciano Guidotti.
Além das Lambrettas e Vespas, o senhor teve participação
em diversos times de futebol?
Sempre joguei como quarto zagueiro joguei na Associação
Ferroviária de Esportes de Piracicaba, no União Porto, no Esporte Clube Cobal.
A Ferroviária não tinha sede, reuníamo-nos na Rua Bela Vista, pegávamos um
caminhão e íamos para a disputa com o time adversário. Para o União Porto eu ia
de Lambretta, deixava-a no barracão do Largo dos Pescadores, trocava de roupa e
ia para a partida de futebol. Era um uniforme vermelho com as listras brancas. A
cor do uniforme da Ferroviária era bordô. A Ferroviária ficou campeã da Segunda
Divisão da Liga Piracicabana de Futebol, isso foi em 7 de fevereiro de1981. O
União Porto também chegou para a final. Jogávamos no Estádio Barão de Serra
Negra. Outro time em que joguei foi no Ponte Preta de Piracicaba, também no
Barão.
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