domingo, janeiro 24, 2010

IVETE D`ABRONZO RONTANI



                                                    IVETE D`ABRONZO RONTANI



PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 21 de janeiro de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADA: IVETE D`ABRONZO RONTANI
Em cima de um piano, tipo armário, repousa já por algumas décadas a escultura da cabeça do artista plástico, jornalista, cartunista, radialista, radioamador, desenhista, contador e advogado Edson Rontani. Aos poucos Piracicaba parece acordar para a importância desse artista. Um reconhecimento muito maior do que obteve em vida. Parece ser o caminho trilhado por todos que se atreveram a fazer da arte e da cultura um sacerdócio. Reconhecido e respeitado pelo seu trabalho como artista gráfico conviveu com grandes mestres da pintura. Colaborou por décadas com a coluna: Você Sabia? Editada no Jornalzinho, que era o suplemento infantil do Jornal de Piracicaba. Chargista, Edson deu forma ao personagem-mascote do XV de Piracicaba, o Nhô Quim. O termo fanzine foi muito utilizado nos Estados Unidos incorporando-se à linguagem brasileira no início dos anos 1970. Ele deriva das palavras fan (fanático) e magazine (revista), entendendo-se como sendo a revista do fan, conforme explica Edson Rontani Jr. Edson Rontani criou o primeiro fanzine nacional, o lançamento ocorreu no dia 12 de outubro de 1965 com o nome de Ficção. Dona Ivete mostra um quadro onde Edson escreveu seu nome em forma de acróstico, quando ainda eram namorados.
Idolatro teu nome cheio de esperança,
Vejo-o gravado no mais lindo livro da vida
Embora o tempo devastador, que não se cansa,
Tragá-lo podia, porque firmemente
Em minha alma gravado estará eternamente
Edson


                                                        EDSON RONTANI

Ivete D`Abonzo Rontani a senhora nasceu em Piracicaba?
Nasci na Vila Rezende, a Rua Maria Elisa, na esquina com a Avenida Rui Barbosa. Aí era a nossa casa, que depois papai derrubou para ampliar a indústria. Nasci no dia 29 de abril de 1942. Minha mãe Julieta Meira D`Abronzo também nasceu no dia 29 de abril. Meu pai é o Comendador Humberto D`Abronzo.
O Comendador Humberto D`Abronzo ainda vivo já era uma pessoa lendária em Piracicaba. É muito comum visitarmos outras localidades e perguntam como vai o XV de Novembro, o Rio Piracicaba e a Caninha Tatuzinho. Quando a senhora nasceu já era uma indústria de grandes proporções?
O início de tudo foi uma fabrica de refrigerantes, que depois veio a constituir a Caninha Tatuzinho.
O casal Julieta e Humberto teve quantos filhos?
Foram: o Sérgio, eu, a Ivone, o Paschoal e a Ivana
A senhora estudou onde?
Estudei no Grupo Escolar José Romão. Meu pai colocou meu irmão Sérgio como aluno interno no Colégio Piracicabano e eu como aluna interna no Instituto Baronesa de Rezende, a um quarteirão de casa, era só atravessar o jardim e eu estava lá. Permaneci por dois anos dos 9 aos 11 anos de idade. As visitas eram no segundo domingo do mês, e eu vinha para casa uma vez por mês. Foi lá que além do estudo regular, aprendi a tocar piano, com a irmã Clemência, de origem austríaca, eu catava no coro, aprendi a bordar. Foi a melhor fase da minha vida, acordava ás cinco horas da manhã para ir á missa, voltava tomava banho, tomava o café da manhã e ia estudar.
Como era o uniforme que era usado no Instituto Baronesa de Rezende?
A saia era azul-marinho, pregueada, a blusa branca de manga comprida, gravata, e um avental xadrezinho que era usado para não sujar o uniforme. O sapato era preto e as meias eram brancas. O sapato colegial, aquele que tinha um risco no centro, uma espécie de vinco. A noite rezava-se o terço, e ia dormir.
A senhora recebia algum tratamento diferenciado por ser filha de um dos homens mais influentes da época?
De forma alguma! Eu queria ser freira, meu pai deixou que eu fosse junto com uma freira conhecer um convento em Araraquara, onde assei uns dias. Quando terminei o quarto ano do primário, passei a estudar o ginásio na Escola Assunção. Nessa época ainda morava na Vila Rezende. Meu Tio Jorge Vargas dizia: “Você vai ser freira, de dois travesseiros!”. Quando terminei o quarto ano do primário, passei a estudar o ginásio na Escola Assunção. Nessa época ainda morava na Vila Rezende. Foi quando conheci o Edson. Ele trabalhava no escritório do Posto São João, na esquina da Rua Boa Morte com a Rua D. Pedro II. Em frente ao Colégio Piracicabano. Ao lado tinha o bar de umas japonesas (hoje Restaurante Babilônia). Eu ia ás vezes até o bar para comprar leite, só para ver o Edson. Eu tinha 15 anos de idade.
Qual foi a primeira vez que a senhora viu o Edson?
Não me lembro se foi no posto ou se foi no jardim. Naquele temo era costume quadrar o jardim. Eu ia com as minhas amigas e via ele lá. Ele era amigo do Arthemio De Lello, e tinha mais uma pessoa, de estatura mais baixa que eles. Os três estavam sempre juntos.
A senhora tinha quantos anos de idade quando passou a namorar o Edson?
Até os 18 anos de idade meu pai não permitia que eu namorasse. Quando completei essa idade, ele admitiu o namoro meu com o Edson.
Qual era a altura do Edson?
Era quase um metro e noventa de altura, olhos verdes, usava um topete. Ele era muito bonito!
Qual era o nome dos pais do Edson?
Eram Seu Guilherme Rontani e Dona Maria Sartini Rontani. Meu sogro era marceneiro. Eles tiveram três filhos: O Milton, a Edna e o Edson.
A senhora e o Edson tiveram quantos filhos?
Tivemos três filhos: o Eron, Edson e Fábio. O Edson é Jornalista, o Eron é publicitário e o Fábio é artista gráfico. Tenho um neto fazendo jornalismo!
Em que igreja a senhora casou-se?
Casamo-nos em 16 de maio de 1963, na Catedral. O casamento religioso foi super simples. A festa foi no Teatro São José, lá sim foi muito chique. Foi a primeira festa de casamento realizada no Teatro São José. A grinalda e a tiara eu trouxe da Espanha.
A que horas vocês casaram?
Estava batendo seis horas, meu pai exigia pontualidade. Ele entrou me conduzindo ao altar, fiquei assustada em ver um grande número de guardas com sua roupa de gala fazendo a guarda de honra. Meu pai segredou para mim: “Fiz essa surpresa para você”. Foi muito bonita a entrada.
Quem fez o seu vestido de noiva?
Foi a minha cunhada, Elza Rontani, ela era modista.
Onde foi a lua de mel?
Fomos para Santos.
Qual é o hobby da senhora?
Piano e acordeom. Estudei ambos. Piano e só toco quando estou muito triste. Eu amo fazer tricô. Sou voluntária em uma casa de caridade, isso me deu muita força quando o Edson faleceu. Faço sapatinhos, toda noite faço um par de sapatinhos, para doar. Faço também mantas e gorros.
A senhora gosta de novelas?
Adoro! Assisto todas que são levadas ao ar pela Televisão Globo. Para mim é uma terapia.
O que mais a impressionou em Edson Rontani?
A inteligência dele me conquistou! Desde solteiro ele desenhava, pintava.
No Brasil ele foi um dos pioneiros em cartuns?
Foi, e ele sentia tristeza ao lembrar-se de que o primeiro salão de humor foi começado com ele, eu lembro-me muito bem dessa exposição De 1974 e 1976, ele realizou na Pinacoteca Municipal, o Salão de Caricaturas de Piracicaba, expondo suas charges e caricaturas, junto com outros artistas que então despontavam como Rudinei Bassete. Estas caricaturas eram exibidas semanalmente, na Galeria Brasil, localizada no centro da cidade. Denominada "O Mural", atraía a atenção dos jovens que passavam pelo local, nos anos 70. Ele tinha um grande sentimento por sentir que não deram o devido valor ao seu trabalho como precursor do salão do humor. Edson foi homenageado com a instituição de uma rua com o seu nome. O projeto de lei nº 5023, de autoria do vereador Gustavo Herrmann, foi sancionado pelo prefeito José Machado e publicado no Diário Oficial do Município, no dia 22 de setembro de 2001. O Deputado Estadual Roberto Morais (quando era vereador em Piracicaba), foi autor de uma lei criando a Sala Edson Rontani no Teatro Municipal Dr. Losso Neto. Foram homenagens póstumas. Está sendo realizado um processo para denominar com o nome de Edson Rontani, uma escola em Piracicaba. Como artista plástico, dedicou-se à pintura a óleo. Foi aluno de Frei Paulo Maria de Sorocaba, nas décadas de 40 e 50. Nos anos 70, foi aluno de Hugo Benedetti.
O Edson era radioamador?
Era! Ele falava no nosso quarto, na cabeceira da cama. Eu gostava, e ficava escutando.
O Edson era muito reservado?
Sempre foi. Só que tinha um espírito muito criativo e brincalhão. Era muito quietinho. Ele era extremamente reservado com relação a receber pessoas em casa., com exceção da família, claro.
A senhora freqüentou o Cine Plaza, que existia junto ao Edifício Luiz de Queiroz, mais conhecido como Comurba?
Freqüentava sim, era o melhor cinema que nós tínhamos. Um detalhe interessante, a minha irmã, a Ivone ia casar e o meu cunhado tinha um apartamento lá. Ela foi ver os detalhes finais, de acabamento, no dia anterior a queda do prédio. Ela ficou doente com o fato. Se o prédio tivesse desabado um dia antes provavelmente ela estaria entre os que faleceram.
A senhora ainda solteira viajou por outros países?
Junto com meu Tio Jorge Vargas, Tia Mariquinha e um casal de primos. Viajamos por três meses. Fomos para Os Estados Unidos, Portugal Espanha, França, Suíça, Itália, Egito, Jordânia, Jerusalém, Belém, Nazareth. A Jordânia estava em guerra, víamos muitos soldados, um grande número de pessoas mutiladas andando pelas ruas. Minha prima é dois ou três anos mais velha do que eu. Ela estava namorando firme. Só que o namorado dela não tinha o habito de escrever muito. Em cada hotel que eu chegava já havia três ou quatro cartas do Edson para mim! Ainda guardo as cartas que ele remeteu e as que eu escrevi.
Essa escultura da cabeça do Edson quem a fez?
Foi o artista plástico Dr. Jairo Ribeiro de Mattos, que a fez e nos deu no nosso casamento. Eles trabalharam juntos na Casa da Lavoura. O Jairo era engenheiro e o Edson desenhista. Nós casamos no ano de 1963. A escultura é tão perfeita que até os óculos do Edson se colocada nela para direitinho!


