domingo, julho 26, 2015

INÊS APARECIDA DE ANDRADE RIOTO

PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 25 de julho de 2015.
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADA: INÊS APARECIDA DE ANDRADE RIOTO

Nascida a 10 de novembro de 1952, em Santo André, o grupo escolar estudou no Colégio São José, o ginásio e o normal no Colégio Américo Brasiliense, era atleta pela escola, jogava handball e nadava.
Após concluir o curso normal você tornou-se professora?
Após concluir o normal, prestei o vestibular e entrei na faculdade de educação física. A professora do colégio onde estudei adoeceu, fui convidada a lecionar educação física em substituição a ela. Quando dei aula eu tinha dezessete a dezoito anos e meus alunos a minha idade. Formei-me na FEFISA- Faculdade de Educação Física de Santo André. Naquela época o professor de educação física podia lecionar educação física, lecionar em clube, exercer o esporte profissional. Hoje é diferente, na faculdade o aluno direciona para que área vai atuar.
Como atleta, você disputava campeonatos em que área?
Disputei pela natação vários campeonatos. Eram campeonatos muito famosos, disputados. Havia uma valorização muito grande do esporte pela escola e a própria escola era muito valorizada. Naquela época independente da sua condição financeira ou social, todos queriam ser aluno da escola publica estadual. O nível dos professores era elevado. Essa escola em que estudei era a maior escola, tinha por volta de três mil alunos. É uma escola muito grande e muito tradicional, tanto para alunos como para professores. Ao formar-me professora queria prestar um concurso, ter uma boa nota para lecionar nessa escola. Foi o que aconteceu, anos depois prestei concurso, ingressei e permaneci nessa escola até me aposentar. Aposentei-me em 1983, Permaneci mais três  anos como professora eventual, quando faltava o professor efetivo a professora eventual substitui para os alunos não ficarem sem aula.


Nesse meio tempo você fez algum curso de especialização?
Fiz quatro cursos de pós-graduação: Natação, Ginástica Rítmica, Handebol e Recreação.
Você se interessou por uma área específica?
Quando eu estava para me aposentar, sabia que não poderia parar. Quando pensamos na aposentadoria achamos que será uma delícia, só vamos passar o tempo viajando. Como se tivéssemos dinheiro para isso! Só que como funcionário público não temos. O professor continua com o salário, e geralmente diminui as horas de planejamento de aula, acabamos perdendo. Fiquei sabendo que havia um curso de Gerontologia, que é o estudo do envelhecimento, na Faculdade de Medicina da USP,
Você então fez a sua quinta pós-graduação, em Gerontologia? Qual foi o tempo de duração do curso?
Fiz a quinta pós-graduação, a duração do curso é de um ano. A partir desse ano ele passou a ser de atualização, no ano seguinte criou-se o curso regular, de graduação, em Gerontologia. A Faculdade de Medicina da USP está formando Gerontólogos, são quatro anos para estudar o envelhecimento.
Como surgiu sua vocação para estudar o envelhecimento?
As pessoas programam sua aposentadoria sob o aspecto financeiro, mas não programam o que irão fazer. Ninguém é preparado para com o que vai utilizar o seu tempo. “Há a ilusão de que irá sair viajando, ou ficar no ‘Dolce Far Niente”, ou seja, o doce fazer nada.