ESCULTURA DE EDSON RONTANI FEITA PELO ARTISTA PLÁSTICO JAIRO RIBEIRO DE MATTOS
A senhora tinha algum contato com as revistas que o Edson colecionava?
Eu não gostava de revistas em quadrinhos. Minha irmã Ivone uma vez pediu e ele emprestou, mas ela não gostava nem de mostrar de medo que fizessem uma orelha na revista. Ele não admitia que dobrasse as folhas da revista para ler a pagina. Tal era o seu zelo. Ele era amigo do Seu Silas, dono do sebo mais antigo da cidade.
A senhora é devota de Nossa Senhora Aparecida e Nossa Senhora Desatadora dos Nós?
Sou sim, muito devota! 
A senhora ia com o Edson em bailes de carnaval?
Um dos carnavais que marcou muito foi quando voltei da viagem ao Líbano e trouxe trajes típicos para mim, para o Edson. E para mais três primos. Ganhamos o prêmio, de melhor bloco, isso foi em 1962, foi no Club Coronel Barbosa.
O que a senhora achava da participação do seu pai Comendador Humberto D`Abronzo como Presidente do XV de Novembro de Piracicaba?
Acho que havia um grande interesse na participação do meu pai, principalmente por ver na sua empresa a capacidade de investir recursos no time.
A senhora torce por algum time?
Quando há jogo do Brasil, torço pelo Brasil. Meu neto diz que eu torço roupa!
O Edson era quinzista?
Eu creio que sim. E corintiano também.



A senhora e seus irmãos tratavam seus pais de você ou senhor e senhora?
Não! Imagine! Se os chamasse de você eles nos quebrariam os dentes! Como a grande maioria dos pais da época o faria. Tínhamos que tomar a benção, mesmo depois de casada. Meu pai fazia questão. Eu tive uma infância maravilhosa. Brincava de carrinho de rolimã, bolinha de gude. Empinava papagaio isso na Vila Rezende. Nós morávamos em uma casinha tão linda, com terraço, dois quartos, sala, cozinha e banheiro, e a dispensa. Eu dormia na sala, porque não havia mais quartos. Quando ele comprou a primeira televisão, vinha muitas pessoas para assistir, era pequeno o número de pessoas que tinham televisão. Eu tinha que esperar todo mundo ir embora para poder deitar. Eu não via a hora de ver o povo ir embora, porque no dia seguinte tinha que levantar cedo para ir de bonde até o Colégio Assunção.
O que levou o pai da senhora a mudar para o centro de Piracicaba?
O terreno em que situava a casa era necessário para ampliar a indústria.
A senhora praticava algum esporte?
Gostava de nadar. No Clube de Campo, o meu Tio Jorge amarrou uma corda na minha cintura e me fez dar a volta nadando. Ele ia todo dia de madrugada nadar no Clube de Campo, ele geralmente estava saindo quando eu chegava. A primeira vez em que entrei na piscina, vi todo mundo pular e sair nadando achei aquilo muito fácil. Quase morri!

sábado, janeiro 16, 2010

JANDYRA SILVEIRA RAMOS
PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 16 de janeiro de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.tribunatp.com.br/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADA: JANDYRA SILVEIRA RAMOS
Bisneta de Prudente de Moraes, a sua avó Maria Amélia casou-se com seu avô João Batista da Silveira Mello. A Professora Jandyra casou-se com o Professor Algemiro Coelho Ramos. Muitas gerações de piracicabanos devem a ambos não só o aprendizado formal de música, português, latim. Formaram um casal que sempre honrou e dignificou o nome de seus antepassados ilustres. Que educou antes de tudo, com o exemplo.
A senhora nasceu onde?
Nasci em Brotas no dia 12 de fevereiro de 1932. Meu avô materno tinha uma fazenda de café no Alto da Serra. Meu pai Silvio Silveira Mello tomava conta dessa fazenda. O pai dele João Batista da Silveira Mello que tinha o cognome carinhoso de Lalau foi um dos primeiros médicos de Piracicaba, ele foi casado com a filha mais velha de Prudente de Moraes, Maria Amélia. Era o genro para quem ele escrevia. Foi ele quem tomou as providencias necessárias para realizar a mudança de Prudente de Moraes quando este terminou seu mandato como presidente da república. Meu avô João Batista Silveira Mello foi um dos primeiros médicos da Estrada de Ferro Sorocabana. Lembro-me da família Martins comentar que ele foi médico deles. Minha mãe era da família Camargo Simões, seu nome é Jandyra Simões Silveira Mello. Os Simões de Brotas abriram fazendas, era sertão, viam-se onças.
Seus pais tiveram quantos filhos?
O João. A Maria Amélia, conhecida por Lia, era muito bonita. Não havia colegial em Piracicaba, ela fez um pouco em Limeira, um pouco no Colégio Piracicabano, e quando abriu no Sud Mennucci só tinha ela de mulher, a classe era de 33 alunos. Eram todos muitos amigos. Ela conheceu seu marido, Hélio Candido de Souza Dias, da família Souza Dias de São Paulo. Ele foi um dos maiores agrônomos que conheci. Eles tiveram nove filhos. Depois vinha o Silvinho, eu, Josette, e a Maria da Glória. É interessante observar que a Josette era muito amiga de Monteiro Lobato, ainda moça ela já escrevia. Monteiro Lobato quando escreveu Os Doze Trabalhos De Hercules, estava na Argentina, de lá ele mandou para ela os fascículos. Antigamente as frutas de Piracicaba eram maravilhosas, e a minha mãe mandou para Monteiro Lobato uma caixa de mangas Bourbon. Ele escreveu uma carta interessante dizendo que ele sempre pensou que a Bahia fosse a rainha das mangas, mas que ele descobriu que Piracicaba era a rainha das mangas!
A senhora conheceu Monteiro Lobato?
Conheci! Foi em uma visita em que a minha irmã Lia foi fazer a ele. A única coisa, que me lembro de ele ter dito foi quando ele me olhou e disse: “–Você é pernilonga quem nem o seu avô!”. Ele e a esposa dele gostavam muito da minha irmã Josette. Quando ele faleceu, sua esposa mandou de presente para a minha irmã Josette uma tesourinha que ele utilizava para abrir suas correspondências.
O Dr. João Batista da Silveira Mello morava aonde em Piracicaba?
Ele morou na Rua Treze de Maio, entre as ruas Santo Antonio e Alferes José Caetano, em frente aonde foi posteriormente o consultório do médico Dr.Tito. O meu pai tinha um grave problema de visão, e mesmo assim ele tomava conta da contabilidade da fazenda, com grande competência. Essa sua deficiência visual o impediu de prosseguir nos estudos. Seus irmãos prosseguiram nos estudos, um deles, João Batista também, foi juiz, o Otávio da Silveira Mello tomava conta do Jardim Botânico.
A senhora teve uma tia que foi prefeita em Limeira?
A minha tia, também neta de Prudente de Moraes, Maria Thereza Silveira Mello de Barros Camargo foi prefeita em Limeira, foi uma das primeiras deputadas.
A mãe da senhora, Dona Jandira Simões Silveira Mello estudou onde?
A família dela era muito grande, minha avó teve muitos filhos e a minha mãe era a mais velha. Com o tempo minha mãe entendia o francês ela lia francês, em espanhol. Ela lia para o meu pai que tinha sua visão deficiente. Eles leram todos os clássicos portugueses. O mais engraçado era quando eles iam ao cinema, com o tempo minha mãe passou a ter uma pequena deficiência auditiva. Ambos iam até o cinema, sentavam-se bem á frente da tela para não incomodar as pessoas que ali estavam. Era um horror para quem se sentava perto deles, porque minha mãe ia lendo as legendas para o meu pai. Quem se sentava sempre por perto era Erotides de Campos e sua esposa. Uma das lembranças que guardo da minha mãe era ela mexendo as panelas com um livro na outra mão: lendo! Ela lia o tempo todo! Discutia qualquer assunto. A família do meu pai era muito ligada a leitura. Ela tinha um tio-avô, o Tio Nhô-Nhô, ele era irmão da Carolina Ferraz Barbosa, esposa do Coronel Barbosa, que deu origem ao nome do Clube Coronel Barbosa. Nós morávamos na Rua Prudente de Moraes, na direção da cadeia, e o Tio Nhô-Nhô morava em uma casa que existe ainda na esquina da Rua Prudente de Moraes com a Rua Tiradentes. No tempo da Segunda Guerra Mundial ele descia até a nossa casa para ouvir o Reporte Esso. Já velhinho, ele entrava, e dizia: “Ó de casa!”. A criançada respondia: “Entra Tio Nhô-Nhô!”. Começava o Repórter Esso tínhamos que fazer silêncio. O apresentador entrava no ar e dizia aos ouvintes: “-Boa Tarde!”, Tio Nhô-Nhô respondia: “-Boa Tarde!”. Ele era lúcido. Todo dia ele ia a nossa casa para a minha mãe ler as Notas e Informações do Jornal O Estado de São Paulo. Ele estava tão acostumado, que para ele só a minha mãe é que sabia ler essas notas e informações! Ela lia bem, entendia o que estava lendo. Em casa, o castigo era quando a minha mãe viajava para acudir um parente doente, alguém era escalado para ler as Notas e Informações do Jornal Estado de São Paulo.
A senhora estudou o primário onde?
Fiz o primário aqui no Prudente, que funcionava onde é hoje o Museu Pedagógico Prudente de Moraes. Antigamente o ginásio era no Sud Menucci, a relação dos alunos que passavam ficavam expostas no Jornal de Piracicaba. Quando entrei na sala de aula a primeira coisa que o Professor Benedito Dutra fez foi fazer a chamada dos alunos, quando chegou o meu nome ele me disse: “- Dona Simões! Vamos ver se não derruba a peteca!”. Por causa dos meus tios que eram muito bons.
E piano, onde a senhora fez seus estudos?
Próximo da minha formatura foi incluído o curso de música no currículo escolar. Os conservatórios só existiam no Rio de Janeiro, em São Paulo e Campinas. Miguel Zigggiate ele vinha para Piracicaba procurando levar alunos para o conservatório. Eu, Cidinha Mahle, que estudava com Dona Dulce Rodrigues de Almeida, ela tinha uma formação excelente como pianista. Eu estudei com Dona Maria Wagner, uma senhora austríaca que tinha vindo ao Brasil para dar aulas á filha de um fazendeira de café
Quantos filhos os pais da senhora tiveram?
Éramos seis. Tínhamos um irmão que faleceu em Jacareí. O mais velho, João Batista Silveira Mello, é vivo ainda, mora em Curitiba, ele era conhecido como João Fazendinha. Ele tem filhos maravilhosos.
Ainda na fazenda a senhora teve aulas de canto?
A Dona Dirce Rodrigues nos ensinava a cantar, na época eu deveria ter de cinco a seis anos de idade. Quando viemos morar em Piracicaba ela tornou-se nossa amiga. Ela era muito amiga. da minha irmã Josette. Essa minha irmã foi pioneira no ensino de musica para bebês a partir dos 10 meses. No ano passado a Universidade Federal de São Carlos implantou esse curso de música.
A senhora tem algum parentesco com o Sr. Rubens Silveira Mello?
Eles são parentes do meu pai. Meu pai conhecia bem Dona Diva, irmão do Silas e do Celso Silveira Mello.
A senhora tem quantos filhos?
A mais velha é a Esther, médica, professora de genética, trabalha com pesquisa na USP. Ela tocava vilino e depois tocou viola na orquestra do Maestro Ernst Mahle. Por três vezes ele foi á Bahia para completar a orquestra da Universidade da Bahia. Depois dela nasceu a Ruth, já falecida. Em seguida a Rachel que é engenheira química, ela trabalhou por treze anos na Gessy Lever. Hoje ela está na Itália com o marido. Conseguimos formar os quatro filhos, dois na USP e dois na Unicamp. O Caio fez direito na São Francisco em São Paulo. Hoje ele é um dos diretores mais novos da Assembléia Legislativa. Ele gosta muito de escrever. Ao conhecer as músicas de Germano Mathias, gostou muito. Descobriu que Germano estava vivo. Ele conseguiu fazer com que o Germano voltasse á mídia, tendo inclusive escrito um livro sobre ele.
A senhora toca instrumento de teclado?
Por 30 anos toquei na Igreja Bom Jesus.
A senhora lecionou em Paraguaçu Paulista?
Lecionei e na a casa onde eu morava pertencia a um alfaiate, Sr. Adolfo Grilli. Para ele eu era a filha mais velha.
A senhora tinha algum grau de parentesco como interventor Fernando Costa?
A esposa dele era prima do meu pai.
Houve um período em que o gado, cabra era tratado com carrapaticida?
Existiam em Piracicaba os banheiros carrapaticidas. Havia um lá adiante da Metalúrgica Dedini e outro na Paulista. A cada vinte dias o gado tinha passar por aquele banho. Era composto por corredores, onde cada pessoa que tivesse gado, cabra levava seus animais para passar por esse corredor. O serviço que o meu pai desenvolveu na escrituração dessas atividades serviu como modelo para a Água Branca, São Paulo.
A senhora lecionou em Londrina?
Quando eu me formei embora estivesse com os devidos registros, não tinha a idade obrigatória para prestar concursos, quer era de 21 anos. Meu irmão trabalhava no Paraná, e eu fui ajudar a minha cunhada a preparar uma festa de formatura. Era obrigatório ter registro para lecionar, o que no caso eu tinha. Com isso dei aulas no colégio particular, do estado.
Qual condução a senhora usou para ir á Londrina?
Fui de avião. Meu tio veio para cá e eu fui com ele. A comunicação entre Londrina e Piracicaba era quase inexistente, o telefone levava horas para poder completar uma ligação. A viagem de trem era constantemente interrompida por queda de barreira. Quando chegava á Sorocaba era um alívio. Em Londrina dei aulas de piano no conservatório de lá.
A senhora chegou à idade de poder prestar concurso, para onde foi designada?
Os concursos eram como provas de mestrado. Havia uma prova de erudição. Uma prova em que a pessoa cantava Lá-rá-rá-rá e você tinha que fazer as notas musicais correspondentes. Depois tinha uma prova com o tempo de 40 minutos, sobre um tema sorteado 24 horas antes. Uma aula dada em escola do Estado, sorteada também 24 horas antes. Na Alta Sorocabana era o local mais próximo da minha irmã. Eu saía de São Paulo ás 4 horas da tarde e chegava a Santo Anastácio no dia seguinte ás 7 horas da manhã. De presidente Prudente vim para Palmital, que é pertinho de Assis. De Palmital eu fui Paraguaçu.
Quando foi que a senhora conheceu o seu marido Professor Algemiro Coelho Ramos?
Ele lecionava latim em Paraguaçu. Ele morava com seus parentes em uma casa que ficava em frente onde eu morava. Então eu ia e voltava com, nós éramos muito amigos, ele tinha as namoradas dele. Depois ele foi para São Paulo. O pai do Algemiro era de família tradicional de Itapetininga, daqueles tradicionais coronéis, uma figura imponente, tinha muita semelhança com Washington Luiz. Na época de Getulio Vargas ele foi preso, pensaram que estavam prendendo Washington Luiz! E ele com maior orgulho! Aos 7 anos de idade a mãe de Algemiro teve morte súbita. Ele foi morar com uma tia em Itu. As Irmãs de São José perceberam que o Algemiro gostava muito de estudar, a madre o aconselhou a entrar para o Seminário em Pirapora dos Padres Premonstratenses. Só que ele não tinha a vocação sacerdotal. Quando teve que passar para o Seminário Maior em São Paulo, ele estava desapontado, conversou com os padres, que o apoiaram na sua decisão. A sua tia foi informada da sua decisão, e como ela tinha mudado para São Paulo ele foi morar com ela. Prestou exame para a Faculdade de Filosofia, entrou, e arrumou emprego em um banco. Quando ele concluiu a faculdade conseguiu uma substituição grande para dar aula de latim em Paraguaçu.
Onde foi o casamento da senhora com o Professor Algemiro?
Foi na Igreja São Judas Tadeu, em São Paulo, no dia 10 de janeiro de 1962. Foi um casamento muito simples.
Ele era uma pessoa muito franca?
Era de uma grandeza, muito preocupado com os outros. Tinha muitas pessoas que o adoravam.
Em que ano ele faleceu?
Foi dia 4 de maio de 1995. Quanta gente ele ajudou, quantas apresentações por carta ele fez! Quantas bolsas ele conseguiu no CLQ, com o Turcão, com Wilson Saito. Em Paraguaçu o Banco do Brasil estava construindo uma agencia, a moçada animou-se, lá não havia muitas oportunidades de trabalho. Pediram ao Algemiro que os preparasse para o concurso do Banco do Brasil. Todo dia ás 6 horas da manhã estava abrindo a escola, deu as aulas pra eles. Passaram todos! Uma vez Algemiro e eu fomos passear em Paraguaçu, passamos pela porta do Banco do Brasil, quando um dos funcionários nos viu, saíram todos de dentro do banco. Aqui em Piracicaba ele era procurado por pessoas das mais diversas faixas etárias para conversar com ele quando tinham problemas.