Como muitos de nossos avós fizeram, quando era outra realidade?
Sim a realidade era diferente.
Percebi que nos aposentamos cedo, e nos aposentamos bem de saúde, não dava para ficar parado, e ao fazer esse curso de Gerontologia, tive aula com uma profissional sensacional a Dra. Marisa Accioly R.C. Domingues, foi a coordenadora que criou o curso de Gerontologia para a USP.-Leste em São Paulo. Após fazer o curso conheci o Dr. Alexandre Kalache, um médico que mora no Rio de Janeiro, que tinha feito pós-graduação em Londres. Foi convidado a ir para a Organização Mundial da Saúde onde foi diretor por 12 anos. Ele criou um programa chamado “Copacabana, Amiga do Idoso”. Ele nasceu e cresceu ali, era um lugar de muitos idosos. Ele levou esse projeto para a Organização Mundial de Saúde, eles acharam muito interessante, o Canadá achou mais interessante ainda. Começaram a criar um protocolo de como criar o programa  “Cidade Amiga do Idoso”.
 O que é Cidade Amiga do Idoso?
Quando você prepara uma cidade para receber o idoso, você recebe pessoas de qualquer idade. É promover acessibilidade. Toda e qualquer cidade deve ter essas características. As cidades foram construías de forma aleatória, nem todas eram programadas. Claro que tem alguns bairros que se tornam mais difíceis pela topografia. O inicio pode ser no centro da cidade ou nos prédios públicos. Nos hospitais, nas UPAs, nas Unidades de Saúde, para promover  a facilidade de acesso dessas pessoas a esses lugares. 
Você chegou a frequentar hospitais?
Alguns, porque não era o meu foco, na verdade, a parte médica, interna aos hospitais liga-se a Geriatria. São os médicos especializados em Geriatria que cuidam da saúde dos idosos.
Qual são as diferenças entre Gerontologia e Geriatria?
A Geriatria cuida da parte médica, é constituída por médicos especializados nessa área. A Gerontologia abrange toda a parte social, o convívio, Como o idoso vai interagir socialmente.
O fator social influi muito na saúde do idoso?
Influi, tanto na parte mental como física. O idoso com melhores condições financeiras com o tempo ele tem possibilidades de orientações sobre uma alimentação melhor, atividades físicas, Isso já vem desde a sua infância. Hoje graças a mídia, a internet, a medicina, é possível à todas pessoas terem acesso a muitas informações.Antigamente só as pessoas em condições melhores podiam ir a um nutricionista. Quando estavam envelhecendo iam a um geriatra. Hoje na rede pública não temos geriatras suficientes. Tanto é que as LPIs, que são as instituições de Longa Permanência para Idosos, os antigos asilos, clínicas existem médicos que atendem, mas nem todos são geriatras. É muito difícil, ainda é muito novo. O Brasil envelheceu, mas não enriqueceu, nem na cultura de atividades para idosos, nem enriqueceu financeiramente para sustentar esses idosos.
Você diria que o país está despreparado para a “nova” geração de idosos?
Está! Em 2040, não só no Brasil, mas no mundo inteiro, teremos mais idosos do que crianças e adolescentes. Nos países desenvolvidos, chamados Primeiro Mundo, idoso é quem tem 65 anos ou mais. No Brasil, assim como nos países em desenvolvimento, é considerado idoso a partir dos 60 anos. Nos países desenvolvidos há toda essa cultura no cuidado para envelhecer. São preparados não só na questão financeira, mas também na questão do tempo. O que eu vou fazer? Como vou ocupar o meu tempo após me aposentar? Essa é a grande mudança. No Brasil começa a surgir uma movimentação nesse sentido, pois é gritante no mundo inteiro. Com a internet que nos liga a diversos países á mais fácil receber informações, também é mais fácil fazer programas e trabalhos com relação ao envelhecimento
A voracidade da mídia sobre esse novo filão que é o idoso, já despertou?
Em alguns aspectos sim. Todos nós que trabalhamos na área acabamos cobrando não só do poder público como também da mídia. Se você observar, as novelas nem sempre nos trazem boas influências, nem sempre são “boas companheiras”. Mas em alguns momentos elas são importantes, porque traz a tona o envelhecimento. Se você pegar todas as questões, inclusive a LGBT, que são gays, lésbicas, bissexuais e travestis, eles sempre existiram, mas nunca se falou que eles envelheciam. A última novela, a pedido até de algumas áreas da gerontologia, realizaram essa novela para mostrar que as pessoas envelhecem. Independente de gênero, independente da sua escolha de afetividade.
O mercado de consumo, os políticos, já descobriram que há um número cada vez maior de idosos com poder de decisão e até mesmo capaz de influenciar na tomada de decisões de outras faixas etárias mais jovens?
Acredito que já estão descobrindo! Por que de fato o idoso tem esse poder. Para o mercado de consumo, aqueles que se prepararam financeiramente, formaram seu patrimônio e se programaram o idoso é um foco bem interessante: as viagens, a boa alimentação, as academias, teatro. Por força da lei quem tem a partir de 60 anos paga metade, na área da cultura, do lazer.
No Brasil o governo está dando a devida importância ao idoso?