Comentários:
Fui aluno de Dona Jandira e do prof Algemiro, no ginásio Dr. Jorge Coury. A eles tenho imenso respeito e saudades dos professores de qualidade, que ajudaram a formar toda uma geração com caráter e hombridade. Esta entrevista trouxe-me muitas recordações. Parabéns, Nassif.
Um abraço de Luiz Ricardo Bastos
# postado por Luiz Ricardo Menezes : 12:11 PM
LAZARO ANTONIO DE ALMEIDA
PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 09 de janeiro de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.tribunatp.com.br/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: LAZARO ANTONIO DE ALMEIDA
Lázaro Antonio de Almeida nasceu em Porto Feliz, no dia 03 de maio de 1944, é o filho mais velho dos oito filhos de João Augusto de Almeida e Irene Barreiros de Almeida. Logo após o seu nascimento, a sua família transferiu-se para a cidade de Assis. Trabalhou como ferroviário, chegando a Chefe da Agencia de Piracicaba do IBGE, onde se aposentou. Ele lembra-se dos tempos da Sorocabana, onde a cada mudança de administração do alto escalão mudavam-se as diretrizes da empresa, muitas vezes ocasionando perdas incalculáveis. Se não havia uma remuneração satisfatória, havia a dedicação integral dos funcionários efetivos. Trabalhava-se com amor. Motivado por busca de melhores condições, prestou concurso e entrou no IBGE. Assumiu a chefia em Piracicaba, onde desenvolveu seu trabalho sendo até questionado por facções que queriam superestimar a população da cidade buscando benefício pessoal. Desde 1992 ele está aposentado, Lázaro tem uma visão cristalina da realidade brasileira.
O senhor estudou em Assis?
Comecei a estudar em Assis, no Grupo Escolar Lucas Thomaz Menk. Pelo período de um ano estudei em Porto Feliz, no Grupo Escolar Coronel Esmédio, onde fui aluno da professora Lígia. No período em que realizei meus estudos de ginásio e colégio em Assis, fui aluno do Curso de Formação em Transportes, CFT, ministrado pela Estrada de Ferro Sorocabana. Estudava durante o dia na Sorocabana e a noite na escola estadual. No curso do CFT as aulas eram dadas alternando-se um dia era aula prática outro dia aula teórica. Como em Assis havia oficinas da Estrada de Ferro Sorocabana, havia duas modalidades de cursos, um que era voltado para quem iria trabalhar nas oficinas e outro voltado para quem iria trabalhar nas estações. Eu fiz o curso para exercer as atividades nas estações. Além do curso de telegrafista, conferente, formação de composição de trens.
As composições que saiam de Assis eram de trens de cargas, passageiros?
Tinha de tudo. Trem só de carga, só de passageiros, de passageiros e cargas. Existiam quatro divisões na Sorocabana. A Quarta Divisão era sediada em Assis. Ali se controlava os trens dos trechos que iam de Ourinhos até Presidente Epitácio. O ramal Dourados não chegou a concluir o seu projeto na integra, que seria de ir até Dourados.
A linha de trem que passava por Assis saía de onde?
A chamada linha-tronco saía da Estação Julio Prestes em São Paulo e ia até Presidente Epitácio. Piracicaba era um ramal da Sorocabana, que tinha seu ponto final em São Pedro.
Aproximadamente, quanto tempo levava a viagem de São Paulo á Assis?
O trem de passageiro levava onze horas, se não me falha a memória, de Assis á São Paulo o percurso ferroviário era de 580 quilômetros, a velocidade média era de 50 quilômetros por hora. O trem de carga levava mais tempo.
O ramal da Sorocabana que passava por Piracicaba era mais lento?
Era outra situação, a viagem era mais demorada. A linha de São Paulo á Presidente Epitácio tinha um trecho entre São Paulo até Sorocaba onde o trem corria muito, a linha era dupla, não havia parada para aguardar a chegada da composição que vinha no sentido contrário.
Quando o senhor passou a trabalhar na Sorocabana ainda existiam as famosas Maria Fumaça?
Tinha uma ou outra que era utilizada para manobras em pátio. Em Assis não havia o virador de locomotiva, para virar a máquina era utilizado o conhecido sistema chamado triangulo.
A eletrificação da linha chegou a funcionar em Assis?
Eu saí da Sorocabana em 1973, se não me engano a eletrificação da linha até Assis chegou em 1970. Hoje o sistema eletrificado está totalmente desativado. A linha permanece funcionando até hoje.
O senhor tem saudade dessa época?
Eu entrei na Sorocabana quando ainda era menino, fiquei bastante tempo, e só sai porque as condições oferecidas pela Sorocabana não permitiam que eu permanecesse, o salário era baixo. O trabalho em si deixava-nos orgulhosos, todos que trabalhavam lá ganhavam pouco, mas exerciam suas funções com amor pelo serviço.
O uso de farda era para alguns cargos?
O maquinista, o chefe de trem, o chefe da estação, eles tinham um fardamento. Os demais funcionários usavam roupas comuns.
O senhor foi telegrafista, quais foram os equipamentos que chegou a usar?
Na escola aprendemos o alfabeto Morse, onde as letras e números são transformados em código utilizando as grafias de traço e ponto. O telegrafo era uma caixa de madeira com uma campainha em cima e duas pequenas tábuas onde batíamos o código. Outro aparelho era só com o toque. Mudava a sonoridade, a aplicação, embora o código fosse o mesmo.
Havia um apelido para o telegrafista que não operava com muita agilidade?
Era denominado em tom de brincadeira como pica-fumo. Uma referencia ao habito comum na época de picar fumo de corda. Nós tínhamos que receber, decodificar e escrever manualmente a mensagem.
O senhor trabalhou em estações pequenas?
Trabalhei em Presidente Epitácio, Álvares Machado, onde eu fazia praticamente todo tipo de trabalho referente á estação. Quem trabalhava á noite atendia o telegrafo, fazia o recebimento de despacho de trens, vendia bilhete de passagens, recebia os trens que chegavam.
Como eram formadas as composições de passageiros?
De Presidente Epitácio o trem não saia completo, ao longo do percurso ia agregando mais carros á composição. De lá saia uma locomotiva, o primeiro carro que era o de bagagem, depois vinha o carro de segunda classe, o carro restaurante e depois o carro de primeira classe, no meio do caminho eram agregados os carros dormitórios, que eram os últimos da composição.
Como era um carro dormitório?
Era divido em cabines, e cada cabine tinha dois leitos, um em cima do outro. Havia em cada uma delas o vaso sanitário, era isolado, porque poderia ocorrer de viajar com pessoas que não eram conhecidas. Normalmente quem viajava nesse tipo de carro eram pessoas com poder aquisitivo mais alto, pelo próprio preço da passagem.
Dormia-se com a roupa que estava no corpo?
Casso o passageiro desejasse poderia trocar de roupa no banheiro, na própria cabine, se estivesse com pessoa que possibilitasse tal liberdade.
Se quisesse viajar de pijama poderia?
Com certeza sim! É interessante observar que no caso das cabines não havia o que era comum nas primeiras e segundas classes, aonde de trecho em trecho vinha o chefe do trem, acordar o passageiro para conferir a passagem. Cada vagão de cabines tinha um responsável, que sabia onde cada passageiro iria descer, chamava-se camareiro. Ele batia na porta avisando o passageiro que o seu destino de viagem estava próximo.
Quantos funcionários geralmente compunham um trem de passageiros?
Havia o maquinista, o auxiliar do maquinista também chamado de foguista, por ter sido no tempo do trem á vapor a pessoa que alimentava a maquina. Viajavam ainda o chefe de trem, o ajudante de chefe de trem, se tivesse cabines havia o camareiro. Quem picotava o bilhete da passagem era o chefe de trem ou seu auxiliar. No caso do carro restaurante era explorado por terceiros. Como os bares das estações também eram explorados por particulares. No carro restaurante havia o cozinheiro, o garçom. Havia um balcão para lanches ou para tomar algum refrigerante. Nas mesas eram servidas as refeições. Em determinadas épocas do ano, poderia ocorrer da pessoa não conseguir passagem para viajar, por causa da grande procura. O excedente ia de ônibus. Havia um trem com características de trem de carga, onde havia um carro de passageiros, os demais eram vagões de cargas. A sigla desse trem era BG. Passageiro que não tinha muita presa ia nele. No trem superluxo havia o carro chamado Pullman de um lado havia uma poltrona e do outro havia duas poltronas, reclinava ficando um semi-leito. Todo trem superluxo tinha ar condicionado.
Por quanto tempo o senhor permaneceu trabalhando na Estrada de Ferro Sorocabana?
Eu comecei a trabalhar mesmo, quando conclui a escola, em 1963 e permaneci até 1973. Foram 10 anos. Quando estava na fase de transformação para a FEPASA eu sai.
O motivo alegado para desativar o transporte ferroviário era o fato de ser deficitário?
Deficitário como quase todas as estatais no Brasil. A Sorocabana tinha uma revista mensal aonde vinha o balancete, era considerada como décimo segundo estado do Brasil em termos de arrecadação. A administração mudava conforme a mudança de governo. Cada governo eleito nomeava o presidente, a diretoria como cargos de sua confiança. Tive a oportunidade de ser chamado em São Paulo, onde conversei com um diretor e pude constatar seu total desconhecimento e despreparo para a função que exercia. O pessoal que ocupava a chefia de estação, de divisão, era efetivo, os cargos não eram de natureza política.
O senhor desligou-se da Sorocabana e foi trabalhar onde?
A baixa remuneração feita pela Sorocabana me levou a prestar um concurso no qual passei, e fui trabalhar no IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Fui nomeado para trabalhar em Ourinhos onde permaneci por um ano. Em 1973 fui para Assis, onde permaneci até o inicio de 1976. Na época me ofereceram a chefia do IBGE em Piracicaba, e assim vim para cá, onde assumi o cargo de Chefe da Agencia de Piracicaba.
Onde se localizava IBGE na época?
Funcionava na Rua Moraes Barros, ao lado de onde era a garagem da CPFL.
Quantos funcionários trabalhavam lá?
Existiam 11 funcionários.
Qual é a função básica do IBGE?
É fazer levantamento de todas as estatísticas possíveis. É comum associar o nome IBGE com estatística populacional. As pesquisas são em diversos campos: industrial, agrícola, estatísticas realizadas em cartórios, prisões.
A sede do IBGE fica aonde?
Fica no Rio de Janeiro.
O senhor permaneceu quanto tempo no IBGE?
Aposentei-me em 1992. Quando cheguei em Piracicaba , havia um censo qüinqüenal, que era o econômico e o agrícola, e estava em pleno andamento. Fiz o censo demográfico em 1980, depois em 1985 o censo agrícola e econômico e o censo demográfico de 1990.
Qual são as principais finalidades de um censo?
O censo é desde a época de Jesus Cristo. Quando ele nasceu, José e Maria iam prestar informações para o recenseamento. No Brasil começou por volta de 1910. É importante para conhecer a realidade de um país. Tem que haver estatística, embora nem todos reconheçam essa importância, na época tínhamos muitas dificuldades em obter informações. Tínhamos uma retaguarda legal que se a pessoa se negasse a prestar informações ela poderia ser intimada a fornecer os dados exigidos. Hoje a pessoa ao ser recenseada se negar a prestar informações ninguém pode obrigá-la a fazer.
As informações mais distorcidas são as de natureza econômica?
Isso sempre existiu, mesmo quando havia na época a garantia de sigilo total. A estatística no Brasil é relegada a um segundo plano. Quando houve a transição de governo, em que o Sarney assumiu a presidência, o censo demográfico de 1980 foi feito em 1981. Porque na fase de transição, percebendo que havia recursos alocados para o censo, os mesmos foram utilizados para outras finalidades. Com isso perdeu-se a série histórica de 10 anos. Até então, todo censo demográfico tinha sido feito com o ano terminado em zero.
De 1973 até os dias atuais o Brasil praticamente duplicou sua população. Isso é positivo?
Eu acho que o crescimento demográfico em certas regiões é necessário.
O senhor é formado pela UNIMEP?
Sou formado em Ciências Contábeis.
Tecnicamente a emancipação de pequenas localidades é um fator positivo?
Depende da cidade. Tem lugar, como por exemplo, Hortolândia e Sumaré. Hortolândia é maior do que Sumaré, no entanto era distrito de Sumaré. Nesse caso é justificável a emancipação. No Brasil há casos em que se cria um município, e o que se arrecada é insuficiente para pagar o salário do próprio prefeito! Há sinais de que vem uma nova onda de criação de novos municípios. Existem certas situações onde são claros os níveis de dificuldades para que o IBGE faça uma pesquisa. Em grandes centros, onde há regiões de alto índice de violência, é impraticável a realização de pesquisa! Quem se arrisca a entrar nesses locais? Não se trata de preconceito e sim de realidade. O Estado não sabe como atuar em situações dessas.
O fato do IBGE estar sediado no Rio de Janeiro e o centro do poder estar em Brasília podem afetar em alguma coisa?
Acredito que não. Atrapalharia mais se a sede localiza-se em Brasília!
Das diversas classes sociais e econômicas existentes qual é a mais propícia a dar informações corretas?
Acho que encontramos maiores facilidades com as classes menos elevadas. A informação é mais pura, mais real. A classe média e a alta trabalham as informações. Acho que falta uma conscientização por parte dessas pessoas, quando se apura o censo não aparece o nome de ninguém.

Comentários:
Li a entrevista, a qual revelou o universo dos ferroviários, cujo o entrevistado, o Senhor Lazaro foi ótimo memoralista, pois relatou ricos contextos históricos,de uma era sobre as rodas de ferro.
Ademir Pfiffer - Historiador - Jaraguá do Sul - SC
# postado por ValeItapocu : 8:45 AM












sexta-feira, janeiro 01, 2010

BABALORIXÁ AZOANE J`LOLÁ



PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 02 de janeiro de 2010
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.tribunatp.com.br/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: BABALORIXÁ AZOANE J`LOLÁ (Diz-se: Azoane Jilolá)
Conhecido em Piracicaba como J`Lolá (pronuncia-se Jilolá), palavra que em iorubá quer dizer “Rei do Sol” ou “Supremo de Dignidade, Virtudes, Qualidades”. É o nome de Obaluaê que é o Universo. Nascido em Salvador, Bahia, no dia 26 de agosto de 1941. Babalorixá, conhecido popularmente como Pai de Santo, que deveria ser chamado de Zelador de Orixá
O senhor é católico?
A minha família sempre foi católica, fui batizado na igreja católica. Eu sou Católico Apostólico Romano, vou á igreja, freqüento a missa. Eu sou o único da família que se interessou pelo candomblé.
Como o padre vê a sua espiritualidade?
Aqui em Piracicaba acredito que eles não sabem a respeito da minha espiritualidade, pelo fato de eu não ter contato com nenhum deles. Em Salvador na Igreja do Bonfim, a Lavagem da Igreja do Bonfim é o candomblé. Lá não existe essa divergência entre o candomblé e o catolicismo. Quando eu tive que fazer uma romaria na Igreja do Bonfim, como uma atividade do candomblé, fui á Igreja do Bonfim com toda a indumentária do candomblé. O Senhor do Bonfim no candomblé é Oxalá! As baianas quando lavam as escadas estão todas de branco, que é a cor de Oxalá. Quem é adepto do candomblé no dia de Oxalá, que é toda sexta feira, não usa roupa de cor, não come comida com sal.
Que idade o senhor tinha quando se despertou para o candomblé?
Eu estava mais ou menos com sete para oito anos de idade. O sentimento espiritual já nasce conosco. É o nosso anjo da guarda. Se ele permanecer abafado ele não se desenvolve. Minha mãe era professora na Ilha de Maré, nessa época eu tinha cinco a seis anos de idade. O dia 16 de agosto é dia de São Roque, nesse dia havia uma procissão marítima. Eu enlouquecia, saia de casa e entrava no mar, os pescadores me acolhiam. Com o passar do tempo, começou a manifestarem-se certas coisas em mim, que apesar de seu ser baiano era leigo no assunto. Eu tinha medo, não aceitava, era completamente contra essas manifestações espirituais.
Como eram essas manifestações?
De repente eu “sumia”, perdia totalmente a noção de tudo que me cercava. Os médicos classificaram “essas ausências” como uma doença clássica. Receitavam remédios fortes. Depois que entrei no candomblé isso tudo passou.
O senhor passou a freqüentar algum local específico em Salvador?
Freqüentei a casa do meu Pai de Santo, Waltinho de Iroco. O local do seu Pai de Santo é denominado Ilê Axé Iba Faromi. Estive lá no mês passado. Lá é que fui feito.
O que é “ser feito”?
É a firmeza daquela entidade. A gente é raspado, é pintado é catulado.
Qual é a diferença entre catulado e raspado?
O catulado é o corte do cabelo com uma tesoura, o raspado é com a navalha.
Esses detalhes que o senhor está fornecendo eram de conhecimento restrito?
Antigamente não era permitido fornecer esse tipo de informação, hoje está aberto. É importante que sejam divulgados para que a cultura seja preservada na sua forma correta.
Como é denominado o seu local, onde o senhor é Pai de Santo?
Quando passei a ser babalorixá recebi a denominação Ilê Axé Iba Tolu.
Quais são as diferenças entre a umbanda e o candomblé?
As diferenças estão nos toques, nas preparações para o axé. O candomblé tem sua origem na África. A umbanda foi desenvolvida no Brasil. A umbanda segue a linha de trabalho com espíritos. O candomblé trabalha com divindades.
Existe a atividade desenvolvida para produzir o bem como também para produzir o mal?
Existe! Isso é lógico! O babalorixá é um conselheiro geral. No mundo existem pessoas querendo fazer de tudo. Cabe ao babalorixá fazer o que melhor decidir que deve ser feito. Já houve caso em que fui procurado para desenvolver um trabalho extremamente prejudicial a uma pessoa. Eu não aceitei. Eu aprendi dentro da seita, que não se pode simplesmente fazer o mal ás pessoas, isso pode voltar contra mim mesmo, o meu anjo da guarda me devolve aquilo.
Existe algum tipo de pessoa que deseja provocar o mal para outra pessoa?
Os mais interessados nesse tipo de ação são pessoas envolvidas na política. Desejam que o seu adversário que se lasque! Procuram travar, enfraquecer, impedir o adversário de ter sucesso.
Pessoas com problemas sérios de saúde procuram suas orações?
Procuram! Somos impedidos de fazer certas coisas na vida, por ser uma afronta com o nosso espírito, com o nosso anjo da guarda. Por desconhecimento muitas vezes as pessoas agem de forma errada. Dentro do nosso ritual, das origens, quem manda em nossa cabeça é Iemanjá. Dia primeiro de fevereiro nas praias são feitas as homenagens á ela.
O senhor ficou até 25 anos de idade em Salvador?
Permaneci em Salvador, porém não me dedicava apenas a religiosidade, trabalhava como professor. Por parte da família da minha mãe todos foram professores, existe em Salvador colégio em nome do meu avô. Meu pai era policial. Toda a minha cultura foi para o lado da minha mãe. Antes de entrar no candomblé eu tinha medo, eu ficava assustado. Existia uma Mãe de Santo que passava sempre na porta da minha casa, quando eu a via, corria. Escondia-me, tal o medo que aquela mulher me dava. Quando entrei para o candomblé eu já não podia fazer mais isso, até que um dia, isso foi em 1961, ela disse-me: “Meu filho, você terá os melhores empregos em sua vida, mas a sua vocação é o candomblé”.
O senhor conheceu Mãe Menininha do Gantois?
Conheci. Ela fazia trabalhos com o meu Pai de Santo.
O senhor veio para São Paulo?
Vim para São Paulo, trabalhei na RCA VICTOR. Depois de certo tempo voltei para Salvador. Voltei para São Paulo, fui trabalhar em Congonhas, na Transbrasil Linhas Aéreas. Descobriram lá dentro que eu era espírita. Passou a ter um afluxo de funcionários da empresa, buscando comigo soluções para problemas afetivos, domésticos. Não havia a história de ver se poderia voar! (risos). É interessante, mas quanto maior o nível de cultura da pessoa maior é o seu gosto em buscar as respostas. É natural do ser humano. Acabei pedindo a conta da Transbrasil, voltei para Salvador. Permaneci mais um tempo lá. Voltei para São Paulo, fui trabalhar na Enciclopédia Britânica. Jogaram-me em Rio Branco, no Acre. Tinha a responsabilidade de realizar cobranças jurídicas. Eles me ofereciam boas condições de trabalho, passagens de avião.Eu morava em uma casa que a companhia me oferecia. Certo dia chegou uma mulher com uma criança e disse-me: “Benza o meu filho!”. Eu disse-lhe: “- A senhora está fora do seu juízo! Eu nem sei o que é isso!”. De tanto ela insistir, para satisfazê-la acabei atendendo o seu pedido. Noutra semana eu não dormia mais era muita gente na minha porta. Comecei a dispensar as pessoas. Voltei para São Paulo e pedi a minha conta. Voltei á Salvador.
E Piracicaba como surgiu na vida do senhor?
Vim em 1992 vim para passar uns dias e já faz 17 anos que estou aqui! Tenho 47 anos de espiritismo, reconhecido pela Federação Baiana de Culto Afro-Religioso.
O que é Ikiri?
É um coquinho. Nele eu consigo ver a trajetória de um ser humano. Só oito pessoas fazem essa leitura no mundo, sendo que mulher não tem acesso ao ikiri, assim meu Pai de Santo me orientou. O verdadeiro fundamento do ikiri está no fundamento branco do meio dos coquinhos. Quem estará presente é o seu anjo da guarda. É essencial que a pessoa esteja presente durante o ritual de leitura do ikiri, não pode ser feito via Embratel e também deve ser guardado o devido respeito, não podendo ser transportado de um lado para outro.
Como o senhor chama uma entidade?
Balançando um sino com duas bocas, ou campânulas, J`Lola explica: “O som produzido pelo adjá é a forma de chamar o Orixá. Não existe como eu falar venha cá”.
O senhor consegue visualizar acontecimentos próximos?
O falecimento da Kassia Eller eu vi aqui. A eleição do Lula eu vi aqui.
O senhor permite fazer duas perguntas que estão na cabeça de muitos brasileiros?
Claro, pode perguntar!
Quem será eleito presidente do Brasil?
(Nesse instante J`Lolá passa a jogar o Ikiri).
O Presidente Lula será o Fidel Castro só que discretamente, mesmo que ele coloque outra pessoa continuará governando na sombra. Ele não irá permanecer se reelegendo, irá colocar alguém, depois essa pessoa sairá, ele entrará de novo. Enquanto ele existir será presidente. Eu vejo isso. A futura presidente é uma mulher.
O Governador José Serra terá alguma chance?
O Serra poderá até atrapalhar ele.
Se a pessoa tiver muita fé em Deus ela estará totalmente protegida?
Lógico que estará. Primeiramente é Deus! Ele é o Ser Supremo.
Se alguém deseja a outro algum mal pode haver uma blindagem?
Se houver fé e um anjo de guarda fortalecido nada te acontecerá!
O senhor recomenda que as pessoas façam suas orações?
Lógico! Todo dia antes de dormir eu rezo, peço a Deus.
A oração é um escudo que o senhor recomenda para que as pessoas pratiquem no ano que se aproxima?
As pessoas devem rezar, ter fé.
O senhor tem uma oração especial para recomendar?
Quando vou deitar rezo: “Com Deus me deito, com Deus me levanto. Com a Graça de Deus, do Divino Espírito Santo. Rezo por três vezes. Amem. Deus me proteja e protegei meus inimigos”. Ás vezes eu rezo uma Ave Maria para as almas dos mortos, dos conhecidos.
Há uma falta de espiritualidade nos dias atuais?
Falta, há uma busca pela satisfação material. Há pessoas que esquecem que Deus está em toda parte e em todos os momentos. Não se podem cometer barbaridades, depois ir até um brechó, comprar um paletó e ir todo comportado a um culto qualquer e ficar perfeito. Sou do candomblé há 47 anos, venho de uma família católica, me considero católico, entro na igreja oro. Isso não é uma mistura, Deus é um só!
A cultura trazida da África mesclou-se com a religião católica?
Os escravos foram quem trouxeram isso tudo. A comida, a dança. Na Bahia teve uma época, que eu não cheguei a ver, mas que o candomblé era proibido. Eu peguei uma época em que para fazer um toque na sua casa precisava pedir licença na polícia.
O que é toque?
É uma festa com atabaque. Para realizar isso nos anos 50 era necessária a autorização policial.
Quando o senhor passa perto de uma pessoa “carregada” o senhor sente?
Sinto! Começo a abrir a boca, a bocejar.
Quem será o ganhador da Copa do Mundo em 2010?
Vai ter muita briga. O fato da representação brasileira sentir-se poderosa irá facilitar ao adversário. Eles estão muito convencidos. Tem graveto que derruba panela. Algum time fraco pode derrubar o grande, e isso pode acontecer ao Brasil. A África do Sul poderá ganhar a copa. A única coisa que pode favorecer o Dunga é que o anjo da guarda dele é da justiça.
Já pediram a ajuda do senhor para que fornecesse os possíveis resultados da Mega Sena?
Já! Eu digo que se eu soubesse não iria contar, iria eu mesmo jogar! Outra coisa, sorte a gente não adquire na vida, já nascemos com ela. Uma criança que nasce no chamado berço de ouro, tem de tudo. Muitas vezes essa pessoa tem um problema. Outra pessoa nasce á mãe joga no lixo, alguém a acolhe, ela um dia será um médico, um doutor. É a sorte!
Existe destino?
Quem faz é gente! Nesse mundo tudo que está na face da terra é o que Deus quer. Se nesse momento estou aqui fazendo isso é por ordem Dele. Não podemos discriminar nada. Ninguém quer ser ladrão, assassino, ou usar droga. Não por vontade própria. São conseqüências.
Uma família que tenha uma pessoa problemática, um dependente químico, por exemplo, há uma razão para a existência desse problema na família?
Tem alguma razão para que exista isso na família.
Um comentário sem fundamento, uma risada maldosa pode trazer conseqüências futuras?
Pode trazer conseqüências graves inclusive. Que acompanhará a pessoa até o final dos seus dias. Dependendo do que você vai falar a palavra é mais forte, em outras ocasiões a mente é mais forte.
O senhor tem discípulos?
Tenho muitos, alguns em grau avançado. É o que me deixa firme. Temos que saber espalhar, dividir.