A importância do idoso, no Brasil, eu acredito que começa no meio acadêmico. Pela possibilidade de fazer intercâmbio, termos expressões mundiais como o Dr. Alexandre Kalache, um brasileiro, que ao aposentar na Organização Mundial voltou ao Brasil e ele está ligado a projetos no mundo inteiro. A UNICAMP, a PUC SÃO PAULO, que já têm a Gerontologia como mestrado e doutorado. Estava mais avançado no meio acadêmico, chegou-se a um ponto em que descobrimos que tínhamos muitas pesquisas, muitos números, mas pouca prática. Ai começa a se despertar. Em São Paulo o Dr. Kalache foi consultor do Governo do Estado e lançou em São Paulo o programa Estado Amigo do Idoso que possui vários projetos, inclusive da área que eu pesquiso que é a Vila Dignidade, área sobre Moradias para Pessoas Idosas. Os antigos asilos e clinicas. Vila Dignidade é um projeto em que a cidade cede um terreno, o Governo do Estado constrói uma média de 20 casas, Essas casas vão ser direcionadas para pessoas de baixa renda, que recebem no máximo dois salários mínimos. O governo constrói, monta, mobília a casa, ai o Departamento de Assistência Social da Prefeitura é que cuida das casas.
Até alguns anos o idoso ou ficava com a família ou ia para o então denominado asilo.
Hoje o nome é mais bonito: Instituição de Longa Permanência para Idosos.
Sua pesquisa delimitou alguma área geográfica?
Iniciei pela cidade onde moro: Santo André. O que se vai notando é que conforme o nível social e a condição financeira eles são bem diferenciados. Tem o residencial do Einstein, o Santa Catarina. Pela Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) a pessoa a partir de 65 anos tem direito a receber um salário mínimo. Quando ela vai para uma instituição 70% do valor desse salário ela usa para pagar a instituição e 30%, por lei, fica com o idoso.
Até o momento em quantas instituições você já fez esse levantamento?
Em instituições filantrópicas já estive em muitas. Com essa facilidade da internet, entrando em contato com amigos que fazem esse mesmo serviço em outros países, começamos a perceber que havia modelos diferentes. Os Estados Unidos está mais avançado nessa questão do idoso, eles tem residenciais, condomínios, que vão desde as pessoas mais simples, são condomínios feitos e mantidos pelo governo, geralmente são prédios de três andares. Apartamentos, só que com toda infraestrutura: lazer, esporte, um posto médico, com enfermeiras. Cuidadores. Tudo isso mantido pelo governo. Há até condomínios em que ao abrir a sua porta você está dentro de um campo de golfe. Nesse nível, só na Florida existe cerca de 60 a 70 condomínios.
No Brasil temos algo parecido?
Temos em São José do Rio Preto, que tem um condomínio em que eles fizeram uma espécie de clube, um família adquiriu terras com essa intenção, lotearam, o interessado compra o terreno, constrói sua casa, eles fizeram ai um clube. A pessoa torna-se sócia daquele clube, com toda infraestrutura de esporte, lazer e cuidados da saúde, também dentro do clube. Se não me engano também é aberta para a cidade, as pessoas da cidade que tenham 60 anos ou mais podem ir, passar o dia, pagam separadamente, mas tem os esportes com profissionais habilitados   e voltados para essas áreas.
Você chegou a ir á essas casas de repouso?
Só nas filantrópicas que nos fomos.
Existe uma oscilação muito grande entre elas com relação ao tratamento ao idoso?
Existe! Isso porque também existem diferentes níveis de demência. Costumamos dizer que existem diferentes velhices.
O idoso não é obrigatoriamente demente.
 Não. Existe senilidade e senescência. Senescência é o envelhecimento normal, onde a gente esquece normalmente uma chave, vamos fazer duas três coisas ao mesmo tempo, alguma coisa fica sem ser feita. Isso é o normal. Tem o outro caso que é a senilidade, que são as demências. O nome demência ficou um paradigma muito forte. As pessoas se  incomodam com esse nome. Demente se ligava ao louco. E não é isso, é simplesmente o fato de você não estar com todo seu potencial cognitivo. Não fazer  todas as funções que você gostaria de fazer. E depois começou vir tanto a tona sobre Alzheimer, hoje em dia quando alguém esquece alguma, até por brincadeira costuma-se dizer que a pessoa tem Alzheimer. Alzheimer é uma das demências. Ficou um nome genérico, todo mundo que esquece alguma coisa já é tachado como portador da doença.
Qual é o seu objetivo com suas pesquisas?
Já que estamos envelhecendo cada vez mais, precisamos acomodar as pessoas, no local onde ela encontre mais facilidade e possa estar melhor instalada, tenha um direcionamento melhor. Tanto alimentação, como atividade física. Uma pessoa que mora sozinha, dificilmente irá chegar ao longo da vida sozinha. Ela pode ter autonomia e ser independente, mas a qualquer momento ela poderá tornar-se dependente. Dentro da Gerontologia costumamos dizer que  o que mais tentamos preservar nas pessoas, quando vamos envelhecendo, como diz o Dr. Kalache, na minha faixa de idade, 62 anos, somos gerontolescentes, preservamos autonomia e independência. Autonomia é o poder que eu tenho de conseguir o que eu quero. Independência é a minha capacidade de locomover-me sem depender de ninguém. Posso cair e ter uma fratura, ser obrigada a ficar em uma cadeira de rodas, mas posso ter autonomia de dizer: “Me leve para lá, me leve para cá”. “Desejo almoçar isso”. “Quero por aquela blusa”. Isso é autonomia. A demência ocorre quando ao longo do tempo vai se perdendo a independência e a autonomia.
Você pretende publicar algum trabalho sobre suas pesquisas?
Eu já estava com o meu mestrado todo planejado quando comecei a ver a questão da moradia, vi que é uma coisa séria e não tinha estudo no país a respeito, quando outros países estão tão avançados.
Pode-se dizer que você é uma pesquisadora pioneira nesse assunto moradia?

Não sei se sou pioneira, o Brasil é muito grande, não existe ainda uma integração entre todas as universidades para tomarmos conhecimento de tudo que é feito. O que acontece às vezes é que a pessoa foca em um determinado local. A minha pesquisa optei em fazer em moradias diferentes, já que teremos velhices diferentes. 

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