FELIZ 2010 !




Ainda menino, lembro-me que na escola fazia o cabeçalho das provas, colocava o nome da cidade, o dia o mês e o ano...1965...1972...O ano 2000 era um tempo tão distante!

Hoje é dia 1 de janeiro de 2010, já não faço mais cabeçalhos em folha de papel almaço pautado. Penso apenas: como passou rápido! Hoje se não uso mais calças curtas, uso bermudas compridas. A tela e o teclado do computador substituíram a folha de papel almaço pautada. A letra era desenhada caprichosamente, e, acredite, usei caneta tinteiro com a tinta cor Azul Royal! Ainda não conhecíamos a caneta esferográfica! De uns tempos para cá, passei a observar que as pessoas com mais anos de vida, estão muitas vezes olhando para o vazio. Isso me intrigou muito, até descobrir que eu simplesmente não estava entendendo nada. Á frente dos seus olhos há uma tela de projeções virtuais. Suas recordações são projetadas ali, como um diretor de um filme, ela escala quem participa de suas lembranças. Geralmente os atores principais não podem mais serem escalados para novas produções. Mas é tão gostoso lembrar-se de desempenhos memoráveis, detalhes que passaram quase imperceptíveis. Quadro a quadro ela analisa os mínimos detalhes. Ás vezes sorri outras vezes deixa escorrer uma lagrima no canto dos olhos. São emoções legitimas dos anos que se passaram. E o mais interessante é que cada indivíduo produz seu próprio filme, escolhe o gênero: romântico, de aventuras, comédias, dramas e até...novelas! Dizem que a vida imita a arte.

Desejo que em 2010 e todos os anos que você tiver pela frente, realize suas mega produções, com os grandes astros que são as pessoas de sua convivência. E que escolha o gênero que mais lhe agrade. Desejo mais, que no dia em que seus olhos estiverem fixos no horizonte, projetando seus filmes virtuais, todos vejam um sorriso nos seus lábios!
João Umberto Nassif
Autor:

sexta-feira, dezembro 25, 2009

FREI SAUL PERON

FREI SAUL PERON
PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 26 de dezembro de 2009
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.tribunatp.com.br/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: FREI SAUL PERON
O Natal é uma data em que comemoramos o nascimento de Jesus Cristo. O Papai Noel, a figura do bom velhinho foi inspirada num bispo chamado Nicolau, que nasceu na Turquia em 280 d.C. O bispo, homem de bom coração, costumava ajudar as pessoas pobres, deixando saquinhos com moedas próximas às chaminés das casas. O presépio também representa uma importante decoração natalina. Ele mostra o cenário do nascimento de Jesus, ou seja, uma manjedoura, os animais, os reis Magos e os pais do menino. Esta tradição de montar presépios teve início com São Francisco de Assis, no século XIII. Essas informações são bem conhecidas. O que desperta a atenção é a de a cada dia a figura do Papai Noel estar mais próxima ao recorde do Guiness Book como “Maior Vendedor do Mundo”, sendo relegado a um segundo plano o verdadeiro sentido Natal. Só os pequeninos, e nem todos, acham que Papai Noel existe, mas a voracidade do consumo o materializa na mente de muitos adultos. O nosso entrevistado é muito estimado pelos piracicabanos que o conhecem. Pela sua franqeza e forma lúcida com que expõe suas convicções torna-se um baluarte em defesa do sentido original do Natal.
O nome civil do senhor qual é ?
Saul Peron, sou filho de Guerino Peron e Cezira Cadari Peron, uma família muito conhecida em Piracicaba, especialmente na Vila Rezende. Nasci no dia 5 de novembro de 1934, potanto já fiz 75 anos na localidade rural onde uns chamam de Guamiun por causa do córrego, também conhecida por Santa Fé que fica entre Vila Nova e Cruz Caiada.
Quantos filhos seus pais tiveram?
Cinco filhos. Até os quarenta anos de idade meu pai trabalhou na agricultura, mudando depois para Piracicaba, onde montou um armazém de secos e molhados, me parece que se chamava Empório São Benedito, na Avenida Dona Francisca, Vila Rezende, proximo onde hoje é o Restaurante Monte Sul.
Era uma zona praticamente rural?
Da casa do meu pai, quando se olhava na direção de onde hoje é o bairro Jardim Monumento, onde está o Mosteiro, a Igreja Nossa Senhora dos Prazeres, plantava-se arroz. Onde hoje é o Hospital dos Fornecedores de Cana praticamente determinava o limite das casas construídas. Quando menino eu conheci a Avenida Dona Francisca com meia dúzia de casas, era piso de terra, cercas de pau a pique. A única rua calçada era a Avenida Rui Barbosa, o bonde ia até o seu ponto final, passava pela Casa Valler e fazia seu ponto final onde hoje é um Posto de Saúde Municipal, pena que não tenha sido preservado. Hoje são mais rigorosos com relação á preservação das obras edificadas. Tomba-se um patrimônio, passando a responsabilidade integral de preservação e manutenção ao seu proprietário. É um procedimento comum pelo que sei no Brasil. Algumas experiências em Minas Gerais fizeram com que o bispo pedisse o apoio dos padres para que fosse feito o “destombamento” que permitisse que ele cuidasse das igrejas que estavam prestes a caírem.
O senhor estudou no Grupo Escolar José Romão?
Estudei por dois anos em um grupo escoar que ficava onde na época denominava-se Bimbóca, hoje Avenida Manoel Conceição. Era uma escola mista, e a escola ficava situada entre uma dúzia de casas, inclusive do Vitti. O Romão já existia, mas nós morávamos ali em baixo nessa época.
Ainda menino o senhor chegou a trabalhar na lavoura?
Trabalhei no sítio. Naquela época não havia impedimento para que o menor trabalhasse.
O senhor é favor ou contrário ao trabalho do menor de 16 anos de idade?
Eu acho que o menor não deve ser explorado. A criança não deve ser usada, manipulada. Há a possibilidade de se adquirir uma mão de obra barata sem oferecer segurança, muitas vezes obstruindo a ida da criança para a escola. No meu tempo não havia isso, ia-se á escola, na volta ia para a roça. Era uma atitude comum na época, em todos os lugares. O menor não ser explorado é uma situação evidente, que ele tenha uma oportunidade para estudar é mais evidente ainda. O poder público deveria providenciar uma maneira que permita á família uma sustentação. Um pai com dois ou três filhos pequenos, não tem um bom emprego, fica difícil. Em contrapartida o trabalho do menor proporciona a evasão das escolas.
O senhor acredita que essa proibição do menor de 16 anos de idade ser proibido de trabalhar, sem que o Estado ofereça a contrapartida é uma solução pela metade?
É sempre assim! É difícil uma solução total.
O senhor foi para O seminário Seráfico São Fidelis com que idade?
Eu devia ter de 15 para 16 anos de idade.
Foi uma mudança de vida radical?
Eu procedo de uma família muito religiosa. Nós morávamos no sítio, os meus avôs eram lideres da comunidade, quando havia missa lá, os celebrantes eram a maioria das vezes eram acolhidos em casa. Desde pequeno tive sempre um bom relacionamento com os frades, e a boa maneira de ser deles me encantou. A experiência familiar para o jovem é fundamental.
Ao ir para o seminário os estudos do senhor iniciaram-se como?
Começava-se com o ginásio, depois o equivalente ao colegial, nós denominávamos de Clássico. Antes de ingressar havia dois anos de preparatório, era a base. Três anos de ginásio, dois anos de curso clássico, e o noviciado, onde era feita a formação religiosa. Em seguida mais três anos de filosofia pura. Estudamos francês, italiano, grego clássico, grego bíblico, latim. Naturalmente se dava grade importância ao português.
Quantos anos o senhor estudou?
No Seminário Seráfico foram quatro a cinco anos, de lá fui para Mococa por dois anos, um ano em Taubaté, voltei ara Mococa onde permaneci por três anos, depois mais quatro anos e meio em São Paulo.
Era um longo período de estudos!
Naquele tempo do começo ao fim passava-se por 13 a 14 anos de estudos.
A oratória é importante na função religiosa?
No meu conceito a oratória é um dom pessoal, um carisma.
Qual é o segredo de um bom orador?
Eu penso que é a habilidade e convicção daquilo que você vai falar. É claro que tem que ser usada técnica específica. Quando você está fora do seu ambiente é natural ocorrer um pouco de inibição. Tenho facilidade em falar, desde que seja dentro do meu campo. Tem pessoas que fala sobre tudo de forma bastante natural, e pode ocorrer em erros.
Quando você está expondo um assunto, naquele assunto provavelmente seu domínio é acima da grande maioria que o escuta. Pode ocorrer de haver entre os ouvintes alguém que está com posições divergentes, e que nem sempre quem está apresentando tem uma resposta convincente. Em palestras de um nível mais elevado isso pode ocorrer com mais freqüência. Temos pessoas muito cultas, com grande capacidade, mas quando se apresentam em público pronunciam-se muito acima do entendimento da platéia.
Porque a Missa do Galo acabou?
As coisas mudam! Por que Missa do Galo? Porque era celebrada á meia-noite, hora do galo cantar. Naquele tempo ao se celebravam missas á noite, elas eram celebradas a noite. A missa tinha todo um encanto, por ser rezada a meia-noite. Era a missa festiva do Natal. Há padres que guardam essa tradição até hoje, se não me engano a Matriz da Vila Rezende manteve esse costume até muito pouco tempo. Naquele tempo você rezava a missa e ia embora para casa á pé. Quando eu era menino por muitos anos participei da Missa do Galo, celebrada pelo Monsenhor Gallo! Na nossa igreja será ás 20h00 minutos, vem uma enormidade de fiéis. Depois irão para sãs casas onde celebrarão em família com a ceia. Fato que acho muito importante, por reunir os membros da família.
Um fato que tem ocorrido ultimamente é a dificuldade de se adquirir presépios, e a farta variedade da figura de Papai Noel em situações inimagináveis.
O Natal está totalmente descaracterizado. O que vale hoje é o consumismo. Praticamente tudo que se encontra “brilhando” no comércio vem da China. Qual é o Natal na China? O cristianismo tem uma pequena parcela da população que pratica e sofre perseguições. É comércio e acabou. Isso existe em todas as partes do mundo. Se você for ao Japão poderá ter a impressão de que é o país mais cristão que existe! Natal para nós não é comércio! Sempre trabalhei, e consegui obter sucesso principalmente em cidades menores, incentivando os comerciantes a montarem presépios em suas vitrines. Inclusive alguns comerciantes chegaram a fazer a novena de Natal. Em uma cidade grande como Piracicaba isso se dilui. Eu tentei dar um colorido diferente á igreja, através de enfeites, de presépios, mensagens. Tentei fazer um pouco de frente aquilo que está ai. É um consumismo desnecessário.
Isso tudo empurra a pessoa para uma situação caótica?
De angústia inclusive! Os pais que não têm poder aquisitivo para adquirir presentes, as crianças que não irão receber praticamente nada, o vizinho que mora ao lado, tem coisas muito boas. O que deveria ser motivo de grande alegria para todo mundo para grande parte acaba sendo motivo de angustias e frustração. Até que ponto que as pessoas que estão nessa situação financeira, econômica e social têm condições religiosas de superar o problema e ter uma visão diferente do sentido do Natal.
A impressão de que se tem é que os confessionários á medida que esvaziam, enchem salas de psicólogos e psiquiatras. Qual é a opinião do senhor?
Fala-se. Comenta-se. São opiniões. Desconheço uma estatística que comprove isso cientificamente. É evidente que hoje a problemática é tão grande, que é importante que haja a confissão, mas é importante também que haja psicólogos, psiquiatras. Muitas vezes alguma pessoa que me procura para uma confissão, eu mando para o psiquiatra, para o médico. O problema da pessoa é muito mais de saúde psíquica do que problemas de pecado. Muitas vezes as pessoas não têm condições para pagar um psiquiatra, ela confessa seus pecados e eles são resultados de desajustes emocionais, familiares, sociais. Na nossa paróquia não diminuiu o número de confissões, pelo contrário, aumentou. Na última segunda feira fizemos uma confissão comunitária, havia praticamente 900 pessoas! É um rito especial. Vem pessoas de todos os cantos da cidade inclusive de outras cidades.
O senhor é um capuchinho convicto?
Sou convicto de que sou um verdadeiro frade!
Nas madrugadas, particularmente na televisão, há uma profusão de programas de cunho religioso, alguns até certo ponto hilários. Como o senhor vê isso?
Está profetizado na Bíblia! Haverá tempos em que surgirão falsos profetas de todos os lados que enganarão inclusive os santos.
O que significa no ano de 2009 o Natal, o nascimento de Jesus Cristo?
Significa tudo! Se Jesus Cristo não tivesse nascido nós não seríamos remidos. Nascimento, a vida Dele, a mensagem Dele, a morte e a ressurreição. O Natal é tudo, complementado com a Páscoa. Nada adiantaria Cristo ter nascido se não tivesse ressuscitado. Qual é o crédito da divindade de Jesus Cristo? É a fé na ressurreição! Ela não é a retomada de um cadáver, é o passar a existir em uma dimensão nova, fora do espaço, fora do tempo, fora da realidade humana concreta.
O senhor foi Frei Guardião aqui na Igreja dos Frades, e era tido como “durão”.
É meu caráter. Eu não mostro os dentes com muita facilidade. Se mudar, não sou eu. A incapacidade de gerenciar as próprias emoções são defeitos, limites do próprio caráter. Temos que trabalhar nosso caráter. São meus pontos de vista, se você me provar o contrário eu não tenho dificuldades em aceitar. Eu peço muitos conselhos ás pessoas! Não tenho também muita preocupação em ficar agradando, ou deixar de fazer alguma coisa porque o outro não concorda. Na minha vida nunca deixei de ter nenhuma iniciativa por medo do fracasso. Nem tudo deu certo. O fracasso é não tomar uma iniciativa por medo do fracasso.
O senhor escreveu algum livro?
Não. Tenho muitas palestras e conferências escritas. Acho que existe muito livro para ler hoje, eu não venço ler tanta coisa!

Comentários:
frei saul peron,
fiz minha primeira comunhão com o senhor em 1976, na capela São José, na Fazenda Taquaral, lá pelo fim da Av. Rio das Pedras.... quanta saudade!
sua benção,
Claudinei Pollesel
# postado por Claudinei Pollesel : 5:17 AM

segunda-feira, dezembro 21, 2009

BRUNO PRATA


                                                     BRUNO PRATA
PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 19 de dezembro de 2009
Entrevista: Publicada aos sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
http://www.tribunatp.com.br/
http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADO: BRUNO PRATA
Os dois bairros rurais vizinhos, Santana e Santa Olímpia, é formado em sua grande maioria por descendentes de tiroleses (trentinos). Bruno Prata nasceu no bairro de Santana, no dia 7 de setembro de 1947. Seus pais João Paulo Prata e Maria Balarim Prata tiveram seis filhos. Bruno Prata está cumprindo seu segundo mandato como vereador em Piracicaba. Além da sua atuação no legislativo ele reúne grande experiência acumulada na assessoria á prefeitos de Piracicaba. É tesoureiro da Pastoral da Caridade da Diocese de Piracicaba.
Onde o senhor realizou seus primeiros estudos?
Foi na Escola Rural da Fazenda Glória. Em Santana permaneci até um ano e meio de idade, depois fomos para Tabela. Lá a escola mais próxima ficava no Bairro do Recreio, uns quatro a cinco quilômetros da fazenda onde nós morávamos. A Escola da Fazenda Glória ficava um pouco mais longe, nós íamos de charrete. Na época havia a necessidade de alguém conduzir a charrete, inclusive porque era a condução que levava a professora depois que ela descia do ônibus que parava na Tabela.
Quem dirigia a charrete levando a professora?
Eu dirigia, na época tinha sete anos de idade, o percurso era de uns oito quilômetros aproximadamente.
Qual é a origem do nome do bairro Tabela?
Havia no local uma placa indicativa para o bairro Recreio. Então dizíamos que ali era Tabela do Recreio. Assim como Santa Luzia, foi o nome dado pelo Seu Pedro Mariconi, que tinha problemas de visão e foi curado, fato que ele atribuiu á Santa Luzia. Quando ele resolveu prestar essa homenagem á Santa Luzia ele procurou meu pai para ajudá-lo a conseguir mais adeptos ao seu propósito.
O pai do senhor exercia qual profissão?
Ele trabalhou na lavoura de café, aos vinte e cinco anos de idade, passou a trabalhar como barbeiro, acumulando a função de fabricar sapatos e arreios. Meus pais levantavam bem cedo e trabalhavam até as 10 horas da noite, inclusive aos sábados e domingos. Eles faziam arreios, tranças, laços, para serem usados em animais que trabalhavam na preparação da terra, na colheita. Não existia o processo mecanizado. Havia muitas encomendas dos engenhos, das usinas.
O senhor trabalhou na fabricação desses produtos?
Aos sete anos de idade eu comecei a trabalhar com selaria. Voltava da escola e já ficava trabalhando. Fabricávamos sapatões para serem utilizados no trabalho rural, não usávamos pregos, eram utilizados os “tornos” feitos de pinho, era um quadradinho com pouco menos de um centímetro. Com a água ele dilatava e nunca despregava, nem enferrujava. Após furar o sapato batíamos com o martelo sobre esses pinos de madeira, fixando-os como se fosse um prego normal. Não havia colas com a qualidade que encontramos hoje. Eu fui me especializando em calçados, fazia sapatos ortopédicos, sapatos femininos. Fazia o modelo, criava os moldes. A fabricação era feita sob encomenda.
Quem usava sapatos era considerado como privilegiado?
Isso acontecia principalmente na zona rural.
Como o seu pai conseguia ter duas atividades tão distintas, a de sapateiro e a de barbeiro?
É interessante! Quando a pessoa vinha procurar os seus serviços de barbeiro ele tinha que inclusive trocar de camisa, além de uma rigorosa limpeza das mãos. Na época a barba era feita com o uso da navalha.
O senhor chegou a aprender o oficio de barbeiro?
Sim! Cortei alguns cabelos, fazia a minha barba com navalha. A melhor navalha era a alemã solingen.
Acertar o fio da navalha é uma arte?
Como tínhamos a sapataria havia a facilidade de amolar na lixadeira, usava-se o rebolo, depois tinha uma pedra mais fina e por último o assentador.
Ao término do corte o cliente gostava de um perfume?
Utilizava-se Água Velva Royal Brilhar. A Bozzano veio depois.
Dizem que barbearia é um ponto fantástico de informação, é verdade?
É o núcleo da fofoca! Fala-se de tudo!
O senhor lembra-se da primeira “vitima” em quem fez a barba?
Lembro-me sim! Foi um primo meu, Renato Prata Garibaldi, falecido recentemente.
O barbeiro era uma figura de destaque na comunidade?
Muitos iam para a barbearia para conversar. Alguns faziam consultas ao me pai, relatavam intimidades, algumas vezes o meu pai tinha que auxiliar a família.
O gosto do senhor por política nasceu ali na barbearia?
Creio que sim! Porque se falava muito em política na barbearia, sobre Janio Quadros, Adhemar de Barros, Luiz Dias Gonzaga. É interessante essa observação, porque meus irmãos não se interessaram por política. Eu era muito curioso, procurava sempre ouvir o que diziam a respeito do que era dito ali
Em que ano a família mudou-se para Piracicaba?
Foi em 1964, tínhamos uma sapataria chamada Casa Prata. Era na Travessa Francisco Faria, 32 na Vila Rezende. A casa existe até hoje. Lá foram realizados os melhores natais das nossas vidas. Meu pai era vivo, tios, havia muitos amigos. Nossa casa era um ponto de referencia, á noite, na passagem do Natal, havia muitas pessoas, até mesmos os vizinhos iam até lá. As pessoas cantavam, a alegria era muito grande. Hoje não existe mais esse tipo de comemoração de Natal.
Era na época uma região menos urbanizada?
As ruas eram de terra, uma ocasião caiu uma carroça com animal e tudo em uma vala produzida pela erosão, decorrente do escoamento constante de águas servidas de uma empresa próxima. Ali era uma região freqüentada predominantemente por pessoas vindas de Santana, Santa Olímpia, Santa Terezinha, Charqueada.
Nessa ocasião a Casa Prata fornecia sapatões para os operários da Dedini?
Fabricávamos sapatões com solas grossas de pneus, para as pessoas poderem trabalhar com os lingotes de ferro, era comum o funcionário trabalhar por meia hora no manuseio dos lingotes e depois ir tomar leite gelado. Havia um constante revezamento de funcionários. A temperatura era muito alta. Trabalhávamos em quatro pessoas na produção da sapataria.
Com quantos anos o senhor casou-se?
Aos 22 anos de idade me casei com Eurides Barbosa Prata, nós tínhamos nos conhecido na escola, no bairro Recreio. Na época o pai dela era frangueiro. O trabalho dele era percorrer a zona rural, levando miudezas, armarinhos, tecidos, produtos industrializados, que muitas vezes eram permutados por ovos, frangos. Embaixo do carrinho de tração animal havia uma gaiola, onde eram transportados os frangos vivos. Meu sogro chamava-se Benedito Barbosa de Oliveira. A Eurides tinha mudado para Piracicaba, quando mudei para Piracicaba a procurei.
Onde foi realizado o casamento do senhor com Dona Eurides?
Foi na Igreja da Imaculada Conceição, na matriz antiga ainda, o celebrante foi Monsenhor Jorge Simão Miguel. Tivemos cinco filhos.
Após casarem-se onde foram morar?
Fizemos uma casa nos fundos da sapataria, nessa época já não havia mais barbearia. Permanecemos lá até 1983. Depois eu e a Eurides mudamos de lá.
Qual é a religião do senhor?
Sou católico, fui inclusive Procurador da Diocese por uns oito ou nove anos, é um cargo normalmente exercido por um padre. O Bispo na época era Dom Eduardo Koaik
Após exercer suas atividades na Casa Prata, o senhor seguiu outra profissão?
Em 1973 comecei a trabalhar como corretor imobiliário, sou um dos corretores mais antigos de Piracicaba. Na ocasião a Nova Piracicaba começou a ter seus lotes vendidos. O responsável pelo loteamento era o Coronel Antonio Bruno e o Capitão Laurival Oliveira, eram funcionários da City, empresa incorporadora. O escritório ficava na Rua Dona Francisca, onde é o Liceu hoje.
Até então a região onde hoje é a Nova Piracicaba era o que?
Era canavial. O loteamento lá começou em 1972 com Ludovico Trevisan, eram lotes padrões de 10 metros de frente por 30 metros de fundo. A City comprou essa área, e o padrão por ela adotado era de no mínimo 12 metros de frente.
A quem pertencia essa área?
Acho que pertencia também á Mário Áreas Vitier, conhecido como Mário da Baronesa.
Onde ficava a casa da Baronesa de Rezende?
Ficava em uma chácara situada no meio do canavial. Próxima onde hoje é a Igreja São Francisco.
Com a atuação do senhor na imobiliária os negócios evoluíram bastante?
Em um período houve uma evolução.
Havia desconfiança por parte do piracicabano de que a Nova Piracicaba poderia não ter o sucesso que teve?
Era difícil vender. Tinha-se que argumentar bastante, os lotes de terreno tinham ruas sem saída, as pessoas ficavam temerosas. O Coronel Bruno era um entusiasta do empreendimento, mostrava os padrões europeus. Quando os compradores passaram a sentir segurança no empreendimento houve uma grande procura pelos lotes. Nessa época trabalhava na imobiliária meu pai e eu, funcionava no mesmo local da Casa Prata.
O mercado imobiliário mudou daquela época para cá?
Não havia tantas exigências como existe hoje, zoneamento, a escritura era passada de forma bastante rápida e simples Hoje há a necessidade de tirar certidões, verificar se o imóvel não tem pendências jurídicas ou comerciais.
A negociação entre comprador e vendedor era mais confiável?
Muito mais confiável!
Quando foi o seu primeiro contato com a política?
Com a abertura política em 1979, 1980 passou a existir a possibilidade de criar-se partidos políticos. Criou-se o Partido Popular, PP, Francisco Salgot Castillon que havia sido injustamente cassado readquiriu seus direitos políticos. Houve a incorporação do PP pelo PMDB para derrotar Paulo Maluf na célebre eleição indireta onde Tancredo Neto venceu as eleições. Fui para o PMDB, e eu saí candidato a vereador foi em 1982, a primeira eleição da qual participei. E ganhei, fui o quarto mais votado de Piracicaba. O prefeito na época era Adilson Maluf. Fui bastante combativo, com atuação efetiva á favor da população. Algumas das minhas atuações tiveram grande repercussão na cidade. Após encerrar meu mandato fiquei um período fora da política. Quando o prefeito Antonio Carlos Mendes Thame foi eleito me convidou para ser seu assessor, meu trabalho era o de acompanhamento de projetos do legislativo.
Como era o Thame como prefeito?
Muito rígido e muito trabalhador. Ás vezes, duas horas da manhã tocava o telefone na minha casa, era o Thame ligando. Não tinha horário, não almoçava, não jantava. Mesmo quando fazia campanha, saia de madrugada com ele, as quatro cinco horas, voltávamos meia noite, uma hora da madrugada seguinte, não almoçávamos, comíamos alguma coisa, e trabalhavamos sem parar. Com isso adquiri o vício de não ter refeições regulares. Hoje eu mudei.
Quando o Thame terminou o mandato o senhor também deixou a assessoria?
Sai quando terminou o período do mandato do Thame. Foi eleito como prefeito Humberto de Campos. Ele me convidou para realizar o mesmo trabalho, o que fiz durante sua gestão. Com a eleição do prefeito José Machado, passei a trabalhar como assessor do deputado Thame. Quando o prefeito Barjas Negri foi eleito exerci a função de seu assessor. No segundo mandato do prefeito Barjas Negri, seis meses antes do período eleitoral sai como candidato a vereador. Fiquei como suplente da vereadora Rosangela Camolesi. Ela assumiu a secretaria municipal de Ação Cultural eu assumi a suplência.
Como é trabalhar com o prefeito Barjas Negri?
Trabalhar com o prefeito Barjas Negri é bom por ser uma administração que tem uma boa referencia popular, ele tem uma aprovação recorde.
Hoje, como vereador qual é a sua bandeira principal?
Meu trabalho principal é o combate as drogas.
O senhor é um político por vocação?
Toda vez que me candidato a minha família é contra.
O que é Pastoral da Caridade?
Pastoral do Serviço da Caridade foi criada por Dom Eduardo, abrange a todos os benefícios que a diocese faz: Pastoral da Criança, Ceame, que trabalha com dependentes químicos, Projeto Recrear, Banco dos Remédios, que distribui gratuitamente remédios á quem não tem condições para adquirir. Essa farmácia existe há 20 anos.
Quando o senhor assiste as imagens transmitidas pelas redes de televisão, mostrando os descalabros que ocorrem em determinados meios políticos qual é a sua reação?
Revolta muito, isso não é política!
Na sua concepção o que é política?
Política é o que definiu Thomaz de Aquino no século XIII: “A arte do bem comum”. Pio XII disse algo formidável: “Uma das maneiras mais belas de se praticar a caridade é através da atividade política”.
A Igreja Católica tem uma grande força junto á população, ela movimenta forças dentro do quadro político que se apresenta?
Ela movimentava mais no tempo de João Paulo II, ela era mais ousada. Com Ratzinger ele ceifou esse ímpeto revolucionário da igreja. A CNBB se pronunciou, condenou atos reprováveis, mas não dita ao clero qual deve ser a ação a ser tomada.
Qual é a saída para a política nacional?
A adoção do voto distrital, que infelizmente não ocorre por falta de interesse de alguns políticos, por motivos óbvios. O Parlamentarismo é outra solução. Hoje, em tese, um analfabeto pode ser eleito.

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